Existe metafísica na ciência?

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Joao Valle
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Mensagem por Joao Valle »

Fernando escreveu: Mas nós só podemos provar algo a outras pessoas por meio do método empírico? Outras pessoas podem corroborar nossa tese apenas pela experiência?


Voce pode utilizar ilusionismo, proselitismo e outras técnicas de convencimento. A crença no papai noel se baseia nisto: na incapacidade do pensamento indutivo nas crianças... Pense bem: voce acredita num velhinho que mora no polo norte, tem uma fábrica de brinquedos onde trabalham duendes, sabe quem é bom e mau, todo o ano voa num trenó puxado por renas e entrega presentes ao redor do mundo em apenas 1 noite?
Mas possívelmente quando criança você acreditou, e acreditou tão fervorosamente que, quando uma criança maior dizia: "não existe", voce respodia: "existe sim. eu sei porque minha mãe me disse e eu recebo presentes todo o ano".
Isto bastava para nós nesta época, mas ao crescer começamos a desenvolver seu pensamento indutivo e utilizar outros elementos para corroborar a premissa, que por fim comprova ser falsa...

Um bom cético vai tentar localizar elementos que falseiem ou corroborem a premissa. Entretanto, para muitos, a ausência de evidências gera um estado de "pseudo-ceticismo", e em vez de colocar a premissa num estado de "indefinição" (ou teoria), descambam para a absoluta negação.

Por exemplo: voce pode tentar convencer um indígena polinésio sobre a existência do gelo, e ele pode acreditar ou não, até que veja um cubo de gelo e se convença. E você, acredita que existe gelo? Porque?

Suponha que eu lhe apresente uma maçã azul. Quantas maçãs azuis voce já viu? Então voce tentaria encontrar expedientes conhecidos para justificar a cor desta maçã, tipo: "foi pintada", "foi cultivada em água com corantes", etc. E se não encontrar nenhum expediente justificável poderá negar a evidência devido a probabilidade remotissima deste evento ocorrer naturalmente... Mas pode ser verdade...

A "realidade" é uma questão "cognitiva"... E a "verdade" não é necessáriamente a "realidade".

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-D-S-
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Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por -D-S- »

Uma pergunta um bocado fora.

A Filosofia pode dizer algo sobre o Mundo?

O Filósofo Thomas Nagel diz que, por exemplo, não podemos refutar o Solipsismo (a ideia de que só eu existo) com argumentos filosóficos. Porque acabamos sempre num argumento circular, uma vez que só disposmos de estados mentais para falar sobre um mundo lá fora, e não temos uma forma direta de falar sobre o mundo. Apesar de tudo, só um maluco é solimpsista. Todos acreditamos que há um mundo exterior a nós. É um instinto poderoso que todos temos e dificilmente levamos a sério o fato de não conseguirmos refutar filosóficamente o Solimpsismo. Neste caso preferimos a crença ao céticismo. Algo semelhante se passa com um chamado ceticismo em relação ao exterior. Mesmo aceitando um mundo exterior que podemos dizer sobre ele? Não será possível ele ser totalmente diferente do meu mundo mental? Afinal a minha mente pode estar numa cuba. Uma vez mais temos o instinto de que há uma correlação positiva entre o mundo mental e o mundo exterior. E tanto melhor é essa correlação quanto melhores forem os nossos sentidos. Mas filosóficamente não podemos refutar o ceticismo em relação ao exterior por causa da circularidade. Usamos sempre o nosso mundo mental e indireto para falarmos do mundo exterior.

Não terá isto algo a ver com a metafísica? Se filosóficamente não podemos decidir para além de qualquer dúvida o valor da REALIDADE ou sequer se há uma REALIDADE exterior... de que vale a metafísica? Não está a metafísica num eterno ceticismo que nunca se resolve?

Pessoalmente prefiro ser crente contra o solimpsismo e o ceticismo em relação ao exterior. Logo, a metafísica é um pouco irrelevante para mim.

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Hugo
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Hugo »

-D-S- escreveu:O Filósofo Thomas Nagel diz que, por exemplo, não podemos refutar o Solipsismo (a ideia de que só eu existo) com argumentos filosóficos. Porque acabamos sempre num argumento circular, uma vez que só disposmos de estados mentais para falar sobre um mundo lá fora, e não temos uma forma direta de falar sobre o mundo. Apesar de tudo, só um maluco é solimpsista.


Sério, eu pensava exatamente assim quando era um pouco menor. Acho que havia lido algum resumo sobre Descartes e ficado meio impressionado. Penso, logo existo. Mas e se tudo o mais for uma ilusão?

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Fernando
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Mensagem por Fernando »

Joao Valle escreveu:E tanto melhor é essa correlação quanto melhores forem os nossos sentidos. Mas filosóficamente não podemos refutar o ceticismo em relação ao exterior por causa da circularidade. Usamos sempre o nosso mundo mental e indireto para falarmos do mundo exterior.

Não terá isto algo a ver com a metafísica? Se filosóficamente não podemos decidir para além de qualquer dúvida o valor da REALIDADE ou sequer se há uma REALIDADE exterior...


Que mundo exterior? É preciso de muita, muita, mas muita filosofia mesmo pra dizer que uma coisa é o que está na minha MENTE e outra é o que está LÁ FORA.

