Olá,
esse é um texto que traduzi do Kripner que aborda temas aqui citados. Destaques em vermelho:
Stanley Krippner
A parapsicologia no século vinte e um
Resumo.- Depois de um século de investigação científica, os parapsicólogos têm o consenso de que o fenômeno psi que se produz num ambiente controlado
não é nem suficientemente intenso nem suficientemente real para conseguir sua aceitação como um fato do mundo natural, ou para exigir uma mudança no atual paradigma. No século XXI, a parapsicologia deveria forjar alianças com outras formas de indagação científicas que emergirão com os paradigmas dominantes, prestando suas experiências a outros campos que estão pesquisando outras anomalias na natureza, reconceitualizando seu vocabulário de modo a escapar de certas dicotomias desnecessárias (especialmente o conceito de “mente” e “matéria”), e fincar o pé na descoberta de princípios mais “locais” que “universais.” A última recomendação é o pós-modernismo na natureza, enfatizar as narrativas, a investigação orientada ao processo, e o reconhecimento de que psi é um fenômeno complexo que na realidade envolve uma multidão de variáveis.
De uma perspectiva pós-moderna, a linguagem está profundamente implicada na construção social da realidade. Há uma clara diferença entre dizer que o mundo está “lá fora” e dizer que a verdade está “lá fora” porque onde não há constructos sociais não há verdade; os contructos sociais estão expressados em linguagens humanas e estas linguagens são criações humanas.
É por esta razão que encontro termos tais como “percepção extra-sensorial” excessivamente “carregado” de “excesso de significados” e prefiro os termos “psi gamma” ou “psi receptivo.” Em lugar de “psicokinesis”, prefiro “psi kappa” ou “psi expressivo.” Do mesmo modo, pode-se descrever à investigação da sobrevivência como “psi theta,” e assim evitar uma linguagem baseada em suposições.
A ciência continuamente se constrói desde a perspectiva de diferentes comunidades. A investigação psi, ainda a mais rigorosa, é a mais controversa no campo da investigação da consciência Devido a que seus respeitáveis estudiosos full-time incluem, em seu maioria, umas mal poucas dúzias de pesquisadores (em todo o mundo) com recursos econômicos muito limitados, isto provoca que seus oponentes se ocupem em combatê-la de forma excessiva. Põem tanta energia em sua oposição além do meramente razoável, já que pensam que a tradição científica ocidental se encontraria ameaçada apenas pela existência da parapsicologia.
Mas de uma perspectiva pós-moderna, todos os métodos de investigação deveriam ser vistos como inerentemente políticos, entrelaçados com questões de poder e legitimidade. Um poderoso número de orçamentos influi a maioria dos métodos de investigação que aplicam os pesquisadores, que é o que se deve pesquisar, e de sua relação entre si. Portanto, o futuro da parapsicologia dependerá, em grande parte, de quanto poder se pode conseguir, quanto dinheiro se pode atrair, e do tipo de alianças se podem forjar.
Existem pesquisadores que falaram das possíveis aplicações da investigação psi para a medicina, a tecnologia, a inteligência militar, os negócios, e a política (p.e. Broughton, 1991; Radin, 1997). Para muitos pesquisadores, a “parapsicologia aplicada” seria demasiado prematura, mas parece ser que as agências governamentais de inteligência e corporações executivas, médicos respeitáveis, e inclusive muitos políticos, aberta ou secretamente, pediram a “clarividentes”,[3] médiuns, curadores, e videntes para que os orientem e aconselhem. As possíveis aplicações tecnológicas, estratégicas, e militares resultaram num monte de dinheiro sem precedentes para a investigação psi de diversas áreas do governo americano, especialmente o Stanford Research Institute, o SRI International, e a Sciences Applications International Corporation. Quando se desclassificaram alguns destes dados, teve várias opiniões a respeito de se a evidência apoiava ou recusava a existência de psi (p.e. Hyman, 1996; Utts, 1996). No entanto, de fato, a Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos pensou que o projeto era de suficiente valor para investir milhões de dólares em suas operações durante três décadas.
