Acauan escreveu:zumbi filosófico escreveu:A favor do estágio e/ou contra essa subordinação fiel a um processo (por acaso, biológico). A favor do estágio, acho que o principal é que em todo o restante do tempo, exceto nessa questão de pró-vida ou escolha, é o estado de atividade cerebral que é valorizado por todo mundo.
Consideramos as pessoas vivas quando cerebralmente vivas, e mortas quando não, independentemente dos outros tecidos e células diversas poderem ser mantidos vivos. Porque nos consideramos mais do que "vida" nesse sentido estritamente biológico, citológico (é interessante que o tempo todo você enfatize que é muito mais do que isso, e eu simplesmente não consigo ver).
O que você apresentou como argumento de defesa da relevância do estágio é na verdade um argumento em defesa da relevância do processo.
Explico.
Se a morte cerebral tivesse todas as características que tem, mas fosse reversível, deixaria de determinar o destino da pessoa na qual foi diagnosticada.
Ou seja, o que torna a morte cerebral decisiva é o fato de ela demarcar o final do processo, o encerramento definitivo da vida. A simples ausência de atividades eletro-químicas representadas pelo eletroencefalogramo nulo, por si só, não teriam o mesmo significado sem esta situação de contexto mais amplo.
No caso do embrião ou feto, ou seja lá como queira chamar, a ausência de atividade cerebral marca o início do processo, ou seja, se analisamos isoladamente as características dos dois estágios, eles se equivalem, mas se analisarmos as características de cada estágio do ponto de vista do processo eles são opostos e assim deveriam implicar em conseqüências opostas.
Pode-se argumentar que é impossível separar da morte cerebral seu aspecto de irreversibilidade, o que tornaria o argumento meramente teórico, mas esta idéia de irreversibilidade também se tinha da morte cardíaca antigamente.
Mesmo que a morte cerebral fosse reversível, ainda seria argumentável o início da atividade cerebral como marco da vida propriamente humana em vez de meramente celular-humana, não importando que esse início seja considerado como determinado pela fecundação e parte do processo de desenvolvimento.
zumbi filosófico escreveu:E simplesmente não importaria que estivesse determinada essa acefalia como estado final do processo. Todos se perguntariam "mas E DAÍ?"
E enquanto o embrião é "acéfalo", no sentido de não haver ainda se formado a cabeça, a discussão é em função da possibilidade e alta probabilidade do estado futuro, dele vir a ter uma cabeça.
A questão do "ainda" e do "enquanto" fazem toda a diferença do mundo, tanto quanto pacientes em coma não estão disponíveis para ser mortos justamente por causa das possibilidades de recuperar sua consciência.
Para mim, o "ainda" anterior ao início da atividade cerebral é mais ou menos equivalente ao "ainda" anterior à fecundação ao qual você não dá importância "humana". Para mim, o fato de o embrião "ainda" não ter iniciado sua atividade cerebral, ou sequer ter cérebro não é comparável a redução de atividade cerebral de coma ou do sono, ou mesmo de uma hipotética morte cerebral reversível, por não ter se iniciado, tal como a fecundação que ainda não ocorreu, não te importa.
O grande problema da ética abortista é que de certa forma ela reduz a dignidade humana a uma espécie de corrida contra o tempo, na qual alguém diz "matem logo este embrião antes que ele forme um sistema nervoso e aí não teremos mais desculpas para matá-lo".
Acho que podemos tentar continuar a discussão toda sem fazer valer a lei de Godwin. Um hipotético pró-óvulo também poderia dizer isso da ética "anti-óvulo" e você simplesmente acharia ridículo, por todos os motivos que já expôs, por considerar ridículo que a dignidade humana fosse determinada já na ovulação. Simplesmente, o fato de estar lá determinado o desenvolvimento ontológico com a fecundação, não desperta em todo mundo a mesma compaixão com o ser humano que desperta em você e em outros. É bem próximo do incompreensível (digo isso mesmo após ter sido pró-vida durante a maior parte da minha vida), de forma similar a que é para vocês o respeito do óvulo não fecundado como humano.
