user f.k.a. Cabeção escreveu:ímpio escreveu:Não vejo porque deve-se considerar alguns estágios mais dignos do que coisas que podem ser bastante análogas a teratomas, óvulos ou fetos anencefálicos, apenas porque são fases do desenvolvimento normal.
Considero como importante o estado atual, não o futuro potencial, pelo qual se salvaria também o óvulo.
Errado. Veja como o seu argumento do "estado atual" é moralmente inaceitável, bastando considerar o caso de uma pessoa em coma. Essa pessoa será preservada pelo seu futuro potencial.
Da mesma forma, um feto tem um futuro potencial como indivíduo.
Já um óvulo não, a menos que seja fecundado e a partir daí se desenvolva um indivíduo.
Coma não é igual a morte cerebral.
ímpio escreveu:Mas você já está considerando aí a individualidade final do indivíduo, não individualidade no sentido de não ser mais uma célula com o genoma materno, mas com um genoma individualizado, único, ainda que não definitivo.
Um óvulo é um gameta, não é um indivíduo. Seres humanos não são haplóides, logo, o óvulo não é humano.
Ele até pode ser individualizado, mas não como um ser humano. E o argumento é construído todo em sima do respeito à dignidade e potencialidade humana, e não de gametas.
Você está simplesmente usando diploidia como o que separa seres humanos de não-seres humanos, não é algo como uma prova incontestável; para você essa característica dos cromossomos de uma célula é suficientemente dignificante, mais crucialmente ou tanto quanto a "vida cerebral"; para mim é insignificante; não vejo o zigoto ou embrião como algo fundamentalmente mais digno do que óvulo, apenas por seus cromossomos, nem o teratoma, cujos cromossomso já seriam inclusive humanos por esse seu critério mas que você provavelmente não se queixaria se fossem esquerdisticamente assassinados - o que meio que revela que o critério "real" não é o cariótipo.
ímpio escreveu:(diria que mesmo que não fosse, isso não importa, porque não são os genes a meu ver que contam... se uma mãe por alguma anomalia viesse a gestar o próprio clone, ótimo, poderia abortá-lo se assim quisesse antes de dado estágio de desenvolvimento, mas não após)
Mas o ponto é que a individualidade genética vem antes da fecundação, mesmo que não seja a definitiva. E não é por não ser definitiva, que não valha nada indiscutivelmente; se o definitivo é o importante, pode-se apontar aspectos não-genéticos não-definitivos ao momento da fecundação e após, como sustentação do direito de se poder abortar, e justamente é o que faço, só que com a ausência de formação do cérebro.
Não se trata de unicidade genética. Gêmeos idênticos têm genes iguais e ainda assim são indivíduos diferentes. Foi o que eu tentei dizer para a Clara.
Então meio que nem tem ponto em se dizer que o óvulo não seria individual, e por isso pode morrer... o ponto final é que o óvulo é só o óvulo, cuja morte não te importa, e o cariótipo é só uma diferença que se pode apontar entre ele e um zigoto ou algum estágio posterior...
ímpio escreveu:Não é "aniquilar uma criança"; isso é do ponto de vista apenas de quem já vê como crianças efetivas os estágios anteriores à formação do SNC.
Mas a formação do SNC é um critério tão idiota quanto qualquer outro. O indivíduo em fase embrionária é o mesmo, antes e depois da formação do SNC. O que os separa é apenas um intervalo de tempo na história de um mesmo ente.
Mas por esse tipo de argumento, poderia se matar qualquer pessoa livremente, porque indivíduos são apenas intervalos de tempo na história das transformações da matéria.
Não nego que a formação do SNC seja um critério arbitrário, tanto quanto qualquer outro, só não o acho idiota, acho preferível a algum grau arbitrário de individualidade, dois anos de idade ou o que quer que se invente.
Se considerarmos um com dignidade suficiente em si para não ser aniquilado, esta se estenderá automaticamente ao outro ( a menos que este tenha violado alguma lei nesse intervalo que preveja como punição a sua execução ).
Caso contrário a dignidade humana seria produto de seus caracteres, e não da própria condição humana. Alguém com um diploma de Harvard teria mais dignidade humana que alguém com um canudo da Estácio de Sá.
Bem, de certa forma é verdade, mas ao mesmo tempo, o mesmo poderia ser dito sobre se decidir engravidar ou não, eliminando uns óvulos e outros não, sendo decidir quando se engravida já uma espécie de "eugenia" ou qualquer coisa moralmente condenável em vez de tentar se fecundar todo óvulo ovulado.
ímpio escreveu:Mas quanto a afirmar qualquer coisa, pode ser "achismo" se for uma previsão específica que pretende se aplicar em todos os casos, mas dizer simplesmente que não se pode dizer qualquer coisa é essencialmente dizer que planejamento familiar é uma bobagem insignificante e as pessoas podem procriar como coelhos que isso não terá efeitos negativos para ninguém. Certamente você não vê a coisa assim (a menos que veja o planejamento familiar como apenas uma outra face esquerdista insana e burra da economia planificada), apenas vê como suficientes meios os contraceptivos disponíveis ou mesmo abortivos pré-estágio em que não se podem mais formar gêmeos. Não tenho nada contra esses métodos, só acho que outros abortivos poderiam ser liberados até certo grau adicionalmente.
A questão é: considerando o feto um indivíduo, é tolerável que este seja aniquilado com base em estatísticas que dizem que ele terá grandes chances de vir a ser uma pessoa violenta?
Eu não acho que isso faça sentido algum; pois da mesma forma se justificaria genocídios de classes inteiras ou coisas do tipo.
O meu ponto sempre é sobre que também não vejo imoralidade em se matar algo que na prática é bastante análogo a um teratoma, feto anencefálico ou pessoa com morte cerebral, ainda que difiram tecnicamente.
Ao mesmo tempo, não posso negar que planejamento familiar seja algo importante para a sociedade, o que é desvinculado de alguma afirmação do tipo de que todo e qualquer filho não-planejado será a semente do caos e da destruição. Só acho que bom também não é, e que o aborto até dado estágio poderia ser um recurso válido, mesmo que o benefício seja mais individual ou de pequenos grupos do que em efeito em grande escala para a sociedade.