
E os espíritas de plantão aqui do RV, pensam o quê a respeito? É caridade?
Rifas: plantando sementes ruins
Autor: Josué de Freitas
Chegou em nossas mãos, carta do Centro Espírita Amor e Caridade, da cidade de Bauru, SP, dirigida por Richard Simonetti, oferecendo às instituições espíritas "a oportunidade de arrecadar recursos financeiros para seus serviços, de maneira prática e simples, sem envolver nenhum investimento". Trata-se de uma grande rifa, feita há 23 anos (?), como diz a carta. A instituição que se interessar pelo presente de grego deverá solicitar o mínimo de 500 bilhetes e terá 50% da renda das papeletas vendidas. A coisa é mesmo de considerável monta, pois estão em jogo carros, computadores e televisores.
Também nos chegou às mãos, um outro bilhete de rifa, dessa vez idealizada pela Federação Espírita do Estado de São Paulo - FEESP, com o sugestivo nome de Loteria da Feesp. Sob o argumento de que precisa terminar sua nova e suntuosa sede, a instituição está rifando um carro Corsa e um apartamento para angariar fundos.
À primeira vista, o sorteio promovido por Simonetti pode parecer um grande negócio e os mais desavisados e pouco preocupados com os aspectos morais do que fazem, abraçam a idéia e ainda agradecem o bondoso coração do ''idealista'', pelo que pensam ser uma grande caridade.
No caso da FEESP, o problema se agrava, pois, como federação, já não é a primeira vez que se transforma num mal exemplo às casas filiadas. Sua atitude abre um grave precedente para a disseminação desse mau hábito nas instituições espíritas, notadamente nas que recebem sua orientação. A FEESP desenvolve um importante trabalho de divulgação doutrinária, desempenhando um relevante papel no meio espírita, tendo portanto, que ter redobrado cuidado com suas ações, desde que muitos grupos nela se espelham. Atualmente, vemos no mundo todo uma febre pelo consumo como sinal evidente do crescimento do materialismo na sociedade. Em nosso país, o hábito de rifas e bingos remonta a épocas idas, mas nos últimos tempos, depois da malfadada legalização da jogatina pela lei Zico, um vendaval desse péssimo costume varreu o país inteiro, certamente trazendo dissabores a muitos irmãos.
Compreende-se que práticas dessa natureza encontrem eco nos corações de pessoas que ainda não alcançaram a magnitude da oportunidade reencarnatória e ainda se deixam levar pela sede de ganho fácil, ilusão causada por todos esses meios de "exploração das más tendências humanas", como dizia Gandhi, quando condenava esses costumes. Entretanto, torna-se incompreensível quando tais expedientes são defendidos por pessoas que dizem professar uma doutrina de libertação do Espírito dessas mesmas más tendências. Pior, quando são utilizadas com a capa da beneficência, levando a criatura a crer que está praticando um ato de caridade, sem observar a sua conseqüência moral.
As rifas, bingos e similares dentro dos centros espíritas já foram assuntos amplamente debatidos pelos meios doutrinários de comunicação, sendo objeto de preocupação da Federação Espírita Brasileira - FEB e do Conselho Federativo Nacional - CFN, tendo esses órgãos chegado a um consenso de que tais práticas não eram eticamente saudáveis como meio de arrecadação de recursos para as instituições. Mas quem liga prá isso?
A justificativa apresentada por Simonetti, ao final da carta, de que "trata-se de promoção autorizada pelos órgãos governamentais competentes, em que o comprador está contribuindo em favor de uma causa justa" não resiste a uma argumentação lógica. Ora, senhores, nem tudo o que é legalizado é moralmente aceito. Basta ver em muitas sociedades atreladas ao materialismo, a legalização do aborto, da pena de morte, das drogas, da união entre homossexuais e até mesmo da eutanásia. Em algumas regiões do país, parlamentares estão com projeto de lei tentando a legalização da prostituição. Qualquer pessoa com o mínimo de bom senso percebe que essas coisas transcendem os limites da racionalidade. Então, os fins justificam os meios? O escritor e a FEESP parecem entender que sim. Dentro deste raciocínio poderemos louvar a atitude dos traficantes de drogas, quando dão assistência material às suas favelas, mesmo que seja com dinheiro tirado da podridão humana. Aqui, mais uma vez, evocaremos a sabedoria de Gandhi: "Que lhes aproveita curar alguns corpos se, ao mesmo tempo, morrerem mil vezes mais almas?".
É prudente que as casas espíritas que receberem esse indigno convite como a carta do Simonetti ou a Loteria da Feesp, dêem como resposta o silêncio, não compactuando com tamanha insensatez. Rifas, bingos ou jogos de qualquer outra natureza, embora legais, são desleais e antiéticos. Não faz sentido que essas práticas, não condizentes com a caridade cristã, sejam trazidas para dentro dos centros espíritas.
Entendemos que há duas coisas a considerar: uma, que a Federação Espírita Brasileira - FEB, se posicione no sentido de alertar com urgência aos seus filiados (federações e centros) que não imitem a federativa paulista. Há risco do movimento ser contaminado por uma onda de rifas beneficentes, envergonhando a causa do Bem. Outra: está mais que na hora de Richard Simonetti e a Federação Espírita do Estado de São Paulo - FEESP, fazerem uma melhor avaliação sobre a ética de tal procedimento.
Texto publicado no jornal A Voz do Espírito, edição 86, 1997
http://www.novavoz.org.br/polemico-13.htm