A ciência moderna e o pensamento racional positivista se construíram sob o modelo da refutabilidade, mas muitos pós-modernistas desconstruíram este princípio em favor das conclusões que oferecem os “envolvimentos pragmáticos da sociedade.” (Gergen, 1985 , p.273). Os pesquisadores psi assinalam que a ciência clássica não foi suficientemente empírica. Para o psicólogo William James (1902/1985) o empirismo radical, “o ato do que tem a ver com a experiência em si mesma” (p. xxiv) abarca toda a atividade humana, e inclusive a telepatia, a clarividência, a precognição, etc.
Alguns parapsicólogos (p.e. White, 1990) põem a ênfase da investigação psi em metodologias mais qualitativas que quantitativas. As descrições fenomenológicas, as análises lingüísticas, os estudos hermenêuticos, e as autobiografias, com freqüência considerados os campos das humanidades, poderiam jogar um papel importante na investigação parapsicológica. Assim como a arte usa uma ou vários formas de retratar, o mais nitidamente possível, a atividade e a experiência vivida, a investigação psi qualitativa também deveria usar uma ou mais formas para identificar, compreender, e descrever o mais precisamente possível a atividade e a experiência vivida. Na realidade, os pós-modernos nos recordam aos artistas no uso da narrativa, seu interesse pelo símbolo e a metáfora, sua tentativa por incorporar a intuição e o sentimento em sua investigação, isto é, fechar a brecha entre a pessoa e o mundo fenomênico e sua apreciação segundo a qual, as pessoas que participam na investigação, possuem identidades que estão influídas por seu próprio contexto cultural.
De maneira similar, os textos dos escritores pós-modernistas e artistas não são, em princípio, governados por regras pré-estabelecidas, os psicólogos pós-modernos não impõem meta-narrativas aos participantes de sua investigação. Com respeito ao uso dos métodos experimentais, o experimento científico pode ser reconceitualizado como uma narrativa que descreve um evento que ocorreu num determinado tempo e lugar.
Os parapsicólogos não precisam ficar com estes métodos para a investigação de certos problemas humanos, senão que poderiam propor que estas histórias sejam recontextualizadas para que sejam úteis. O “efeito Hawthorne[4]“ e os efeitos da expectativa interpessoal demonstram o papel que tem o ordenamento sobre os resultados experimentais (p.e. com respeito às expectativas do pesquisador, estas aparentemente são percebidas em forma sutil pelos participantes da investigação quem podem desempenhar-se em formas tais que confirmem tal expectativa). Ambos efeitos foram observados na investigação psi.
McClennon (1994) descreveu de que maneira os “eventos assombrosos” (p.e. visões compartilhadas) derivam, em parte, destas experiências essenciais e conformam as tradições populares locais. A tese de McClenon surge do pensamento pós-moderno, hipotetizando narrativas “essenciais” e “universais” que contribuem ao discurso pós-moderno revisando centenas de eventos locais. Também reflete as tendências na pós-modernidade as quais conduzem aos folcloristas e a seus métodos de investigação à parapsicologia; este movimento contribuiu ao que a psicóloga Susan Blackmore (1988) chama a “nova parapsicologia.” Blackmore focaliza a natureza psicológica e sociológica dos eventos anômalos, não sua veridicabilidade. A “nova parapsicologia” sustenta um aspecto pós-moderno sobre psi como uma “variável socialmente definida” (McClenon, 1994, p. 26). O argumento de Blackmore segundo o qual há que pesquisar as crenças concomitantes com psi das pessoas que tiveram experiências anômalas não está demasiado longe de eliminar o argumento de White de um “paradigma experiencial” das experiências excepcionais subjetivas[5].
O empirismo convencional e a filosofia do conhecimento aderem aos modelos racionais de indagação, mas só dentro de um contexto de justificativa. Para o mundo moderno, a ciência se converteu numa forma “privilegiada” de adquirir conhecimento; mais para justificar determinadas crenças do que qualquer outro enfoque (Schick, 1997). A moderna filosofia do conhecimento nos exige agudizar a distinção entre como se constrói um novo conhecimento (o qual pode ser mais intuitivo que empírico-racional) e como este se pode justificar (que deve ser empírico-racional).
