Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

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Herf
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Herf »

Anna escreveu:Cara, é simplesmente ARBITRÁRIO. Se tem dignidade humana e essa dignidade lhe dá igualdade humanitária a ser protegida por lei, não interessa se o pai dele é um assassino, estuprador e em que condições ele foi concebido, ele tem o direito de vida baseado nos conceitos adotados para salvaguardar essa vida.

Uma analogia que o zumbi filosófico fez certa vez: essa de considerar que o zigoto possui dignidade apenas se for gerado em circunstâncias altamente específicas, ou seja, apenas quando é fruto de uma interação pênis-vagina em uma relação sexual consentida por ambas as partes, soa tão pateticamente arbitrário como considerar que pessoas naturais de outros países não são tão "pessoas" como "nós", e, portanto, não seria tão errado maltratá-las, escravizá-las, ou mesmo matá-las.

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Acauan
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Acauan »

Procedure escreveu:Uma analogia que o zumbi filosófico fez certa vez: essa de considerar que o zigoto possui dignidade apenas se for gerado em circunstâncias altamente específicas, ou seja, apenas quando é fruto de uma interação pênis-vagina em uma relação sexual consentida por ambas as partes,...


Eu disse isto?

Procedure escreveu:...soa tão pateticamente arbitrário como considerar que pessoas naturais de outros países não são tão "pessoas" como "nós", e, portanto, não seria tão errado maltratá-las, escravizá-las, ou mesmo matá-las.


Dispensando-me de retornar à estúpida e já comentada analogia, é fato que ambas as posições nesta polêmica são, necessariamente em maior ou menor grau, arbitrárias.
A diferença é que um dos lados invoca o arbítrio para autorizar a destruição indiscriminada de embriões humanos e o outro para conter tal destruição.
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SickBoy
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por SickBoy »

Acauan escreveu:A diferença é que um dos lados invoca o arbítrio para autorizar a destruição indiscriminada de embriões humanos e o outro para conter tal destruição.


como se conter tal "destruição" não implicasse em outras coisas, como a violação do próprio direito da mulher sobre seu corpo, quando não o bem-estar desta e mesmo do futuro filho


a contraposição ao aborto inevitavelmente implica nisso

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Acauan
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Acauan »

SickBoy escreveu:
Acauan escreveu:A diferença é que um dos lados invoca o arbítrio para autorizar a destruição indiscriminada de embriões humanos e o outro para conter tal destruição.


como se conter tal "destruição" não implicasse em outras coisas, como a violação do próprio direito da mulher sobre seu corpo, quando não o bem-estar desta e mesmo do futuro filho

a contraposição ao aborto inevitavelmente implica nisso


Os que com tanta facilidade e frequência alegam o "direito da mulher sobre seu corpo" como bandeira abortista deveriam pensar uma ou duas vezes sobre de onde vêm os direitos.

Caso não saibam, há duas vias, o Direito Natural e o Direito Positivo.

No Direito Positivo é direito o que a lei, ou regra de igual força, ordena que seja respeitado como tal e provê os meios coercitivos para garantir este respeito.
Logo, em países como o Brasil, onde o aborto é proibido, segundo o Direito Positivo simplesmente não existe o direito de a mulher dispor de seu corpo destruindo o embrião ou feto, exceto nas exceções previstas.

A segunda forma de se atribuir direitos é o Direito Natural, que defende que determinados direitos são inatos à pessoa humana.
Neste caso, voltamos ao impasse sobre até onde um alegado direito natural da mulher sobre seu corpo deva ter precedência sobre um alegado direito natural à vida do embrião ou feto.

Antes que se lancem a teorizar sobre o assunto, convém dar uma olhada no que juristas ilustres escreveram a respeito. Pode ser bastante elucidativo e evitar mais perda de tempo nesta discussão interminável.
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SickBoy
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por SickBoy »

o ponto é que pretende se elevar a posição anti-abortista a algo que não causaria nenhum mal, ao mesmo tempo em que se admite que ela é uma posição tão arbitrária quanto a abortista. se a arbitrariedade abortista implica numa hipotética morte de uma vida humana, a arbitrariedade anti-abortista implica SIM numa lesão à autonomia da mulher sobre o próprio corpo.



quanto ao direito positivo, que eu saiba ele não é imutável.

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Acauan
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Acauan »

SickBoy escreveu:o ponto é que pretende se elevar a posição anti-abortista a algo que não causaria nenhum mal, ao mesmo tempo em que se admite que ela é uma posição tão arbitrária quanto a abortista. se a arbitrariedade abortista implica numa hipotética morte de uma vida humana, a arbitrariedade anti-abortista implica SIM numa lesão à autonomia da mulher sobre o próprio corpo.


O chato nestas discussões intermináveis é o número de vezes que se tem que atender àqueles que pegaram o bonde andando e querem sentar na janelinha.
Por favor, reveja o que eu escrevi sobre o assunto acima em 30/03/2007, há um ano, portanto, e analise se dá para concluir
"que pretende se elevar a posição anti-abortista a algo que não causaria nenhum mal".
Antecipando-me à resposta padrão neste caso, que é alegar desobrigação de ler ou saber tudo o que já foi dito na discussão, esta tem como contrapartida a obrigação da cautela antes de fazer afirmações sobre o que não se está completamente informado.

Segue citação:

Acauan, em 30/03/2007, escreveu:O aborto não é polêmico enquanto discussão científica sobre as capacidades ou potencialidades neurológicas do embrião e do feto, e sim como questão moral, que confronta o direito potencial da mulher de renunciar a uma gravidez indesejada contra a limitação a este direito estabelecida pela existência de uma outra vida humana na questão, cujo ciclo de vida individual já foi iniciado.

Questões morais muitas vezes não nos permitem o conforto da escolha fácil entre o BEM pleno e o mal absoluto.
As polêmicas surgem quando as escolhas se situam na zona cinzenta onde se deve optar entre um mal maior e um mal menor, sem ter certeza sobre a veracidade dos métodos que definem qual é qual.

Nestas situações há três posturas morais possíveis:

1. Não assumir posição, mantendo-se neutro;
2. Assumir uma posição e suas conseqüências, negativas e positivas;
3. Assumir uma posição e suas conseqüências positivas, mas negar-se a assumir as negativas.

Os que assumem a primeira posição, a da neutralidade, respondem moralmente por ela conforme o caso, dado que esta neutralidade pode ter vários motivos, que vão da comodidade ou conveniência ao sincero interesse de conhecer melhor a questão antes de decidir, visando prevenir uma tomada de posição incorreta.

Os que optam por assumir uma posição e suas conseqüências, positivas e negativas, enfrentam sempre o risco de haver tomado a posição errada, mas terão ao seu favor o reconhecimento de que tiveram a coragem moral de assumir uma decisão e suas conseqüências, quando era necessário que se fizesse isto.

O terceiro caso apresenta uma deficiência moral óbvia, dado que os que optam por ela aceitam apenas os benefícios da posição assumida, mas não os seus ônus, uma atitude claramente desonesta.
...
Quem defende a proibição do aborto deve assumir consciente e necessariamente que muitas mulheres sofrerão problemas em decorrência disto e, possivelmente, muitas crianças nascidas indesejadas também.

Quem defende a legalização do aborto deve assumir que negou todas as chances de existência a muitas vidas humanas com o ciclo já iniciado e definido, renunciando a buscar alternativas a esta extrema.

Cada qual, dentro da honestidade de suas posições, deve assumir sua parcela de responsabilidade no que entende como o mal menor da questão, mesmo acreditando que o mal maior foi evitado.


SickBoy escreveu:quanto ao direito positivo, que eu saiba ele não é imutável.


As atribuições de direito baseadas no Direito Positivo são mutáveis, por definição.
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SickBoy
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por SickBoy »

Acauan,


seu post de 30/03/2007 está em acordo com o que eu apontei. ambas as posições, arbitrariamente, visam minimizar o que consideram o pior mal.

suas palavras em resposta ao procedure foram:

"A diferença é que um dos lados invoca o arbítrio para autorizar a destruição indiscriminada de embriões humanos e o outro para conter tal destruição."


supondo que os dois lados sejam o abortista e anti-abortista, essa afirmação entra em contradição com o referido post, que afirma que assumir algumas das posições implica em assumir as consequências positivas e negativas. a posição anti-abortista não implica só em conter tal destruição, mas, nas suas palavras "Quem defende a proibição do aborto deve assumir consciente e necessariamente que muitas mulheres sofrerão problemas em decorrência disto e, possivelmente, muitas crianças nascidas indesejadas também.".


Quanto aos neutros, incapazes de tomar alguma decisão, não sei qual a relevância moral desse posicionamento, se são neutros mesmo, também não tomariam uma posição caso o direito positivo não reconhecesse o embrião como digno de direito à vida. Não consigo ver neutralidade como algo diferente de um dar de ombros. Se são neutros, são em suas posições, e não porque a neutralidade (e as leis atuais) lhes são convenientes.


os últimos que eu ouviria são esses.

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Acauan
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Acauan »

SickBoy escreveu:Acauan,

seu post de 30/03/2007 está em acordo com o que eu apontei. ambas as posições, arbitrariamente, visam minimizar o que consideram o pior mal.


Veja, as posições em si não visam coisa alguma. São as pessoas e grupos que defendem cada posição que podem ou não ter por objetivo minimizar o mal. Muitos, dos dois lados, estão preocupados apenas com seus próprios interesses.

SickBoy escreveu:suas palavras em resposta ao procedure foram:

"A diferença é que um dos lados invoca o arbítrio para autorizar a destruição indiscriminada de embriões humanos e o outro para conter tal destruição."


supondo que os dois lados sejam o abortista e anti-abortista, essa afirmação entra em contradição com o referido post, que afirma que assumir algumas das posições implica em assumir as consequências positivas e negativas. a posição anti-abortista não implica só em conter tal destruição, mas, nas suas palavras "Quem defende a proibição do aborto deve assumir consciente e necessariamente que muitas mulheres sofrerão problemas em decorrência disto e, possivelmente, muitas crianças nascidas indesejadas também.".


Não há contradição pois me referi especificamente à posição que cada grupo defende quanto a destruição dos embriões e fetos. O fato de existir desdobramentos destas posições não muda que é do modo referido que cada lado se refine quanto àquela questão específica.

SickBoy escreveu:Quanto aos neutros, incapazes de tomar alguma decisão, não sei qual a relevância moral desse posicionamento, se são neutros mesmo, também não tomariam uma posição caso o direito positivo não reconhecesse o embrião como digno de direito à vida. Não consigo ver neutralidade como algo diferente de um dar de ombros. Se são neutros, são em suas posições, e não porque a neutralidade (e as leis atuais) lhes são convenientes.

os últimos que eu ouviria são esses.


Segundo Dante, em A Divina Comédia, largados à porta do inferno padecem os neutros, aqueles que não tomaram partido nem por Deus, nem pelo diabo e por isto foram rejeitados por ambos.

Coragem moral implica em aceitar riscos.
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Orbe »

Ainda espero um dia, quem sabe, derrepente, talvez, receber uma iluminada resposta, de um dos usuários contrários ao aborto, para a questão: Porque um embrião gerado em um estupro é menos digno de viver que um embrião gerado em qualquer outra relação sexual?

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King In Crimson
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por King In Crimson »

Orbe escreveu:Ainda espero um dia, quem sabe, derrepente, talvez, receber uma iluminada resposta, de um dos usuários contrários ao aborto, para a questão: Porque um embrião gerado em um estupro é menos digno de viver que um embrião gerado em qualquer outra relação sexual?

Quem defende, diz basicamente que a mulher não tem nenhuma obrigação com o embrião.

Seria como culpar alguém desse fórum pela morte de criancinhas na África.

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user f.k.a. Cabeção
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

zumbi filosófico escreveu:
user f.k.a. Cabeção escreveu: Como assim de forma analoga? Voce entendeu bem o problema? Nao ha nada de analogo, justamente porque a fecundacao PODE ser vista como um fenomeno de « ignicao » de um novo processo, coisa que a formacao do sistema nervoso nao pode.

Tanto o ovulo quanto o espermatozoide, ao se fundirem, dao inicio a um processo conjunto novo onde cada um individualmente contribui com a sua parcela de informacao, e que nao e uma sequencia dos processos individuais onde eles estavam inseridos.

Ja o que ocorre na formacao do sistema nervoso e um processo cujo unico start identificavel sao as mitoses decorrentes da fecundacao e as diferenciacoes graduais subsequentes.

O fato do ovulo ter sua individualidade dentro do seu processo nao implica que ele seja humano, agora o fato de um embriao de duas ou vinte semanas serem o mesmo ser implica que se um e humano o outro tem bons motivos para ser considerado tambem.

São coisas análogas, o que é diferente de você ver como igualmente válido.

Você poderia, por exemplo, estar argumentando para um evangélico rigoroso, daqueles que acham que as mulheres só devem usar saias ou vestidos, e calças são apenas para os homens, que ambas as roupas são iguais, só roupas, panos (mais ou menos como eu não vejo diferença no processo reprodutivo como um todo e a fecundação especificamente).

O crente obviamente objetaria (sei lá por que), dizendo que apesar de serem ambos "roupas", são roupas fudamentalmente diferentes, e sustentaria que as mulheres devem sim usar saias e não calças, bem como homens não devem usar saias (talvez sendo até sua recusa em usar minissaia uma evidência de que as mulheres não devem usar calças), e que por diversas maneiras o simples fato de serem "roupas" é irrelevante diante das diferenças entre esses tipos de roupas (analogamente a isso da fecundação como desengate do desenvolvimento ser muito mais importante que a excitação sexual ou ovulação como desengate do de um ciclo reprodutivo).

Eu dou de ombros para que a fecundação é um ponto bioquimicamente mais identificável, ou o que quer mais que haja implícito aí, não me parece ter nada que dê humanidade ao zigoto, e você dâ de ombros para as diferenças diversas entre calças e saias e acha que não tem sentido que as mulheres não possam usar calças.



Eu quotei a minha mensagem para evidenciar que voce nao refuta o que eu disse, mas propoe algo absurdo e desligado do problema como uma « situacao analoga ». Esse metodo de argumentacao, alem de invalido e cansativo, e portanto serei curto e breve, espero que pela ultima vez.
E o que voce da de ombros nao importa, o que importa e que eu consigo definir o inicio de um processo de existencia humana na fecundacao e formacao de um embriao ; e voce nao consegue sequer dizer o que e o inicio da atividade cerebral, ou mesmo defini-la.

Eu posso identificar responsaveis por uma acao que tem implicacoes sobre outro individuo, no caso, gerando-o. Voce so consegue dizer coisas vagas.


zumbi filosófico escreveu:Novamente, não vejo por que isso seria mais importante de não se poder gerar um boi ou nematóide com um óvulo humano.


Nem um ser humano. A informacao que voce adicionou e a de que ovulos humanos sao diferentes de nematoides, mas acho que esse nao e bem o ponto da nossa discussao e qualquer pessoa tomaria como valido a priori sem maiores problemas.

O que eu coloquei e que a diferenca qualitativa entre os embrioes humanos e de diferentes animais se realiza tanto na sua origem quanto no seu potencial, independente de semelhancas fisicas cuidadosamente escolhidas em ad hoc. Quando nos temos a liberdade de escolher as semelhancas « em determinado sentido », nao ha limites para o que podemos igualar.

Mas quando dizemos que o processo do embriao esta contido no processo humano do qual podemos identificar claramente o inicio e o fim, e no qual sua existencia individual independe da escolha de demais individuos e demais eventos casuais, estabelecemos uma categoria de ser humano que compreende muito bem aquilo que chamamos de embriao.

E claro que voce pode, inocente e desavisadamente, ou desonestamente, afirmar que aquilo que somos sempre depende da acao dos demais e em eventos casuais. Logo, ovulo = embriao = sem dignidade.
So que esse silogismo igualaria facilmente tambem pessoa = cadaver = adubo = sem dignidade, ja que cada um desses pode se transformar no outro via acao de uma terceira pessoa.

E a sua brilhante conclusao seria a de que nao podemos ter dignidade humana, e dai tudo seria permitido.

O processo “ovulo” difere do processo “embriao” em basicamente tudo, desde a origem ate o fim.

Um pode se transformar no outro somente graças a acao de terceiros, o que nao os iguala, como visto acima.

Isso tambem e diferente, embora sutilmente, de uma pessoa que so pode sobreviver gracas a terceiros. Mas embora receber um rim de alguem nao te transforme em outra pessoa, ninguem pode ser obrigado a te doar um rim, a menos e claro que essa pessoa seja responsavel pelo seu problema no rim.

Assim, supondo que voce forcaria uma analogia entre um ovulo e alguem com um problema de rim precisando urgentemente de transplante, voce nao deve ser necessariamente obrigado a contribuir para a realizacao desse salvamento se voce nao tem nenhuma responsabilidade assumida mediante uma acao.

Ja o embriao seria como a pessoa que voce causou o dano no rim. Nao importando se o ato foi culposo ou doloso, voce e responsavel e pode ser, portanto, responsabilizado moralmente. No caso da gravida, ela deve levar a gravidez em diante.

Eu nao tenho como ser mais claro do que eu estou sendo agora. Mais uma analogia com ovulos e eu desisto.


zumbi filosófico escreveu:Apenas o fato dele já estar num estágio mais adiantado, não me parece relevante. Teria que ser mais adiantado ainda.



Como eu disse, nao se tratam de estagios diferentes, mas de processos qualitativamente diferentes. Possuem origens e fins diferentes, responsaveis diferentes, caracteristicas fisicas e comportamentos diferentes. Para um se transformar no outro e preciso acao de terceiros, que nao estao a priori vinculados a responsabilidade de realizar tal transformacao.

Chamar de estagios diferentes e portanto equivocado.


zumbi filosófico escreveu:Sua opinião, talvez escapista de outra forma.


A questao da etica nos experimentos geneticos e importante, mas ela nao permite estabelecer criterios morais para o tratamento de problemas que sao anteriores a tais experimentos, e que derivam de acoes cotidianas.

A resposta para o seu problema e que, ao inves de saber o que fazer com um embriao hibrido de gente com outros animais, deveriamos evitar de brincar de fazer esse tipo de criatura.


zumbi filosófico escreveu:Acho que não. Por exemplo, não há praticamente polêmica alguma se cientistas quiserem colocar genes de cérebro de gato num rato ou numa beterraba. Se querem colocar genes do cérebro humano num rato, a coisa muda de figura.


Se esses animais modificados puderem ser capazes, ainda que fracamente e potencialmente, de identificar o certo e o errado e agir de acordo com uma Lei Moral, eu nao vejo porque eles e seus eventuais embrioes nao devam ser respeitados como o de todo ser humano.

Nao e o gene A ou B que define o homem e sua dignidade. Nem mesmo essa nocao de capacidade moral que eu dei. Eu nao sei quais sao as condicoes necessarias, mas creio que essa condicao seria suficiente, com certeza.


zumbi filosófico escreveu:Será mesmo? Por que? Neandertais seriam humanos ou não? O limite da "humanidade" é o conceito biológico/reprodutivo de espécie?


O escapismo esta em tratar um problema que nunca existiu, ou pelo menos nao existe mais. Se os cientistas ressucitarem os neandertais, ai sim poderemos falar de questoes eticas concernentes.

zumbi filosófico escreveu:
user f.k.a. Cabeção escreveu: A quantidade de respeito destinado a cada especie animal pode levar em consideracao criterios como o grau de desenvolvimento mental. Isso porque o animal nao porta dignidade alguma, e se os respeitamos e tao somente porque nao e necessario inflingir-lhes um sofrimento inutil.

Ja a dignidade humana deve preceder toda caracteristica parcial, e aplicar-se a todo ser humano por igual.


