user f.k.a. Cabeção escreveu:
Mas o fim da obrigatoriedade não significa o fim do ensino. É isso que eu tentei dizer.
Nem eu disse que significa. Embora o que signifique também seja algo preocupante.
user f.k.a. Cabeção escreveu:
Pois é. Eu sou contra qualquer tipo de burocratização da educação, mas no atual estágio de contaminação, é preciso pensar em soluções reais e aplicáveis, e que por essa razão envolvam alguma dose de burocracia, do que ficar falando sobre um mundo ideal e libertário. Não porque as idéias completamente libertárias não funcionem, mas por culpa da tirania do status quo que estipula a dependencia de uma certa dose de burocracia pelo simples fato das pessoas acreditarem piamente na necessidade dela.
Eu acredito que a burocracia atual na maioria dos países, no caso da educação, existe como um meio de garantir que o serviço seja prestado com qualidade e seja realmente necessária para isso, e não que seja apenas a tirania de uma situação atual perniciosa injustificada. Burocracia excessiva prejudica qualquer sistema, mas não acho que seja o caso. As pessoas realmente acreditam que precisam da burocracia, mas no geral é por bons motivos, assim como os que você mesmo vai apresentar para evitar que o sistema que você defende se corrompa. Um sistema educacional totalmente libertário seria altamente segregacionista e por conseqüencia prejudicaria a sociedade como um todo, na minha opinião.
user f.k.a. Cabeção escreveu:
Assim, eu tenho bastante apreço pela idéia de vouchers educativos por exemplo, para restauração da qualidade, diversidade e competitividade no setor educativo. As escolas passariam a ser empresas privadas e as famílias seriam subsidiadas com cheques escolares, e poderiam agir como consumidores escolhendo as instituições de ensino mais adequadas para seus filhos. Com o reestabelecimento da propriedade privada, as escolas competiriam por alunos e desperdiciariam menos recursos, se ocupariam de avaliar a qualidade dos professores e o desempenho dos estudantes, como toda empresa privada preocupada em melhorar sua produtividade.
A liberdade na composição dos conteúdos poderia permitir, por exemplo, o desenvolvimento de escolas voltadas para a formação técnica profissional, com grades curriculares adaptadas, e mais objetivas e curtas, algo extremamente necessário e escasso no Brasil, assim como outras possibilidades que não podem ser antecipadas mas que a existencia de um mercado torna reais. Essas escolas formariam operários e motoristas, encanadores e mecânicos, marceneiros e pintores que fossem competentes, e isso teria muito pouco ou nada a ver com o fato deles terem ou não ouvido falar de Charles Darwin.
Algum nível de gerenciamento burocrático seria necessário para evitar fraudes, tais como açougues registrados como escolas que trocam cheques escolares por carne, ou escolas de doutrinamento fascistas e comunistas, mas essa fiscalização por sua vez não precisaria ser algo centralizado e poderia ser deixado a cargo das comunidades locais (assim como as leis que definiriam os critérios escolares mínimos e certas exigências curriculares), podendo ser feita por comitês de pais, pela imprensa e etc.
School choice. Este sistema é interessante, mas as experiências na Suécia e em Washington mostram que o quanto ele é bem sucedido depende da sociedade onde ele é implementado, não sendo uma fórmula infalível.
Na Suécia, o school choice foi implementado em 1992 e é considerado um sucesso. O sistema é utilizado até hoje, se tornando o sistema educacional oficial do país e continuado por governos de direita e esquerda, a sua retirada é pouco discutida. Entretanto, o sistema não mostra uma superioridade significativa na qualidade do ensino em comparação com países que utilizam o sistema público e particular comum em testes internacionais. A Suécia conseguiu apenas o 22º lugar entre 57 países no último teste do PISA (Programme for International Student Assessment) em 2006, organizado pela OECD. O teste é realizado com alunos de 15 anos, visando a qualidade da educação básica nos países participantes.
Outro fator importante que deve ser levado em consideração é que na Suécia não existia o setor privado na educação antes da implementação do sistema. Não havia o risco de a maior parte da população migrar para escolas particulares, pois estas não existiam.
Podemos considerar que, na Suécia, o sistema funciona satisfatoriamente. Já a experiência americana não tem sido tão tranqüila.
A National School Boards Association acusa o sistema, implementado em Washington D.C. pelo governo federal em 2004, de diversas irregularidades e problemas estruturais, baseada em estatísticas do próprio governo.
Despite predictions by voucher proponents that the program would enable students to attend a better school, the federally mandated evaluation of the program has twice found no significant academic differences in reading and math between private school voucher students and Washington, D.C. public school students. In addition, a 2007 review by the U.S. Government Accountability Office (GAO) uncovered several accountability problems with the program, suggesting that many resulted from a lack of detailed fiscal policies and high staff turnover at the non-profit entity that operates the program. Among the problems:
- Voucher funds were spent for students’ tuition at some schools that do not charge any tuition for non-voucher students.