Entre os séculos XVII e XVIII, a palavra em inglês “scientist” [cientista] ou seus equivalentes em outros idiomas era desconhecida (Toulmin, 1982, p. 84). Desde princípios do século XIX, a ciência moderna desenvolveu seu próprio vocabulário (incluindo o termo “scientist”, em inglês desde 1840) e suas próprias instituições, as quais eventualmente se foram especializando (p. 83). No entanto, os pós-modernistas questionam se a investigação deveria ficar limitada às instituições acadêmicas ou aos “cientistas” em geral. Independente disso, pesquisadores não-filiados publicaram importantes contribuições à investigação psi. O biólogo Rupert Sheldrake (1995) descreveu “sete experimentos que poderiam mudar ao mundo” e espera achar uma “ciência antecipatória” que esteja “aberta a qualquer pessoa interessada” (p. xiiii). Por exemplo, “o sentido de orientação dos animais é um tema de investigação pouco estudado, comparado com, digamos, a biologia molecular, e muito poucos cientistas trabalham sobre isto” (pp. xiii-xiv). Os experimentos de Sheldrake –que foram descritos em detalhes– são pouco custosos, se poderiam executar mediante computadores caseiros, e este biólogo pensa que há gente com tempo livre que poderia descobrir o grande potencial destes experimentos.
De uma perspectiva similar, também Tart (1975) referiu-se ao desenvolvimento de “ciências específicas de estados de consciência,” baseadas nas percepções, contemplações, e comunicações obtidas quando os pesquisadores estão em estados não-ordinários de consciência Em certo grau, a indagação em estados específicos funciona mediante os procedimentos dos xamãs, as práticas de ioga, e as disciplinas que praticam meditação. Estes praticantes são “experientes” e “profissionais” em seu próprio campo, mas geralmente operam fora dos claustros acadêmicos.
O engenheiro britânico e parapsicólogo Arthur Ellison (1997) fez uma demonstração prática da objetividade acadêmica e de como a expectativa afeta as percepções da gente. Durante uma conferência na universidade, Ellison propôs a sua audiência que tente levitar um vaso. Depois de um minuto ou dois, o vaso lentamente se elevou no ar, e ao cair-se se rompeu. Uma senhora disse que ela havia visto uma “substância acinzentada” que fez força para levantar o vaso e à mesa onde estava apoiado o vaso. Um professor de física disse que ele não havia visto movimentos nem nenhuma outra coisa. Ambos estavam equivocados. Ellison havia colocado um dispositivo para levantar o vaso, mas a mesa estava presa ao chão e assim permaneceu durante toda a demonstração.
A maioria dos parapsicólogos “privilegiam” uma explicação racional, mas muitos tomam uma posição conservadora, como um “caráter factual” do fenômeno psi. A avaliação de Douglas Stokes (1986) não é a única na investigação psi: um exame imparcial e objetivo dos casos espontâneos anima ao menos uma suspeita razoável de que o fenômeno psi existe.
Na literatura experimental existem indicadores segundo os quais é possível produzir estes fenômenos sob controles experimentais.
Devido a que estes efeitos não estão todavia aceitos pela maioria dos pesquisadores, não podemos dizer que estes fenômenos foram demonstrados cientificamente. No entanto, seria prematuro fechar o caso; os fenômenos psi merecem um estudo profundo (p. 418). No livro Foundations in Parapsychology, seus autores (Edge et al., 1986) dizem com franqueza: “A
verdade última é que a ESP, aparentemente demonstrada até agora em ambientes controlados, simplesmente não é o suficientemente forte ou o suficientemente real para que exijamos sua aceitação como um fenômeno natural” (p. 182).