Bem, isso é a sua opinião sobre o assunto. Como somos animais, e não a única a possivelmente ter características humanas, não acho a posição mais adequada.



Voce nao entendeu o que eu disse.

Eu disse que para animais, o criterio de desenvolvimento cerebral, que vise minimizar o sofrimento, pode ser aplicavel, na medida que eles nao portam dignidade individual propria.

Assim como o criterio daquele que prefere suas orquideas aos parasitas que nela habitam pode ser valido, ou o seu cao ou gato de estimacao a um macaco ou golfinho qualquer.

Com seres humanos a coisa nao pode funcionar assim, e cada um deve portar dignidade equivalente.

Foi isso basicamente o que eu disse, voce toma como opiniao minha, ou seria talvez algo aceito universalmente ?


zumbi filosófico escreveu:É exagero sim, tal como seria dramatizar com "extermínio de óvulos".


Nao estou dramatizando nada. O aborto legalizado autoriza o exterminio de embrioes. Se eles sao ou nao seres humanos, ou melhor, se devem ou nao ser considerados como seres humanos, e a questao do debate que estamos tendo.

Se voce nao gosta da palavra e prefere usar eufemismos, fique a vontade. Mas isso nao muda um fato, e o teor de dramatismo do mesmo nao depende das figuras de linguagem que foram usadas para expressa-lo.


zumbi filosófico escreveu:Não adianta ficar batendo o pé com bastante força e dizendo que a comparação do óvulo instantes antes e depois da fecundação já é tão fundamentalmente diferente e obviamente merece dignidade humana mas um segundo antes é uma besteira indigna de consideração.


Ja disse que essa questao de « instanteaneidade » nao importa, e um pseudo-problema.

Se uma pessoa pode mudar de viva para morta em fracoes de segundo, bastando ser alvejada na cabeca por um tiro de fuzil, e o estado antes de ser fuzilado e depois sao suficientemente diferentes para sabermos identificar cada um deles.


zumbi filosófico escreveu:Sim, eles tem diferenças citológicas diversas, mas não é claro que essas diferenças já "dignifiquem" a mesma célula como humana em um instante. É apenas sua opinião que elas são relevantes e suficientes para a humanidade.


A relevancia delas nao e a minha opiniao. Elas sao relevantes pois iniciam um processo de manera evidente, processo que em um determinado estagio e evidemente humano, coisa que voce nao conseguiu arranjar substituto a altura, sobretudo com o besteirol de inicio da atividade mental, algo que nem voce sabe o que e nem o que esta querendo dizer, achando que com uma mera confusao conceitual voce tem a prerrogativa para matar o que quiser.

Se essa relevancia obvia e suficiente para determinar um individuo humano digno, ai sim, e a minha opiniao.


zumbi filosófico escreveu:Poderia ficar bolando raciocínios diversos do porque alguns poderiam defender que os espermatozóides são menos importantes. Poderia compará-los a uns "vírus" mais gordinhos, dizer que a contribuição de citoplasma e mitocôndrias é negligenciável ou nula, etc. Você, claro, não iria se convencer de que esses motivos distinguem o suficiente essas células, assim como vê como distinção fundamental e importantíssima as existentes entre óvulo e zigoto.

O ponto da comparação não é realmente te convencer que os óvulos é que devam ser tão protegidos quanto os zigotos, mas ilustrar como esse tipo de diferença de nível citológico/genético pode parecer ridículo.



Nao sao as semelhancas em niveis especificos que igualam as coisas. Se nao, do ponto de vista da fisica balistica, um bebe e um saco de bosta seriam aproximadamente iguais.

O fato e que a fecundacao permite discernir dois processos, e um deles compreende um estagio onde existe um ser humano digno. Isso voce nao consegue negar.

As diferencas citologicas/geneticas, pequenas ou grandes, sao suficientes para garantir isso que eu acabei de dizer.

O que voce nao consegue perceber e que o que eu digo sobre processos e acoes humanas sao fatos, cabendo a voce contestar a validade dos mesmos e a relevancia para com relacao a nossa questao ; enquanto o que voce diz sobre diferencas « grandes » ou « pequenas » no nivel bioquimico e que sao meras impressoes pessoais.


zumbi filosófico escreveu:Ao mesmo tempo em que é realmente difícil defender como "ridículo" que o óvulo não seja humano quando o óvulo fecundado de repente é. O tempo todo, apenas listam as diferenças entre um e outro como se elas fossem as determinantes da "humanidade": diploidia, ter pai e mãe definidos, idioma e outras variáveis sócio-culturais implícitas, etc. Todas ou já presentes no óvulo em variados graus (como é mesmo depois da fecundação) ou na verdade, muito discutíveis como realmente o critério de "humanidade" (diploidia, por exemplo, que nem é especificamente humana)


Ninguem citou diploidia nem idioma, e voce nao achara isso no meu texto.

Quanto a ter pai e mae, gostaria de ver uma explicacao de como um ovulo ja teria um pai, sem apelar para coisas como predestinacao. E de qualquer modo, mesmo apelando para a predestinacao, teriamos que os ovulos predestinados a ser fecundados nao correm o risco de serem eliminados, o que nao causa portanto problema algum com o que foi dito.

Nao que eu defenda algo assim, so estou tentando entender voce.


zumbi filosófico escreveu:Sim, entendo que isso para você distingue fundamentalmente o óvulo do zigoto, tanto que ele, agora, de repente, nem é mais simplesmente um óvulo fecundado mas outra coisa muito maior.

Pois bem, não vejo porque a maturação não poderia ser arbitrariamente valorizada da mesma maneira, como momento em que o ADN se diferencia daquele do da mãe e a célula/humano se prepara para iniciar o desenvolvimento que culminará em um bebê.

Entenda, não estou tentando te convencer que deva acreditar nisso, apenas não vejo diferença fundamental nas duas interpretações desses eventos citológicos no que concerne a "humanidade" da(s) célula(s). Muitas coisas que se diz diferente poderiam ser "enxergadas" em ambas.



Voce esta se prendendo a pormenores que nao tem importancia.Ninguem esta tratando do problema « o aborto pode ser feito entre a fecundacao e a maturacao genetica ?». Do ponto pratico, ambos podem ser considerados simultaneos.

(Eu nao sei em que momento age a pilula do dia seguinte, talvez seja nesse que voce disse. Isso pode levantar uma questao interessante, mas que nao e a que vem sendo tratada aqui, sobre a legalidade do aborto, metodo praticavel tao somente quando existe um embriao identificavel.)

De qualquer modo, o processo de definicao do individuo tem diversas etapas significativas, da sua maturacao genetica ate a sua aceitacao ou nao em Harvard.


zumbi filosófico escreveu:Não, na verdade eu não vejo importância na quantidade de material. Um pró-óvulo poderia ver para "desumanizar" o zigoto tal como os pró-vida, talvez você também, vêem a quantidade de material genético como algo fundamental. Eu não vejo diferença ou relevância dessas questões citológicas. Acho que a "humanidade" existe apenas num nível "histológico" maior. Por isso inclusive a comparação.



Eu nao acho nada disso. Eu acho simplesmente que a humanidade tem sentido e existe no nivel individual, e nao acho que o seu criterio “histologico” seja suficientemente claro para definir um individuo.


zumbi filosófico escreveu:Acho que tudo é "relativização". Delimitar o início da humanidade no zigoto e não no óvulo ou mais tarde, inclusive. Não acho que isso seja "encontrar A Verdade", mas analisar o que são as coisas, dar nomes a elas, e então se balançar as coisas. Assim, eu considero mal que crianças sejam filhos indesejados ou não planejados apenas para "salvar a vida" do óvulo, zigoto ou embrião ou feto sem atividade cerebral iniciada que um dia ela já foi, num sentido mais biológico/histológico ou até citológico. O fato de pessoas nessas condições muitas vezes, talvez na maioria das vezes, não declararem que preferiam não ter nascido não vejo como sendo muito relevante, pois praticamente toda pessoa que fosse concebida diria o mesmo.



O que eu considero um mal e dissociar do individuo a sua dignidade, atribuindo a mesma a um estado especifico, escolhido atraves de um criterio ad hoc conveniente para com sua ideologia.

Nao acho o ser humano um produto da ideologia, nem a sua definicao pode ser. Ideologias mudam sem que as pessoas deixem de ser pessoas.
"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem

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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
zumbi filosófico escreveu:
user f.k.a. Cabeção escreveu: Como assim de forma analoga? Voce entendeu bem o problema? Nao ha nada de analogo, justamente porque a fecundacao PODE ser vista como um fenomeno de « ignicao » de um novo processo, coisa que a formacao do sistema nervoso nao pode.

Tanto o ovulo quanto o espermatozoide, ao se fundirem, dao inicio a um processo conjunto novo onde cada um individualmente contribui com a sua parcela de informacao, e que nao e uma sequencia dos processos individuais onde eles estavam inseridos.

Ja o que ocorre na formacao do sistema nervoso e um processo cujo unico start identificavel sao as mitoses decorrentes da fecundacao e as diferenciacoes graduais subsequentes.

O fato do ovulo ter sua individualidade dentro do seu processo nao implica que ele seja humano, agora o fato de um embriao de duas ou vinte semanas serem o mesmo ser implica que se um e humano o outro tem bons motivos para ser considerado tambem.

São coisas análogas, o que é diferente de você ver como igualmente válido.

Você poderia, por exemplo, estar argumentando para um evangélico rigoroso, daqueles que acham que as mulheres só devem usar saias ou vestidos, e calças são apenas para os homens, que ambas as roupas são iguais, só roupas, panos (mais ou menos como eu não vejo diferença no processo reprodutivo como um todo e a fecundação especificamente).

O crente obviamente objetaria (sei lá por que), dizendo que apesar de serem ambos "roupas", são roupas fudamentalmente diferentes, e sustentaria que as mulheres devem sim usar saias e não calças, bem como homens não devem usar saias (talvez sendo até sua recusa em usar minissaia uma evidência de que as mulheres não devem usar calças), e que por diversas maneiras o simples fato de serem "roupas" é irrelevante diante das diferenças entre esses tipos de roupas (analogamente a isso da fecundação como desengate do desenvolvimento ser muito mais importante que a excitação sexual ou ovulação como desengate do de um ciclo reprodutivo).

Eu dou de ombros para que a fecundação é um ponto bioquimicamente mais identificável, ou o que quer mais que haja implícito aí, não me parece ter nada que dê humanidade ao zigoto, e você dâ de ombros para as diferenças diversas entre calças e saias e acha que não tem sentido que as mulheres não possam usar calças.



Eu quotei a minha mensagem para evidenciar que voce nao refuta o que eu disse, mas propoe algo absurdo e desligado do problema como uma « situacao analoga ». Esse metodo de argumentacao, alem de invalido e cansativo, e portanto serei curto e breve, espero que pela ultima vez.


Realmente é cansativo. Fecundação e ovulação SÃO análogos (ambos podem ser vistos como "começos de processo", mas claro que você pode fazer pesar mais o processo que julgar, arbitrariamente, mais importante) e ambos são relacionados, essenciais, à reprodução humana. Nem de longe a ovulação é "desligada" da questão da reprodução humana e desenvolvimento.


E o que voce da de ombros nao importa, o que importa e que eu consigo definir o inicio de um processo de existencia humana na fecundacao e formacao de um embriao


Claro, definições podem ser tão arbitrárias e esquisitas quantos se queira.


; e voce nao consegue sequer dizer o que e o inicio da atividade cerebral, ou mesmo defini-la.



    É claro que as coisas acontecem no cérebro — principalmente nas camadas superiores da "massa cinzenta" convoluta a que se chama córtex cerebral. Os cerca de 100 biliões de neurónios do cérebro constituem a base material do pensamento. Os neurónios estão ligados uns aos outros e as suas sinapses desempenham um papel fundamental no acto de pensar. Mas a interligação de neurónios em larga escala só começa entre a 24ª e a 27ª semanas de gravidez — o sexto mês.

    Através da colocação de eléctrodos inofensivos na cabeça de um paciente, os cientistas medem a actividade eléctrica produzida pela rede de neurónios existente dentro do crânio. Tipos diferentes de actividade mental produzem tipos diferentes de ondas cerebrais. Mas as ondas cerebrais de padrão regular características do cérebro humano adulto só são detectadas no feto por altura da 30ª semana de gravidez — à entrada do 3.º trimestre. Antes disso o feto não tem a necessária arquitectura cerebral. Ainda não pode pensar.

    Aceder a matar qualquer criatura viva, em especial uma que possa mais tarde transformar-se num bebé, é perturbador e doloroso. Mas nós rejeitámos os extremos do "sempre" e do "nunca" e isto coloca-nos — quer queiramos, quer não — na rampa escorregadia. Se nos obrigam a escolher um critério de desenvolvimento, então é aqui que traçamos a linha: mal se torna possível o começo do pensamento caracteristicamente humano.

    Trata-se, efectivamente, de uma definição muito conservadora: raramente se detectam em fetos ondas cerebrais regulares. Talvez mais investigação ajudasse. (Nos babuínos e nos fetos de ovinos as ondas cerebrais bem definidas também só começam no fim da gestação.) Se quiséssemos tornar o critério ainda mais rigoroso, prevendo a eventualidade de casos de desenvolvimento cerebral fetal precoce, podíamos traçar a linha aos seis meses. Por acaso foi aí que o Supremo Tribunal a traçou em 1973 — embora por razões completamente diferentes.
- Carl Sagan & Ann Druyan - "Aborto: é possível ser ao mesmo tempo pró-vida e pró-escolha?"


Ainda que isso não esteja suficientemente definido por algum critério imaginável, isso não dá validação automática à proposta de conceito diplóide/genético/ontológico de humanidade, mesmo que esse possa ser melhor definido por se tratar de uma reação química inicial mais simples.





zumbi filosófico escreveu:Novamente, não vejo por que isso seria mais importante de não se poder gerar um boi ou nematóide com um óvulo humano.


Nem um ser humano.


Absolutamente todos seres humanos foram gerados de óvulos humanos.





O que eu coloquei e que a diferenca qualitativa entre os embrioes humanos e de diferentes animais se realiza tanto na sua origem quanto no seu potencial, independente de semelhancas fisicas cuidadosamente escolhidas em ad hoc. Quando nos temos a liberdade de escolher as semelhancas « em determinado sentido », nao ha limites para o que podemos igualar.


Óvulos e zigotos humanos diferem em potencial e origem dos óvulos e zigotos dos outros animais. "Quando temos a liberdade de escolher momentos-chave em um processo abrangente, praticamente não há limites para as divisões que podemos fazer para separar os processos em subprocessos e dizer serem distintos".






Mas quando dizemos que o processo do embriao esta contido no processo humano do qual podemos identificar claramente o inicio e o fim, e no qual sua existencia individual independe da escolha de demais individuos e demais eventos casuais, estabelecemos uma categoria de ser humano que compreende muito bem aquilo que chamamos de embriao.


O "processo do embrião" tem um início claro; o processo humano é um contínuo, que precede o embrião.

E claro, se um grupo de pessoas define uma coisa qualquer, Y, como "X", essa coisa Y será claramente aquilo que aqueles que usam essa definição de "X" chamam de "X".





E claro que voce pode, inocente e desavisadamente, ou desonestamente, afirmar que aquilo que somos sempre depende da acao dos demais e em eventos casuais. Logo, ovulo = embriao = sem dignidade.
So que esse silogismo igualaria facilmente tambem pessoa = cadaver = adubo = sem dignidade, ja que cada um desses pode se transformar no outro via acao de uma terceira pessoa.


Eu simplesmente não vejo relevância de "eventos casuais" ou não na humanidade, portanto essa coisa de "pessoa = cadáver" porque podem vir a ser por eventos casuais, é igualmente irrelevante.






Um pode se transformar no outro somente graças a acao de terceiros, o que nao os iguala, como visto acima.


Eu em momento algum defendi que sejam exatamente iguais, a mesma coisa exatamente.

Mas também não é o óvulo armazenado e o óvulo ovulado.


Não acho que é essa diferença de "ação de terceiros" que determina a humanidade (ou qualquer que seja a relevância disso), bem como você não acha que é a ovulação (que, indiretamente, depende da omissão, voluntária, de uma "terceira", em usar algum contraceptivo anti-ovulatório, diga-se de passagem).

E acho que você consideraria como "humanos" pessoas resultantes de casos de partenogênese que viessem a ocorrer, ou que tenham ocorrido, como alguns suspeitam. Mesmo não tendo havido "ação de terceiros".






Isso tambem e diferente, embora sutilmente, de uma pessoa que so pode sobreviver gracas a terceiros.


Obviamente, pois sua definição de "humano" exclui o óvulo. Se não, seria exatamente a mesma coisa.







Mas embora receber um rim de alguem nao te transforme em outra pessoa, ninguem pode ser obrigado a te doar um rim, a menos e claro que essa pessoa seja responsavel pelo seu problema no rim.

Assim, supondo que voce forcaria uma analogia entre um ovulo e alguem com um problema de rim precisando urgentemente de transplante, voce nao deve ser necessariamente obrigado a contribuir para a realizacao desse salvamento se voce nao tem nenhuma responsabilidade assumida mediante uma acao.


O problema dessa analogia de transplante de rim é que distancia um pouco a coisa. Uma analogia muito mais próxima seria do óvulo com um zigoto que precisa de uma nova relação sexual para não ser abortado espontâneamente.

Supondo que zigotos sejam gente, imagino que fosse defensável a responsabilidade legal dos pais em fazer o possível para salvar a vida do filho. Enquanto a decisão de *não* doar um rim para salvar a vida de um filho talvez fosse até legalmente defensável, por ter risco, ser uma cirurgia, e etc, uma ejaculação é uma coisa tão banal, mais insignificante que uma transfusão de sangue, que imagino que ficaria difícil defender a posição de pais que optassem por não fazer isso para salvar o filho.








Ja o embriao seria como a pessoa que voce causou o dano no rim. Nao importando se o ato foi culposo ou doloso, voce e responsavel e pode ser, portanto, responsabilizado moralmente. No caso da gravida, ela deve levar a gravidez em diante.


Eu nao tenho como ser mais claro do que eu estou sendo agora. Mais uma analogia com ovulos e eu desisto.


Eu entendo perfeitamente a posição pró-vida; da fecundação em diante se teria para praticamente todos os fins, uma pessoa, e logo não se poderia fazer nada contra ela, como não se pode fazer contra pessoas de modo geral.

Analogias do zigoto e outros estágios com o óvulo partem de um princípio onde as premissas sobre o que é "humano" e o que não é ou são "neutras" ou assumem, para fins de comparação, que o óvulo poderia ser considerado humano por alguns dos critérios usados para defender a humanidade do zigoto, obviamente falhando se os critérios pró-zigoto são tão tautológicos quanto puderem ser, não importando o quão irrelevantes sejam as diferenças bioquímicas ou de outro tipo para um conceito razoável de humanidade; elas obviamente não servem para nada se você tenta entendê-las com a premissa de que a partir da fecundação se tem gente, e antes disso, não havia nada significante.







zumbi filosófico escreveu:Apenas o fato dele já estar num estágio mais adiantado, não me parece relevante. Teria que ser mais adiantado ainda.



Como eu disse, nao se tratam de estagios diferentes, mas de processos qualitativamente diferentes. Possuem origens e fins diferentes, responsaveis diferentes, caracteristicas fisicas e comportamentos diferentes. Para um se transformar no outro e preciso acao de terceiros, que nao estao a priori vinculados a responsabilidade de realizar tal transformacao.

Chamar de estagios diferentes e portanto equivocado.


Essa é sua classificação. Os eventos que temos são um contínuo; uma célula se matura no ovário, milhões de outras células vão até ela, uma delas entra na primeira célula, que então irá eventualmente se dividir, mais do que comumente se dividiria se não tivesse sido fecundada por outra célula, e tem 50-80% de chance natural de se diferenciar e atingir o grau de organização daquilo que consensualmente chamamos de seres humanos.