- Students from Washington, D.C. public schools “in need of improvement” are vastly underrepresented in the voucher program although the law stipulates that they are to receive priority for receiving a voucher. In 2006, just 24 percent of participating voucher students had been enrolled in schools in need of improvement, whereas 52 percent of all DCPS students attend such schools. (Note: participating private schools are permitted to maintain their admission standards).
- In a randomly selected sample of 18 participating private schools, three lacked a building occupancy permit, six had a building occupancy permit but not to operate as a private school or child care center and seven had only an occupancy permit to operate as a child care center.
- In a randomly selected sample of 50 participating students, GAO identified voucher payment problems with 46 of the students.
- Voucher funds were spent on before- and after-school care for 60 percent of students (in the random sample) but in most cases GAO could not determine whether the schools’ services included any academic support activities, as required by the program.
- Though intended to serve K-12 students, it is essentially an elementary and middle school program because so few seats have been made available by private high schools.
O texto completo:
http://www.nsba.org/MainMenu/Advocacy/FederalLaws/SchoolVouchers/NSBAsIssueBriefonPrivateSchoolVouchers.aspxEu sei que existem outras experiências com o método, em outros estados americanos e no Canadá em menor escala, mas acho que a experiência bem sucedida na Suécia e a mal sucedida em Washington já servem pra deixar claro onde quero chegar. Na situação atual do Brasil, com a falta de fiscalização, corrupção, serviços de má qualidade na área da educação e má fé dos governantes, os problemas que surgiram em Washington apareceriam muito maiores por aqui, e até acho que abalariam a fraca estrutura de nosso sistema educacional, aumentando ainda mais a evasão escolar, o analfabetismo e a segregação, dependendo de quais medidas fossem implementadas.
Quero deixar claro que não existe má vontade de minha parte com o sistema propriamente dito, mas acho que apenas em determinadas sociedades já propícias à sua implementação é que o sistema lograria êxito.
user f.k.a. Cabeção escreveu:
Em particular, a idéia de que esse sistema liberal produziria escolas nazistas e comunistas, apenas por não criar regras explícitas contra a existência delas, é simplesmente um erro de perspectiva. Burocratas não são os responsáveis pelas pessoas não aderirem a ideologias viciosas, em geral, eles são os próprios catalizadores dessas ideologias, por perceberem nelas vantagens que lhes permitem aumentar os seus poderes. É porque as pessoas são conscientes o bastante para não engolir esse tipo de discurso (pelo menos não sem muito esforço de dissumulação e propaganda) é que esse tipo de coisa não existe. Pelo contrário, a burocratização e centralização dos currículos e normas que permitiu a lenta infiltração da agenda revolucionária socialista nas salas de aula. Num mercado livre, professores comunistas seriam extintos ou existiriam de forma meramente residual em escolas de comunidades hippies alternativas, e certamente não se proliferariam como ratos tal qual o fazem no sistema burocrático atual.
Será mesmo que seria muito difícil surgir uma escola especializada em economia de cunho extrema-direita fascista caso não haja o que impeça, e também escolas especializadas em formar operários que ensinem coisas como mais-valia e outras idéias comunistas? Se isso não existisse graças ao bom senso das pessoas, a figura clássica do professor de história comunista que doutrina seus alunos não existiria. Ela só existe porque há liberdade para que professores ensinem seus ideais políticos em suas aulas. Toda essa liberdade permite que pessoas mal-intencionadas levem seus planos adiante, mesmo que eles prejudiquem ativamente a sociedade, caso não exista nada que impeça. Se jovens se tornam comunistas na faculdade por culpa das aulas dos professores, que podem ensinar ideais comunistas, já vemos que não se pode contar com o bom senso das pessoas. Coisas que podem prejudicar a educação de um povo ou colocar em risco a sociedade democrática, como o criacionismo ou o comunismo, deveriam ser proibidos de serem ensinados como dogmas nas salas de aula. Não vejo problema em ambos serem estudados, mas nunca poderiam ser ensinados como verdades.
Pra evitar confusão, é bom deixar claro que as sociedades que utilizam o sistema dos vouchers educativos não possuem este problema. Estou me referindo a uma sociedade hipotética libertária demais em que o governo não tivesse controle nenhum sobre as escolas.
user f.k.a. Cabeção escreveu:
Um sistema desses já acrescentaria muito em liberdade e qualidade para o ensino, reduzindo o desperdício e produzindo incentivos corretos para educadores e para alunos. Com o aumento do poder aquisitivo das pessoas (e principalmente com o ganho de noção de que para se ter algo é preciso poupar e pagar diretamente), os subsidios poderiam ser gradualmente reduzidos até que os cotemplados fossem de fato apenas os casos mais graves.
Neste ponto, não existiriam mais escolas públicas, certo? Um aspecto interessante na experiência da school choice na Suécia é que não houve um "boom" no setor privado da educação a ponto de rivalizar com as escolas públicas. As escolas particulares atualmente educam apenas 6% dos alunos no país, depois de quase 20 anos de sistema. Creio que o ideal seria manter, e não almejar que um dia todas as escolas sejam particulares, pois as escolas públicas continuariam atendendo a população mais pobre e com aumento de qualidade.