Nova praga na lavoura

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Jack Torrance
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Nova praga na lavoura

Mensagem por Jack Torrance »

Nova praga na lavoura
Bóias-frias se viciam em crack para cortar mais cana-de-açúcar
São José do Rio Preto, 8 de junho de 2008

Allan de Abreu

Edvaldo Santos
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A.A.S., viciado desde 2007: “Fiquei pior que bagaço de cana”

Os cortadores de cana na região de Rio Preto descobriram um meio arriscado de aumentar a produtividade na lavoura. Para cortar até 18 toneladas da planta durante dez horas por dia, sob sol forte, muitos deles se viciam no crack, uma droga barata que, nos primeiros meses de uso, estimula o corpo e reduz a sensação de cansaço. “Eu parecia um raio no corte. Era o meu biotônico Fontoura”, afirma A.A.S., 25 anos, cortador de cana de Santa Adélia que se viciou em crack no canavial em 2007. Camuflada entre os pés de cana, a droga avança silenciosa. Desde o ano passado, sindicato e entidades que tratam dependentes químicos na região descobriram cerca de 50 cortadores viciados em crack, incluindo migrantes do Nordeste. “Há três anos, não havia droga na cana”, diz Gilmar Cândido Inácio, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Monte Aprazível.

O efeito estimulante do entorpecente para o bóia-fria dura pouco. Com três meses de uso contínuo, o usuário começa a sentir os efeitos devastadores do crack: cansaço físico, aumento da freqüência cardíaca, fissura pela droga. Em dez meses o trabalhador está um trapo humano”, afirma o médico toxicologista Igor Vassilieff. “Eu fiquei pior do que o bagaço da cana”, diz A.A.S., há duas semanas no Lar Bom Samaritano, em Catanduva, que trata dependentes químicos. O rapaz começou a cortar cana aos 14 anos. Em 2006, descobriu a maconha, oferecida por migrantes nordestinos no canavial. “A erva ajudava a relaxar. A gente fumava depois do almoço e na parada da tarde.” No ano passado, A.A.S. conheceu o crack por meio de três cortadores da Paraíba. “Larguei logo a maconha. O crack me deixava um touro, eu esquecia de tudo, a concentração no corte era total. Cheguei a cortar até 20 toneladas por dia. Antes, não passava de 13.”

A droga era comprada nos fins-desemana pelo grupo por R$ 5 a pedra nas bocas-de-fumo do bairro Bom Pastor, periferia de Catanduva. Para não chamar a atenção, esmagavam as pedras do crack e fumavam em cigarros comuns - na cidade, a droga costuma ser consumida em cachimbos improvisados. “Era um cigarro atrás do outro na roça”, diz A.A.S.. O salário mensal, proporcional à produção, chegava a R$ 1,5 mil. A lua-de-mel de A.A.S. com o crack, porém, chegou ao fim em quatro meses de uso diário. “Tudo o que eu ganhava gastava em pedra. Fiquei preguiçoso, não conseguia mais acordar cedo para trabalhar. O crack era o meu café-da-manhã, almoço e janta. Passei a viver pela droga”, diz. Abandonado pela família, o rapaz largou o emprego há dois meses, e passou a viver nas ruas de Catanduva. Até decidir se internar.

Casos como o de A.A.S. são freqüentes no Lar Bom Samaritano. Desde o ano passado, passaram pela entidade cerca de dez cortadores de cana viciados em crack, segundo a psicóloga Patrícia Rocha, que trabalha no local. “Atualmente, temos dois nessa situação”, diz. Na Comunidade Nova Vida, em Votuporanga, foram atendidos seis casos nos últimos 15 meses. O último era um migrante que residia temporariamente em Potirendaba. Em novembro de 2007, por pouco o crack não invadiu a própria entidade. “Havia 20 deles fumando em um canavial vizinho à nossa chácara, onde ficam os internos. Tivemos de alertar o fiscal da turma para que parassem”, diz o coordenador da comunidade, Juvêncio Antônio Ferreira, que já atendeu cortadores viciados do Piauí, Tocantins e Maranhão.