Entenda, não necessito argumentar aqui que ele é, factual e incontestavelmente, tão bom quanto o zigoto (embora eu veja dessa maneira), o objetivo aqui é apenas ilustrar a estranheza do conceito. Você se pergunta "mas é daí que no óvulo maduro já há distinção genética da mãe, individual, e etc? Ele ainda tem possibilidades infinitas pela frente, então não é ninguém" (sem intenção de qualquer espantalho aqui). Para outros essa simples restrição das "possibilides infinitas" para um genótipo é tão relevante quanto é para você a distinção genética entre o óvulo e a mãe. E assim, a sua defesa da legalidade de métodos contraceptivos diversos, para ele seria vista como uma matança em nome de hedonismo e sei lá mais o quê, mas para você isso não faz sentido, é só uma célula ainda sem "importância humana". Para nós, também é o caso do zigoto, e diversos estágios posteriores. Não vale para judeus, para indigentes, comunistas, etc. Iniciada a atividade cerebral, as nossas opiniões provavelmente devem convergir em 100%. Aí você não se importa mais com meras células humanas, elas deixam de ser especiais, e o que importa é o processo ou estado de atividade cerebral.
zumbi filosófico escreveu:Não devemos obediência aos processos biológicos de modo geral, mesmo que já tenham sido biologicamente determinados, mesmo se tratando de vida humana - não de maneira tão simples e literal assim.
Obviamente não devemos obediência aos processos biológicos, mas devemos obediência aos valores éticos atrelados de alguma forma, em maior ou menor grau, aos sistema biológicos.
Algumas diferenças são irrefutáveis, como um ser humano em desenvolvimento é diferente de um ser não-humano, tanto um cérebro que deixou de funcionar para sempre é diferente de um cérebro que irá começar a funcionar e outros fatos auto-evidentes, mas que podem ser sofismados infinitamente quando substituímos as impressões diretas que recebemos da realidade pela interpretação ideológica orientada para um determinado fim.
Concordo. Mas ainda não vejo porque as diferenças biológicas óbvias (e irrefutáveis, incontestadas) entre zigoto e óvulo fazem do primeiro já tão humano. Ainda me parece que apenas com muito esforço se distingue a "humanidade" de ambos.
Na verdade, o que vejo é que você pode distinguí-los de diversas maneiras, meio "além" da bioquímica; dizer que óvulo tem infinitas possibilidades futuras, então sua individualidade não importa "huamanamente", e o zigoto já tem pai, mãe, e uma situação sócio-econômica e cultural implícitas. Eu acho que muito disso pode, ser igualmente aplicado ao óvulo antes da fecundação, e ainda que você me convencesse que não, que estou absolutamente errado, que não é um ponto de vista seu, mas uma verdade universal que o óvulo não tem nada de relevante e tudo se aplica apenas após a fecundação e não um nanosegundo antes, não vejo apenas nessas determinações, genética e sócio-culturais, o surgimento da "humanidade".
Recapitulando, de forma similar que talvez alguém pudesse "ver" algo mais nas diferneças do óvulo ovulado e no imaturo, que para você são "humanamente" insignificantes.
zumbi filosófico escreveu:E suspeito que o mesmo seria verdade se tentássemos vê-los não como biológicos mas como "existenciais", considerá-los apenas processos, sendo a biologia subjacente um mero detalhe. Não que não possam haver exceções. Uma exceção seria o próprio processo de atividade mental humana, que não é só um estado, mas também processo, que não podemos interromper.