Pode-se pensar que muitos supostos fenômenos psi não servem para uma adequada exploração mediante a maioria dos métodos empregados comumente pela ciência moderna. O psi receptivo e expressivo poderia ser resultado de tantas forças interatuantes que teria que usar melhor um modelo de sistemas, em lugar de um simples modelo causa-efeito (p.e. Harman, 1988). O papel crucial (e o sistema de crenças) que pode desempenhar o experimentador na investigação psi dependerá de encontrar outro experimentador com uma atitude similar para o mesmo experimento. Em realidade, o filósofo David Griffin (1997) identifica o fracasso na distinção entre objetividade e subjetividade como uma das contribuições do pensamento pós-moderno ao discurso científico. Os efeitos da expectativa interpessoal (p.e. os “efeitos do experimentador”) em parapsicologia, e outros campos de indagação, revelam a debilidade de tal distinção (Harris & Rosenthal, 1988; Sheldrake, 1998).
Quiçá uma ciência pós-moderna estará melhor capacitada para compreender o fluxo sutil de informação e influência dos conceitos de tempo, espaço e energia do que a ciência moderna. Existem muitos pesquisadores psi dedicados a mudar a “investigação dirigida à prova” por uma “investigação dirigida ao processo,” esperando que a descoberta dos correlatos de psi produzirão um fenômeno psi mais confiável, e desenvolver teorias fundadas empiricamente (Edge et ao., p. 185). Griffin (1997) também propõe o procedimento filosófico de Whitehead como uma alternativa para o dualismo e o monismo materialista em torno dos fenômenos psi, incluindo a reencarnação e a vida após a morte
Pessoalmente penso que o dado parapsicológico per se não atingiu suficiente potência como para justificar uma mudança no paradigma. Como muitos críticos pontualizam, fenômenos pretensamente extraordinários requerem provas extraordinárias. No entanto, a investigação psi é uma das muitas fontes de dados que indicam que nossa atual visão do mundo, no melhor dos casos, é incompleta, e, no pior dos casos, é defeituosa (p.e. Globus, 1995; Harman, 1988; McClenon, 1994; Sheldrake, 1981; White, 1991). Por exemplo, psi oferece uma visão da “mente” que depende mais da conexão com outras “mentes,” que do isolamento de “outras mentes” (Williams, 1997, p. 342).
Ao mesmo tempo, devemos admitir que, com freqüência, o pós-modernismo lhe tira mérito à razão, repudia todo o universal, e abandona a busca de valores. A credulidade de alguns pós-modernistas ficou demonstrada em 1996 por um engano em que se enviou para sua publicação um ensaio carente de sentido lógico a uma revista especializada em teorização pós-modernista... e se o aceitou (Pinkser, 1996)! Ademais, há um paradoxo estrutural com a posição pós-modernista segundo a qual a linguagem usada no discurso sistêmico confia no contexto e nas construções sociais de seu significado e propósito. Mas os pós-modernistas mesmos usam linguagem comum que socavam sua própria utilidade quando emitem uma crítica potente (Brand, 1998). No entanto, a maioria dos pós-modernistas mais sãos propõem estratégias para preservar o mero pluralismo que as ordenes acadêmicas, sociais, e políticas monolíticas põem em risco.
White (1993) diz que a investigação contemporânea de psi, operando de acordo com o paradigma modernista, não pôde cumprir seu propósito. Mas de uma perspectiva pós-moderna, a investigação psi no próximo milênio poderia seguir os seguintes passos para compensar este desequilíbrio:
(1) Quiçá a parapsicologia poderia ganhar méritos mais rapidamente se tenta forjar alianças com alguns dos movimentos sugestivos do paradigma emergente. Por exemplo, há muitos físicos que não vêem aos fenômenos psi incoerentes em relação com a teoria quântica. A teoria holonômica sugere que o fenômeno psi reflete simplesmente a presença de informação em todos os níveis da realidade (p.e. Pribam, 1986). A teoria geral dos sistemas poderia incorporar a psi num ou mais níveis de um sistema vivo (p.e. Krippner, Ruttenber, Engelman & Granger, 1985). Na ecologia biológico-sinérgica humana, psi poderia jogar um papel importante como mediador entre a mente e o corpo e entre as interações organismo/meio ambiente. Em cooperação mais próxima com estas ou outras perspectivas, se poderia aumentar a potência necessária como para que a investigação psi seja mais influente, e converter-se num formidável competidor no cenário científico.
