Estado declara guerra à homeopatia antidengue e apreende remédio hoje
São José do Rio Preto, 28 de março de 2007
Andrea Inocente
Carlos Chimba

Complexo homeopático contra a dengue foram distribuídas em UBSs
A Secretaria de Estado da Saúde declarou ontem guerra ao medicamento homeopático contra a dengue distribuído pelo município nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Todas as 23 UBSs de Rio Preto, além de farmácias de manipulação particulares, estão proibidas de administrar ou prescrever à população o complexo homeopático contra dengue adotado pela Prefeitura como forma de conter o crescente número de casos da doença – já são 867 registros desde o início do ano. Desde o último dia 17, o medicamento era distribuído pela Secretaria de Saúde tanto para pessoas com sintomas da doença como para assintomáticos, ou seja, quem nunca teve a virose. A medida contra a distribuição do complexo foi baixada pelo Centro de Vigilância Sanitária Estadual, órgão vinculado à Secretaria de Estado da Saúde, que interdita a partir desta quarta-feira o medicamento distribuído pela Secretaria de Saúde local. Segundo a diretoria da Vigilância Sanitária Estadual, o medicamento, além de não ter registro no Ministério da Saúde, estaria sendo administrado de forma irregular.
Hoje, técnicos da Direção Regional de Saúde (DRS-XV) irão inspecionar as farmácias de todas as unidades de saúde de Rio Preto e apreender todos os frascos do complexo homeopático. Nota oficial distribuída pela Saúde Estadual afirma que a Prefeitura de Rio Preto não tem seguido regras de manuseio e distribuição. Técnicos da Secretaria irão verificar se o produto pode até mesmo contaminar a população, causando graves riscos à saúde. A Secretaria – diz a nota – verificou que o produto vem sendo oferecido à população indiscriminadamente, até mesmo sem receita médica e para pessoas que não estão com dengue. As normas brasileiras para produtos homeopáticos, definidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), proíbem que haja distribuição de uma mesma fórmula em larga escala, sem que o produto seja individualizado.
O material será levado para São Paulo, onde será testado pelo Instituto Adolfo Lutz. Além da interdição, a Vigilância Sanitária Estadual afirmou que vai denunciar o município ao Ministério Público por irregularidades na distribuição de medicamentos. “Apesar de não haver nenhuma notificação de efeito colateral, a Secretaria de Estado da Saúde teme que isso possa acontecer”, afirmou Maria Cristina Megid, diretora da Vigilância Sanitária Estadual. “Qualquer tipo de medicamento, mesmo que homeopático, deve ter prescrição individual e personalizada. Oferecer um complexo à população indiscriminadamente, sem sequer receita médica e até para pessoas que não estão com a doença é um grande risco para a população. Não há nenhuma prova de que esse complexo tenha algum efeito”, disse.
“O secretário de saúde de Rio Preto já sabia da irregularidade. O município foi oficiado sobre a distribuição irregular do medicamento no último dia 15 de março pelo Estado. Inclusive, nós enviamos para ele As pessoas pensam que estão protegidas e acabam se descuidandotoda a legislação da Anvisa que normatiza a distribuição de medicamentos homeopáticos. Ele ficou de rever a posição. É importante frisar que não estamos dizendo que o medicamento tem algum problema, mas que a forma de prescrição está incorreta”, afirmou a diretora da Vigilância Sanitária Estadual.
19 mil pessoas já tomaram
Em 10 dias, 19.440 pessoas foram às Unidades Básicas de Saúde (UBSs) de Rio Preto em busca do complexo homeopático criado para amenizar os sintomas da dengue e restringir a cadeia de transmissão da doença. Balanço da Secretaria de Saúde de Rio Preto mostra que 96,7% daqueles que receberam o medicamento não apresentavam os sintomas da doença. Além de Rio Preto, as gotinhas contra a dengue também chegaram até Cuba. Depois de ter contato com o medicamento, o país de Fidel Castro elevou o complexo homeopático contra a dengue, testado pioneiramente em Rio Preto, em 2001, à categoria de tratamento padrão nos casos de epidemia. O complexo foi aplicado em Havana e Camaguey. Os próximos a buscarem o modelo homeopático rio-pretense no tratamento da dengue são os paraguaios. O composto foi desenvolvido pelo médico homeopata rio-pretense Renan Marino. O medicamento é formado por três substâncias químicas: o Eupatorium 30 CH, retirado de uma planta americana; o Crotalus horridus 30 CH, veneno de uma cobra cascavel norte-americana; e o Phosphoros 30 CH, fósforo mineral.
Distribuição será normal
De acordo com o secretário de Saúde de Rio Preto, Arnaldo Almendros de Mello, o município sequer foi comunicado da interdição do complexo homeopático contra dengue e deverá continuar distribuindo o medicamento normalmente em todas as unidades de saúde. “Fiquei sabendo da medida pela imprensa, essa decisão do Estado só nos faz refletir sobre os interesses alheios que estão atrás da medida e escancara o conflito de interesses nesse assunto. Divulgar primeiro para os veículos de comunicação sem sequer consultar a Secretaria de Saúde é uma postura estranha, pra não dizer fascista”, disse. Para o secretário, a decisão da Secretaria de Estado da Saúde é também um desrespeito com a homeopatia. “Tirar a credibilidade de uma prática homeopática é uma invasão muito grande. Essa súbita preocupação do Estado é suspeita, principalmente em termos epidemiológicos já que a atuação da Secretaria de Estado só deixa a desejar”, afirmou.
De acordo com Mello, se não tiver um mandado de segurança ou liminar que autorize a entrada nas unidades de saúde, a Vigilância Sanitária do Estado sequer pode inspecionar as farmácias dos postinhos. “Temos gestão plena em Saúde concedida pelo Ministério da Saúde, a distribuição do medicamento homeopático tem até o aval inclusive do presidente da Anvisa”, disse. Sobre o pedido de alteração na distribuição do complexo relatado pela diretora da Vigilância Sanitária Estadual, o secretário de saúde confirma o contato do Estado. “O órgão realmente entrou em contato com a gente, tanto que o município publicou uma portaria na última sexta-feira para normatizar a dispensação. Uma das decisões foi suspender a prescrição para pacientes assintomáticos”, afirmou. Para o homeopata Renan Marino, responsável pela implantação do tratamento homeopático no sistema municipal de saúde de Rio Preto para os infectados pelo vírus da dengue, a medida do Estado foi equivocada. “Alegar que 50 frascos de 10 ml cada um é escala industrial é extremamente questionável. O entendimento do Estado é medíocre. A população tem de cobrar e o Estado tem de responder sobre isso”, diz.
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