La fora onde? As idéias verdadeiras não estão na minha cabeça. Nem as coisas estão la fora. A idéia não é material, e enquanto tal não precisa estar em lugar algum.

Quando alguém diz que nós temos uma representação da mesa pq a mesa, ela mesma, não cabe dentro da nossa mente, não está sendo nem um pouco ingênuo. Tem MUITA filosofia por trás desta cisão entre sujeito e objeto.

Veja bem. A questão da correspondência, tal como era usada pela filosofia metafísica era uma metáfora, não um princípio da verdade como correspondência.

A metáfora era essa: Numa balança nós colocamos coisas diferentes em cada lado (imagine uma balança antiga). Quando a balança é equilibrada, é sinal de que o MESMO pesso está em ambas. Não existe um peso de 2 Kg de um lado e outro peso de 2 Kg do outro. O peso é o MESMO em ambos os lados.

Da mesma forma, quando nós conhecemos a realidade, conhecemos aquilo que ela própria é. Aquilo que é o mesmo na realidade e no nosso pensamento. Se existe IDENTIDADE entre aquilo que se chama de 'coisa' e o que se chama de 'nosso pensamento' não pode existir uma exterioridade. Não se cai no solipcismo. Pq o solipcismo é a pressuposição de que existe uma coisa interior e outra exterior, quando no conhecimento verdadeiro não existe nem interioridade nem exterioridade.

Muitos lêem Descartes como solipsista. Mas Descartes tb é muito mal lido.


Joao Valle escreveu:Por exemplo: voce pode tentar convencer um indígena polinésio sobre a existência do gelo, e ele pode acreditar ou não, até que veja um cubo de gelo e se convença. E você, acredita que existe gelo? Porque?


A realidade não vai mudar em nada se o índigena polinésio não acreditar na existência do gelo.

Joao Valle escreveu:Suponha que eu lhe apresente uma maçã azul. Quantas maçãs azuis voce já viu? Então voce tentaria encontrar expedientes conhecidos para justificar a cor desta maçã, tipo: "foi pintada", "foi cultivada em água com corantes", etc. E se não encontrar nenhum expediente justificável poderá negar a evidência devido a probabilidade remotissima deste evento ocorrer naturalmente... Mas pode ser verdade...


Eu não discuto valores empíricos. Se um cientista me disser que existem maças azuis eu vou falar "tá bom", e vou continuar falando do meu discurso como se o cientista não tivesse falado nada.

O que só pode ser empiricamente conhecido, só pode ser conhecido através de testes empíricos e experimentação. Mas é justamente isso que não é objeto da metafísica. É justamente isso que é conhecimento obscuro e mutilado. Os próprios cientistas confirmam isso ao dizer que nunca pode saber se o que dizem é ou não uma verdade em sentido último.
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Fernando
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Fernando »

Kramer escreveu:
-D-S- escreveu:O Filósofo Thomas Nagel diz que, por exemplo, não podemos refutar o Solipsismo (a ideia de que só eu existo) com argumentos filosóficos. Porque acabamos sempre num argumento circular, uma vez que só disposmos de estados mentais para falar sobre um mundo lá fora, e não temos uma forma direta de falar sobre o mundo. Apesar de tudo, só um maluco é solimpsista.


Sério, eu pensava exatamente assim quando era um pouco menor. Acho que havia lido algum resumo sobre Descartes e ficado meio impressionado. Penso, logo existo. Mas e se tudo o mais for uma ilusão?


A próxima pergunta depois da conclusão de que vc existe é, como posso conhecer as coisas com esta mesma certeza que me conheço? E não será que o mundo existe. Pq responder à questão da existência do mundo é pressupor a possibilidade de conhecer ou não conhecer o mundo. Só se não fosse possível conhecer o mundo é que poderíamos cair neste solipcismo.

Eu sei que vc está falando de algo pessoal seu. Mas é que se encaixa muito bem no assunto que estamos tratando.

Mas vc duvidava da realidade pq era criança e ainda não conseguia pensar direito. (hehehe)
:emoticon1:
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Joao Valle
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Mensagem por Joao Valle »

Fernando escreveu:Se existe IDENTIDADE entre aquilo que se chama de 'coisa' e o que se chama de 'nosso pensamento' não pode existir uma exterioridade. Não se cai no solipcismo. Pq o solipcismo é a pressuposição de que existe uma coisa interior e outra exterior, quando no conhecimento verdadeiro não existe nem interioridade nem exterioridade.


Somos simplesmente incapazes de compreender completamente um grão de sal. Então não existe a possibilidade de haver um conhecimento "pleno" e "absoluto" sobre o objeto percebido, e portanto "verdadeiro".

(Carl Sagan - Can We Know the Universe?)
"Consider one microgram of table salt, a speck just barely large enough for someone with keen eyesight to make out without a microscope. In that grain of salt there are about 10^16 sodium and chlorine atoms ...
How much can the brain know? There are perhaps 10^11 neurons in the brain, the circuit elements and switches that are responsible in their electrical and chemical activity for the functioning of our minds. A typical brain neuron has perhaps a thousand little wires, called dendrites, which connect it with its fellows. If, as seems likely, every bit of information in the brain corresponds to one of these connections, the total number of things knowable by the brain is no more than 10^14, one hundred trillion. But this number is only one percent of the number of atoms in our speck of salt.
So in this sense the universe is intractable, astonishingly immune to any human attempt at full knowledge. We cannot on this level understand a grain of salt, much less the universe."