(2) O papel potencial da investigação psi é único. A parapsicologia desenvolveu métodos e técnicas de investigação de eventos anômalos que são mais sofisticados que os que se encontram em outros campos. Estes provêm da ciência moderna mas, em combinação com as futuras contribuições da ciência pós-moderna, poderiam oferecer meios rigorosos e disciplinados de investigação muito apropriados para o labor futuro. Os supostos fenômenos psi não são a única anomalia que requer consideração, os parapsicólogos poderiam também prestar sua experiência aos pesquisadores das experiências próximas à morte, as experiências fora do corpo, as experiências de abduções alienígenas, e os de uma multidão de outros casos que sempre foram ignorados.
(3) Na visão pós-moderna, as concepções e aplicações de psi poderiam assumir formas radicalmente diferentes das que atualmente as caracterizam. Isto não é surpreendente devido a que os atuais modelos de psi são o resultado de uma perspectiva própria da era modernista. O psi na era pós-moderna poderia ser mais simples, mais elegante, e mais parcimonioso que o que podemos imaginar hoje em dia. As dicotomias entre “cérebro” e “mente”, entre “corpo” e “psique,” e entre “matéria” e “espírito” se podem desenvolver em favor de um sistema orientado no modelo interacionista da consciência. O que hoje é considerado “extra-sensorial” amanhã poderia ser conceitualizado como “super-sensorial”; as concepções atuais de “psicokinesis” se podem incorporar aos conhecimentos dos “campos biológicos” dos organismos e sua influência a distância.
(4) A investigação pós-moderna de psi apresenta um enfoque dual. Por um lado, o trabalho em laboratório e as observações controladas devem continuar, mas reconhecendo que este labor apresenta um complexo entrelaçamento do participante, o pesquisador, o tempo, e o lugar –qualquer dos quais podem enviesar os resultados numa forma que pode sublinhar mais uma “verdade local” do que uma verdade universal.” Ao mesmo tempo, a investigação dos “textos” das experiências humanas excepcionais das pessoas podem aderir ao que William James (1907/1978) chamava “metodologia pluralista,” usando métodos heurísticos, hermenêuticos, e fenomenológicos que sirvam como formas mais profundas de introspecção do fenômeno psi melhor do que qualquer outra coisa que se capture num laboratório.
Qual será, pois, a visão da parapsicologia no século XXI? Permitam-me voltar para trás e depois retomar. Dean Radin empregou a “meta-análise,” uma técnica estatística para avaliar diversas áreas da investigação psi, cujos resultados publicou em seu livro The Conscious Universe (1997). Por exemplo, quando se meta-analisaram todos os experimentos de telepatia em sonhos conduzidos por Montague Ullman e por mim, o resultado obtido contra o esperado pelo acaso foi de 75 milhões a um. Numa destas sessões experimentais, a imagem selecionada a esmo foi a obra de arte “Escola de Dança” de Edgar Degas; que mostra a cena de uma classe de baile com várias mulheres jovens. O relatório do sonho continha expressões tais como: “estava num classe reunido com o que poderia ser meia dúzia de pessoas; se parecia como a uma escola” e “tinha uma pequena que estava tratando de dançar comigo.”
Nossos experimentos de sonhos evoluíram num procedimento mais simples chamado “Ganzfeld” (que provém de uma palavra que quer dizer “campo total”). O termo foi aplicado a uma série de estudos em que os pesquisadores estavam em condições de privação sensorial parcial e lhes pedimos que tentassem identificar os conteúdos da imagem que se selecionava a esmo mediante um computador. Por exemplo, quando se selecionou a pintura “A crucificação de Cristo” de Salvador Dalí, o participante reportou impressões de “espíritos guias”, “superiores eclesiásticos,” “Deus sol,” e “Moisés.” Esta técnica foi inaugurada por Charles Honorton e William Braud nos Estados Unidos e Adrian Parker na Grã-Bretanha. Desde 1974 a 1997, publicaram-se mais de 2.500 sessões de ganzfeld em mais de 40 publicações; a média global de “acertos” (33,2%) dificilmente pode ser atribuída ao acaso com diferenças que superam mil milhões a um.