Do ponto de vista existencial temos um indivíduo definido, sendo que o corpo deste indivíduo ainda está em desenvolvimento. Desde a fecundação, como já disse, já estão definidas para a futura criança quem são seus pais, seu sexo, em condições normais a época de nascimento e na grande maioria dos casos o país, língua e costumes no qual será criado. Você pode achar isto tudo irrelevante, mas não pode atrelar esta alegada irrelevância a outra coisa que não sua opinião pessoal.
Mas eu penso que a importância dada a essas coisas é também apenas sua opinião pessoal. E acho que provavelmente que nem dá tanta importância assim na realidade. Acho que valoriza humanos com atividade cerebral (ou mesmo em estágios pré-natais anteriores a atividade, muito provavelmente), mesmo que numa situação onde essas coisas todas fossem desconhecidas ou indeterminadas. Mãe cerebralmente morta, sem identidade ou nacionalidade conhecida, que tivesse hermaforditismo ou probabilidade desconhecida de se desenvolver num sexo ou outro, e estivesse em getação em algum tipo de "área internacional", e não tivesse então nenhum idioma determinado.
Não acho que considere que uma pessoa nessas condições extremas valha nem um pouco menos que uma pessoa com essas condições determinadas da melhor forma possível. Seria então, algo que eu "cortaria" da argumentação, até porque, penso que em menor grau é algo defensável até antes da fecundação; mais indefinido, tal como essa hipotética pessoa, mas ainda assim, também tem "potenciais" parecidos - a futura mãe já tem seu país, tem seu idioma, sua condição sócio econômica X, talvez tenha um marido/namorado que iria ser o futuro pai para complementar isso. Sobra praticamente apenas a genética. Eu não vejo a genética como de qualquer importância na dignidade humana, mesmo que o cérebro funcional em última instância se deva a ele. Também se deve às leis da física, mas também não devemos um tipo de "devoção" às leis da física em função disso. Para mim não importa um eventual caso de indeterminação genética mais ou menos análogo ao da pessoa anterior de indeterminação social, o que quer que isso pudesse ser, geneticamente.
zumbi filosófico escreveu:Isso não significa que essa subordinação a processos devesse ser um ponto de partida para decisões morais ou legais, de modo geral, termos que privilegiar processos em detrimento de estágios determinados, apenas porque há esse encadeamento causal.
Há uma confusão muito séria no parágrafo acima.
O que está em discussão nesta polêmica não é se temos que necessariamente tomar este ou aquele ponto de partida para avaliar os desdobramentos morais do aborto, mas entre três pontos de partida propostos, a concepção, a formação do sistema nervoso e o nascimento em si, qual deles é preferível do ponto de vista ético, dentro do melhor julgamento do que seja dignidade humana.
Na verdade eu fui ainda mais abrangente. Não acho que o fato de processos determinarem estados signifique que necessariamente devemos privilegiar os processos e por algum motivo, seguí-los até qualquer que seja o seu estado final ou qualquer estado "natural". Não vejo razão para abstrairmos valores morais desse princípio básico. Inclusive, acho que poderíamos passar horas e horas listando um monte, digamos "coisas" que consideramos mais ou menos consensuais que podem ser interrompidas, e ficar numa guerrinha de refrasear a coisa como estado ou processo, ou colocar no limite de uma coisa e outra e etc.
Você mencionou mais adiante na mensagem que eu tentava refutar uma regra com meia dúzia de exceções, mas não acho que sejam poucas as "exceções", acho que deve ser no mínimo algo como 50:50, se não forem mais "exceções" do que coisas cuja interrupção dos processos seria imoral. Havendo ainda todo o problema de linguagem, de diversas coisas poderem ser consideradas ambos, procesos ou estágios e etc.
Se você realmente pensa que isso é algum tipo de "regra geral" para abstrair a moral (porque foi mais ou menos o que entendi da argumentação toda), talvez queira dar uma explicação mais "isolada" desse contexto todo, ou apontar para alguma referência qualquer, algum filósofo ou qualquer coisa do tipo que já tenha defendido isso. Acho, no entanto, que devem existir inúmeros outros sistemas morais que simplesmente ignoram isso sem nem refutar, além dos que contestam e etc.
