Publicado no Jornal O Estado de São Paulo
Fonte: http://www.estado.com.br/editorias/2006 ... p34406.xml
Sem saber que desrespeitava lei do islamismo, grupo que defende o Al-Ansar se hospeda em cidade sagrada
Autor: Eduardo Maluf

Cinco brasileiros foram centro da crise que provocou a prisão de um dirigente, a deportação de outro e, provavelmente, o rebaixamento de um time para a Segunda Divisão do Campeonato Saudita. Sem nenhuma culpa e sem saber de nada, infringiram uma das leis fundamentais do islamismo: os não-muçulmanos não podem entrar na sagrada cidade de Meca, na Arábia Saudita, onde nasceu o profeta Maomé e onde é mantida a pedra sagrada da religião, a Caaba. Eles ficaram horas no local proibido, com o aval da diretoria do clube, passaram por apuros e viveram situação inusitada.
A história começou na noite de quarta-feira, 25 de janeiro. Os brasileiros do Al-Ansar, time de Medina, chegaram a Meca - acompanhados do restante da delegação - para enfrentar o Al-Wahda, equipe da cidade, pela competição nacional. Os cinco: o zagueiro Dênis, que atuou pelo Palmeiras em 2003, os atacantes Celso, ex-Vasco e Inter-RS, e Moisés, ex-Rio Verde-GO, além de Gaúcho, técnico, e Marcelo Guerreiro, preparador físico.
Após o jantar, na véspera do duelo com o Al-Wahda, os brasileiros seguiram para o quarto do hotel em que o elenco estava hospedado. Por volta das 3 horas da madrugada de quinta-feira, 26, três policiais entraram em suas habitações, os acordaram e exigiram que todos deixassem o local imediatamente. "Havia, além dos policiais comuns, policiais religiosos; eles ficaram sabendo que nós estávamos lá", conta Dênis. "Fomos levados para Jeddah (cerca de uma hora distante de Meca), onde normalmente os estrangeiros costumam ficar quando têm de jogar em Meca."
Os não-muçulmanos são liberados para jogar em Meca, mas, habitualmente, só chegam à cidade e ao estádio momentos antes da partida. Assim que termina o confronto, precisam ir embora.
O fato de os brasileiros terem se hospedado no hotel dos colegas sauditas, dentro de Meca, provocou rápida reação das autoridades locais. Dênis e seus companheiros se livraram de punição. Não foram considerados culpados. Mas o clube e seus dirigentes estão pagando muito caro pelo desrespeito ao islamismo. O secretário da agremiação, um egípcio, responsável pela organização da viagem, foi deportado. O gerente do Al-Ansar, um saudita que chefiava a delegação, foi preso e terá de cumprir dois anos de pena. O presidente, um riquíssimo empresário, foi afastado. E, como se não bastasse, a equipe, considerada mediana no país, ainda deverá ser automaticamente rebaixada para a Segunda Divisão, independentemente da colocação final no Campeonato Saudita.
Para constar, o confronto entre Al-Ansar e Al-Wahda terminou empatado: 0 a 0.