Esse é o processo que gera humanos. Ele pode ser subdividido em diversos subprocessos, como você fez. Não acho que seja apenas pela possibilidade de divisão, ou possibilidade de se defender a indivisibilidade, ou contingência/hierarquia de processos, que se define satisfatoriamente o que são "humanos".

Também não vejo importância "em ações de terceiros", não mais do que qualquer outro evento bioquímico que consideremos humanamente irrelevante, mas seja necessariamente incidental ao processo.

Você possivelmente também não vê, imagino que no caso de se descobrir que há casos de partenogênese humana viável, ainda seria contra o aborto nesses casos, mesmo não tendo a "ação de terceiros" desengatado a geração de um novo ser humano.







zumbi filosófico escreveu:Sua opinião, talvez escapista de outra forma.


A questao da etica nos experimentos geneticos e importante, mas ela nao permite estabelecer criterios morais para o tratamento de problemas que sao anteriores a tais experimentos, e que derivam de acoes cotidianas.

A resposta para o seu problema e que, ao inves de saber o que fazer com um embriao hibrido de gente com outros animais, deveriamos evitar de brincar de fazer esse tipo de criatura.


Bem, eu acho que enquanto não se tem cérebros modificados em jogo, podemos fazer "criaturas" diversas. Apoio e torço muito para as técnicas de clonagem para utilização de células estaminais de embriões-clones, que serão mais eficientes que de células estaminais de outros embriões por minimizar muito a chance de rejeição. Talvez até órgãos para transplante possam ser feitos assim.






zumbi filosófico escreveu:Acho que não. Por exemplo, não há praticamente polêmica alguma se cientistas quiserem colocar genes de cérebro de gato num rato ou numa beterraba. Se querem colocar genes do cérebro humano num rato, a coisa muda de figura.


Se esses animais modificados puderem ser capazes, ainda que fracamente e potencialmente, de identificar o certo e o errado e agir de acordo com uma Lei Moral, eu nao vejo porque eles e seus eventuais embrioes nao devam ser respeitados como o de todo ser humano.

Nao e o gene A ou B que define o homem e sua dignidade. Nem mesmo essa nocao de capacidade moral que eu dei. Eu nao sei quais sao as condicoes necessarias, mas creio que essa condicao seria suficiente, com certeza.


Eu não sei, acho mais complicado que isso. Crianças não tem essa habilidade, podem talvez não desenvolver, e não é desenvolvida em diversos tipos de retardamento ou lesão mental, e nem por isso as pessoas nessas condições deixam de ser "humanas". Acho que talvez um hipotético animal com cérebro geneticamente anabolizado a níveis parecidos com os dos humanos, talvez devesse ser considerado mais ou menos assim. E por isso, acho que esse tipo de coisa não deveria ser permitida, acho que seria bem próximo a se fazer experiências com membros da espécie humana (além de. imagino, não ter um potencial de aplicação tão importante quanto outras coisas que se pode fazer sem chegar ao desenvolvimento de cérebros)







zumbi filosófico escreveu:
user f.k.a. Cabeção escreveu: A quantidade de respeito destinado a cada especie animal pode levar em consideracao criterios como o grau de desenvolvimento mental. Isso porque o animal nao porta dignidade alguma, e se os respeitamos e tao somente porque nao e necessario inflingir-lhes um sofrimento inutil.

Ja a dignidade humana deve preceder toda caracteristica parcial, e aplicar-se a todo ser humano por igual.


Bem, isso é a sua opinião sobre o assunto. Como somos animais, e não a única a possivelmente ter características humanas, não acho a posição mais adequada.



Voce nao entendeu o que eu disse.

Eu disse que para animais, o criterio de desenvolvimento cerebral, que vise minimizar o sofrimento, pode ser aplicavel, na medida que eles nao portam dignidade individual propria.

Assim como o criterio daquele que prefere suas orquideas aos parasitas que nela habitam pode ser valido, ou o seu cao ou gato de estimacao a um macaco ou golfinho qualquer.

Com seres humanos a coisa nao pode funcionar assim, e cada um deve portar dignidade equivalente.

Foi isso basicamente o que eu disse, voce toma como opiniao minha, ou seria talvez algo aceito universalmente ?


Acho que isso de que "animais não tem dignidade alguma" é opinião, ainda que bem comum. A própria idéia de que é "bom" não lhes proporcionar sofrimento inútil praticamente não faz sentido sem uma analogia com o sofrimento humano, e como não devemos causar sofrimento humano desnecessário. Não é, embora talvez alguns possam comparar, análogo a não destruir um monte de pedras ou plantas, mesmo que inúteis, simplesmente porque não é necessário destruí-las. É análogo ao sofrimento humano.







zumbi filosófico escreveu:É exagero sim, tal como seria dramatizar com "extermínio de óvulos".


Nao estou dramatizando nada. O aborto legalizado autoriza o exterminio de embrioes. Se eles sao ou nao seres humanos, ou melhor, se devem ou nao ser considerados como seres humanos, e a questao do debate que estamos tendo.

Se voce nao gosta da palavra e prefere usar eufemismos, fique a vontade. Mas isso nao muda um fato, e o teor de dramatismo do mesmo nao depende das figuras de linguagem que foram usadas para expressa-lo.


zumbi filosófico escreveu:Não adianta ficar batendo o pé com bastante força e dizendo que a comparação do óvulo instantes antes e depois da fecundação já é tão fundamentalmente diferente e obviamente merece dignidade humana mas um segundo antes é uma besteira indigna de consideração.


Ja disse que essa questao de « instanteaneidade » nao importa, e um pseudo-problema.

Se uma pessoa pode mudar de viva para morta em fracoes de segundo, bastando ser alvejada na cabeca por um tiro de fuzil, e o estado antes de ser fuzilado e depois sao suficientemente diferentes para sabermos identificar cada um deles.


Ainda que a estranheza da importância de um instante especificamente, desapareça, se é usado um instante crucial no fim da parte consensual da humanidade, não era a instantaneidade o ponto, ela apenas enfatiza a esquisitice da diferença de importância em algo que difere do óvulo em uns pentelhogramas de moléculas. Imagine que alguém defendesse que a vida não começa na fecundação, mas, digamos, depois da quinta divisão celular, depois de ter sido sintetizada em uma pequena quantidade alguma proteína qualquer.

Sei que para você uma proteína qualquer não tem a importância toda, que é o contexto no qual ocorre a fecundação, apenas não consigo ver importância nesse contexto tal como você provavelmente não conseguiria ver importância em qualquer motivo que alguém concebesse para a síntese de uma proteína em particular que só começasse na quinta divisão celular.










zumbi filosófico escreveu:Poderia ficar bolando raciocínios diversos do porque alguns poderiam defender que os espermatozóides são menos importantes. Poderia compará-los a uns "vírus" mais gordinhos, dizer que a contribuição de citoplasma e mitocôndrias é negligenciável ou nula, etc. Você, claro, não iria se convencer de que esses motivos distinguem o suficiente essas células, assim como vê como distinção fundamental e importantíssima as existentes entre óvulo e zigoto.

O ponto da comparação não é realmente te convencer que os óvulos é que devam ser tão protegidos quanto os zigotos, mas ilustrar como esse tipo de diferença de nível citológico/genético pode parecer ridículo.



Nao sao as semelhancas em niveis especificos que igualam as coisas. Se nao, do ponto de vista da fisica balistica, um bebe e um saco de bosta seriam aproximadamente iguais.

O fato e que a fecundacao permite discernir dois processos, e um deles compreende um estagio onde existe um ser humano digno. Isso voce nao consegue negar.

As diferencas citologicas/geneticas, pequenas ou grandes, sao suficientes para garantir isso que eu acabei de dizer.


Como eu disse em diversas vezes, não é apenas durante a fecundação que se sabe que acontece uma coisa, e o resto é tudo completamente nebuloso sem que se saiba de nada. Há diversos estágios conhecidos suvicientemente para se dividir processos em que se podeiria delimitar arbitrariamente qualquer coisa. Apenas em 2 meses já se tem 23 "estágios Carnegie". E provavelmente se pode encontrar subestágios e estágios posteriores, etc.

A ovlução em si também é outro estágio, é uma coisa que acontece e que poderíamos usar como marco.

Mas tanto a ovulação, como a fecundação, quanto os estágios Carnegie, me são totalmente irrelevantes para a "humanidade", ainda que todos (incluindo a ovulação) sejam incidentalmente necessários para a "humanidade" conhecida.







O que voce nao consegue perceber e que o que eu digo sobre processos e acoes humanas sao fatos, cabendo a voce contestar a validade dos mesmos e a relevancia para com relacao a nossa questao ; enquanto o que voce diz sobre diferencas « grandes » ou « pequenas » no nivel bioquimico e que sao meras impressoes pessoais.


Eu não questiono que seja um fato que para a fecundação ocorrer, precisa haver sexo entre dois indivíduos de sexos diferentes, pelo menos. O ponto é que, simplesmente isso não me diz nada sobre "humanos", tal como a ovulação ser necessária e ser uma coisa que se pode dizer que é um estágio/processo bem definido se sabe que acontece e etc, também não me diz nada.







zumbi filosófico escreveu:Ao mesmo tempo em que é realmente difícil defender como "ridículo" que o óvulo não seja humano quando o óvulo fecundado de repente é. O tempo todo, apenas listam as diferenças entre um e outro como se elas fossem as determinantes da "humanidade": diploidia, ter pai e mãe definidos, idioma e outras variáveis sócio-culturais implícitas, etc. Todas ou já presentes no óvulo em variados graus (como é mesmo depois da fecundação) ou na verdade, muito discutíveis como realmente o critério de "humanidade" (diploidia, por exemplo, que nem é especificamente humana)


Ninguem citou diploidia nem idioma, e voce nao achara isso no meu texto.


O Acauan citou idioma, se bem me lembro, mas acho que ele não acha isso importante de fato.








Quanto a ter pai e mae, gostaria de ver uma explicacao de como um ovulo ja teria um pai, sem apelar para coisas como predestinacao.


Relacionamentos, namoro, casamento. Casais falam dos "seus filhos" antes de tê-los de fato. Se Fulano é casado com a Beltrana, querem ter filhos, é presumido que ele seria o pai dos filhos dela.

Não sei porque esse tipo de paternidade seria menos importante para a "humanidade" que a paternidade "efetivada" com a fecundação. Ainda que de qualquer forma, eu também não veja importância, senão bioquímica e incidental, para a paternidade na "humanidade". Apenas me parece que se a paternidade genética de um pai que pode até morrer antes do filho nascer, ou simplesmente abandonar a ambos, seria mais importante do que a paternidade "social" e biológica implícita num relacionamento estável.

Mas ao mesmo tempo, se achamos que as pessoas são humanas mesmo que não tenham tido um pai que tenha contribuido com mais do que um espermatozíde, seja por ter sido filho uma doação de esperma anônima, ou seja por terem sido abandonadas completamente pelos pais que realizaram a cópula, ou mesmo que sejam filhas de estupradores até, fica claro que não há de fato importância alguma nesses fatores "sociais" paternidade na definição da humanidade.

O que sobra da paternidade, tirando aquilo que se concorda não ser essencial, é a genética, diploidia. Vê-se que resto, demonstradamente irrelevante ou meramente incidental para a humanidade, são coisas que vão colocando para tentar de alguma forma engrossar o caldo da difícil argumentação a favor da fecundação como critério de alguma forma. Isso vale tanto para as coisas relativas aos "extras" não-genéticos da paternidade, quanto para todas as outras argumentações, "é um processo distinto", "depende da vontade de fazer sexo do casal", "é o início da vida", e etc.











zumbi filosófico escreveu:Acho que tudo é "relativização". Delimitar o início da humanidade no zigoto e não no óvulo ou mais tarde, inclusive. Não acho que isso seja "encontrar A Verdade", mas analisar o que são as coisas, dar nomes a elas, e então se balançar as coisas. Assim, eu considero mal que crianças sejam filhos indesejados ou não planejados apenas para "salvar a vida" do óvulo, zigoto ou embrião ou feto sem atividade cerebral iniciada que um dia ela já foi, num sentido mais biológico/histológico ou até citológico. O fato de pessoas nessas condições muitas vezes, talvez na maioria das vezes, não declararem que preferiam não ter nascido não vejo como sendo muito relevante, pois praticamente toda pessoa que fosse concebida diria o mesmo.



O que eu considero um mal e dissociar do individuo a sua dignidade, atribuindo a mesma a um estado especifico, escolhido atraves de um criterio ad hoc conveniente para com sua ideologia.

Nao acho o ser humano um produto da ideologia, nem a sua definicao pode ser. Ideologias mudam sem que as pessoas deixem de ser pessoas.


Um hipotético pró-óvulo poderia simplesmente repetir a frase sobre o que você considera um mal, se referindo aos "anti-óvulo".

Não sei se existe qualquer coisa 100% livre de ideologia, acho que pró-vida é uma ideologia, que traz resultados prejudiciais à vida que considero realmente importante, humana. Desde as coisas mais diretas, como simplesmente não ter o direito de aborto, passando por implicações individuais e sociais de qualidade de vida (inclusive das "vidas" que se objetivava "salvar"), até criminalidade, e mais recentemente, tendo influência negativa até em áreas da medicina muito promissoras para a "vida", potencial de ajudar muitas vidas que vai pelo ralo, que só poderia ser explorado se a "vida" fosse respeitada de uma maneira que considero muito mais racional.

Tudo bem, nazistas poderiam usar a mesma frase que eu para defender experiências com judeus, mas enfim... é isso aí mesmo, ainda que não seja o que eu defenda.
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

Acauan escreveu:Dispensando-me de retornar à estúpida e já comentada analogia, é fato que ambas as posições nesta polêmica são, necessariamente em maior ou menor grau, arbitrárias.
A diferença é que um dos lados invoca o arbítrio para autorizar a destruição indiscriminada de embriões humanos e o outro para conter tal destruição.


O que só tem alguma relevância se já partimos do pressuposto que a partir da fecundação e não antes é que temos algo cuja destruição pode ser considerada imoral.

Mesmo pró-vida defendem a destruição de óvulos, e nem por isso, apenas por ser "destruição", é algo "mal".
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

Anna escreveu:
Cara, é simplesmente ARBITRÁRIO. Se tem dignidade humana e essa dignidade lhe dá igualdade humanitária a ser protegida por lei, não interessa se o pai dele é um assassino, estuprador e em que condições ele foi concebido, ele tem o direito de vida baseado nos conceitos adotados para salvaguardar essa vida. E pelo que vi aqui nenhum deles foi quebrado. O que está sendo usado para permitir a quebra arbitrária é o estado psicológico da mãe frente a violência sofrida, e nada além, então vcs deveriam ser a favor da vida daquele carinha, e contra aborto em qualquer situação! Porque ele é digno e se há um problema no caminho ele não tem culpa nenhuma da merda qeu aconteceu que dê direito ao seu assassinato!

:emoticon2:


Realmente não faz sentido. No máximo, se consideramos equiparável a um homicídio, teria que ser julgado nesses casos com esse aspecto psicológico como atenuante, meio talvez como se julgaria um crime passional, ou qualquer outra coisa que possam usar para defender um assassino. Mas a lei não apenas tolerar, mas até dar assistência ao que se considera equivalente a um assassinato premeditado, é ridículo.

Não são todos os pró-vida que defendem isso, de qualquer forma.

O que não sei se tem qualquer motivo razoável para se considerar lá muito melhor do que não ter nenhum...

Não é muito melhor do que, sei lá, se umas pessoas defendessem que a nossa Lua é de queijo, e que as de Marte também são, em vez de "inconsistentemente" aceitarem que as de Marte são de pedra.
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Samael »

Eu já perguntei e não fui respondido:

E se hipotetizarmos que o óvulo JÁ é digno e humano, o espermatozóide não passaria a ser apenas mais um "fator determinado" do processo todo?

Acho que o Acauan diria que "as informações essenciais que nos tornam únicos, como o sexo, por exemplo, ainda não estariam definidas num óvulo", mas nesse caso creio que o sexo seria apenas uma dos fatores originados dentro do próprio processo, e poderia ser igualado a qualquer outro fator fenotípico como um "fator determinado" também.

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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

zumbi filosófico escreveu: Realmente é cansativo. Fecundação e ovulação SÃO análogos (ambos podem ser vistos como "começos de processo", mas claro que você pode fazer pesar mais o processo que julgar, arbitrariamente, mais importante) e ambos são relacionados, essenciais, à reprodução humana. Nem de longe a ovulação é "desligada" da questão da reprodução humana e desenvolvimento.


Veja bem, voce novamente incorreu naquilo que eu tinha dito. O que me frustra nesse debate e que eu fico com a impressao de que voce nao le realmente o que esta sendo dito, algo que me faz lembrar o comportamento d’ « o pensador ».

Nas mensagens que voce cotou nos NAO estavamos discutindo a potencial analogia entre ovulacao e fecundacao, mas entre os criterios de atribuicao de dignidade em questao, ou seja, o presumido inicio das atividades cerebrais contra a fecundacao.

Logo, o seu paragrafo e desconexo do que foi dito, e sua presenca parece ser devida ao acionamento de um algoritmo que parece operar na sua cabeca de que sempre que voce nao tiver resposta para algum problema operacional colocado claramente voce reduz tudo ao absurdo da comparacao com a ovulacao, como se isso transformasse o seu criterio em alguma coisa logica.

Quanto as proposicoes em particular, ninguem reduziu em nenhum momento a importancia da ovulacao. Mulher que nao ovula nao pode ser fecundada e nao pode portanto gerar um embriao. Assim, a nocao de fecundacao ja admite a hipotese da ovulacao.

Mas a ovulacao nao e suficiente para podermos identificar um individuo, coisa que a fecundacao (e os processos imediatamente posteriores) permitem.


zumbi filosófico escreveu:
    É claro que as coisas acontecem no cérebro — principalmente nas camadas superiores da "massa cinzenta" convoluta a que se chama córtex cerebral. Os cerca de 100 biliões de neurónios do cérebro constituem a base material do pensamento. Os neurónios estão ligados uns aos outros e as suas sinapses desempenham um papel fundamental no acto de pensar. Mas a interligação de neurónios em larga escala só começa entre a 24ª e a 27ª semanas de gravidez — o sexto mês.

    Através da colocação de eléctrodos inofensivos na cabeça de um paciente, os cientistas medem a actividade eléctrica produzida pela rede de neurónios existente dentro do crânio. Tipos diferentes de actividade mental produzem tipos diferentes de ondas cerebrais. Mas as ondas cerebrais de padrão regular características do cérebro humano adulto só são detectadas no feto por altura da 30ª semana de gravidez — à entrada do 3.º trimestre. Antes disso o feto não tem a necessária arquitectura cerebral. Ainda não pode pensar.

    Aceder a matar qualquer criatura viva, em especial uma que possa mais tarde transformar-se num bebé, é perturbador e doloroso. Mas nós rejeitámos os extremos do "sempre" e do "nunca" e isto coloca-nos — quer queiramos, quer não — na rampa escorregadia. Se nos obrigam a escolher um critério de desenvolvimento, então é aqui que traçamos a linha: mal se torna possível o começo do pensamento caracteristicamente humano.

    Trata-se, efectivamente, de uma definição muito conservadora: raramente se detectam em fetos ondas cerebrais regulares. Talvez mais investigação ajudasse. (Nos babuínos e nos fetos de ovinos as ondas cerebrais bem definidas também só começam no fim da gestação.) Se quiséssemos tornar o critério ainda mais rigoroso, prevendo a eventualidade de casos de desenvolvimento cerebral fetal precoce, podíamos traçar a linha aos seis meses. Por acaso foi aí que o Supremo Tribunal a traçou em 1973 — embora por razões completamente diferentes.
- Carl Sagan & Ann Druyan - "Aborto: é possível ser ao mesmo tempo pró-vida e pró-escolha?"