Mas resumindo essa parte, não vejo o porque dessa hierarquia entre processos e estados deva ser fielmente seguida, seja de modo geral, seja especificamente nesse caso, ou especificamente se falando da fecundação em detrimento de algum estágio do desenvolvimento. Acho que tal como você qualifica os processos como "contingentes" e portanto mais importantes, poderia dizer que os estados são "superiores", "mais específicos", ou qualquer coisa do tipo. Além de outros "pontos de vista", como já disse, a ovulação poder ser vista como parte do processo reprodutivo que precede e é necessária para a fecundação e assim é mais importante que ela. Enfim, acho que por esse caminho é mais provável ficar se discutindo fraseamentos diversos do que o porque a "humanidade" já estaria lá no zigoto ou se estaria só mais adiante.
zumbi filosófico escreveu:Se o resultado é indesejado, e não há impedimentos legais, não somos de modo geral moralmente impedidos de abortar o processo. Não apenas por isso, por devoção ao processo em si, ao menos. Se houver impedimento legal ou moral, é porque interfere com os direitos de outra parte, e aí talvez a coisa se mostre de certa forma novamente tautológica, falando de proteção à vida a partir da concepção.
Vamos fazer uma breve analogia. Na Alemanha nazista os judeus eram indesejados e não havia impedimentos legais ao assassinato deles, isto torna o holocausto moralmente aceitável?
Lei e moralidade têm uma correlação desejável, mas não necessária.
Ficou um tanto mal escrito, obviamente não defendo que a moral deva simplesmente seguir a lei, pois sendo o aborto ilegal aqui, então não teria nem discussão, acabado, é imoral e pronto. Eu dava continuidade:
se houver impedimento legal ou moral, é porque interfere com os direitos de outra parte, e aí talvez a coisa se mostre de certa forma novamente tautológica, falando de proteção à vida a partir da concepção.Ou seja, apenas continuava a argumentação contra essa obediência a processos; podemos interromper quaisquer processos de modo geral, se assim desejarmos, por qualquer motivo que seja - a menos que isso prejudique a alguém, e de forma considerável como imoral. No que tange a essa discussão, não considerando todos os estágios de desenvolvimento como "alguém", o aborto seria permissível em alguns; não considerando, não seria.
E não há tautologia a partir do momento que a concepção define uma identidade humana, mesmo que quem irá fisicamente assumir esta identidade esteja em um estágio muito inicial de desenvolvimento.
Antes que volte com as analogias absurdas com o óvulo não fecundado, um embrião já pode ser definido como filho de determinado pai e de determinada mãe desde seus instantes iniciais de desenvolvimento e a partir desta condição pode-se analisar o potencial de direito que este filho já possui perante seus pais e a responsabilidade de seus pais perante ele.
Acho que talvez tenha havido um desentendimento.
A tautologia no caso seria que, está aqui em discussão se o zigoto já é ou não alguém; se tratando da relevância do processo em detrimento de um estágio (apenas), seria tautológico se tudo fosse resumido mais ou menos nessas linhas:
A: O aborto é permissível em algum estágio?
B: Não, pois o processo que forma qualquer estágio é superior aos estágios, não podem então ser interrompidos.
A: Mas por que o processo não pode ser interrompido?
B: Por que a interrupção em qualquer instante do processo já estaria provocando a morte de alguém.
Assim, somente, é tautológico. Se em algum momento você define que é essa sua concepção de identidade huamna que importa, e não simplesmente o fato de ser um processo, deixa de ser tautológico, mas também deixa de importar que é o desenvolvimento um processo, e que outros estágios hipotetizados como permissíveis para o aborto sejam determinados por esse processo.
Se a partir da fecundação a célula está num estado que já considera "humano", então isso é praticamente irrelevante.