Os experimentos que empregaram geradores de eventos aleatórios (RNG) são o equivalente contemporâneo dos estudos com dados. O RNG é um circuito eletrônico que cria seqüências de zeros e uns pulsando repetidamente uma “moeda” eletrônica e registrando os resultados. Pede-se-lhe ao participante de um experimento que influa mentalmente o circuito RNG de maneira que gere mais uns que zeros ou vice-versa. Os circuitos RNG contam com um ruído eletrônico ou uma partícula radioativa usando um procedimento desenvolvido nos Estados Unidos por Helmut Schmidt. Uma meta-análise baseada em 152 estudos levados a cabo entre 1959 e 1987 produziu diferenças contra a casualidade que superam cem milhões a um. Meta-análises mais recentes mostram resultados similares.
Outros dois parapsicólogos americanos, William Braud e Marilyn Schlitz, estudaram pessoas que tentavam influir, a distância, o sistema nervoso de participantes –animais e humanos. A medição dos resultados do experimento era, em geral, a atividade eletrodérmica –calma ou excitada. Em 1991, Braud e Schlitz resumiram todos seus experimentos que compreendiam um total de 655 sessões. 37 experimentos resultaram numa diferença contra o esperado pelo acaso em mais de cem trilhões a um.
A “visão remota” é outro procedimento que usa as técnicas de “resposta livre” em lugar de testes com cartas padronizadass desenvolvidas por Rhine e seu grupo. Harold Puthoff, Russell Targ, e Edwin May desenvolveram este procedimento nos Estados Unidos. No geral, o participante da investigação ou “clarividente” devia tentar identificar uma localização física selecionada ao acaso; alguém também pode viajar a um lugar e tentar transmitir suas impressões ao “clarividente.” Por exemplo, durante um estudo científico financiado pelo Governo, o “clarividente” identificou corretamente uma base militar secreta. Por causa de que o governo que financiou os projetos não proporcionou os resultados para poder efetuar análises estatísticas adequadas, Radin calculou os resultados de 334 ensaios de visão remota conduzidos no Laboratório de Investigações em Engenharia Anômala da Universidade de Princeton. Os resultados globais foram de 100 bilhões a um.
Um dos estudos contemporâneos mais interessantes tem a ver com as reações corporais inconscientes de eventos futuros; Dean Radin dos Estados Unidos e Dick Bierman de Holanda obtiveram resultados estatisticamente significativos em experimentos virtualmente idênticos. Um participante se senta numa cômoda cadeira frente ao monitor de um computador e vários eletrodos ajustados a seus dedos registram as flutuações da atividade elctro-dérmica e a pressão sanguínea. O participante usa o mouse de um computador para selecionar uma fotografia a esmo dentre um grande número de possibilidades. Algumas das fotos serão emocionalmente “neutras” enquanto outras serão “intensas;” as reações físicas dos participantes se tornam mais ativas se a foto futura é “intensa.” Em outras palavras, os participantes pressentem seus futuros estados emocionais, manifestando reações antes de ver a imagem.