Fernando escreveu:A realidade não vai mudar em nada se o índigena polinésio não acreditar na existência do gelo.

A verdade pode não mudar, mas a realidade sim pois a realidade é formada através da cognição. O indigena que nunca viu um cubo de gelo não pode falar daquilo que não conhece, então para ele esta "realidade" não existe.
Para um doente esquizofrenico os sonhos as vozes da sua "cabeça" são reais, e fazem parte da sua realidade.
Alterações cognitivas (ou estados alterados da mente) provocadas por stress ou drogas alucinógenas podem criar outras "realidades" ou alterar sua percepção em relação à realidade que voce vive hoje.
E se um sonho não é "real", porque muitas vezes acreditamos ser "real"?
Simplesmente porque o conceito de "realidade" é cognitivo.

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Samael
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Samael »

Fernando escreveu:
Samael escreveu:Yep. Você tá certo, Fernando.

Eu só quis salientar que muito do nosso método empírico (considerado por muitos a base da ciência) tem raízes metafísicas muito profundas.


E eu só quis salvaguardar a possibilidade da metafísica instituir-se como ciência independentemente da física.


Longe de mim querer defender qualquer coisa desse tipo, nem a um ponto (o realismo obtuso) nem a outro (a divagação total sem conexão com a realidade).

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Fernando
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Mensagem por Fernando »

Joao Valle escreveu:Somos simplesmente incapazes de compreender completamente um grão de sal. Então não existe a possibilidade de haver um conhecimento "pleno" e "absoluto" sobre o objeto percebido, e portanto "verdadeiro".

(Carl Sagan - Can We Know the Universe?)
"Consider one microgram of table salt, a speck just barely large enough for someone with keen eyesight to make out without a microscope. In that grain of salt there are about 10^16 sodium and chlorine atoms ...
How much can the brain know? There are perhaps 10^11 neurons in the brain, the circuit elements and switches that are responsible in their electrical and chemical activity for the functioning of our minds. A typical brain neuron has perhaps a thousand little wires, called dendrites, which connect it with its fellows. If, as seems likely, every bit of information in the brain corresponds to one of these connections, the total number of things knowable by the brain is no more than 10^14, one hundred trillion. But this number is only one percent of the number of atoms in our speck of salt.
So in this sense the universe is intractable, astonishingly immune to any human attempt at full knowledge. We cannot on this level understand a grain of salt, much less the universe."


É, conhecer totalmente alguma coisa pelo método empírico é meio complicado mesmo.

Joao Valle escreveu:A verdade pode não mudar, mas a realidade sim pois a realidade é formada através da cognição. O indigena que nunca viu um cubo de gelo não pode falar daquilo que não conhece, então para ele esta "realidade" não existe.
Para um doente esquizofrenico os sonhos as vozes da sua "cabeça" são reais, e fazem parte da sua realidade.
Alterações cognitivas (ou estados alterados da mente) provocadas por stress ou drogas alucinógenas podem criar outras "realidades" ou alterar sua percepção em relação à realidade que voce vive hoje.
E se um sonho não é "real", porque muitas vezes acreditamos ser "real"?
Simplesmente porque o conceito de "realidade" é cognitivo.


Ok. Quando eu falo de realidade, penso a realidade como sinônimo de verdade. Pq pra mim a realidade independe da nossa cognição. A realidade é aquilo que permite a nossa cognição, e enquanto tal, nossos conhecimentos dependem intrinsecamente dela.

Ou vc acha mesmo que quando foi desoberto que a terra não era o centro do universo todo o cosmos parou e começou uma nova ação de acordo com aquele conhecimento?
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Dante, the Wicked
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Dante, the Wicked »

Samael escreveu:
Fernando escreveu:
Samael escreveu:Yep. Você tá certo, Fernando.

Eu só quis salientar que muito do nosso método empírico (considerado por muitos a base da ciência) tem raízes metafísicas muito profundas.


E eu só quis salvaguardar a possibilidade da metafísica instituir-se como ciência independentemente da física.


Longe de mim querer defender qualquer coisa desse tipo, nem a um ponto (o realismo obtuso) nem a outro (a divagação total sem conexão com a realidade).


Que há uma realidade que pode ser conhecida é algo que transcende à própria realidade. Independe dela ser newtoniana ou quantica. Aliás, antes de saber se a realidade é newtoniana ou quantica eu preciso saber se há uma realidade que pode ser conhecida. Portanto, que há uma realidade que pode ser conhecida, é algo metafísico.
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Joao Valle
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Mensagem por Joao Valle »

Fernando escreveu: Ok. Quando eu falo de realidade, penso a realidade como sinônimo de verdade. Pq pra mim a realidade independe da nossa cognição. A realidade é aquilo que permite a nossa cognição, e enquanto tal, nossos conhecimentos dependem intrinsecamente dela.

Ou vc acha mesmo que quando foi desoberto que a terra não era o centro do universo todo o cosmos parou e começou uma nova ação de acordo com aquele conhecimento?