Ainda que isso não esteja suficientemente definido por algum critério imaginável, isso não dá validação automática à proposta de conceito diplóide/genético/ontológico de humanidade, mesmo que esse possa ser melhor definido por se tratar de uma reação química inicial mais simples.



O que esta sendo exatamente colocado e ate onde essa reducao da humanidade a um sinal especifico « de onda cerebral » e um criterio decente para determinacao de um individuo e com ele sua devida dignidade.

Ainda que nao seja essencial, e importante entrar no merito da insuficiencia da teoria neurologica atual para explicar ou mesmo medir o que e entendido por consciencia. Quanto mais reduzi-la a um padrao de sinal de ondas eletromagneticas. E ainda que fosse, humanidade nao se resume ao estado atual de consciencia, ja que pacientes em coma possuem apenas um estado potencial da mesma.

E pessoas que por motivos apresentassem padroes diferentes de ondas cerebrais, seja devido a doencas, acidentes ou por razoes outras ?

Alem do mais, o texto se permite a arbitrariedades tais como “producao em massa”, coisa que nao da para ser interpretada como algo diferente de um subterfugio vago o suficiente para se escolher arbitrariamente.

O sistema nervoso e a consciencia sao processos que se desenvolvem durante toda a vida, desde os primeiros estagios rudimentares de comunicacao celular basica, passando pelas descobertas da infancia e adolescencia e indo ate o termino de um Tratado Filosofico ou de uma teoria cientifica merecedora de um premio Nobel.

Nenhuma dessas etapas marca a humanidade de forma mais clara que a outra, e todas fazem parte de um processo so. E claro que nem todo mundo vai ganhar um Nobel, e alguns nao chegarao ate a descobertas da infancia. Isso nao lhes diminui a dignidade como seres humanos.

Estabelecer portanto que a « producao em massa » de neuronios iniciada a partir da N-esima semana como marco da humanidade e apenas uma forma camuflada de dizer « Quero ter o direito de abortar fetos com menos de N semanas e vou arranjar qualquer desculpa esfarrapada para tornar isso um ato moralmente aceitavel ».

O meu criterio e simples na medida que atribui a humanidade ao individuo, e que o individuo da semana N-1 e o mesmo da semana N, apenas uma semana mais velho.

Nao vejo que mal maior se possa causa em estabelecer o vinculo automatico da dignidade ao caractere individual e vivo, coisa que esta presente tanto no Homem adulto, quanto no bebe e no embriao de quantas semanas forem.

(essa e a deixa para o seu algoritmo de ausencia de resposta dizer « e o ovulo tambem ! », ignorando tudo que ja foi discutido acerca de processos e estagios e passando por cima de todos os problemas serios colocados com relacao a sua metodologia e a forma como ela e convenientemente escolhida, afim de « tornar etico » a um objetivo decidido a priori, como se etica funcionasse assim.)


zumbi filosófico escreveu:Absolutamente todos seres humanos foram gerados de óvulos humanos.


O que o torna uma condicao necessaria, mas absolutamente insuficiente para a existencia de um individuo humano. Dizer que de ovulos sairam seres humanos e uma aproximacao bastante pretenciosa, e infantil, que negligencia uma serie de eventos.
Como disse o Acauan, nada alem da sua matematica bizarra de Ovulo+Espermatozoide = Zigoto ; onde o Espermatozoide e negligenciavel porque tem uma massa muito menor, logo Ovulo = Zigoto, o que torna um misterio insondavel o fato de que todas as mulheres « ovuladas » mas nao fecundadas nao terem filhos.


zumbi filosófico escreveu:Óvulos e zigotos humanos diferem em potencial e origem dos óvulos e zigotos dos outros animais. "Quando temos a liberdade de escolher momentos-chave em um processo abrangente, praticamente não há limites para as divisões que podemos fazer para separar os processos em subprocessos e dizer serem distintos".


zumbi filosófico escreveu:O "processo do embrião" tem um início claro; o processo humano é um contínuo, que precede o embrião.

E claro, se um grupo de pessoas define uma coisa qualquer, Y, como "X", essa coisa Y será claramente aquilo que aqueles que usam essa definição de "X" chamam de "X".


zumbi filosófico escreveu:Eu em momento algum defendi que sejam exatamente iguais, a mesma coisa exatamente.

Mas também não é o óvulo armazenado e o óvulo ovulado.


Não acho que é essa diferença de "ação de terceiros" que determina a humanidade (ou qualquer que seja a relevância disso), bem como você não acha que é a ovulação (que, indiretamente, depende da omissão, voluntária, de uma "terceira", em usar algum contraceptivo anti-ovulatório, diga-se de passagem).

E acho que você consideraria como "humanos" pessoas resultantes de casos de partenogênese que viessem a ocorrer, ou que tenham ocorrido, como alguns suspeitam. Mesmo não tendo havido "ação de terceiros".



A acao de terceiros pode marcar isso muito bem no sentido legal, afinal, nos poderiamos realmente continuar a discussao futil ate chegar a conclusao que o individuo existe nos seus pais, que existem nos seus avos, que existem nos seus bisavos, e dai concluir que nao existe individuo, mas um so processo coletivo no universo, e portanto nao faz sentido falar de direitos individuais.

Ou entao nos podemos partir do principio de que o pai e a mae sao individuos diferentes, e que portanto o espermatozoide do pai e o ovulo da mae sao coisas diferentes, ate o momento em que devido a uma acao consciente desses dois individuos (pai e mae), ovulo e espermatozoide se tornam uma coisa so, e um individuo diferente daquilo que eram antes por conseguinte. A esse individuo nos chamamos embriao, e esse embriao se desenvolve ate se tornar o bebe humano que os pais chamarao de filho. Ou seja, a existencia do terceiro individuo so pode ser rastreada ate a acao que o gerou, e podemos entao atribuir o inicio da sua existencia, algo que nao podemos fazer na espermatogenese ou na ovulacao sem perdermos o conceito filosofico basico de identidade. Como o terceiro individuo foi gerado numa acao para a qual existem responsaveis, podemos delegar responsaveis pela vida daquele individuo, pelo menos ate o momento onde ele podera ser responsavel de si proprio.

O primeiro raciocinio e o seu, o segundo e o meu. O principio do qual eu parto e o de que existem individuos portadores de dignidade e eles sao responsaveis por suas acoes e as implicacoes das mesmas nos demais individuos portadores de dignidade.

Qual e o seu ? Ate agora, o unico principio que voce parece seguir e o de « defina como etico qualquer coisa que voce julgue necessaria, nao importando as implicacoes ».

zumbi filosófico escreveu:O problema dessa analogia de transplante de rim é que distancia um pouco a coisa. Uma analogia muito mais próxima seria do óvulo com um zigoto que precisa de uma nova relação sexual para não ser abortado espontâneamente.


Se voce ler bem o que eu escrevi, foi exatamente essa a analogia que eu fiz.

zumbi filosófico escreveu:Supondo que zigotos sejam gente, imagino que fosse defensável a responsabilidade legal dos pais em fazer o possível para salvar a vida do filho. Enquanto a decisão de *não* doar um rim para salvar a vida de um filho talvez fosse até legalmente defensável, por ter risco, ser uma cirurgia, e etc, uma ejaculação é uma coisa tão banal, mais insignificante que uma transfusão de sangue, que imagino que ficaria difícil defender a posição de pais que optassem por não fazer isso para salvar o filho.


No entanto, a base moral para o comprometimento dos pais para com relacao aos filhos e o conteudo de responsabilidade pessoal assumido ao trazer aquela crianca a vida. E nesse caso, nenhuma responsabilidade pode ser atribuida a uma mulher que simplesmente ovulou.

Certas coisas sao tao obvias e ao mesmo tempo tao necessarias de ser ditas.


zumbi filosófico escreveu:Eu entendo perfeitamente a posição pró-vida; da fecundação em diante se teria para praticamente todos os fins, uma pessoa, e logo não se poderia fazer nada contra ela, como não se pode fazer contra pessoas de modo geral.


Eu nao faco parte de nenhum movimento que tenha adotado o slogan “pro-vida”, nem mesmo endosso as ideias que definiram slogans como « pro-vida » ou « pro-escolha » e que por algum motivo tornaram « vida » e « escolha » conceitos antagonicas.

Se voce estiver se referindo a minha posicao, creio que seja mais adequado referir-se a ela como « anti-abortista », algo que ela evidentemente e, assim como eu me refiro a voces como « abortistas », algo que voces evidentemente sao.


zumbi filosófico escreveu:Analogias do zigoto e outros estágios com o óvulo partem de um princípio onde as premissas sobre o que é "humano" e o que não é ou são "neutras" ou assumem, para fins de comparação, que o óvulo poderia ser considerado humano por alguns dos critérios usados para defender a humanidade do zigoto, obviamente falhando se os critérios pró-zigoto são tão tautológicos quanto puderem ser, não importando o quão irrelevantes sejam as diferenças bioquímicas ou de outro tipo para um conceito razoável de humanidade; elas obviamente não servem para nada se você tenta entendê-las com a premissa de que a partir da fecundação se tem gente, e antes disso, não havia nada significante.


Novamente, poderia caso abrissemos mao do conceito de identidade individual e a fortiori da propria nocao de individuo.


zumbi filosófico escreveu:Essa é sua classificação. Os eventos que temos são um contínuo; uma célula se matura no ovário, milhões de outras células vão até ela, uma delas entra na primeira célula, que então irá eventualmente se dividir, mais do que comumente se dividiria se não tivesse sido fecundada por outra célula, e tem 50-80% de chance natural de se diferenciar e atingir o grau de organização daquilo que consensualmente chamamos de seres humanos.

Esse é o processo que gera humanos. Ele pode ser subdividido em diversos subprocessos, como você fez. Não acho que seja apenas pela possibilidade de divisão, ou possibilidade de se defender a indivisibilidade, ou contingência/hierarquia de processos, que se define satisfatoriamente o que são "humanos".

Também não vejo importância "em ações de terceiros", não mais do que qualquer outro evento bioquímico que consideremos humanamente irrelevante, mas seja necessariamente incidental ao processo.

Você possivelmente também não vê, imagino que no caso de se descobrir que há casos de partenogênese humana viável, ainda seria contra o aborto nesses casos, mesmo não tendo a "ação de terceiros" desengatado a geração de um novo ser humano.



Esse paragrafo parece uma copia dos que ja foram respondidos mais acima.

De qualquer forma, voce esta correto, dentro do ponto de vista filosofico que admite o Universo como um so processo e aniquila portanto conceitos como existencia individual. Isso pode ser interessante para elucubracoes metafisicas pos-modernas, mas nao interessa do ponto de vista etico e pratico.

Desse ponto de vista nos temos individuos humanos dotados de dignidade e que podem ter sua existencia individual rastreada somente ate a fecundacao, caso o principio de identidade se conserve e tenhamos que o ovulo e o espermatozoide que deram origem a fecundacao sao coisas completamente diferentes do embriao gerado.

Mas voce pode ficar nessa, ou pode ir alem e dizer tambem que nos somos em parte o hamburger que comemos ontem, entao aquele hamburger devia ter um pouco da dignidade que temos hoje, mas para mim isso e uma besteira que nao precisa ser respondida.


zumbi filosófico escreveu:Bem, eu acho que enquanto não se tem cérebros modificados em jogo, podemos fazer "criaturas" diversas. Apoio e torço muito para as técnicas de clonagem para utilização de células estaminais de embriões-clones, que serão mais eficientes que de células estaminais de outros embriões por minimizar muito a chance de rejeição. Talvez até órgãos para transplante possam ser feitos assim.


Eu tambem nunca levantei uma palavra contra o desenvolvimento de porcos como banco de figados ou de coracoes.
Quando eu disse da criacao de criaturas hibridas e obvio que eu me referia aquelas capazes de desenvolver e compreender, ainda que potencial ou fracamente, a racionalidade e moralidade.

Mas nao seria o seu estagio presente de compreensao que determinaria isso, mas o seu potencial como individuos.


zumbi filosófico escreveu:Eu não sei, acho mais complicado que isso. Crianças não tem essa habilidade, podem talvez não desenvolver, e não é desenvolvida em diversos tipos de retardamento ou lesão mental, e nem por isso as pessoas nessas condições deixam de ser "humanas". Acho que talvez um hipotético animal com cérebro geneticamente anabolizado a níveis parecidos com os dos humanos, talvez devesse ser considerado mais ou menos assim. E por isso, acho que esse tipo de coisa não deveria ser permitida, acho que seria bem próximo a se fazer experiências com membros da espécie humana (além de. imagino, não ter um potencial de aplicação tão importante quanto outras coisas que se pode fazer sem chegar ao desenvolvimento de cérebros)


Foi exatamente por isso que eu disse que essa condicao e suficiente, embora nao seja necessaria.

Se eu conhecesse as condicoes necessarias e suficientes para um individuo portar dignidade humana eu conheceria a definicao de ser humano, coisa que eu disse a priori desconhecer, e tambem desconhecer alguem que a conheca.

O que eu disse, se voce ler direito, e que se um dia porcos e ratos forem capazes de um comportamento moral, ou seja, aceitar que leis de conduta se apliquem a ele e aos demais que compreendem essas leis, eles deveriam ser considerados portadores de dignidade equivalente a nossa.


zumbi filosófico escreveu:Acho que isso de que "animais não tem dignidade alguma" é opinião, ainda que bem comum. A própria idéia de que é "bom" não lhes proporcionar sofrimento inútil praticamente não faz sentido sem uma analogia com o sofrimento humano, e como não devemos causar sofrimento humano desnecessário. Não é, embora talvez alguns possam comparar, análogo a não destruir um monte de pedras ou plantas, mesmo que inúteis, simplesmente porque não é necessário destruí-las. É análogo ao sofrimento humano.


Uma experiencia mental interessante, mas que eu nao estou com tempo de elabora-la decentemente aqui e a seguinte :

Imagine um mundo onde o PETA e ALF venceram : patos e galinhas, ras e crocodilos, todos tem a mesma dignidade e direitos dos seres humanos, e portanto pos-se um fim a exploracao cruel daqueles por estes.
Agora animais sao totalmente livres. Mas a liberdade, para existir, precisa compreender em si uma nocao de limites, quando ela passa a interferir na liberdade alheia, como John Locke bem observou.

Ora, os animais cruzam e defecam onde quiserem, nao respeitam o espaco dos outros e inclusive atacam e matam uns aos outros. Se fosse exigido que esses animais respeitassem uns aos outros, caso contrario sofreriram restricoes legais cabiveis aos que infringem a lei, todos parariam na cadeia, ou seja, todos os animais perderiam a liberdade.

A conclusao e a de que animais nao podem portar dignidade humana uma vez que nao sao capazes de compreender o seu significado. Nos podemos respeita-los, mas nao como individuos humanos, ou parcialmente humanos. A categoria de seres humanos separa-se da categoria de animais tambem nisso, e se um dia algo nao-humano adiquirir essa capacidade diferencial, ele tambem portara dignidade equivalente a humana.

Mas a coisa para ai. Nao da para dai tirar inferencias sobre um embriao humano e sua capacidade de compreensao moral e racional. Ele e um individuo e e um potencial, do qual a unica coisa que sabemos e que pertence a categoria dos seres humanos e portanto deve ser portador a priori de dignidade e respeito.

Quando ele for uma crianca, ele deve aprender e compreender tanto pelo ensino quanto pela experiencia essas regras. Se um dia ele se mostrar um individuo virulento, incapaz de respeitar os demais, coisa que a priori nos nao sabemos, que ele seja posto em isolamento. Se ele se mostrar um doente inofensivo, ele devera ser tratado por aqueles que desejam o seu bem estar, e que por ele assumiram uma responsabilidade.


zumbi filosófico escreveu:Ainda que a estranheza da importância de um instante especificamente, desapareça, se é usado um instante crucial no fim da parte consensual da humanidade, não era a instantaneidade o ponto, ela apenas enfatiza a esquisitice da diferença de importância em algo que difere do óvulo em uns pentelhogramas de moléculas.


Alguns virus de HIV diferem de voce em pentelhogramas, e mesmo assim acho que voce ainda considera bem diferente estar infectado por eles ou nao.

Cara, voce esta se escorando sempre em criterios errados para basear suas analises. As coisas nao sao diferentes somente se parecerem diferentes de um determinado ponto de vista escolhido. E isso tambem e obvio.

zumbi filosófico escreveu:Imagine que alguém defendesse que a vida não começa na fecundação, mas, digamos, depois da quinta divisão celular, depois de ter sido sintetizada em uma pequena quantidade alguma proteína qualquer.

Sei que para você uma proteína qualquer não tem a importância toda, que é o contexto no qual ocorre a fecundação, apenas não consigo ver importância nesse contexto tal como você provavelmente não conseguiria ver importância em qualquer motivo que alguém concebesse para a síntese de uma proteína em particular que só começasse na quinta divisão celular.


Eu poderia responder a essa pessoa que ela pode chamar de vida o que ela quiser, mas o individuo e o mesmo.

Voce pode entrar com a suposicao de gemeos, algo que ja vi fazer certa vez com o Acauan. Mas isso so torna o caso de gemeos uma excessao, onde a individualidade e rastreada somente ate o ponto onde houve a divisao.

Mesmo que voce possa alegar que nao sabemos a priori se uma celula ovo sera ou nao origem de gemeos mais tarde, para efeitos praticos esse evento pode ser identificado a fecundacao, ja que os metodos abortivos sao praticados muito mais tarde na gestacao.

No geral, eu acho que essas objecoes com relacao a formacao do individuo nos processos imediatamente posteriores a fecundacao de importancia para o debate da pilula do dia seguinte apenas, algo que eu nao estou defendendo nem objetando aqui, e sobre a qual eu assumo uma neutralidade de quem ainda nao se informou o suficiente a respeito. Eu nao sei se ela mata o embriao formado, ou impede que ele se forme durante o processo fecundacao (que nesse caso, dado as ordens de grandeza de tempo, pode ser chamado de processo), ou se torna inviavel uma fecundacao tardia de um esperma residual.

E algo sobre o qual eu devo me informar melhor para poder apresentar uma opiniao decente, mas que a priori esta a leguas de distancia do aborto de um embriao/feto cogniscivel e individual, assunto que estamos tratando agora.

zumbi filosófico escreveu:Como eu disse em diversas vezes, não é apenas durante a fecundação que se sabe que acontece uma coisa, e o resto é tudo completamente nebuloso sem que se saiba de nada. Há diversos estágios conhecidos suvicientemente para se dividir processos em que se podeiria delimitar arbitrariamente qualquer coisa. Apenas em 2 meses já se tem 23 "estágios Carnegie". E provavelmente se pode encontrar subestágios e estágios posteriores, etc.

A ovlução em si também é outro estágio, é uma coisa que acontece e que poderíamos usar como marco.

Mas tanto a ovulação, como a fecundação, quanto os estágios Carnegie, me são totalmente irrelevantes para a "humanidade", ainda que todos (incluindo a ovulação) sejam incidentalmente necessários para a "humanidade" conhecida.


O que eu disse e que para todos os individuos a diferenciacao crucial ocorre na fecundacao, que determina a individualidade para quase todos ainda para os gemeos ocorra uma logo em seguida.

As demais sao coisas como passar de ano, receber um nao para um pedido de casamento ou ganhar um premio Nobel. Podem mudar um pouco o que voce e e como voce se ve, mas nao te tornam outro individuo.

zumbi filosófico escreveu:Eu não questiono que seja um fato que para a fecundação ocorrer, precisa haver sexo entre dois indivíduos de sexos diferentes, pelo menos. O ponto é que, simplesmente isso não me diz nada sobre "humanos", tal como a ovulação ser necessária e ser uma coisa que se pode dizer que é um estágio/processo bem definido se sabe que acontece e etc, também não me diz nada.