Pese ao vigor destes resultados, o financiamento da investigação psi nos Estados Unidos é imprevisível. Isto dificulta as investigações parapsicológicas a longo prazo, e não oferece garantias às pessoas jovens interessadas em integrar-se a este campo. No entanto, os avanços na tecnologia da exploração cerebral pode conduzir à descoberta de partes do sistema nervoso central que se ativam quando uma pessoa tem sucesso em suas experiências psi. Norman Dom e seus colaboradores já conduziram vários estudos piloto promissores com participantes americanos e não-americanos. Ademais, vários laboratórios também pesquisaram as flutuações geomagnéticas que existem durante as sessões experimentais. Por exemplo, nossos estudos de telepatia em sonhos tendiam a ser mais exitosos se não havia atividade de manchas solares nem tormentas elétricas à noite em que se faziam os experimentos. Por outra parte, há dados que indicam que a alta atividade geomagnética favorece a obtenção de altas pontuações durante os experimentos de psicokinesis. As relações sol/lua estão sendo estudadas por Dean Radin, Edwin May, e James Spottiswoode, entre outros. As fases da lua e o tempo local sideral poderiam ser variáveis importantes quando os pesquisadores tentam predizer o momento ótimo para conduzir experimentos psi, ou para observar a ocorrência natural dos fenômenos psi.
Parece-me que a investigação psi se incorporará na ciência clássica quando possa encontrar-se um mecanismo para sua operação, ou quando se possa encontrar uma aplicação prática. Isto último parece improvável devido à natureza efêmera do fenômeno, conquanto abundam os reportes episódicos em outros campos, tais como a cura, os jogos de casualidade, e a espionagem. Uma provável estratégia para os pesquisadores seria concentrar-se nos correlatos somáticos e cerebrais do fenômeno psi ou os correlatos com o meio ambiente, como o geomagnetismo e os efeitos do sol e da lua. Até que o enigma de psi fique resolvido, ao menos parcialmente, a ciência terá uma imagem incompleta do ser humano e de outras formas de vida. O século vinte viu como a investigação psi adotou uma diversidade de procedimentos científicos; o século vinte e um poderia ver à investigação psi como uma empresa científica legítima e muito importante.
A parapsicologia do próximo milênio não poderia fazer melhor do que exibir as características da “disciplina compacta” descrita por Toulmin (1972):
1 . suas atividades estão organizadas em torno de e dirigidas para um número específico e real de ideais, p.e. uma descrição e entendimento do fenômeno psi;
2 . estes ideais coletivos impõem exigências a todos os profissionais, p.e. o compromisso com modelos rigorosos de indagação assim como compreender que o pesquisador é parte inevitável do que se está estudando;
3 . o melhoramento dos conceitos e técnicas convencionais, p.e. os extraídos da teoria dos sistemas dinâmicos, a teoria da complexidade os métodos hermenêuticos e fenomenológicos, e de outros conceitos e técnicas iniciais, ao mesmo tempo em que o refinamento dos procedimentos quantitativos e qualitativos como resultado da meta-análise e de um diálogo crítico;
4 . o uso de foros profissionais para avaliar a aceitação coletiva de novos procedimentos, p.e. a utilização de organizações já existentes tais como a Parapsychological Association e a Society for Scientific Exploration como espaços para esta discussão;
5 . determinar critérios de adequação, p.e. produzindo “relatórios de posição que representem o state-of-the-art[6] da investigação psi (p.e. Parapsychological Association, 1989; Krippner et ao., 1994). Toulmin concluiu que “Não há teoria alguma que possa auto-proclamar-se como absoluta, de maneira que legitime todas as observações; em conseqüência os pontos de vista complementares freqüentemente sobreviverão como ‘tradições’ minoritárias” (p. 381). A investigação psi deverá representar a esta tradição minoritária até que a evolução em outros campos produzam anomalias congruentes com as que os parapsicólogos vêm estudando desde longa data.
Os dados resultantes da investigação parapsicológica, quaisquer sejam suas explicações últimas, sugerem formas de fluxo de informação e influência que são naturalmente unitivas, confundindo as fronteiras convencionais entre uns organismos e outros, entre os organismos e seu médio ambiente, e entre os organismos e sua localização no tempo e o espaço. Estes resistem a tendência da ciência moderna que ignora as questões cosmológicas e o que Toulmin (1982) chama “o Tudo” (p. 237). A “nova parapsicologia” estaria relacionada com “ajudar as pessoas a obter o que é valioso em suas vidas.” Precisa-se acentuar a atividade anômala humana e as experiências humanas excepcionais em seus próprios mundos, em “situações de vida específicas e complexas” (Schneider, 1998, p. 283). O modelo conectivo que caracteriza estes fenômenos psi podem proporcionar indícios, modelos, metáforas, e inclusive aplicações que nos ajudem a resolver alguns dos problemas críticos que tenhamos que enfrentar e o que seja que num mundo pós-moderno possa emergir no futuro.