É apenas uma questão de termos... Eu cito realidade como resultado da percepção da verdade. A verdade não muda, mas a percepção pode mudar.
Antigamente se considerava que a "realidade" era a terra como centro do universo, e isto se deve deve a uma simples insuficiência cognitiva. Ver o sol "girando" ao redor da terra é uma simples questão de relatividade do observador.
Em um determinado momento obtiveram-se mais dados e alterou-se a percepção.
O que quero dizer com tudo isto é que existe um vácuo, um "gap" entre a "verdade" e a percepção. E a percepção é sempre deficiente para capturar a verdade em sua totalidade. Então sempre criamos modelos mentais da verdade, que denominamos "realidade".
E estes modelos mentais tem sempre aspectos incompletos e imperfeitos.
Se a percepção fosse absoluta e perfeita não existiriam "teorias" e "problemas" para resolver...
Porisso disse desde o começo que a metafísica nos ajuda como "um esforço extraordinariamente obstinado para pensar com clareza"...

Dante, the Wicked
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Mensagem por Dante, the Wicked »

Joao Valle escreveu:
Fernando escreveu: Ok. Quando eu falo de realidade, penso a realidade como sinônimo de verdade. Pq pra mim a realidade independe da nossa cognição. A realidade é aquilo que permite a nossa cognição, e enquanto tal, nossos conhecimentos dependem intrinsecamente dela.

Ou vc acha mesmo que quando foi desoberto que a terra não era o centro do universo todo o cosmos parou e começou uma nova ação de acordo com aquele conhecimento?


É apenas uma questão de termos... Eu cito realidade como resultado da percepção da verdade. A verdade não muda, mas a percepção pode mudar.
Antigamente se considerava que a "realidade" era a terra como centro do universo, e isto se deve deve a uma simples insuficiência cognitiva. Ver o sol "girando" ao redor da terra é uma simples questão de relatividade do observador.
Em um determinado momento obtiveram-se mais dados e alterou-se a percepção.
O que quero dizer com tudo isto é que existe um vácuo, um "gap" entre a "verdade" e a percepção. E a percepção é sempre deficiente para capturar a verdade em sua totalidade. Então sempre criamos modelos mentais da verdade, que denominamos "realidade".
E estes modelos mentais tem sempre aspectos incompletos e imperfeitos.
Se a percepção fosse absoluta e perfeita não existiriam "teorias" e "problemas" para resolver...
Porisso disse desde o começo que a metafísica nos ajuda como "um esforço extraordinariamente obstinado para pensar com clareza"...


Os conceitos podem depender de nós, mas a verdade não.
Por exemplo, veja as seguintes proposições: "o gato está sobre a mesa", "o felino está sobre o artefato de madeira" e "o bichinho peludo está sobre a mesa". Estas três proposições descrevem o mesmo estado de coisas com conceitos distintos, os quais estão relacionados a cosmovisões distintas. Porém, a verdade das três proposições acima depende apenas de uma coisa: que na realidade factual exista uma entidade que se enquadra dentro do conceito que assume o lugar de sujeito ("gato", "felino" ou "bichinho peludo"), exista uma entidade que se enquadra dentro do conceito que assume o lugar de predicado ("mesa" ou "artefato de madeira") e a primeira exerça, no presente, a relação "estar sobre" com a segunda.
Ou seja, uma vez que definimos nossos conceitos e construimos nossa cosmovisão, não podemos mais estipular o que é verdade, mas descobrir o que é verdade.

Na questão geocentrismo X heliocentrismo, o fato é que os gregos (geocentristas no geral) não tinham um conceito de movimento precisamente definido. Mas dado o conceito que eles tinham, eles estavam equivocados no que concerne o movimento dos astros.
Só na física clássica que o conceito de movimento veio a ser precisamente definido. A saber, quem se movimenta é o corpo que está sob ação de uma força ou energia que o põe em movimento. Nesta perspectiva, quem se movimenta é a Terra em torno do Sol, e não o contrário.
Com a teoria da relatividade geral, a coisa muda de figura. Segundo conceito que esta teoria tem de movimento, não faz diferença se a roda de bibicleta gira em torno de si mesma ou o universo gira em torno da roda de bicicleta.

É isto. Alguém me corrija se eu estiver errado nas minhas ponderações sobre a física.
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Samael
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Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Samael »

Dante, a partir do escopo observado, a realidade não pode mudar? Por exemplo, de uma visão microscópica, podemos ver tanto a mesa quanto o gato de uma forma, com partículas móveis, espaços vazios entre as partes, etc...

De uma visão microscópica, temos a visão comum relatada.

Você não acha que a realidade não depende unicamente de si mesma, mas também do ponto de vista do observador?

Dante, the Wicked
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Dante, the Wicked »

Samael escreveu:Dante, a partir do escopo observado, a realidade não pode mudar? Por exemplo, de uma visão microscópica, podemos ver tanto a mesa quanto o gato de uma forma, com partículas móveis, espaços vazios entre as partes, etc...

De uma visão microscópica, temos a visão comum relatada.

Você não acha que a realidade não depende unicamente de si mesma, mas também do ponto de vista do observador?


