Mas de quem é a culpa?
“(...) tão triste — ou até mais — do que a tortura com pedigree, aquela exercida contra militantes de esquerda no passado, é a que existe ainda hoje nos presídios brasileiros. Imaginem se cada preso comum acionar o Estado por conta de maus-tratos ilegais sofridos cotidianamente nas cadeias. Ocorre que essa gente não conta com a disposição militante para fazer proselitismo. Não existe uma comissão especial para cuidar do assunto. A esquerda, como sempre, só dá pelota para o "seu povo", não para 'o' povo.”
O trecho acima é de um post deste blog do dia 26 de novembro do ano passado. E, de fato, reproduz um outro que eu já havia escrito em... 2004. É evidente que a tortura é prática corriqueira nas cadeias brasileiras e que isso é detestável. Diante da exposição da barbárie, como se viu no Pará (ler notas abaixo), quem acaba sempre pagando o pato é uma tal “sociedade”. Culpados sem endereço e que não podem ser fotografados quase sempre são mero truque retórico.
Quem é “a sociedade”? Por mais que o seu Zé da Esquina não tenha lido Rousseau ou Beccaria e acredite que o preso tem mais é de ser esfolado, o estado brasileiro não é obrigado a lhe dar bola. Aliás, ele é ignorado em tantas outras coisas, por que teria de ser ouvido nesse particular? A sociedade dispõe de leis que protegem os presos. Conta com Poderes instituídos que obrigam o detentor do mandato público — ou um seu delegado — a cumpri-las. Vigiando a todos está o Ministério Público. A “sociedade” já paga toda essa gente para cumprir a sua tarefa.
Que o homem comum não esteja especialmente preocupado com o bandido preso, compreendo. Aliás, acho esse traço até saudável. Já lhe basta ser ameaçado nas ruas. O constrangimento a que foi submetida a menor L. numa cadeia paraense não é culpa de quem vitupera contra “os direitos humanos para bandidos”, mas de quem não cumpre o seu dever funcional de garantir os direitos próprios a um detido. Mais um pouco, e ainda vão jogar nas costas da “direita” o que acontece nas cadeias de dona Ana Júlia Carepa. Ou então, por que não?, nas do Capitão Nascimento... Isso é só guerrilha ideológica. Que tal punir os responsáveis com nome, cargo e endereço?
O que acho curioso é outra coisa, que motivou aquele meu texto de 26 de novembro do ano passado. “Estepaiz” tem uma das legislações mais avançadas quando o assunto é indenizar os que sofreram maus-tratos durante o regime militar — e também os malandros que embarcaram na onda. E quanto mais medalhão e influente era quem reivindicava a reparação, maior a indenização. O Estadão traz reportagens que demonstram que alguns anônimos receberam só caraminguás.
Pois é. Até hoje, só em indenizações pagas a ex-militantes e/ou familiares, o país já arcou com R$ 3,5 bilhões. As pensões custam todo mês, ao estado brasileiro, R$ 28 milhões — nesse valor, está a mais indecente delas, a de Lula. O valente recebe uma mensalidade por ter sido “perseguido” pela ditadura militar. Nunca lhe encostaram a mão, e ele jamais deixou de receber salário do sindicato — à diferença dos grevistas que ele liderava, que tinham de se virar. Muitos perderam o emprego. Lula estava cavando o seu empregaço, o maior da República. É indenizado por quê?
Assim como não foi “a” sociedade que decidiu essas indenizações, não é “a” sociedade que tortura presos e que transforma presídios em pocilgas. A responsabilidade cabe à incúria e à desídia de quem tem a competência legal para fazer valer as leis. Já basta culparem a coitada pela existência dos criminosos.
Lugar de bandido é na cadeia, sim. E com o menor número possível de regalias. São Paulo prova que, quando mais marginal preso, menos assassinatos, menos crimes, menos violência. As leis que garantem a dignidade de quem está sob a guarda do estado já existem. Mas, na maioria dos casos, não são cumpridas. Aliás, não se cumpre boa parte da legislação que protege também quem não é bandido. E, obviamente, nesse caso, ninguém se lembra de culpar as pessoas que se opõem à tal política de direitos humanos para presos.
Sem essa de tentar fazer uma agenda passar em lugar da outra. O Brasil precisa de mais e melhores presídios. Ainda há muito bandido solto. E precisa começar a cumprir as leis que existem. E atribuir a responsabilidade pelos descalabros a quem tem. Que tal começarmos por verificar a contribuição efetiva da tal Secretaria Nacional de Segurança Pública e da Secretaria Nacional de Direitos Humanos na melhoria dos nossos presídios?
Quem culpa todo mundo não culpa ninguém e só livra a cara dos reais culpados.
http://veja.abril.com.br/blogs/reinaldo/
Mas de quem é a culpa?
Mas de quem é a culpa?
TULIO
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