Toulmin (1982) diz que a ciência pós-moderna nos coloca em posição de reverter a destruição cosmológica que a ciência moderna forjou desde o 1600 A.C. em adiante. A cosmo-visão da ciência pós-moderna contemporânea é algo que as questões teóricas e práticas, a contemplação, e a ação, não podem separar-se jamais; e é o que nos devolve uma ordem de unidade e um sentido de proporção... o que nos advertiam os filósofos da Antigüidade” (p. 264). Esta reunificação da humanidade e a natureza não é só uma tarefa para a investigação psi, ainda que a “nova parapsicologia” tem uma oportunidade única de desempenhar um papel vital nesta missão histórica.
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PARAPSYCHOLOGY IN THE TWENTY-FIRST CENTURY, by Stanley Krippner.
Abstract.- After a century of research, it is the consensus of many parapsychologists that psi phenomena produced in controlled environments is neither strong enough or reliable enough to compel their acceptance as facts of nature, or to propel a paradigm shift. In the 21st century, parapsychology might forge alliances with other scientific inquiries that question the dominant paradigms, lend its expertise to other fields that are investigating anomalies of nature, reconceptualize its vocabulary to avoid unnecessary dichotomies (especially between “mind” and “matter”), and focus on discovering “local” rather than “universal” principles. The latter recommendation is postmodern in nature, stressing narratives, process-oriented research, and recognizing that psi is a complex phenomena that involve a multitude of variáveis.
[1] Artigo original enviado pelo autor à Revista Argentina de Psicologia Paranormal. Traduzido do inglês por Alejandro Parra. Supervisionado por Jorge Villanueva.
[2] Professor de Psicologia e diretor do Center for Consciousness Studies no Instituto Saybrook de São Francisco. Foi presidente da Parapsychological Association. Foi co-autor do livro Dream Telepathy (McFarland, 1989, com Montague Ullman e Alan Vaughan). É editor-Chefe de Advances in Parapsychological Research publicado em oito volumes. Ademais é membro fundador da International Society for the Study of Multiple Personality and Dissociative States.
[3] A expressão remote viewers, traduzida como "clarividentes," se refere a pessoas que detectam extra-sensorialmente lugares geográficos longínquos mediante a técnica de visão remota, empregada por alguns pesquisadores usando pessoas com habilidades psíquicas. N. do T.
[4] Quando se inicia um novo desenho experimental ou um novo tratamento psico-terapêutico ou um novo empreendimento comercial com freqüência o resultado é espetacular. Mas mal por algum tempo. Depois de um período, a excitação se dissipa e os resultados se tornam a mais ou menos ao mesmo nível, como antes, quando começou o novo desenho, tratamento ou procedimento. Hawthorne era o nome de um negócio no qual qualquer novo procedimento aumentava a produtividade, por algum tempo.
[5] Susan Blackmore, quem é cética de psi, argumenta que enquanto os parapsicólogos se preocupem por estudar um (inexistente) psi, não prestam atenção ao mesmo tempo à enorme riqueza psicológica e social em torno da experiência em si mesma.
Pelo contrário, Rhea White argumenta que os parapsicólogos deveríamos renunciar ao método científico e ocupar-nos de estudar as experiências humanas excepcionais (também as parapsicológicas), usando todas as perspectivas e metodologias que a investigação proporciona. N. do T.
[6] O estado atual no desenvolvimento de um área tecnológica empregando as últimas técnicas ou equipes. N. do T.
Artigo publicado na RAPP, Volume 10, Nº 04, outubro de 1999
Artigo disponível em
http://www.alipsi.com.ar/publicaciones_ ... ticulo=346