A realidade não depende dos nossos conceitos, mas nosso conhecimento sim. A realidade e as coisas que a compõe têm suas propriedades as quais independem totalmente do juízo que fazemos delas. O problema é que a apercepção das propriedades depende mais da cosmovisão, da relevância dada pelo sujeito cognoscente a ela, do que aquilo que a coisa seja em si.
Por exemplo, os gregos repararam que alguns astros não mantinham a posição relativa no céu, então criaram o conceito de "planeta" que se refere especificamente a estes, construindo assim um conhecimento.
Mas suponha uma tribo nômade que nunca fique muito tempo em um lugar, nunca volte para o mesmo lugar dentro de uma geração e cuja marcha migratória seja desordenada. Essa gente sequer desenvolveria o conceito de "posição relativa", muito menos o de "planeta".
Então é isto. O que se vem a conhecer depende préviamente do que já se sabe. O que se diz sobre as coisas é sempre feito sob a óptica de uma cosmovisão construída com conceitos.
Isto não quer dizer que o conhecimento seja totalmente relativo. Os povos que tem o conceito de "posição relativa" e identificavam isto no céu, são capazes de fazer prognósticos certeiros acerca de fenômenos astronômicos. Também existe um ótimo motivo para termos uma intrincada taxonomia dos seres vivos do que simplesmente usar a tomista (três tipos de animais: nocivos, benéficos ou indiferentes ao homem). Um motivo que vai além de determinação social.
Por outro lado, não dá pra levar a sério esta balela positivista de um conhecimento puro e absolutamente objetivo. Isso pressupõe uma linguagem formada por conceitos que descrevem o que a realidade é independentemente dos olhos humanos. E nós nunca poderíamos dizer o que a realidade é de fato, apenas como ela se apresenta aos nossos olhos.
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Dante, the Wicked »

Samael escreveu:Você não acha que a realidade não depende unicamente de si mesma, mas também do ponto de vista do observador?


ah... e por acaso, a realidade quantica depende, não do observador, mas da observação.
O Fayman te explica isto.
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Re: Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Samael »

Dante, the Wicked escreveu:
Samael escreveu:Dante, a partir do escopo observado, a realidade não pode mudar? Por exemplo, de uma visão microscópica, podemos ver tanto a mesa quanto o gato de uma forma, com partículas móveis, espaços vazios entre as partes, etc...

De uma visão microscópica, temos a visão comum relatada.

Você não acha que a realidade não depende unicamente de si mesma, mas também do ponto de vista do observador?


A realidade não depende dos nossos conceitos, mas nosso conhecimento sim. A realidade e as coisas que a compõe têm suas propriedades as quais independem totalmente do juízo que fazemos delas. O problema é que a apercepção das propriedades depende mais da cosmovisão, da relevância dada pelo sujeito cognoscente a ela, do que aquilo que a coisa seja em si.
Por exemplo, os gregos repararam que alguns astros não mantinham a posição relativa no céu, então criaram o conceito de "planeta" que se refere especificamente a estes, construindo assim um conhecimento.
Mas suponha uma tribo nômade que nunca fique muito tempo em um lugar, nunca volte para o mesmo lugar dentro de uma geração e cuja marcha migratória seja desordenada. Essa gente sequer desenvolveria o conceito de "posição relativa", muito menos o de "planeta".
Então é isto. O que se vem a conhecer depende préviamente do que já se sabe. O que se diz sobre as coisas é sempre feito sob a óptica de uma cosmovisão construída com conceitos.
Isto não quer dizer que o conhecimento seja totalmente relativo. Os povos que tem o conceito de "posição relativa" e identificavam isto no céu, são capazes de fazer prognósticos certeiros acerca de fenômenos astronômicos. Também existe um ótimo motivo para termos uma intrincada taxonomia dos seres vivos do que simplesmente usar a tomista (três tipos de animais: nocivos, benéficos ou indiferentes ao homem). Um motivo que vai além de determinação social.
Por outro lado, não dá pra levar a sério esta balela positivista de um conhecimento puro e absolutamente objetivo. Isso pressupõe uma linguagem formada por conceitos que descrevem o que a realidade é independentemente dos olhos humanos. E nós nunca poderíamos dizer o que a realidade é de fato, apenas como ela se apresenta aos nossos olhos.


Perfeito, não tenho nada a discordar. Acho que a realidade independe do observador, já o objeto é totalmente dependente do observador, visto que necessita dos próprios conceitos para ser. Inclusive, a etimologia de "objeto" explicita isso.

Dante, the Wicked
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Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Dante, the Wicked »

Por acaso, Rodrigo, estou lendo Comte, Reorganizar a Sociedade. Ser chamado de "positivista" agora me parece bem mais ofensivo que anteriormente.
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Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Samael »

:emoticon12:

O positivismo tem várias facetas para ser descrito apenas como uma "religião cientificista".

Dante, the Wicked
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Re.: Existe metafísica na ciência?

Mensagem por Dante, the Wicked »

Só pra constar, considero o marxismo uma cosmovisão completamente viciada, cheia de conceitos vazios e completamente prescindíveis.
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Fayman
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Mensagem por Fayman »

Fernando escreveu:Só pra explicar sobre o Fayman. Ele NUNCA aceitou isso que vc diz. Pelo menos não em discussões comigo. Pois no fundo eu sei que existe uma metafísica materialista por detrás da forma que defende a mecânica quântica. A unidade articuladora da pluralidade é, para ele, o átomo, e com isso os problemas quânticos. Os problemas quânticos são aqueles que dizem respeito de forma mais descolada possível e menos passível de interpretações ao funcionamento do mundo. A realidade é quantica pq o mundo, em seu estado mais FUNDAMENTAL (olha a noção de fundamento aparecendo no radical de uma expressão muito utilizada por ele), a realidade é o conjunto de reações quânticas.