Ainda é discutível, no entanto, se esse estado que considera "humano" para início de conversa é mesmo ou não. Queira ou não, há vários pontos em comum entre óvulo e zigoto, e como disse repetidas vezes, não é apenas por repetir que esses não são os seus critérios pessoais de humanidade que eles se tornam absurdos e os seus se tornam verdades absolutas.
Para um hipotético pró-óvulo a identidade do óvulo já seria suficiente, apenas a "maternidade" e todos os fatores sócio-culturais existentes no momento da fecundação poderiam ser defendidos como suficientes para fazer do óvulo, com qualquer que seja o seu eventual pai, uma pessoa. Para você não é obastante, você quer a determinação parterna, e eu não vejo ambas as coisas como muito diferentes ou relevantes para a "humanidade", conforme ilustrei anterioremente.
Ninguém disse que é insignificante. Ou melhor, você disse, logo, espero que sua intenção não fosse me atribuir palavras que não são minhas.
Lembra-se das infinitas possibilidades?
Não né?
Como repeti milhares de vezes alhures, as possibilidades de um óvulo gera individualidade vão do zero – aquele que não é fecundado – a infinitas, consideradas todas as combinações possíveis com todos os espermatozóides existentes.
Em infinitas possibilidades de individualidades geráveis não há uma individualidade que possa ser destacada ou (no caso dos gêmeos) um muito pequeno grupo de individualidades, o que equivale a dizer que nenhuma individualidade humana pode ser associada ao óvulo não fecundado.
Antes que retorne ao papo de individualidade genética do óvulo, lembre que estou falando da e você levantou a questão da individualidade existencial humana, que é outra coisa que abrange a primeira e a supera também potencialmente ao infinito.
Eu acho, partindo de um ponto de vista que ou é neutro quanto a questão do óvulo ser ou não gente ou talvez que assuma isso, argumentável que:
- o óvulo, que é uma célula humana, tal como o zigoto, morre se não fecundado (implicando na possibilidade de uma "morte humana" que poderia ser evitada, se o consideramos humano o suficiente);
- qualquer que seja o resultado genético/social específico da fecundação, ele será sempre humano - a "humanidade" da pessoa está portanto pré-determinada no óvulo e não depende de especificidades, que podem variar;
- em diversos cenários hipotéticos, com variados graus de realismo, poderíamos conceber pessoas que não tem diversas desssas determinações, e ainda são pessoas de qualquer forma;
- a menstruação implica sempre na morte do filho-óvulo da mulher que o menstruou; ela não terá um filho específico, ainda que ele nunca tivesse sido "completamente determinado" e fossem consideráveis como infinitas as suas possibilides de determinação "extra".
Eu sei que esses simplesmente não são os seus critérios, que não considera isso identidade suficiente, devem ser mais completo, etc. De forma similar, seus critérios podem ser considerados insuficientes.
zumbi filosófico escreveu:E eu não imagino por que, existencialmente, sob essa noção de seria tão mais importante um processo, e não um estado, o estado zigótico/diplóide (ou, da "determinação da identidade", para fugir do jargão biológico - o que não quer dizer que não estejamos falando de biologia, de qualquer forma) de repente seria superior ao processo ao qual está subordinado, o ciclo reprodutivo. Quero dizer, não imagino outra razão senão a coisa toda ser essencialmente um modo de criar uma aparência de maior embasamento intelectual/filosófico à noção pró-vida de que a vida "se inicia" na concepção.
Talvez o problema esteja aí. Quando você não consegue imaginar alguma coisa parece que automaticamente considera a coisa que não consegue imaginar como bobagem e consequentemente como bobagens todos os desdobramentos racionais dela derivados.
Isto tem ficado muito claro ao longo desta discussão.
Talvez esteja também aí o problema da sua rejeição da comparação com a proteção à vida desde a ovulação.