O sexo entre dois seres humanos de generos opostos, em periodos ferteis, acarretando em um terceiro ja reune condicoes suficientes para se determinar o inicio da vida deste e seus responsaveis.
Ja ovulacao, sinto muito, mas nao.


zumbi filosófico escreveu:Relacionamentos, namoro, casamento. Casais falam dos "seus filhos" antes de tê-los de fato. Se Fulano é casado com a Beltrana, querem ter filhos, é presumido que ele seria o pai dos filhos dela.

Voce esta querendo que eu leve isso a serio como argumento?

zumbi filosófico escreveu:Não sei porque esse tipo de paternidade seria menos importante para a "humanidade" que a paternidade "efetivada" com a fecundação.

Talvez porque nenhuma mulher fique gravida so de bater um papo sobre o que ela espera do futuro de seus eventuais filhos. Apenas talvez...

zumbi filosófico escreveu:Ainda que de qualquer forma, eu também não veja importância, senão bioquímica e incidental, para a paternidade na "humanidade".

Talvez porque nao se conhecam muitos humanos sem pais (do sexo masculino). Talvez Jesus, mas o pai dele era Deus, e ele nao era exatamente um humano comum.
Mas de novo, apenas talvez...


zumbi filosófico escreveu:Apenas me parece que se a paternidade genética de um pai que pode até morrer antes do filho nascer, ou simplesmente abandonar a ambos, seria mais importante do que a paternidade "social" e biológica implícita num relacionamento estável.


Logo, pais geneticos devem ser isentados das responsabilidades legais para com seus filhos legitimos e maridos cornos e que devem pagar o pato. Nao sei porque, mas a sua logica nao me parece consistente...


zumbi filosófico escreveu:Mas ao mesmo tempo, se achamos que as pessoas são humanas mesmo que não tenham tido um pai que tenha contribuido com mais do que um espermatozíde, seja por ter sido filho uma doação de esperma anônima, ou seja por terem sido abandonadas completamente pelos pais que realizaram a cópula, ou mesmo que sejam filhas de estupradores até, fica claro que não há de fato importância alguma nesses fatores "sociais" paternidade na definição da humanidade.



O fato dele ter contribuido com apenas um espermatozoide pode ser devido a diversos motives: ele pode nunca ter vindo a descobrir os efeitos de sua acao, ele pode ter morrido ou ele pode ter abandonado. Nada disso o exime da responsabilidade moral pelo ato cometido, e pela vida ali gerada. Se essa responsabilidade podera ser cobrada, e um outro problema.


zumbi filosófico escreveu:O que sobra da paternidade, tirando aquilo que se concorda não ser essencial, é a genética, diploidia. Vê-se que resto, demonstradamente irrelevante ou meramente incidental para a humanidade, são coisas que vão colocando para tentar de alguma forma engrossar o caldo da difícil argumentação a favor da fecundação como critério de alguma forma. Isso vale tanto para as coisas relativas aos "extras" não-genéticos da paternidade, quanto para todas as outras argumentações, "é um processo distinto", "depende da vontade de fazer sexo do casal", "é o início da vida", e etc.

Ler acima.

zumbi filosófico escreveu:Um hipotético pró-óvulo poderia simplesmente repetir a frase sobre o que você considera um mal, se referindo aos "anti-óvulo".

Errado, pois ele nao conseguiria estender a individualidade ate o ovulo sem incidir na sua “matematica maluca”, e sem trivializar o conceito de individuo, tornando qualquer discussao sobre a etica nas relacoes individuais uma discussao futil.

zumbi filosófico escreveu:Não sei se existe qualquer coisa 100% livre de ideologia

Coisas sao o que sao, e isso nao depende de ideologia.

zumbi filosófico escreveu:acho que pró-vida é uma ideologia

Concordo, mas ja disse que nao me identifico com ela.

zumbi filosófico escreveu:que traz resultados prejudiciais à vida que considero realmente importante, humana.

E que ate agora voce nao disse em quais principios se baseia para considerar tal vida humana, exceto um criterio besta escolhido a dedo para satisfazer uma ideologia abortista.

Enquanto eu assumo partir da concepcao de basica de individuo humano e da sua dignidade propria para estabelecer meus raciocinios, voce escolhe um numero de semanas que se caracteriza em geral por um determinado comportamento observado como um criterio maximo de etica na decisao de matar ou nao matar.


zumbi filosófico escreveu:Desde as coisas mais diretas, como simplesmente não ter o direito de aborto, passando por implicações individuais e sociais de qualidade de vida (inclusive das "vidas" que se objetivava "salvar"), até criminalidade, e mais recentemente, tendo influência negativa até em áreas da medicina muito promissoras para a "vida", potencial de ajudar muitas vidas que vai pelo ralo, que só poderia ser explorado se a "vida" fosse respeitada de uma maneira que considero muito mais racional.

Tudo bem, nazistas poderiam usar a mesma frase que eu para defender experiências com judeus, mas enfim... é isso aí mesmo, ainda que não seja o que eu defenda.



Exatamente.

Voce pode ate dizer que tentar buscar principios universais validos para todos os individuos, e basear as decisoes da Justica, dentro da medida do possivel e praticavel, nesses principios universais, como uma especie de ideologia.

Mas o que voce sugere como opcao ?
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zumbi filosófico
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
zumbi filosófico escreveu: Realmente é cansativo. Fecundação e ovulação SÃO análogos (ambos podem ser vistos como "começos de processo", mas claro que você pode fazer pesar mais o processo que julgar, arbitrariamente, mais importante) e ambos são relacionados, essenciais, à reprodução humana. Nem de longe a ovulação é "desligada" da questão da reprodução humana e desenvolvimento.


Veja bem, voce novamente incorreu naquilo que eu tinha dito. O que me frustra nesse debate e que eu fico com a impressao de que voce nao le realmente o que esta sendo dito, algo que me faz lembrar o comportamento d’ « o pensador ».

Nas mensagens que voce cotou nos NAO estavamos discutindo a potencial analogia entre ovulacao e fecundacao, mas entre os criterios de atribuicao de dignidade em questao, ou seja, o presumido inicio das atividades cerebrais contra a fecundacao.


Realmente acabou ficando desconexo e sem sentido. Não li toda a citação, apenas parte do o final e como a maior disputa é sobre se a ovulação poderia ser análoga à fecundação como marco, e não que a atividade cerebral, já que é aceita como critério de "vida" durante todo o resto do tempo, assumi que fosse isso.

Vou retomar então o seu comentário inicial, embora ache que provavelmente estarei sendo repetitivo. Fecundação e início de atividade cerebral são análogos como "marcos", são eventos que ocorrem e que tendem a polarizar as pessoas quanto ao conceito de "humanidade" num sentido mais do que meramente biológico. A fecundação talvez possa ser considerada um marco claro, por ser um evento mais simples, mas não acho que apenas isso faz dela um marco melhor para a humanidade. Acho que é só um evento celular mais simples, mas isso não me diz nada quanto à humanidade.

Também não concordo com não se poder estabelecer um início melhor para a ativididade cerebral do que a própria fecundação. Não é como se não soubéssemos de nada que ocorre depois da fecundação. E se tudo que há após ela pode ser visto como nublado e "a mesma coisa" por relações causais interconectadas, também poderíamos nublar o processo reprodutivo todo, mesmo quando os gametas ainda estão separados. A única diferença é que estamos falando de reações que ocorrem em um espaço maior, em vez de mais localizado. Mesmo o zigoto ou o embrião têm espaço e sub-entidades isoladas que atuam/compõem o processo.


Mas a ovulacao nao e suficiente para podermos identificar um individuo, coisa que a fecundacao (e os processos imediatamente posteriores) permitem.


Se um indivíduo é definido como um zigoto e não um óvulo, como acima de qualquer coisa, um zigoto e nunca um óvulo, então obviamente a ovulação não será suficiente para se poder identificar um indivíduo.

Qualquer individualidade particular, natural do óvulo simplesmente não será suficiente, pois não será individualidade do zigoto-humano, pelo fato natural de que ele não é um zigoto.

Ao mesmo tempo, vejo os níveis de individualidade presentes em ambas as células como muito próximos, distintos apenas em bioquímica e nada propriamente "humano".





O que esta sendo exatamente colocado e ate onde essa reducao da humanidade a um sinal especifico « de onda cerebral » e um criterio decente para determinacao de um individuo e com ele sua devida dignidade.

Ainda que nao seja essencial, e importante entrar no merito da insuficiencia da teoria neurologica atual para explicar ou mesmo medir o que e entendido por consciencia. Quanto mais reduzi-la a um padrao de sinal de ondas eletromagneticas. E ainda que fosse, humanidade nao se resume ao estado atual de consciencia, ja que pacientes em coma possuem apenas um estado potencial da mesma.


Na verdade, comatosos têm ondas cerebrais "normais". Mesmo que não fosse o caso, que fosse algo mais parecido com uma morte cerebral, e no entanto pudesse ser revertido, ainda seria diferente pela possibilidade de reversão; também é diferente, de qualquer forma, a possibilidade de restaurar algo já iniciado e a possibilidade de um futuro início absoluto, assim como são diferentes para você a fecundação tendo ocorrido de fato do potencial de ocorrer.

Ainda que essa coisa toda de "ondas cerebrais" e a tecnologia toda de se observar o cérebro fosse algo mais prmitivo de não confiável do que realmente é, ainda acho que o ideal seria procurar algum outro marco parecido, relacionado à mente e cérebro, em vez de se declarar humanidade apenas por causa de diploidia proveniente de coito. Preferencialmente com uma margem anterior, mas não tanto a ponto de se "suspeitar" que já pudesse haver atividade cerebral desde o zigoto, por exemplo.







E pessoas que por motivos apresentassem padroes diferentes de ondas cerebrais, seja devido a doencas, acidentes ou por razoes outras ?


Padrões diferentes de ondas podem existir e ter diversas causas e significados, e certamente, todos podem ser considerados humanos, mas a ausência de ondas (ou de cérebro de forma geral) é outra coisa.

Se puder haver algo como consciência mesmo num padrão de EEG que seja igual ao de morte cerebral, provavelmente teria que se rever todo esse conceito de morte cerebral e início da vida. Não é algo que se julga ser possível no caso do cérebro, mas talvez seja necessário algum tipo hipotético de hardware alternativo para a consciência. O que se deveria fazer é entender esse novo hardware e estabelecer seus critérios específicos de "vida".



Alem do mais, o texto se permite a arbitrariedades tais como “producao em massa”, coisa que nao da para ser interpretada como algo diferente de um subterfugio vago o suficiente para se escolher arbitrariamente.


Como se poderia frasear alternativamente a mesma coisa, sem soar como um tipo de conspiração neurocientífica-abortista?




O sistema nervoso e a consciencia sao processos que se desenvolvem durante toda a vida, desde os primeiros estagios rudimentares de comunicacao celular basica, passando pelas descobertas da infancia e adolescencia e indo ate o termino de um Tratado Filosofico ou de uma teoria cientifica merecedora de um premio Nobel.

Nenhuma dessas etapas marca a humanidade de forma mais clara que a outra, e todas fazem parte de um processo so. E claro que nem todo mundo vai ganhar um Nobel, e alguns nao chegarao ate a descobertas da infancia. Isso nao lhes diminui a dignidade como seres humanos.


O sistema nervoso e a consciência são processos cujo desenvolvimento depende de toda a vida, desde a ovulação, fecundação (exceto em eventuais casos de partenogênese viável), comuniação celular simples e estágios maiores de organização decorrente dela. Mas até um determinado estágio não se tem mais consciência ou mesmo sistema nervoso do se tem na pele ou mesmo em plantas.





Estabelecer portanto que a « producao em massa » de neuronios iniciada a partir da N-esima semana como marco da humanidade e apenas uma forma camuflada de dizer « Quero ter o direito de abortar fetos com menos de N semanas e vou arranjar qualquer desculpa esfarrapada para tornar isso um ato moralmente aceitavel ».


Ou, poderia dizer, negligenciar os conhecimentos neurológicos como se fossem um monte de abobrinhas é só uma forma camuflada de dizer "eu não quero que as pessoas tenham o direito de abortar de forma alguma, porque acho que tem que assumir a responsabilidade por terem feito sexo, e vou manter isso mesmo que a mesma lógica mantivesse o direito de proteção à vida de óvulos ou de pessoas decapitadas cujo corpo pudesse se manter vivo".





O meu criterio e simples na medida que atribui a humanidade ao individuo, e que o individuo da semana N-1 e o mesmo da semana N, apenas uma semana mais velho.

Nao vejo que mal maior se possa causa em estabelecer o vinculo automatico da dignidade ao caractere individual e vivo, coisa que esta presente tanto no Homem adulto, quanto no bebe e no embriao de quantas semanas forem.

(essa e a deixa para o seu algoritmo de ausencia de resposta dizer « e o ovulo tambem ! », ignorando tudo que ja foi discutido acerca de processos e estagios e passando por cima de todos os problemas serios colocados com relacao a sua metodologia e a forma como ela e convenientemente escolhida, afim de « tornar etico » a um objetivo decidido a priori, como se etica funcionasse assim.)


A comparação com o óvulo, se dá tanto por ele ter individualidade - apenas arbitrariamente insuficiente para ser considerada digna - quanto pelo poder de ilustração do mal que uma coisa parecida (a dignidade humana desde o zigoto). Desde a simples restrição de liberdades individuais a favor da vida de célula(s) sem cérebro, até implicações para a vida indesejada resultante disso, implicações sociais e etc.

Se considera isso uma "ausência de resposta", eu não sei bem o que fazer, realmente fico então sem resposta.

Não nego que possam haver problemas em qualquer metodologia, mas não vejo problemas reais nesse caso, apenas essa tentativa de alguma forma desqualificar e imoralizar as técnicas que se tem para se saber se há ou não um padrão de "vida cerebral".

O que não é diferente, novamente, do problema do óvulo e do zigoto. Pode se hipotetizar que se descobriria que a atividade cerebral precede o tempo que se imagina que ela tenha início, que de alguma forma o cérebro funciona de outra maneira e não requer o estágio de desenvolvimento que por acaso, ou por qualquer razão é atingido mais tarde; e também poderia se hipotetizar que o óvulo na verdade já detém muito mais individualidade e que a contribuição do espermatozóide é negligenciável; que ele talvez fosse escolhido (isso é até em parte fato) e manipulado pelo óvulo, por exemplo.

Eu continuaria achando, de qualquer forma, que ainda seria muito estranho dar dignidade à uma célula apenas por se julgar que tem um critério qualquer de "individualidade humana", e que apenas a possibilidade de atividade mental independente da atividade cerebral conhecida seria algo digno de preocupação ética, muito embora não haja motivos para se levar essa possibilidade muito a sério, pelo que se conhece dos cérebros.




zumbi filosófico escreveu:Absolutamente todos seres humanos foram gerados de óvulos humanos.


O que o torna uma condicao necessaria, mas absolutamente insuficiente para a existencia de um individuo humano. Dizer que de ovulos sairam seres humanos e uma aproximacao bastante pretenciosa, e infantil, que negligencia uma serie de eventos.


Tautologia de novo. Poderia se dizer que o desenvolvimento embrionário é necessário, mas insuficiente para a existência de um indivíduo humano, uma vez que pode ser abortado e aí não teríamos um indivíduo humano, que por outro critério, só se forma mais tarde.



Como disse o Acauan, nada alem da sua matematica bizarra de Ovulo+Espermatozoide = Zigoto ; onde o Espermatozoide e negligenciavel porque tem uma massa muito menor, logo Ovulo = Zigoto, o que torna um misterio insondavel o fato de que todas as mulheres « ovuladas » mas nao fecundadas nao terem filhos.


(Não se sabe (ainda que seja de qualquer forma o que se julgue mais provável) se são todas; a resposta mais garantida seria que todas as mulheres cujos óvulos não se tornam diplóides e se instalam no útero, não têm filhos).

Não é de qualquer forma a mera diferença de massa que me faz julgar o espermatozóide insnignificante.

Julgo tanto o óvulo como o espermatozóide insignificantes, na verdade, acho que a analogia do óvulo-humano deve ter causado alguma confusão.

O objetivo era justamente expor que estamos falando de umas porcarias de células, e não que o óvulo que é realmente a "melhor", que já é como uma pessoa/zigoto, e o espermatozóide é apenas complementar.

Zigoto, óvulo, espermatozóide, são todos a "mesma" coisa, apesar de suas inegáveis diferenças. Não considero que a "humanidade" esteja nas diferenças existentes entre eles.

Acho que as diferenças bioquímicas incontestáveis entre essas células insignificantes sob esse aspecto, que a humanidade é muito mais que isso.









A acao de terceiros pode marcar isso muito bem no sentido legal, afinal, nos poderiamos realmente continuar a discussao futil ate chegar a conclusao que o individuo existe nos seus pais, que existem nos seus avos, que existem nos seus bisavos, e dai concluir que nao existe individuo, mas um so processo coletivo no universo, e portanto nao faz sentido falar de direitos individuais.


Se isso fosse a conclusão decorrente do que se mantém como critério de humanidade, não haveria problema algum nisso, exceto em praticidade, mas acredito que a humanidade se sobrepõe em importância ao pragmatismo.

Não se enfrenta esse problema ou algo parecido, se a "humanidade" é definida como tendo início (ou qualquer que seja a forma preferida de frasear a justificativa para proteção desde o zigoto) na fecundação.

Se por outro lado, tudo que há no zigoto proveniente de fecundação está presente num zigoto decorrente de partenogênese, a conclusão seria necessariamente que temos humanos também nesses casos, indepententemente da ação de terceiros.

A dignidade humana não pode ser uma mera questão de conveniência ou inconveniência, e também não de circunstâncias de origem. Se podemos considerar zigotos originados por partenogênese como "não-humanos" apenas por não terem se originado pela ação de terceiros, podemos simplesmente escolher o motivo que quisermos para o zigoto ou qualquer coisa não ser "humana"; poderia, por exemplo, ser a falta de intenção de terceiros na sua origem. Não vejo porque o acidente da partenogênese deva ser fundamentalmente diferente de acidente relacionado à falha de contraceptivos ou por deixar se levar irresponsavelmente pela libido. O produto é o mesmo.









Ou entao nos podemos partir do principio de que o pai e a mae sao individuos diferentes, e que portanto o espermatozoide do pai e o ovulo da mae sao coisas diferentes, ate o momento em que devido a uma acao consciente desses dois individuos (pai e mae), ovulo e espermatozoide se tornam uma coisa so, e um individuo diferente daquilo que eram antes por conseguinte. A esse individuo nos chamamos embriao, e esse embriao se desenvolve ate se tornar o bebe humano que os pais chamarao de filho. Ou seja, a existencia do terceiro individuo so pode ser rastreada ate a acao que o gerou, e podemos entao atribuir o inicio da sua existencia, algo que nao podemos fazer na espermatogenese ou na ovulacao sem perdermos o conceito filosofico basico de identidade. Como o terceiro individuo foi gerado numa acao para a qual existem responsaveis, podemos delegar responsaveis pela vida daquele individuo, pelo menos ate o momento onde ele podera ser responsavel de si proprio.


Eu não vejo na origem da "humanidade" pela ovulação (ou espermatogênese) algo que comprometesse o "conceito filosófico básico de identidade". Todos gametas poderiam ser considerados indivíduos, e isso não seria "filosoficamente problemático", apenas teríamos como fatos naturais que muitos indivíduos morrem na fecundação, e talvez que a vida dos indivíduos humanos não têm valor antes que dois indivíduos tenham se fundido para combinar seus genomas, se mantivéssemos as mesmas práticas/valores "pró-vida".