Se vc olhar o tópico que ele abriu sobre a realidade quântica vc verá que a mecância quântica é a ciência mais fundamental, pois é a que está maix próxima do mundo. Tudo bem, isso não pretende desvalorizar as outras ciências experimentais. Mas tem sim no fundo uma pretensão metafísica de falar no sentido último da realidade que são os problemas quânticos.

Uma visão muito diferente dessa é a de que embora toda a natureza seja constituída de átomos, o sentido unificador da pluralidade é outra coisa que não o átomo propriamente. Assim os problemas da MQ seriam relativos à MQ e não à extrutura do real. A MQ falaria da extrutura da matéria, não da realidade.

É este avanço de estabelecer uma hierarquia das ciências colocando a MQ como ciência mais fundamental que dá a ela a pretenção metafisica. É isso que precisa ser tornado mais claro.

Junte-se isso ao pressuposto materialista fundamental de que a realidade é a matéria e bingo. A MQ pode exercer livremente o papel que a Metafísica exercia para os modernos.


Puxa!

Até fiquei curioso para saber o que o Flávio Costa diria sobre isto!


Flávio Costa escreveu:Na Física Quântica existe muito questionamento acerca da natureza da realidade (até porque a MQ revela alguns fenômenos que "não fazem sentido"), os físicos bem informados não são ingênuos ao ponto de ignorar o cunho filosófico da realidade quântica que é objeto de muita discussão entre os cientistas.


Muito bem lembrado!

Dante escreveu:Por exemplo, o pressuposto epistemológico segundo o qual a experimentação é muito mais eficiente do que a elucubração tem profundas raízes metafísicas e mudou a forma de se fazer ciência.


De fato, tenho de concordar, principalmente porque tal pressuposto com raízes metafísicas corrobora aquilo que afirmo!
Fayman

autor de:

OS GUARDIÕES DO TEMPO
RELÂMPAGOS DE SANGUE

ANJO - A FACE DO MAL
AMOR VAMPIRO
(Coletânea 7 autores)

o pensador
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Mensagem por o pensador »

Na verdade a ciência e seu método empírico estâo pautados em princípios metafísicos empiricamente inverificáveis;princípio da verificabilidade empírica e princípio da falseabilidade,por exemplo.A ciência é epistemologicamente redutível à metafísica desde que parte de pressupostos metafísicos.

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Flavio Costa
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Mensagem por Flavio Costa »

Fayman escreveu:
Fernando escreveu:Só pra explicar sobre o Fayman. Ele NUNCA aceitou isso que vc diz. Pelo menos não em discussões comigo. Pois no fundo eu sei que existe uma metafísica materialista por detrás da forma que defende a mecânica quântica. A unidade articuladora da pluralidade é, para ele, o átomo, e com isso os problemas quânticos. Os problemas quânticos são aqueles que dizem respeito de forma mais descolada possível e menos passível de interpretações ao funcionamento do mundo. A realidade é quantica pq o mundo, em seu estado mais FUNDAMENTAL (olha a noção de fundamento aparecendo no radical de uma expressão muito utilizada por ele), a realidade é o conjunto de reações quânticas.

Se vc olhar o tópico que ele abriu sobre a realidade quântica vc verá que a mecância quântica é a ciência mais fundamental, pois é a que está maix próxima do mundo. Tudo bem, isso não pretende desvalorizar as outras ciências experimentais. Mas tem sim no fundo uma pretensão metafísica de falar no sentido último da realidade que são os problemas quânticos.

Uma visão muito diferente dessa é a de que embora toda a natureza seja constituída de átomos, o sentido unificador da pluralidade é outra coisa que não o átomo propriamente. Assim os problemas da MQ seriam relativos à MQ e não à extrutura do real. A MQ falaria da extrutura da matéria, não da realidade.

É este avanço de estabelecer uma hierarquia das ciências colocando a MQ como ciência mais fundamental que dá a ela a pretenção metafisica. É isso que precisa ser tornado mais claro.

Junte-se isso ao pressuposto materialista fundamental de que a realidade é a matéria e bingo. A MQ pode exercer livremente o papel que a Metafísica exercia para os modernos.


Puxa!

Até fiquei curioso para saber o que o Flávio Costa diria sobre isto!

Bem, eu diria o seguinte:

Primeiro, o Fernando está usando um conceito de átomo meio "primeiro grau". A Física Quântica não estuda o átomo como partícula fundamental, e sim outras partículas muito menores. Aliás, o entendimento de que o átomo é relativamente "grande" vem de bem antes da MQ. Porém, creio que o Fernando sabe disso e falou em átomo na verdade pensando "qualquer coisa que a Física Quântica diga que são partículas fundamentais".