Ganho por produção
A remuneração por produtividade está diretamente ligada ao uso de drogas pelos bóias-frias, na opinião da coordenadora da Pastoral do Migrante, Inês Faccioli. “Enquanto permanecer esse sistema de trabalho, o crack vai avançar no canavial, é inevitável”, diz. “Esses trabalhadores vêm de longe com o compromisso de mandar dinheiro para as suas famílias no Nordeste. Por isso lançam mão de todos os recursos para aumentar a produção e o salário, inclusive as drogas.” No ano passado, documento da Pastoral divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) alertou sobre o consumo de drogas pelos cortadores. Ao contrário dos trabalhadores paulistas, os migrantes são mais arredios ao tratamento. “A maioria volta para a terra natal sem nada”, afirma o sindicalista Inácio. Às vezes, porém, não há volta para os migrantes crackeiros, literalmente. Há dois anos, um cortador de cana do Piauí viciado na droga entrou em depressão e enforcou-se em Poloni.

Edvaldo Santos
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O cortador de cana M.M.P. se recupera do alcoolismo no Lar Bom Samaritano, em Catanduva

Corte da cana ‘espanta’ 4 mil migrantes
A vida dos migrantes nordestinos que se aventuram nos canaviais do Noroeste Paulista é uma romaria de privações. Longe da família, enfrentam o preconceito, as más condições de moradia e o trabalho pesado na lavoura no interior paulista. A Pastoral do Migrante estima que, na safra atual, 10% dos cerca de 40 mil trabalhadores vindos do Nordeste para a região de Rio Preto, cerca de 4 mil pessoas, já regressaram à terra natal por não suportar o corte da cana. “Tudo parece conspirar contra o cortador, principalmente as condições de trabalho”, diz a coordenadora da Pastoral, Inês Faccioli. Só em uma usina de Monte Aprazível, segundo o presidente do sindicato dos trabalhadores local, Gilmar Cândido Inácio, 200 migrantes desistiram do trabalho no último mês. “O sistema de corte da cana é desesperador”, resume Inácio.

Desmaios
As mortes no campo diminuíram (a última foi há quatro anos, em Palmares Paulista), mas ainda são comuns desmaios de cortadores durante o trabalho, causados pelo calor aliado à desidratação. “Se o sujeito não tem uma boa saúde, não suporta muitos dias”, afirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ariranha, José Carlos Bento. A pressão por produtividade no campo cresceu nos últimos dez anos. Se em 1998 a média de corte diário era de oito toneladas, hoje um trabalhador corta uma média de 12 toneladas. “Quem corta menos de dez toneladas está praticamente fora do mercado”, diz Bento. Para cada tonelada, o bóia-fria ganha R$ 3,34, segundo o sindicalista, o que representa um salário médio mensal de R$ 1,2 mil. Para ganhar esse dinheiro no fim do mês, o trabalhador precisa cortar 3,6 quilômetros de cana.

Quando se expande o resultado do suor do cortador para os 501,5 mil hectares de cana plantada na região, surgem os números que animam usineiros e fornecedores de cana: a previsão do Instituto de Economia Agrícola (IEA), do governo paulista, é de que se colham 44,3 milhões de toneladas de cana-de-açúcar no Noroeste Paulista na safra 2008/2009. “O que o setor não vê é que esses números grandiosos que se divulga estão baseados no sofrimento diário do trabalhador”, afirma Rosimeire Cameron, que preside o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Potirendaba.

Trabalhadores sofrem com alcoolismo
Até o início do ano, M.M.P., 34 anos, de Novo Horizonte, vivia uma rotina dura nos canaviais da região. Acordava todos os dias às 4h30, embarcava no ônibus dos trabalhadores e às 6 horas estava na lavoura. “Eu aproveitava o começo da manhã, quando está mais fresco, para cortar mais cana. Depois, com o calor, fica insuportável”, diz. Há quatro pausas durante o expediente. A primeira, por volta das 10 horas, é para o almoço, que dura uma hora. As seguintes não passam de dez minutos. O trabalho só termina por volta das 16 horas.