Mas muito provavelmente irá objetar, defendendo que os seus critérios, os elementos que vê como determinantes do valor humano no estado zigótico são verdades absolutas, enquanto a valorização de menos elementos é como dizer que o fogo é molhado ou qualquer coisa do tipo.
Ainda que, como eu demonstrei, você de fato provavelmente valoriza menos elementos (exemplo da orfã sendo gestada por uma mulher com morte cerebral desconhecida, que você deve valorizar independentemente da satisfação de todos esses elementos). Ainda que talvez possa refrasear como "valores negativos" atribuídos às variáveis, e que, logicamente, podem em qualquer dos casos, para muitas das variáveis, mudar ao longo da vida sem que a pessoa se torne menos humana - mas o "direito" de ter vagas ou mutáveis as variáveis não é dado ao óvulo antes da fecundação.
...
Agora estou ficando confuso. Como cocilio isso:
Só para constar, se quiser volte ao começo desta postagem onde respondo sobre este outro espantalho que é a "obediência ao processo", obediência que você inventou e aparentemente tenta me atribuir.
Com isso:
zumbi filosófico escreveu:Assim, essa parte da argumentação referente à "submissão a processos determinados", continua me parecendo apenas uma "roupa nova do imperador".
O que lhe parece é absolutamente irrelevante para a validade do argumento, uma vez que até agora você não conseguiu prová-lo inválido logicamente, fica apenas repetindo suas opiniões a respeito, o que pouco importa para os resultados da discussão.
Há no mínimo uma leve sugestão disso da "obediência aos processos", que acabou de dizer ser um espantalho, não ter sido "refutado"
Ao mesmo tempo me parece sugerir que não está se falando de qualquer processo e estado de forma geral, mas desses especificamente, que, nessas circunstâncias, teriam as implicações éticas X e Y. Sendo que toda a parte do processo parece praticamente inútil para definição da "humanidade" do óvulo, uma vez que ela já é dada como certa desde o estado zigótico. No máximo seria uma reafirmação do que é o zigoto, que todos sabem. Depois parece falar de estados e processos generalizadamente.
Em minha simplicidade eu me limitei a dizer que o processo precede, abrange e determina o estágio – o que não pode ser desmentido logicamente de modo algum, é uma verdade auto-evidente derivada das próprias definições dos elementos citados.
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Sim, OK. Agora, no que tal afirmação, seja numa aceitação mais genérica ou preenchendo com as variáveis específicas da questão, torna em algo evidente e necessário que a "humanidade" esteja presente no zigoto?
Já você diz coisas como "estados podem valer mais que processos" e não apresenta nenhuma justificativa para sua afirmação, achando que ela deve ser aceita apenas porque você acredita que seja assim.
... eu gostaria de recomendações de alguma escola filosófica, autores, que defendessem o que quer que seja isso que você está defendendo aí, quem sabe alguém escreveu de algum jeito que eu compreendo melhor, ou acho algo do tipo "processualismo existencial for dummies".
Vou tentar listar alguns processos que considero que possam ser interrompidos, mesmo que iniciados, além de gestação:
- o desenvolvimento de doenças individuais, genéticas ou não
- o processo reprodutivo, seja através de menstruação/contracepção ou aborto "pré-cerebral"
- proliferação de epidemias
- proliferação de pragas
- a ocupação urbana de áreas perigosas
- escoadores podem ser ativados em caso de enchente
- o processo de ocupação de prédios sob risco de desabamento
- uma viagem que se queira interromper
- uma refeição que se queira interromper
- o sono de alguém se houver necessidade
etc
Nesses casos, pode ser que estados justifiquem a interrupção desses processos, ainda que, como eu tenha dito anteriormente, provavelmente será quase sempre possível atribuir um estado a um processo e fazer da coisa semânticamente irrefutável - apenas porque acho que devem ser mínimos estados totalmente estáticos e consideráveis como desvinculados de qualquer processo.