Depois, existem alguns problemas quânticos que parecem não ter explicação. Pois o que explicaria o comportamento dual partícula-onda que os elétrons apresentam? Não-localidade, realidade dependente da observação, etc. OK, mas o que isso diz sobre o sentido último da realidade? Acho que não diz tanto assim. A MQ fala sim de partículas fundamentais, talvez pode haver algum viés materialista nisso, mas não vejo nisso um "sentido último". Talvez a MQ nos traga a decomposição definitiva da realidade material, mas quem disse que isso diz tudo o que há para ser dito sobre "o sentido último da realidade"? A Física Quântica pode ser a decomposição mais fundamental da Física, mas a Física, por si só, não explica tudo aquilo que entendemos por realidade.

O que eu digo é que muitos cientistas reconhecem que há questões filosóficas por trás das questões puramente físicas. Por exemplo, se a dualidade do elétron se deve ao papel da observação sobre o fenômeno, o que isso quer dizer? É um tipo de poder da subjetividade? É uma dimensão superior? É um elemento desconhecido? A busca da resposta para essas questões envolve um grande esforço filosófico.

O que me parece é que o Fayman está bem consciente disso, o que ele coloca é que o esforço filosófico não é suficiente, mas que as conclusões precisam ser testadas e, principalmente, prever novos fenômenos ou propriedades destes. Estamos falando justamente da ciência como ferramenta derivada do trabalho filosófico com o objetivo de explicar fenômenos dentro dos modelos científicos (que não necessariamente são a realidade, mas fazem sentido no universo conceitual definido) e, eventualmente, produzir benefício e possibilidades para os seres humanos.
The world's mine oyster, which I with sword will open.
- William Shakespeare
Grande parte das pessoas pensam que elas estão pensando quando estão meramente reorganizando seus preconceitos.
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Fernando
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Mensagem por Fernando »

Fayman escreveu:
Flávio Costa escreveu:Na Física Quântica existe muito questionamento acerca da natureza da realidade (até porque a MQ revela alguns fenômenos que "não fazem sentido"), os físicos bem informados não são ingênuos ao ponto de ignorar o cunho filosófico da realidade quântica que é objeto de muita discussão entre os cientistas.


Muito bem lembrado!


Que ótimo! Então deixe a tarefa de falar da realidade para a metafísica. Os problemas da quântica são mera explicação de algumas espécies de fenômenos particulares, que em nada tocam a realidade. Tocam apenas o funcionamento DESSA ESPÉCIE ESPECÍFICA de fenômenos.

Não diga que é impossível falar da realidade, pois esse é um empedimento específico da física quântica. Pois é ela que tem este empedimento em seus próprios fundamentos.

No mais, pode continuar fundando a importância dela na medida em que cria computadores mais "legais" pra nós. Por mim não há problema algum com isso.
"Nada tem valor algum senão dentro do coração, e não como coisa" (Hegel)

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Flavio Costa
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Mensagem por Flavio Costa »

Fernando escreveu: Que ótimo! Então deixe a tarefa de falar da realidade para a metafísica. Os problemas da quântica são mera explicação de algumas espécies de fenômenos particulares, que em nada tocam a realidade. Tocam apenas o funcionamento DESSA ESPÉCIE ESPECÍFICA de fenômenos.

A questão é que os fenômenos quânticos fazem parte da realidade e, se eles não puderem ser explicados, a nossa compreensão da realidade talvez seja definitivamente limitada por isso.
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Fernando
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Mensagem por Fernando »

Flavio Costa escreveu:
Fayman escreveu:
Fernando escreveu:Só pra explicar sobre o Fayman. Ele NUNCA aceitou isso que vc diz. Pelo menos não em discussões comigo. Pois no fundo eu sei que existe uma metafísica materialista por detrás da forma que defende a mecânica quântica. A unidade articuladora da pluralidade é, para ele, o átomo, e com isso os problemas quânticos. Os problemas quânticos são aqueles que dizem respeito de forma mais descolada possível e menos passível de interpretações ao funcionamento do mundo. A realidade é quantica pq o mundo, em seu estado mais FUNDAMENTAL (olha a noção de fundamento aparecendo no radical de uma expressão muito utilizada por ele), a realidade é o conjunto de reações quânticas.

Se vc olhar o tópico que ele abriu sobre a realidade quântica vc verá que a mecância quântica é a ciência mais fundamental, pois é a que está maix próxima do mundo. Tudo bem, isso não pretende desvalorizar as outras ciências experimentais. Mas tem sim no fundo uma pretensão metafísica de falar no sentido último da realidade que são os problemas quânticos.

Uma visão muito diferente dessa é a de que embora toda a natureza seja constituída de átomos, o sentido unificador da pluralidade é outra coisa que não o átomo propriamente. Assim os problemas da MQ seriam relativos à MQ e não à extrutura do real. A MQ falaria da extrutura da matéria, não da realidade.

É este avanço de estabelecer uma hierarquia das ciências colocando a MQ como ciência mais fundamental que dá a ela a pretenção metafisica. É isso que precisa ser tornado mais claro.

Junte-se isso ao pressuposto materialista fundamental de que a realidade é a matéria e bingo. A MQ pode exercer livremente o papel que a Metafísica exercia para os modernos.


Puxa!

Até fiquei curioso para saber o que o Flávio Costa diria sobre isto!