“Perto do meio dia, o ritmo fica mais lento. O sol é muito forte”, afirma. Na tentativa de amenizar o sofrimento, M.M.P. começou a beber cachaça no canavial. “A gente bebia escondido no meio da cana. Se o fiscal de turma visse, dava gancho (suspensão).” M.M.P. chegava a tomar um litro inteiro de pinga durante o dia no corte. B.R., 38 anos, contraiu o mesmo vício. Nascido em Marapoama, B.R. conta que a bebida era um alívio para o corpo durante o corte. “A pinga tirava a dor nas costas. Na roça, eu não me separava da garrafa de cachaça por nada.” Hoje, ambos estão em tratamento no Lar Bom Samaritano, em Catanduva.

Usinas ignoram droga na cana
A Associação dos Produtores de Açúcar, Álcool e Energia (Biocana), que reúne as usinas da região, desconhece o uso de drogas pelos cortadores de cana. “Não sabemos de nenhum caso concreto”, disse Leila Alencar Monteiro de Souza, gerente-executiva da entidade. Leila ressaltou que todas as usinas ligadas à Biocana têm trabalhos de prevenção ao álcool e às drogas com seus trabalhadores. “São palestras, dinâmicas de grupo e até teatro. Todas as informações sobre os danos causados pelas drogas são repassadas ao cortador”, disse.

As usinas, segundo ela, também têm assistentes sociais que acompanham de perto a rotina dos trabalhadores. “Elas visitam as moradias (dos lavradores) constantemente.” A reportagem contatou na semana passada a Associação dos Fornecedores de Cana de Catanduva, mas uma funcionária informou que somente o presidente, João Pedro Gomieri, poderia falar sobre o assunto, e ele estava em viagem. Só voltaria amanhã.

Ferdinando Ramos
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O promotor Henrique Lima Correia: “Jornada diária dos cortadores de cana é penosa demais”

Promotor vai investigar crack no canavial
O Ministério Público do Trabalho (MPT) em Rio Preto vai investigar o uso de crack pelos cortadores de cana. “Eu desconhecia esse problema na região, mas, com base na reportagem do Diário, vou instaurar um inquérito para apurar o caso”, disse o promotor Henrique Lima Correia. Para o promotor, a “invasão” do crack nos canaviais do Noroeste Paulista é reflexo direto das más condições de trabalho dos cortadores. “A jornada diária dessas pessoas é penosa demais. A droga surge como um escape.” Nos próximos dias, ele pretende enviar fiscais do MPT para verificar o uso de entorpecente pelos cortadores. Assim como a Pastoral do Migrante, Correia acredita que o crack só vai desaparecer da lavoura quando o salário do bóia-fria deixar de ser vinculado à produção individual - a droga é usada para aumentar a produtividade do trabalhador. “Infelizmente, esse sistema de pagamento pela mão-de-obra é legal, previsto na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Embora o corte da cana seja extremamente penoso, não há adicional de penosidade na lei.” Atualmente, segundo o promotor, os acordos coletivos firmados pelos sindicatos dos trabalhadores são o único modo de eliminar o pagamento por produção. “A Promotoria está de mãos atadas”, disse Correia. A maioria das entidades, porém, defende o pagamento por produção individual. “Se o sistema atual acabar, as usinas não irão pagar R$ 1,4 mil, que é o salário médio do cortador hoje”, afirmou Rosimeire Cameron, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Potirendaba. “É por isso que nenhum cortador quer ganhar salário fixo.”

Proposta
Há um projeto de lei na Câmara dos Deputados que elimina o pagamento por produção nos canaviais, do deputado federal João Dado (PDT), de Votuporanga. Pela proposta, o trabalhador receberia um salário fixo, com adicional de insalubridade de 40% e jornada diária de, no máximo, seis horas. “Com a presente medida, pretendemos incitar o debate sobre a atividade laboral dos cortadores de cana, segmento de mão-de-obra rural que reclama urgente atenção”, afirma o deputado no projeto. A proposta foi aprovada pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara, e aguarda votação em plenário.