O primeiro raciocinio e o seu, o segundo e o meu. O principio do qual eu parto e o de que existem individuos portadores de dignidade e eles sao responsaveis por suas acoes e as implicacoes das mesmas nos demais individuos portadores de dignidade.

Qual e o seu ? Ate agora, o unico principio que voce parece seguir e o de « defina como etico qualquer coisa que voce julgue necessaria, nao importando as implicacoes ».


O primeiro raciocínio não é meu.

Eu parto do mesmo princípio de que há indivíduos portadores de dignidade e são responsáveis por suas ações e pelas conseqüências nos demais indivíduos portadores dessa dignidade, só discordo que seres unicelulares ou sem cérebros funcionais devam ser dotados dessa dignidade.

Penso também que quando se dota de dignidade demais coisas como células ou corpos sem cérebros se compromete a dignidade de seres com cérebro, meio como seria se déssemos demasiada dignidade à árvores ou aos infames óvulos.





zumbi filosófico escreveu:Supondo que zigotos sejam gente, imagino que fosse defensável a responsabilidade legal dos pais em fazer o possível para salvar a vida do filho. Enquanto a decisão de *não* doar um rim para salvar a vida de um filho talvez fosse até legalmente defensável, por ter risco, ser uma cirurgia, e etc, uma ejaculação é uma coisa tão banal, mais insignificante que uma transfusão de sangue, que imagino que ficaria difícil defender a posição de pais que optassem por não fazer isso para salvar o filho.


No entanto, a base moral para o comprometimento dos pais para com relacao aos filhos e o conteudo de responsabilidade pessoal assumido ao trazer aquela crianca a vida. E nesse caso, nenhuma responsabilidade pode ser atribuida a uma mulher que simplesmente ovulou.

Certas coisas sao tao obvias e ao mesmo tempo tao necessarias de ser ditas.


O óbvio não é tão óbvio assim. Para mim, como disse anteriormente, o óbvio é que pessoas só são pessoas mesmo com cérebros funcionando, e células, órgãos, ou conjuntos de órgãos e tecidos vivos, mas sem cérebro funcionando não são, ou ainda não são.

Se uma célula é passível de ser considerada "humana", não é nem um pouco óbvio que "outra", que na verdade é a mesma, não pudesse ser, apenas porque um pênis não adentrou e ejaculou numa vagina sem algo que contivesse o esperma ou matasse os espermatozóides.

Isso para mim é tão maluco como uma pessoa só ser considerada uma pessoa depois que o rei lhe desse o "bicoito sagrado" para que ele comesse, e antes disso a mesma pessoa pudesse ser muito provavelmente apedrejada até a morte, já que não era alguém, não era gente. Possivelmente os cidadãos desse reinado talvez achassem isso "óbvio", para mim não é. Ou, para algo menos unilateral, que envolvesse algo mais parecido com sexo, se o rei e a rainha lhe dessem o biscoito, concedendo assim a dignidade. (sendo um biscoito literal, não aquele do "molhar o biscoito"; a similaridade com sexo aqui é apenas em ser uma ação de duas pessoas).






zumbi filosófico escreveu:Eu entendo perfeitamente a posição pró-vida; da fecundação em diante se teria para praticamente todos os fins, uma pessoa, e logo não se poderia fazer nada contra ela, como não se pode fazer contra pessoas de modo geral.


Eu nao faco parte de nenhum movimento que tenha adotado o slogan “pro-vida”, nem mesmo endosso as ideias que definiram slogans como « pro-vida » ou « pro-escolha » e que por algum motivo tornaram « vida » e « escolha » conceitos antagonicas.

Se voce estiver se referindo a minha posicao, creio que seja mais adequado referir-se a ela como « anti-abortista », algo que ela evidentemente e, assim como eu me refiro a voces como « abortistas », algo que voces evidentemente sao.


Não, na verdade eu não sou a favor do aborto, não sou "abortista", até acharia muito bom que ocorressem tanto menos quanto fosse possível (falo dos induzidos, uma eventual diminuição dos espontâneos tem menor importância, ainda que também fosse bom, acho), tal como acho que transplantes o cirurgias plásticas não são exatamente coisas a serem comemoradas e cujos números devessem aumentar.

Não acho que ninguém seja "abortista", da mesma forma que não há "transplantistas" ou "cirurgia-plastistas", ainda que talvez aquela mulher brasileira que diz ter reconstituído o hímem e parece ter feito tantas cirurgias plásticas que já deve ser 40% não-biodegradável talvez fosse encaixável no último grupo.

Eu não acho "pró-vida" e "pró-escolha" a melhor escolha de termos do mundo, bem como "esquerda" e "direita", mas é sem dúvida bem melhor que "abortista" e "anti-abortista" por ambos serem cunhados em cima de uma coisa que não existe ("abortistas"), e mesmo os opositores também não existirem literalmente (não se opõem ao aborto espontâneo, que são os mais numerosos).

Termos mais adequados seriam talvez "pessoas a favor da descriminalização do aborto" e "pessoas contrárias à descriminalização do aborto", mas acaba sendo mais rápido "pró-vida" e "pró-escolha" por serem mais breves e não serem pejorativos; a possível implicação de que os pró-vida seriam "anti-escolha" e os pró-escolha seriam "anti-vida" me parece bem pouco importante, não lembro de ter visto por aqui gente tentando fazer esse tipo de argumentação.




zumbi filosófico escreveu:Analogias do zigoto e outros estágios com o óvulo partem de um princípio onde as premissas sobre o que é "humano" e o que não é ou são "neutras" ou assumem, para fins de comparação, que o óvulo poderia ser considerado humano por alguns dos critérios usados para defender a humanidade do zigoto, obviamente falhando se os critérios pró-zigoto são tão tautológicos quanto puderem ser, não importando o quão irrelevantes sejam as diferenças bioquímicas ou de outro tipo para um conceito razoável de humanidade; elas obviamente não servem para nada se você tenta entendê-las com a premissa de que a partir da fecundação se tem gente, e antes disso, não havia nada significante.


Novamente, poderia caso abrissemos mao do conceito de identidade individual e a fortiori da propria nocao de individuo.


Não, a idéia de que um óvulo individual é um indivíduo não obriga a se abrir mão do seu conceito de identidade individual, apenas a aceitar que ela existe antes da fecundação; se acha que seria injusto não estender o conceito aos zigotos, que não é a alta mortandade natural ou menor volume celular que os tornaria menos humanos, simplesmente seria um fato da natureza que a maioria dos indivíduos morre muito cedo, o que não é muito diferente da realidade, se considera os zigotos já como gente.






zumbi filosófico escreveu:Essa é sua classificação. Os eventos que temos são um contínuo; uma célula se matura no ovário, milhões de outras células vão até ela, uma delas entra na primeira célula, que então irá eventualmente se dividir, mais do que comumente se dividiria se não tivesse sido fecundada por outra célula, e tem 50-80% de chance natural de se diferenciar e atingir o grau de organização daquilo que consensualmente chamamos de seres humanos.

Esse é o processo que gera humanos. Ele pode ser subdividido em diversos subprocessos, como você fez. Não acho que seja apenas pela possibilidade de divisão, ou possibilidade de se defender a indivisibilidade, ou contingência/hierarquia de processos, que se define satisfatoriamente o que são "humanos".

Também não vejo importância "em ações de terceiros", não mais do que qualquer outro evento bioquímico que consideremos humanamente irrelevante, mas seja necessariamente incidental ao processo.

Você possivelmente também não vê, imagino que no caso de se descobrir que há casos de partenogênese humana viável, ainda seria contra o aborto nesses casos, mesmo não tendo a "ação de terceiros" desengatado a geração de um novo ser humano.



Esse paragrafo parece uma copia dos que ja foram respondidos mais acima.

De qualquer forma, voce esta correto, dentro do ponto de vista filosofico que admite o Universo como um so processo e aniquila portanto conceitos como existencia individual. Isso pode ser interessante para elucubracoes metafisicas pos-modernas, mas nao interessa do ponto de vista etico e pratico.


É mais ou menos esse o ponto que eu tentei fazer quanto a sua recusa em aceitar a possibilidade de divisão do processo de desenvolvimento em estágios diferentes. Você diz que "são todos um só", que a conexão causal entre todos eles fazem com que não haja pontos mais importantes que outros e etc. (Essa coisa de "todos são um só" não só soa pós-modernista como new age e comunista ao mesmo tempo)

Você acha que pode se dividir o processo claramente no evento da fecundação, eu admito isso, mas também admito que é possível dividir ainda mais, de forma que considero muito mais racional e menos nociva; e também admito que que na verdade, nenhuma dessas divisões é algo meio "elementar"/"natural", que a realidade mesmo é de certa forma uma coisa toda "misturada", não existem inícios e fins absolutos, talvez em algumas coisas físicas, mas talvez nem no big-bang. Mas essas divisões podem ser feitas, podemos ter conceitos úteis e suficientemente reais como, de indivíduo, ou de estágios de desenvolvimento, e dizer coisas como que, a atividade cerebral acabou ou ainda não começou.






Desse ponto de vista nos temos individuos humanos dotados de dignidade e que podem ter sua existencia individual rastreada somente ate a fecundacao, caso o principio de identidade se conserve e tenhamos que o ovulo e o espermatozoide que deram origem a fecundacao sao coisas completamente diferentes do embriao gerado.

Mas voce pode ficar nessa, ou pode ir alem e dizer tambem que nos somos em parte o hamburger que comemos ontem, entao aquele hamburger devia ter um pouco da dignidade que temos hoje, mas para mim isso e uma besteira que nao precisa ser respondida.


Tem sorte de estar na sua posição. Eu acho que a noção de humanos sem cérebro ativo ou até unicelulares, é mais ou menos parecida com isso, mas para meu azar há quem defenda isso, e não são poucos. Acaba se tornando importante discutir isso, porque tem repercussões legais e sociais.




zumbi filosófico escreveu:Bem, eu acho que enquanto não se tem cérebros modificados em jogo, podemos fazer "criaturas" diversas. Apoio e torço muito para as técnicas de clonagem para utilização de células estaminais de embriões-clones, que serão mais eficientes que de células estaminais de outros embriões por minimizar muito a chance de rejeição. Talvez até órgãos para transplante possam ser feitos assim.


Eu tambem nunca levantei uma palavra contra o desenvolvimento de porcos como banco de figados ou de coracoes.
Quando eu disse da criacao de criaturas hibridas e obvio que eu me referia aquelas capazes de desenvolver e compreender, ainda que potencial ou fracamente, a racionalidade e moralidade.

Mas nao seria o seu estagio presente de compreensao que determinaria isso, mas o seu potencial como individuos.


Eu não me referia a porcos, mas a clones "humanos", principalmente em estágio embrionário/"células tronco", em substituição aos embriões criados para isso (como permite a lei nos EUA) ou doados por pais que produziram para fertilização, e sobraram alguns (o que é permitido no Brasil). Para órgãos, teriam que ser clones com acefalia ou anencefalia induzida.



zumbi filosófico escreveu:Acho que isso de que "animais não tem dignidade alguma" é opinião, ainda que bem comum. A própria idéia de que é "bom" não lhes proporcionar sofrimento inútil praticamente não faz sentido sem uma analogia com o sofrimento humano, e como não devemos causar sofrimento humano desnecessário. Não é, embora talvez alguns possam comparar, análogo a não destruir um monte de pedras ou plantas, mesmo que inúteis, simplesmente porque não é necessário destruí-las. É análogo ao sofrimento humano.


Uma experiencia mental interessante, mas que eu nao estou com tempo de elabora-la decentemente aqui e a seguinte :

Imagine um mundo onde o PETA e ALF venceram : patos e galinhas, ras e crocodilos, todos tem a mesma dignidade e direitos dos seres humanos, e portanto pos-se um fim a exploracao cruel daqueles por estes.
Agora animais sao totalmente livres. Mas a liberdade, para existir, precisa compreender em si uma nocao de limites, quando ela passa a interferir na liberdade alheia, como John Locke bem observou.

Ora, os animais cruzam e defecam onde quiserem, nao respeitam o espaco dos outros e inclusive atacam e matam uns aos outros. Se fosse exigido que esses animais respeitassem uns aos outros, caso contrario sofreriram restricoes legais cabiveis aos que infringem a lei, todos parariam na cadeia, ou seja, todos os animais perderiam a liberdade.

A conclusao e a de que animais nao podem portar dignidade humana uma vez que nao sao capazes de compreender o seu significado. Nos podemos respeita-los, mas nao como individuos humanos, ou parcialmente humanos. A categoria de seres humanos separa-se da categoria de animais tambem nisso, e se um dia algo nao-humano adiquirir essa capacidade diferencial, ele tambem portara dignidade equivalente a humana.


Eu não acho que animais devessem ser exatamente como humanos, mas não exatamente por não serem capazes de compreender o significado de certo e errado e etc. Bebês e crianças não são, ao menos não muitas vezes, e é possível que algumas pessoas já adultas também não. Diversos desses humanos também podem até defecar em qualquer lugar se não estiverem usando fraldas e até atacar como animais.

Talvez alguns animais devessem ser vistos de forma mais ou menos parecida (e não o vice-versa - não que você esteja sugerindo isso). Não tenho uma posição bem definida a esse respeito, de qualquer modo.



zumbi filosófico escreveu:Ainda que a estranheza da importância de um instante especificamente, desapareça, se é usado um instante crucial no fim da parte consensual da humanidade, não era a instantaneidade o ponto, ela apenas enfatiza a esquisitice da diferença de importância em algo que difere do óvulo em uns pentelhogramas de moléculas.


Alguns virus de HIV diferem de voce em pentelhogramas, e mesmo assim acho que voce ainda considera bem diferente estar infectado por eles ou nao.

Cara, voce esta se escorando sempre em criterios errados para basear suas analises. As coisas nao sao diferentes somente se parecerem diferentes de um determinado ponto de vista escolhido. E isso tambem e obvio.


Eu ainda não vejo uma falha essencial nisso que eu disse. Embora eu definitivamente veja que há uma diferença muito importante em ter ou não HIV, de qualquer forma, eu seria humano. Da mesma forma, a fecundação é para mim uma modificação menor, que não altera as coisas em um sentido "humano", ainda que biologicamente seja mesmo muito importante, que não seja nem de longe desprezível, e mesmo que a "humanidade" realmente dependa disso, ao menos como a conhecemos. A humanidade também depende da ovulação e até de um evento cujo nome nem me lembro, que precede a ovulação, onde os cromossomos da mãe ficam presos de uma forma que já determina qual será o genoma haplóide do óvulo maduro.

Para mim são só um monte de eventos celulares, necessários para a vida de todos indivíduos, mas não os acho mais importantes do que a síntese de queratina (que imagino que também deve ser essencial a todos indivíduos). Não são o que justificam considerar-se uma célula ou algo mais já como um ser humano.




zumbi filosófico escreveu:Imagine que alguém defendesse que a vida não começa na fecundação, mas, digamos, depois da quinta divisão celular, depois de ter sido sintetizada em uma pequena quantidade alguma proteína qualquer.

Sei que para você uma proteína qualquer não tem a importância toda, que é o contexto no qual ocorre a fecundação, apenas não consigo ver importância nesse contexto tal como você provavelmente não conseguiria ver importância em qualquer motivo que alguém concebesse para a síntese de uma proteína em particular que só começasse na quinta divisão celular.


Eu poderia responder a essa pessoa que ela pode chamar de vida o que ela quiser, mas o individuo e o mesmo.


Eu odeio voltar ao óvulo, mas acho que o óvulo é o mesmo, antes e depois da fecundação, mesmo que ela potencialmente salve a vida dele, a altere crucialmente.

Aí a coisa passa a ser que não é a individualidade que importa, mas a "humanidade", não presente para você no óvulo, e não presente para esse fulano hipotético até a síntese de uma proteína X. Que talvez fosse, sei lá, um evento aleatório que fosse mais importante para a determinação das características individuais posteriores que o genoma produtoa da fecundação.

...e como você talvez dissesse que ainda é o mesmo indivíduo, mesmo depois de mudanças cruciais, e que ainda assim o óvulo não era, eu também simplesmente manteria que o tempo todo estariam falando de células com ADN humano e ainda não de gente propriamente dita.






zumbi filosófico escreveu:[sobre o óvulo ter um pai]

Relacionamentos, namoro, casamento. Casais falam dos "seus filhos" antes de tê-los de fato. Se Fulano é casado com a Beltrana, querem ter filhos, é presumido que ele seria o pai dos filhos dela.

Voce esta querendo que eu leve isso a serio como argumento?


Sinceramente, eu não vejo nisso nada que fundamentalmente devesse ser levado menos a sério do que a idéia de humanos unicelulares ou sem cérebro.



zumbi filosófico escreveu:Não sei porque esse tipo de paternidade seria menos importante para a "humanidade" que a paternidade "efetivada" com a fecundação.

Talvez porque nenhuma mulher fique gravida so de bater um papo sobre o que ela espera do futuro de seus eventuais filhos. Apenas talvez...


Eu não sugeria que isso de fato levasse à gravidez.

O ponto é que foi argumentado, ou ao menos assim entendi, que "ter um pai", seria um dos critérios para humanidade, ou para se merecer dignidade humana, ou ao menos isso foi colocado no saco de coisas em comum entre zigoto e pessoas consensuais com uma razão que me escapa agora, e teria a ver com as pessoas poderem menstruar mas não abortar, qualquer que fosse o "rationale" exato.

Se a "paternidade", dentre outras, é algo que confere a algo a dignidade humana, então essa paternidade implícita em um relacionamento também já seria bem concebível que desse algum grau de dignidade. Óvulos de mulheres em relacionamentos estáveis seriam gente mesmo, porque teriam pais, e óvulos de mulheres solteiras seriam como uma casta cuja vida não se valoriza.

Se não é assim, se é apenas o tipo/grau de partenidade efetivada do zigoto, então a relação é oposta; não é a paternidade que dá importância ao zigoto, mas ela é declarada como importante porque o zigoto, que se considera importante, a tem, e nos termos que apenas do zigoto em diante tem.




zumbi filosófico escreveu:Ainda que de qualquer forma, eu também não veja importância, senão bioquímica e incidental, para a paternidade na "humanidade".

Talvez porque nao se conhecam muitos humanos sem pais (do sexo masculino). Talvez Jesus, mas o pai dele era Deus, e ele nao era exatamente um humano comum.
Mas de novo, apenas talvez...


Também acho que não há humanos sem queratina. Não sei realmente, mas acho que bem possivelmente o desenvolvimento humano deve ser inviabilizado se não houver a síntese de queratina.





zumbi filosófico escreveu:Apenas me parece que se a paternidade genética de um pai que pode até morrer antes do filho nascer, ou simplesmente abandonar a ambos, seria mais importante do que a paternidade "social" e biológica implícita num relacionamento estável.


Logo, pais geneticos devem ser isentados das responsabilidades legais para com seus filhos legitimos e maridos cornos e que devem pagar o pato. Nao sei porque, mas a sua logica nao me parece consistente...


Eu não entendi bem a conexão do seu desmembramento lógico a partir do que eu disse. Só acho que se o cumprimento de obrigações legais com pensão tiver a ver com critérios para humanidade, coitados dos filhos dos Ricardões... :emoticon5:

... o meu ponto todo era que a paternidade genética é necessária, mas não considero suficiente, para a humanidade (como a já mencionada queratina ou a velha conhecida ovulação).