Bem, eu diria o seguinte:

Primeiro, o Fernando está usando um conceito de átomo meio "primeiro grau". A Física Quântica não estuda o átomo como partícula fundamental, e sim outras partículas muito menores. Aliás, o entendimento de que o átomo é relativamente "grande" vem de bem antes da MQ. Porém, creio que o Fernando sabe disso e falou em átomo na verdade pensando "qualquer coisa que a Física Quântica diga que são partículas fundamentais".

Depois, existem alguns problemas quânticos que parecem não ter explicação. Pois o que explicaria o comportamento dual partícula-onda que os elétrons apresentam? Não-localidade, realidade dependente da observação, etc. OK, mas o que isso diz sobre o sentido último da realidade? Acho que não diz tanto assim. A MQ fala sim de partículas fundamentais, talvez pode haver algum viés materialista nisso, mas não vejo nisso um "sentido último". Talvez a MQ nos traga a decomposição definitiva da realidade material, mas quem disse que isso diz tudo o que há para ser dito sobre "o sentido último da realidade"? A Física Quântica pode ser a decomposição mais fundamental da Física, mas a Física, por si só, não explica tudo aquilo que entendemos por realidade.

O que eu digo é que muitos cientistas reconhecem que há questões filosóficas por trás das questões puramente físicas. Por exemplo, se a dualidade do elétron se deve ao papel da observação sobre o fenômeno, o que isso quer dizer? É um tipo de poder da subjetividade? É uma dimensão superior? É um elemento desconhecido? A busca da resposta para essas questões envolve um grande esforço filosófico.

O que me parece é que o Fayman está bem consciente disso, o que ele coloca é que o esforço filosófico não é suficiente, mas que as conclusões precisam ser testadas e, principalmente, prever novos fenômenos ou propriedades destes. Estamos falando justamente da ciência como ferramenta derivada do trabalho filosófico com o objetivo de explicar fenômenos dentro dos modelos científicos (que não necessariamente são a realidade, mas fazem sentido no universo conceitual definido) e, eventualmente, produzir benefício e possibilidades para os seres humanos.


Flávio,

Eu e o Fayman já discutimos muito. E ele nunca se contenta quando eu falo que a física quantica não fala da realidade. Quando eu falo isso ele fala do realismo científico. Como se o que eu quisesse defender é o realismo científico. E tenta refutar minhas posições através de testes empíricos.

Não sei se vc é desta época, mas houve um tempo no RV em que só se podia falar algo no RV se antes lêssemos o tópico "A realidade é quantica". Qualquer tópico de teor metafísico logo era refutado com um "a realidade não é assim como vc diz, a realidade é quântica".

Se muitas vezes eu aceitei debater estes temas foi por causa da obscuridade com que o conceito de realidade foi colocado. Quer dizer. Quando eu falo de realidade, estou pensando na realidade mesma. Quando os defensores da MQ falam de realidade, horas falam como se a realidade não fosse a realidade e horas como se fossem.

Eu NUNCA teria me metido em nenhum embate se este posicionamento de que a MQ não fala da realidade fosse completamente claro.
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Mensagem por Flavio Costa »

Fernando escreveu:Eu e o Fayman já discutimos muito. E ele nunca se contenta quando eu falo que a física quantica não fala da realidade. Quando eu falo isso ele fala do realismo científico. Como se o que eu quisesse defender é o realismo científico. E tenta refutar minhas posições através de testes empíricos.

Eu não participei dessa discussão de "realismo científico", então não estou a par dessa polêmica.

Fernando escreveu:Não sei se vc é desta época, mas houve um tempo no RV em que só se podia falar algo no RV se antes lêssemos o tópico "A realidade é quantica". Qualquer tópico de teor metafísico logo era refutado com um "a realidade não é assim como vc diz, a realidade é quântica".

:emoticon12: Creio que se estava falando do determinismo, não? O ponto que o Fayman defende e que eu entendo é que a MQ provou de maneira bastante confiável que existem fenômenos não-determinísticos. Creio que para o Fayman, dizer "existem fenômenos não-determinísticos" é a mesma coisa de dizer "a realidade é não-determinística". Se para você são afirmações diferentes, seria bom você esclarecer para ele qual diferença você vê.

Fernando escreveu:Se muitas vezes eu aceitei debater estes temas foi por causa da obscuridade com que o conceito de realidade foi colocado. Quer dizer. Quando eu falo de realidade, estou pensando na realidade mesma. Quando os defensores da MQ falam de realidade, horas falam como se a realidade não fosse a realidade e horas como se fossem.

Uma hora falam uma coisa e na outra falam algo diferente justamente porque é uma questão controversa e ainda por esclarecer. Para algumas pessoas, a descrição das partículas materiais fundamentais é a descrição da realidade, porque, para essa pessoa, "realidade" é sinônimo de realidade material. Talvez ela nem pense que tudo é matéria, mas quando pensa naquilo que pode ser descrito como "existente", pensa nas partículas materiais e suas combinações. Já outros podem ter uma visão mais abrangente do que se deve chamar de realidade e não se satisfaz numa descrição da realidade das partículas fundamentais como se fosse uma descrição completa da realidade. Talvez essa seja uma descrição fundamental da realidade, mas certamente não é uma descrição completa nem suficiente e não é à toa que as demais ciências têm o espaço delas.
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