Os efeitos da droga:


:: O crack é formado pela mistura de cocaína, bicarbonato de sódio ou amônia e água destilada, resultando em grãos que são fumados em cachimbos. No canavial, as pedras são prensadas e fumadas em cigarros

:: O consumo do crack é maior que o da cocaína, pois é um entorpecente mais barato. Seus efeitos começam a ser sentidos em 15 segundos, contra 10 minutos da cocaína inalada

:: Devido à sua ação sobre o sistema nervoso central, o crack gera aceleração dos batimentos cardíacos, aumento da pressão arterial, dilatação das pupilas, suor intenso, tremores, excitação, maior aptidão física e mental. Os efeitos psicológicos são euforia, sensação de poder e aumento da auto-estima

:: Uma vez inalado pelo usuário, a dependência do crack é imediata. Com três meses de uso contínuo, a droga começa a prejudicar os batimentos cardíacos, levando à taquicardia e até ao infarto. Também destrói o sistema nervoso central

Fonte: Reportagem

Droga pode levar ao enfarte
Sob efeito do crack, o trabalhador consegue duplicar a produção diária, segundo o médico toxicologista Igor Vassilieff, que fez pesquisas sobre o uso do entorpecente pelos cortadores na região de Botucatu (SP) no início da década. “A droga funciona como um estimulante. Mas é errado dizer que o crack reduz o cansaço. Na verdade, há uma diminuição na percepção do cansaço pelo cérebro. O corpo se desgasta pelo acúmulo de ácido lático nos músculos”, diz. É por isso que, em oito meses de uso contínuo, afirma o médico, o trabalhador “mal consegue erguer o podão (facão utilizado no corte da cana)”.

“O crack é devastador para o organismo. Ele ataca principalmente o coração, acelerando o batimento cardíaco e ‘cansando’ o órgão. São comuns casos de enfarte entre os usuários.” O efeito da droga no organismo dura, em média, quatro horas. Mas a presença do crack na corrente sangüínea é detectada até três dias depois do uso. “É um dos entorpecentes mais potentes que se conhece”, diz o toxicologista. Com seis meses de uso, segundo Vassilieff, o usuário começa a sentir tristeza e depressão. “São comuns casos de suicídio envolvendo os dependentes”, afirma.

‘A vida deles é miserável’
Para a socióloga Arlete Fonseca de Andrade, além de aumentar a produção na lavoura, o uso do crack é um recurso do cortador de cana para minimizar a baixa auto-estima. “A vida deles é muito miserável, cheia de privações. A droga funciona como um escape dessa realidade, porque transmite ao usuário uma sensação de poder”, afirma. O uso do crack pelos cortadores foi tema da dissertação de mestrado de Arlete na PUC, em São Paulo. “O consumo de drogas é uma forma de serem aceitos e incluídos em qualquer grupo social”, diz.

Para a socióloga, a “invasão” do entorpecente no canavial é conseqüência da violência social e moral existente na cadeia produtiva da cana-de-açúcar desde o Brasil colonial. “Mesmo com a modernização tecnológica nesta década e o ‘boom’ do etanol no Brasil e no mundo, o setor ainda se baseia em uma cultura de trabalho arcaica, com trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão”, afirma Arlete. Na dissertação, a pesquisadora não exime o poder público de responsabilidade pelo problema. “A ausência de recursos públicos na assistência às populações rurais faz com que informações sobre a droga não cheguem a esses indivíduos”, afirma Arlete no trabalho acadêmico.

http://www.diarioweb.com.br/noticias/co ... cia=108845
“No BOPE tem guerreiros que matam guerrilheiros, a faca entre os dentes esfolam eles inteiros, matam, esfolam, sempre com o seu fuzil, no BOPE tem guerreiros que acreditam no Brasil.”

“Homem de preto qual é sua missão? Entrar pelas favelas e deixar corpo no chão! Homem de preto o que é que você faz? Eu faço coisas que assustam o Satanás!”

Soldados do BOPE sobre BOPE

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Wallace
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Re: Nova praga na lavoura

Mensagem por Wallace »

Putzzzz, pensei que seria mais uma incursão do MST. :emoticon12:
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Trancado