E é necessária apenas de forma mais ou menos parecida que a queratina é; não é como se tivesse a ver com julgamentos sobre se alguém é humano ou não, tendo que ser apenas depois de se comprovar geneticamente quem é o pai ou mesmo, no mínimo que não é um partenoto.






zumbi filosófico escreveu:Mas ao mesmo tempo, se achamos que as pessoas são humanas mesmo que não tenham tido um pai que tenha contribuido com mais do que um espermatozíde, seja por ter sido filho uma doação de esperma anônima, ou seja por terem sido abandonadas completamente pelos pais que realizaram a cópula, ou mesmo que sejam filhas de estupradores até, fica claro que não há de fato importância alguma nesses fatores "sociais" paternidade na definição da humanidade.



O fato dele ter contribuido com apenas um espermatozoide pode ser devido a diversos motives: ele pode nunca ter vindo a descobrir os efeitos de sua acao, ele pode ter morrido ou ele pode ter abandonado. Nada disso o exime da responsabilidade moral pelo ato cometido, e pela vida ali gerada. Se essa responsabilidade podera ser cobrada, e um outro problema.


De repente isso virou sobre responsabilidade legal em casos de gravidez, e não mais sobre o que é ou não "humano"...

Não disse que pais não devem ter responsabilidade, ainda que considere as coisas devessem ser um pouco diferentes de como são agora.






zumbi filosófico escreveu:Não sei se existe qualquer coisa 100% livre de ideologia

Coisas sao o que sao, e isso nao depende de ideologia.


Melhor dizendo então, não sei se podemos ter uma visão pura do que são as coisas, 100% ideology free. Seriam descrições meramente "científicas" das coisas, no máximo, não teriam importância moral implícita nem nada.



zumbi filosófico escreveu:que traz resultados prejudiciais à vida que considero realmente importante, humana.

E que ate agora voce nao disse em quais principios se baseia para considerar tal vida humana, exceto um criterio besta escolhido a dedo para satisfazer uma ideologia abortista.


Bem, primeiramente, não sou "abortista". O critério para o que é "humano" é provavelmente o mesmo do que você considera "humano" depois da 23ª semana de gestação, a menos que considere pessoas cerebralmente mortas ou sem cabeça como "humanos".






Enquanto eu assumo partir da concepcao de basica de individuo humano e da sua dignidade propria para estabelecer meus raciocinios, voce escolhe um numero de semanas que se caracteriza em geral por um determinado comportamento observado como um criterio maximo de etica na decisao de matar ou nao matar.


Parte da *sua* "concepção básica de indivíduo", que não te impede de julgar que é permissível matar coisas bem parecidas (ainda que as considere muito diferentes, por definição), porque simplesmente não são indivíduos, ou não o suficiente.

Eu parto da idéia que me parece bem razoável de que o cérebro, a mente, é algo fundamentalmente importante que nos separa de vida simplesmente biológica ou individual-diplóide-biológica, de plantas e de diversos outros animais. Algo que é aceito por praticamente todo mundo no restante do tempo. Permite, de certa forma, matar coisas "bem parecidas" com as coisas que proíbe, mas acho que faz muito mais sentido assim.




zumbi filosófico escreveu:Desde as coisas mais diretas, como simplesmente não ter o direito de aborto, passando por implicações individuais e sociais de qualidade de vida (inclusive das "vidas" que se objetivava "salvar"), até criminalidade, e mais recentemente, tendo influência negativa até em áreas da medicina muito promissoras para a "vida", potencial de ajudar muitas vidas que vai pelo ralo, que só poderia ser explorado se a "vida" fosse respeitada de uma maneira que considero muito mais racional.

Tudo bem, nazistas poderiam usar a mesma frase que eu para defender experiências com judeus, mas enfim... é isso aí mesmo, ainda que não seja o que eu defenda.



Exatamente.

Voce pode ate dizer que tentar buscar principios universais validos para todos os individuos, e basear as decisoes da Justica, dentro da medida do possivel e praticavel, nesses principios universais, como uma especie de ideologia.

Mas o que voce sugere como opcao ?


Não temos opção, e nem acho que precisamos; uma ideologia muito "alternativa" a esses princípios básicos seria algo potencialmente bizarro.
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user f.k.a. Cabeção
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

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Zumbi Filosofico,
Nao da para levar a serio alguem que nao le o que vai comentar, da so uma orelhada no final e liga um modo automatico de fugir do assunto tratado. Se voce nao ler exatamente o que eu escrevo, voce nao vai estar debatendo comigo, mas com algum preconceito existente na sua cabeca a respeito do que voce supoe que eu teria escrito. E voce estara contrargumentando esse preconceito, e nao a mim.

Vamos organizar essa discussao, ja que em muitos trechos diferentes estamos discutindo exatamente a mesma coisa e isso esta extremamente repetitivo. E sobretudo, vamos focar no essencial.


Voce parece compreender muito bem a questao de que quanto mais se rarefaz uma definicao, no caso, a definicao de ser humano, a mais coisas ela vai se aplicar. Esse e o cerne da sua argumentacao sobre « ovulos poderem ser considerados humanos » e etc.

So que isso e evidente, vale para toda e qualquer coisa : quanto menos exigencias se faz, mais coisas atendem ao que se esta pedindo.

O fato assumido a priori foi o de que se desconhece o que precisamente confere a dignidade humana. Podemos apenas especular sobre condicoes de consciencia, ja que o conhecimento ultimo sobre o estado de consciencia do outro sera sempre um problema filosofico em aberto. Foi colocado que a definicao de humanidade e uma questao que transcende o escopo da ciencia dada a evidencia de que a ciencia e definida pelo homem, nao o contrario.

Num primeiro momento, tomamos como evidente que um bebe e um ser humano e um ovulo nao, e o problema de demarcacao estaria limitado aos estagios que separam um ovulo de um bebe, a comecar pela fecundacao.

Esse procedimento em nenhum momento assume que o estagio seguinte ao ovulo e humano e digno, ele apenas separa uma coisa que temos certeza ser humana e digna de outra que temos certeza que nao e.

Existe uma variedade de razoes eticas e praticas que permitem essa separacao, quase todas evidentes. Ovulos nao possuem caracteristicas proprias suficientes para se identificarem como individuos, ovulos sao descartados naturalmente pelo organismo, e o mais importante, para se transformarem num embriao eles dependem da acao decisiva e consciente de individuos, mesmo que nao tenham esse objetivo em mente.

Mas todas essas razoes sao insignificantes dentro de uma discussao em que as duas partes concordam que ovulos nao sao significativos o suficiente para serem considerados humanos, o que eu tomei como verdade desde o principio. Voce , por sua vez, nao cansou de apelar a um hipotetico « humanizador de ovulos » toda vez que precisava usar esse argumento de que ovulos poderiam portar dignidade, o que e uma estrategia apenas cansativa, ja que nao contribui para o seu argumento, nem ameaca o meu, mas apenas coloca uma opiniao que nao pertence a ninguem.

De qualquer forma, mesmo imaginando o hipotetico humanizador de ovulos, o seu argumento de que a posicao dele e analoga a minha, exceto talvez por ser um grau mais abrangente, e falso, mesmo se considerarmos que o ovulo possui dignidade de um ser humano, ou algo parecido.

Isso porque no argumento aqui apresentado nao e apenas o de que o caractere humano do feto/ovulo que deve determinar a obrigacao de se seguir uma gravidez, mas sim a responsabilidade assumida para com os atos e as consequencias deles sobre outros seres humanos. E no caso, temos apenas um ato que pode ser avaliado de acordo com as suas consequencias, e esse ato e a relacao sexual que deu origem ao feto.

Nenhuma mulher e responsavel por seus ovulos, ela ja nasce com eles e nao tem culpa alguma de que o destino deles sera a eliminacao fisiologica decorrente da nao fecundacao. Exigir que ela faca sexo como forma de salvar seus ovulos e o mesmo que exigir que alguem se prostitua para alimentar as criancas que morrem na Africa.

Ninguem aqui esta defendendo isto. A posicao dos anti-abortistas e clara: ao passo que nos nao temos, e dificilmente poderemos ter, criterios bons o suficientes para decidir sobre a humanidade do feto que se desenvolve no utero de uma mulher, e que aquele individuo em algum momento se tornara um ser humano, e sabemos que a mae tem a sua parcela de responsabilidade sobre a vida que ali se desenvolve, a decisao de prosseguir com a gravidez e a unica eticamente cabivel.

Ja a posicao dos abortistas e bem menos clara : num primeiro momento eles estabelecem que a consciencia humana e o melhor criterio, depois eles dizem que e o sistema nervoso central, mas existem problemas graves ja que o sistema nervoso se desenvolve durante toda a gestacao, e no fim eles assumem que e a « producao em massa de neuronios » e ao sinal de ondas cerebrais especifico em uma determinada semana da gestacao que lhes conviem. Diante de uma postura fica a duvida se o que se esta procurando e um criterio etico pelo qual se orientar ou se e uma desculpa pseudo-cientifica que justifique uma orientacao ja decidida a priori.

Uma postura desconhece um criterio evidente para definir uma pessoa, mas consegue identificar claramente os responsaveis (ou um dos responsaveis), e decide que o mais justo e que estes responsaveis assumam as consequencias de seus atos.

A outra postura, diante da mesma ignorancia, admite que um criterio arbitrario para matar pode ser a solucao utilitarista mais conveniente para as partes que vao tomar a decisao (ja que o feto nao apita nada), e para isso escolhe uma justificativa « cientifica » adequada para corroborar essa conduta.

Nem e preciso dizer qual postura e mais honesta. E que evidentemente nao sao analogas quanto a Etica.

Como esta resumido ai em cima, temos a diferenca evidente de condicao entre um ovulo e um embriao. Ainda que possamos iguala-los usando uma definicao fraca de ser humano, um deles deve sua condicao a acao de terceiros, enquanto o outro e apenas um produto de metabolismo.

Coisa que toda crianca aprende, bebes surgem de contatos sexuais, e por terem trazido criancas ao mundo, os pais sao responsabilizados por elas.

Temos tambem a diferenca notoria entre estabelecer um criterio utilitarista arbitrario para se matar, diante de uma situacao onde uma definicao clara nao e possivel, e a conclusao de que os responsaveis devem arcar com as consequencias de seus atos sobre terceiros.

Creio que isto engendre o cerne do que esta sendo discutido aqui, afinal, argumentos residuais, tais como semelhancas eventuais entre ovulos e zigotos, insignificancia do espermatozoide, ficcoes sobre clones e a questao da « dignidade » dos animais nao merecem maior atencao do que a que ja foi dedicada, e nao tem nenhuma implicacao sobre o que esta escrito ai em cima.

Para ajudar voce com relacao a problemas de logica argumentativa, eu vou resumir os meus silogismos :
A diferenca basica entre ovulos e embrioes se da no conteudo de responsabilidade que a mae tem sobre cada um deles. E dessa responsabilidade teria origem a obrigacao moral dela para com a gravidez e a vida do feto, algo que ela nao teria para com seus ovulos, MESMO que estes fossem considerados humanos.

A diferenca existente entre assumir um criterio arbitrario para matar e a de conferir aos responsaveis a obrigacao para com as consequencias e que separa as posturas de abortistas e de anti-abortistas, e do ponto de vista etico essa diferenca e suficiente para justificar o anti-abortismo, sem qualquer arbitrariedade.

Sao esses dois argumentos que voce deve atacar, mostrar algum erro na sua deducao, ou nos principios assumidos. Ate agora eu nao vi voce fazendo isso nos seus textos.
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zumbi filosófico
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
[...]

Mas todas essas razoes sao insignificantes dentro de uma discussao em que as duas partes concordam que ovulos nao sao significativos o suficiente para serem considerados humanos, o que eu tomei como verdade desde o principio. Voce , por sua vez, nao cansou de apelar a um hipotetico « humanizador de ovulos » toda vez que precisava usar esse argumento de que ovulos poderiam portar dignidade, o que e uma estrategia apenas cansativa, ja que nao contribui para o seu argumento, nem ameaca o meu, mas apenas coloca uma opiniao que nao pertence a ninguem.


A dignidade humana dos óvulos é uma hipótese perfeitamente válida de discussão uma vez que se considerasse que zigotos tem dignidade humana, ou que ele e todos estágios de desenvolvimento devessem ser protegidos como tal, já que pode-se sempre retroceder da afirmação de dignidade mais forte do zigoto, para alguma outra posição que essencialmente visa manter as práticas condizentes com o conceito de que a vida começa na fecundação.

E é também útil como analogia, pois ajuda a eliminar aspectos dos zigotos e outros estágios que são apontados como "dignificadores", uma vez que se demonstre que, em muitos casos, ambas as células os tem, ainda que, obviamente, em diversos casos apenas o zigoto as tenha nos termos que o zigoto tem.



user f.k.a. Cabeção escreveu:Isso porque no argumento aqui apresentado nao e apenas o de que o caractere humano do feto/ovulo que deve determinar a obrigacao de se seguir uma gravidez, mas sim a responsabilidade assumida para com os atos e as consequencias deles sobre outros seres humanos. E no caso, temos apenas um ato que pode ser avaliado de acordo com as suas consequencias, e esse ato e a relacao sexual que deu origem ao feto.


Isso é um ponto comum a ambos os lados da questão, o que muda é que de um lado se acha que já está se afetando a outros seres humanos, ainda que em um estranho estado unicelular ou sem atividade cerebral de humanidade, e do outro não se considera que outros seres humanos estejam sendo afetados.

Basicamente por isso que se tem os nomes pró-vida e pró-escolha. Para os pró-vida, desde o zigoto se tem uma "vida", sendo vida humana, mais importante que o óvulo, não sendo então mais uma questão de escolha; e para os pró-escolha, não se tem uma "vida" humanamente diferente do óvulo, então é uma questão de escolha, não de "vida ou morte".





user f.k.a. Cabeção escreveu:Ja a posicao dos abortistas e bem menos clara : num primeiro momento eles estabelecem que a consciencia humana e o melhor criterio, depois eles dizem que e o sistema nervoso central, mas existem problemas graves ja que o sistema nervoso se desenvolve durante toda a gestacao, e no fim eles assumem que e a « producao em massa de neuronios » e ao sinal de ondas cerebrais especifico em uma determinada semana da gestacao que lhes conviem. Diante de uma postura fica a duvida se o que se esta procurando e um criterio etico pelo qual se orientar ou se e uma desculpa pseudo-cientifica que justifique uma orientacao ja decidida a priori.


Bem, essa é a sua suspeita; a minha é de que o lado pró-vida que de alguma forma ou outra vai fazer todo tipo de malabarismo argumentativo para tentar manter a idéia de que a vida começa na fecundação ou defender de alguma forma práticas consistentes com essa idéia, por mais sem sentido que seja.

Já a posição pró-escolha se baseia no critério de morte e vida cerebral para essa questão, como é normal que se faça com todas as outras situações; evitando que as pessoas não tenham sua liberdade restrita por conceitos bizarros como de "humanos unicelulares", ou algo que na prática é essencialmente como se fosse isso. O que não apenas garante uma maior liberdade (e não irresponsabilidade) com bases racionais, como possibilita uma melhor qualidade de vida do que seria possível com práticas consistentes com a adoção de critérios bizarros de humanidade.





user f.k.a. Cabeção escreveu:
Uma postura desconhece um criterio evidente para definir uma pessoa, mas consegue identificar claramente os responsaveis (ou um dos responsaveis), e decide que o mais justo e que estes responsaveis assumam as consequencias de seus atos.

A outra postura, diante da mesma ignorancia, admite que um criterio arbitrario para matar pode ser a solucao utilitarista mais conveniente para as partes que vao tomar a decisao (ja que o feto nao apita nada), e para isso escolhe uma justificativa « cientifica » adequada para corroborar essa conduta.

Nem e preciso dizer qual postura e mais honesta. E que evidentemente nao sao analogas quanto a Etica.


Se eu vejo sentido em vida e morte cerebral, me faz tanto sentido se falam em "salvar a vida" de um zigoto, embrião ou feto ainda sem atividade cerebral, quanto se falassem de salvar a vida de um óvulo, de uma pessoa com morte cerebral ou um acéfalo.

Como vejo as coisas por essa perspectiva, sim, científica, sem aspas, não posso deixar de considerar a posição pró-vida, não exatamente "irresponsável", uma vez que a adoção do conceito de "humano-unicelular" ou algo parecido cria expectativas diferentes quanto a responsabilidade nessas situações, mas sem dúvida muito nociva, de diversas formas. Infelizmente, talvez principalmente às mesmas pessoas que essa posição intenciona "salvar".

Se eu vejo as coisas por essa perspectiva, a única posição responsável é ser a favor da legalidade do aborto, uma vez que a "responsabilidade" pelo ato sexual simplesmente perde totalmente o sentido, pois não há uma "vítima" potencial do aborto que surge instantaneamente com a fecundação; e sem isso, faria tanto sentido quanto negar socorro médico a pessoas que se acidentaram em função de qualquer descuido numa ação voluntária.



Novamente aqui também teve um pouco de um tom de que mparece ter em mente a idéia de que os pró-escolha estão doidos de vontade para abortar, como se fosse um tipo de sonho de vida. Como se fosse melhor do que usar contraceptivos. Como se fosse legal esperar até que se desenvolva um feto para então abortar. Talvez, do ponto de vista da mulher, para comprar roupas de grávida, ganhar presentes num chá de bebê, e depois não precisar devolver, e ficar usando fraldas pelas quais não teve que pagar, sem ter que ir ao banheiro. Para os homens, talvez só pelo prazer de engravidar uma mulher, e não ter que cuidar do filho; isso deve proporcionar ao "abortista", muito maior satisfação do que simplesmente transar com a mulher, sem ter filhos por não engravidar. Deve ser o aborto que dá o prazer. Talvez seja uma tara, meio como aquela de transar onde talvez possa ser flagrado, mas em vez disso é de engravidar e esperar até o último limite legal para interromper a gravidez, para elevar os níveis de adrenalina, e no fim vir o alívio, o "ufa".

Não é nada disso. Simplesmente não vejo sentido em se falar em "vida humana" tão dissociada do conceito de atividade cerebral quanto seria a partir da fecundação, e portanto não vejo sentido em leis que se baseiem nessa idéia de "vida humana" (ou que valorizem a atividade cerebral de forma extremamente indireta, mas coincidentemente a partir do momento da fecundação apenas). E mais do que simplesmente não ver sentido, vejo que tem resultados práticos muito ruins, a troco de absolutamente nada.

Quanto a um ou outro lado ser desonesto ou sem ética, isso é só fuga do assunto/ad hominem; de qualquer forma, ambos os lados tem representantes honestos e desonestos, e as práticas defendidas por cada lado são anti-éticas se julgadas a partir dos pressupostos do outro lado, ou com pressupostos-espantalho.





user f.k.a. Cabeção escreveu:
Para ajudar voce com relacao a problemas de logica argumentativa, eu vou resumir os meus silogismos :
A diferenca basica entre ovulos e embrioes se da no conteudo de responsabilidade que a mae tem sobre cada um deles. E dessa responsabilidade teria origem a obrigacao moral dela para com a gravidez e a vida do feto, algo que ela nao teria para com seus ovulos, MESMO que estes fossem considerados humanos.

A diferenca existente entre assumir um criterio arbitrario para matar e a de conferir aos responsaveis a obrigacao para com as consequencias e que separa as posturas de abortistas e de anti-abortistas, e do ponto de vista etico essa diferenca e suficiente para justificar o anti-abortismo, sem qualquer arbitrariedade.

Sao esses dois argumentos que voce deve atacar, mostrar algum erro na sua deducao, ou nos principios assumidos. Ate agora eu nao vi voce fazendo isso nos seus textos.


Engraçado, eu já acho que se óvulos fossem considerados humanos, se teria sim a responsabilidade sobre eles, independentemente até da ação voluntária.

Como exatamente isso não existe, talvez seja interessante um exemplo análogo mais próximo do plausível, uma pessoa que tivesse nascido de partenogênese; não considero que pudesse ser morta (e acredito que você também não considere, apesar dessa argumentação), muito embora considere que um embrião ou feto partenogênico pudesse ser abortado antes de ter atividade cerebral/vida humana, como um proveniente de fecundação. Talvez para você fosse mais ou menos como se fosse numa situação de estupro, o aborto só sendo permissível até a viabilidade do feto, imagino.

Também só posso discordar quanto ao que separa pró-vida dos pró-escolha, não se trata de critérios arbitrários para matar e para se livrar de responsabilidade de um lado, versus responsabilidade, honra, honestidade e heroísmo do outro; mas verdadeiro cerne mesmo da questão é apenas que de modo geral, de um lado há os que acham que deve se proteger qualquer coisa que houver no útero ou prestes a se implantar nele desde a fecundação, por diversas argumentações; e do outro gente que defende algo compatível com o conceito de morte e vida cerebral para essa questão.

E, diga-se de passagem, é também o lado que penso que tem os critérios menos arbitrários para se matar - por exemplo, não acho que faça sentido que se possa matar uma pessoa apenas por não ter sido produto de sexo consensual.
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user f.k.a. Cabeção
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


O que voce nao esta percebendo e que a sua analogia com o ovulo erra o ponto justamente por atacar aquilo que eu nao estou defendendo: uma definicao precisa do que e um ser humano.

A questao nao e o que precisamente nos define como seres humanos, algo que nos nunca poderemos saber. A questao e, se diante dessa limitacao intransponivel de conhecimento, a postura mais correta e a de estipular um prazo para se tomar uma decisao utilitarista, ou se e arcar com as consequencias dos proprios atos.

O seu criterio arbitrario sobre o periodo de tolerancia onde um desenvolvimento cerebral tido como primitivo permitiria o aborto nao e diferente de um criterio mais abrangente que permitisse o "aborto" antes do desenvolvimento da capacidade falar.

E ele nao tem nada de "cientifico sem aspas", ele e utilitarista, isso sim. Nao existe nenhuma teoria cientifica que endosse o exterminio de fetos com um estagio X ou Y de desenvolvimento cerebral, isso e simplesmente uma opiniao conveniente partilhada por algumas pessoas, e que nao pode nem ser testada como hipotese.

A analogia com a morte cerebral e falsa, pois a morte cerebral e seu carater de irreversibilidade decretam o fim da existencia como individuo em suas potencialidades. Nao e o fato dele nao sentir ou pensar nada que permite que o consideremos morto, mas o fato de que nunca mais ele podera sentir, pensar ou fazer qualquer coisa. Isso e totalmente o oposto de um feto onde o cerebro e a mente ainda se desenvolvem.

No mais, como eu disse antes, um feto nao e uma geladeira onde os componentes sao montados parte por parte e depois sao ligados numa tomada. Tudo e parte de um continuo onde identificar qualquer instante como o acionamento de um processo mental mais elaborado e nao so especulativo como provavelmente falso.

O que eu proponho, ao contrario, e que a origem de todos os individuos e a fecundacao, e na medida que essa e realizada por um ato voluntario, ainda que intencional ou nao, temos a quem responsabilizar. Essa e a origem de toda a responsabilidade materna e paterna sobre os filhos, e voce nao tem como elaborar malabarismos retoricos que permitam escapar dessa verdade fundamental. Ninguem paga pensao pelo filho do vizinho.

A fecundacao e o unico ato ao qual podemos atribuir responsaveis, sendo portanto razoavel falar de obrigacao para com a gestacao. Contra esse fato voce me propoe hipoteticos alienigenas clones hibridos de animais gerados por partenogenese, mas nao insere nenhum dado razoavel para que eu possa considerar esse caso como relevante.

E no mais, a simples existencia de individuos gerados por partenogenese nao endossa o aborto em geral, mas apenas abre uma discussao sobre a obrigacao da mae de levar adiante uma gravidez, nesse caso especifico.

O silogismo aqui e simples: dado que uma mae e responsavel pelo filho que carrega, na medida que este surgiu dos seus atos, ela nao deve optar pelo utilitarismo que melhor lhe convier para dispor da existencia deste. Dizer que ate determinado ponto o feto nao e considerado humano e simplesmente arbitrar tal utilitarismo.


(O caso de paternotos, por nao se enquadrar em tal silogismo, exigira uma interpretacao diferente, a qual eu nao estou tratando e que nao faz parte do problema aqui abordado. Alias, talvez nao faca parte de problema algum, uma vez que cabe a voce demonstrar qual e a relevancia desse caso, que no momento presente parece pertencer aos dominios da ficcao.)


Tambem nao interessa a sua opiniao estetica pessoal sobre o aborto. Na medida que voce o defende como um "direito" voce e um abortista, nao importando se voce o aprecia como pratica ou nao.
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Segundo a pagina de partenogense na Wikipedia, nao existem casos conhecidos de partenogenese natural em mamiferos http://en.wikipedia.org/wiki/Parthenogenesis#Mammals .
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por Anna »


Não haver nenhum registro científico de partenogênese humana não exclui a possibilidade de sua existência, há vários casos de grupos de animais onde nunca houve registros, que recentemente receberam tais registros. No que diz respeito a construção de hipóteses e discussão científica a partenogenese humana é, então, excluída por não haver como ser testada ou medida.

Entretanto, o caminho como levam o debate em questão está no âmbito subjetivo entre a crença pessoal e o conhecimento (epistêmico), portanto não há motivo algum para não incluir e discutir a hipótese incluindo a possibilidade de partenogênese, CASO houvesse partenogenese humana como uma possibilidade.
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Anna escreveu:
Não haver nenhum registro científico de partenogênese humana não exclui a possibilidade de sua existência, há vários casos de grupos de animais onde nunca houve registros, que recentemente receberam tais registros. No que diz respeito a construção de hipóteses e discussão científica a partenogenese humana é, então, excluída por não haver como ser testada ou medida.

Entretanto, o caminho como levam o debate em questão está no âmbito subjetivo entre a crença pessoal e o conhecimento (epistêmico), portanto não há motivo algum para não incluir e discutir a hipótese incluindo a possibilidade de partenogênese, CASO houvesse partenogenese humana como uma possibilidade.



Oi Anna, quanto tempo hein?

Entao, eu nao exclui a partenogenese do rol de coisas possiveis, eu questionei qual e a sua validade nessa discussao uma vez que nunca foi observada.

Uma discussao como essa deve centrar-se em fatos, e nao em especulacoes, e e isso que o lado abortista parece nao compreender. Eles especulam que a vida comeca numa determinada semana onde o cerebro atinge um certo grau de maturidade, eles especulam que milhoes de mulheres morrem em abortos clandestinos (o que na verdade e mentira), eles especulam que as criancas pobres que nascem vao virar bandidos necessariamente, eles especulam que elas prefeririam morrer a nascer pobres.

E agora parece que o sr Zumbi filosofo introduziu uma nova especulacao: a de criancas paternotas. Mas ele poderia ter especulado sobre uma crianca vir do futuro e dizer para a mae dela abortar, ou entao pior, um adulto vir do futuro e se tornar o pai dele mesmo.

Eu estou apenas colocando um fato na mesa: criancas paternotas nao existem. E se um dia passarem a existir, que o caso delas seja analisado separadamente, talvez levando em consideracao uma eventual analogia ao tratamento dado ao caso de fetos oriundos de estupros, como sugeriu o Usuário deletado. Mas com cuidado nas generalizacoes.

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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

A analogia com o óvulo é mais "geral", não dirigida espeficicamente aos seus argumentos.

Acho que de qualquer forma, ainda é mais ou menos universal que, "humanamente" falando, o zigoto não pode ser muito diferente dos óvulos não fecundados, a menos, claro, que se force uma definição de "humano" ou humanidade calcada no zigoto, daí não tem jeito mesmo. Estou também tentando deixar ela de lado sempre que possível, muito embora seja necessário usá-la como exemplo de outra célula que todos fomos, que se deixada seguir o seu curso natural resultaria em um "humano consensual", mas que diferentemente dela mesma no instante seguinte à fecundação, não se considera que se deve proteger (sendo também que as diferenças do sexo voluntário ou bioquímicas resultantes da fecundação não me são suficientes para justificar essa diferença de tratamento ainda).



Todos os critérios podem ser mais ou menos análogos à outros que não estão necessariamente sendo defendidos: do lado pró-vida, o critério de fecundação é parecido com o de implante no útero ou de ejaculação no interior da vagina, ou do famigerado óvulo ovulado (se é colocado ainda como parte da argumentação a origem da identidade, coisas como aquisição de idioma também "poderiam" valer na prática, em vez de um tipo de "aquisição potencial" com a recombinação do ADN); do outro lado, poderia ainda ser parecido com um critério de desenvolvimento do tubo neural, de aprender o próprio nome, se reconhecer no espelho, ou de aquisição de linguagem.

Penso que especificidade do início da atividade cerebral faz a diferença, e que é o mais racional, melhor em todos os sentidos, comparado às alternativas.



Não importa que sejam coisas distintas, a atividade cerebral ainda não ter começado e ter cessado definitivamente. Se é isso que consideramos como "vida" humana, não importa que ela irá muito provavelmente começar, tal como não importa "do outro lado" que ocorreu a ovulação, não há obrigação de fecundação, ainda não surgiu o que se considera como realmente importante.

Os cientistas defendem a possibilidade de se identificar o início da atividade cerebral; não acho que isso seja motivado por algum tipo de conspiração "pró-abortismo", mas que seja mesmo legítimo, assim como você deve considerar legítimos os conhecimentos acerca de fecundação, que não são um tipo de corrupção inventada pelos cristãos para manter práticas pró-vida.



Não considero relevante o fato do desenvolvimento todo estar encadeado causalmente (ou poder se considerar que teve importância fundamental a ação de pessoas conscientes), pois tudo está geneticamente determinado desde o óvulo, ou de forma mais abrangente, nos genes da espécie. Você não vê importância num encadeamento causal mais abrangente que o existente a partir da fecundação, e eu não vejo nesse mais restrito, após a fecundação. Apesar de diferenças técnicas, como o uma célula já ter adentrado outra, em vez de milhões dessas ainda estarem no corpo do homem que já se prepara para a cópula, ou que já estejam correndo rumo ao óvulo, seja pela uretra masculina ou pelo canal vaginal, não considero que essas diferenças dizem algo sobre "humanidade".

Assim como você vê como conveniente e de certa forma verdadeiro o marco da fecundação, ainda que não seja necessariamente a divisão entre humano e não humano, implicitamente podendo ser apenas em algum momento mais tarde), vejo o início da atividade cerebral como um marco verdadeiro e bem melhor que a mera fecundação, por ser realmente o que considero que faça a diferença "humana" em vez de um limite ultra zeloso.

Assim as pessoas não precisam ter suas liberdades reduzidas sem a justificativa de outra pessoa estar sendo afetada (mas claro que isso não vale se não for considerado um marco no mínimo verdadeiro ou até mais abrangente daquilo que se considere "humanidade"). Também não são necessariamente colocadas pessoas no mundo mesmo sendo não-planejadas ou até mesmo indesejadas, o que seria de outra forma feito com o objetivo de "protegê-las" quando ainda não tinham um cérebro funcionando ou sequer começado a se desenvolver. Algo que eu não acho que faça mais sentido do que proteger os óvulos.



A legalidade do aborto não implica de forma alguma que as pessoas não tenham mais responsabilidade por seus filhos, de forma mais ou menos parecida que a legalidade de socorro médico (ou de qualquer coisa que possa evitar algo não planejado de modo geral) em caso de acidentes não implica que ninguém mais deva ser responsabilizado por qualquer acidente que cause ou por suas ações de modo geral.

O exemplo que dei - apenas partenogênese, nada de clones ETs e etc - foi inclusive para salientar algo que vai mais na direção contrária a uma suposta "irresponsabilidade". Caso partenogênese ocorra raramente em humanos, não vejo relevância alguma na mulher não ter responsabilidade para a "humanidade"/defesa legal do ser resultante, desde que tenha se iniciado a atividade cerebral. O mesmo vale para casos de estupro. A vida humana é mais importante do que as pessoas terem responsabilidade por ela ou não; não é apenas por não termos responsabilidade sobre alguém estar num lugar X onde não devia, e isso interfere com algum direito nosso, que teríamos o direito de matá-la.

Talvez o ponto da responsabilidade seja mais ou menos parecido com o que imagino que seja provavelmente a sua posição quanto a DIU e/ou gel espermicida.

Provavelmente não vê uma responsabilidade apenas pelo ato sexual em si, ou seja, não é apenas porque tem espermatozóides livres no corpo da mulher e que algum deles vai/pode eventualmente fecundar algum óvulo que já se deve ter "responsabilidade", e não se pode matar os gametas; a responsabilidade é para com o que considera uma vida humana, que seria para fins práticos com a fecundação, pelos seus critérios (com quaisquer ressalvas necessárias sobre não ser exatamente o começo da humanidade mas a proteção à vida "humana" ter que começar daí).

Eu considero que isso se estende até o início da atividade cerebral. Não vejo sentido em se iniciar com a fecundação assim como você provavelmente não vê em se ter alguma obrigação implícita apenas por excitação sexual, preliminares ou ejaculação dentro da vagina (muito embora de qualquer forma você possivelmente seja capaz de encontrar diferenças que considere cruciais entre as coisas).



O aborto também não é, a partir do pressuposto que a vida propriamente "humana" tem atividade cerebral, uma opção exatamente utilitarista, rótulo que só faria sentido se considerando que há algo feito contra uma pessoa (embrião ou feto) para o bem de um número maior de pessoas (provavelmente os pais). Se não consideramos que faz sentido falar em vida humana sem haver ainda (ou não mais) atividade cerebral, isso não é mais utilitarista do que decidir não engravidar. E depois que de fato há uma pessoa, com a atividade cerebral, não há a possiblidade de uma opção utilitarista.

Se você acha mesmo que esse critério de atividade cerebral é inventado depois para justificar uma medida que na verdade todos saberiam "ser" utilitarista, e que por falta de escrúpulo moral adotariam mesmo assim, fico curioso com a sua posição anterior, já que disse que foi "abortista". Você considera que esses adjetivos todos que aplica aos "abortistas", sobre falta de ética, de honestidade, de responsabilidade, etc, se aplicavam a você? Era a favor de matar quaisquer pessoas, até mesmo indefesas, desde que isso beneficiasse a um número maior de pessoas, e tinha o critério de atividade cerebral ou viabilidade apenas como uma desculpa, como uma fachada?
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Re: Por que e quando o aborto é moralmente aceitável - o tópico

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Anna escreveu:
Não haver nenhum registro científico de partenogênese humana não exclui a possibilidade de sua existência, há vários casos de grupos de animais onde nunca houve registros, que recentemente receberam tais registros. No que diz respeito a construção de hipóteses e discussão científica a partenogenese humana é, então, excluída por não haver como ser testada ou medida.

Entretanto, o caminho como levam o debate em questão está no âmbito subjetivo entre a crença pessoal e o conhecimento (epistêmico), portanto não há motivo algum para não incluir e discutir a hipótese incluindo a possibilidade de partenogênese, CASO houvesse partenogenese humana como uma possibilidade.



Oi Anna, quanto tempo hein?

Entao, eu nao exclui a partenogenese do rol de coisas possiveis, eu questionei qual e a sua validade nessa discussao uma vez que nunca foi observada.

Uma discussao como essa deve centrar-se em fatos, e nao em especulacoes, e e isso que o lado abortista parece nao compreender.


Existem vários pontos interessantes a serem extraídos do que se sabe de partenogênese. Se argumentamos pelo potencial de se tornar humano, o fato de que óvulos podem por vezes sozinhos se desenvolver em fetos que só são distintos dos normais através de exame genético, e talvez até poderem de fato nascer, serem pessoas, teria implicações importantes.

Poderia ser quanto às práticas que teriam que talvez ser revistas para se conformar com esse potencial que antes era de certa forma desconhecido, que aproxima muito o óvulo do zigoto (e até do feto, ou mesmo de pessoas, caso tenham havido casos), ou talvez o que se tivesse que se rever fosse o próprio critério de potencial de desenvolvimento.


user f.k.a. Cabeção escreveu:
Eles especulam que a vida comeca numa determinada semana onde o cerebro atinge um certo grau de maturidade


Isso não é uma "especulação", e nem é exatamente essa a frase. A vida precede esse estágio de desenvolvimento, assim como também precede a fecundação, e os pró-vida não "especulam" que ela comece aí, mas a valorizam apenar a partir desse evento celular.

Do outro lado, também não se "especula" sobre o início da vida, se considera propriamente humano, digno de proteção à vida, a partir da atividade cerebral, que sabemos que se inicia apenas em uma determinada semana.




user f.k.a. Cabeção escreveu:eles especulam que milhoes de mulheres morrem em abortos clandestinos (o que na verdade e mentira), eles especulam que as criancas pobres que nascem vao virar bandidos necessariamente,


Eu não especulo nenhuma das duas coisas, ao menos. Eu não sei exatamente o que você pensava quando era "abortista", mas não generalize todos pelo que realmente pensava, ou, não faça espantalhos.

Também ainda não sei exatamente quais são os números das mortes. Só dei uma breve lida nos tópicos referentes a isso, e houveram alguns questionamentos pertinentes. Não é de qualquer forma, de importância central para a questão, é uma das coisas que só faz sentido argumentar se já não se considerasse o aborto em qualquer estágio como matar uma pessoa.



user f.k.a. Cabeção escreveu:
eles especulam que elas prefeririam morrer a nascer pobres.


Mas isso é piada, não é?

Parece que tudo que se diz escorre pelo ralo, e depois reclama de eu ter pensado que uma reclamação sobre a argumentação tinha sido uma repetição de uma reclamação freqüente.

Enquanto isso especificamente, acho que talvez NUNCA tenha sido dito aqui. Talvez por um ou outro mais lesado, mas seria mais ou menos como eu pegar frases esporádicas do emmmmmmcri ou sei lá de quem e atribuir generalizadamente aos pró-vida.







user f.k.a. Cabeção escreveu:
E agora parece que o sr Zumbi filosofo introduziu uma nova especulacao: a de criancas paternotas. Mas ele poderia ter especulado sobre uma crianca vir do futuro e dizer para a mae dela abortar, ou entao pior, um adulto vir do futuro e se tornar o pai dele mesmo.


Na verdade eu até fiz isso como paródia em um tópico onde eram levantadas questões irrelevantes sobre clones.




user f.k.a. Cabeção escreveu:
Eu estou apenas colocando um fato na mesa: criancas paternotas nao existem. E se um dia passarem a existir, que o caso delas seja analisado separadamente, talvez levando em consideracao uma eventual analogia ao tratamento dado ao caso de fetos oriundos de estupros, como sugeriu o Usuário deletado. Mas com cuidado nas generalizacoes.


Na verdade, ainda não se sabe se não existem. De aproximadamente dezenove casos, apenas na Inglaterra, um cuja possibilidade de partenogênese não pode ser excluída, ao menos pelas técnicas da época em que os casos foram estudados (por volta de 1950, se não me falha a memória).

Há de qualquer forma, mais casos (ao menos 25) de fetos que surgem de partenogênese, e tem que ser removidos porque a "gestação" não se dá no útero, como se tem que fazer mesmo com fetos normais.



Por outro lado, se a vida humana não importa, e sim ela ter sido criada por ou não uma ação consciente, acidental ou propositalmente, isso de qualquer forma não importaria, eventuais humanos resultantes de partenogênese poderiam ser sempre mortos, como seria com os filhos de estupradores.

A menos talvez que já sejam bastante disponíveis anticoncepcionais anti-ovulatórios, pois aí poderia se imputar responsabilidade na mulher pela ovulação, tornando assim a vida do óvulo importante... :emoticon26:
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Trancado