Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

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zumbi filosófico
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:

Uma coisa e constatar que a ordem social depende da existencia, reconhecimento e preservacao da lei, outra coisa e voce dizer a unica forma possivel de se produzir tal fenomeno e atraves da designacao de poderes arbitrarios a certas pessoas sobre outras pessoas, que consiste na definicao usual de Estado.

Do ponto de vista teorico, essa posicao e amplamente problematica, pois se para existir ordem e preciso que certos vigilantes dominem e imponham a sua lei sobre os vigiados, resta saber quem e que vigia os vigilantes, de maneira a garantir que suas deliberacoes nao sejam apenas outra forma de caos?


E qual seria a alternativa, para se ter lei e ordem, ao mesmo tempo em que não se tem os famigerados vigilantes arbitrários?

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Onde quer que o ser humano observe ordem complexa ele observara design inteligente. E exatamente o mesmo argumento do relogio de Paley: o seu intrincado mecanismo induz a conclusao da existencia de um relojoeiro mecanico, assim como a complexidade evidente de um organismo vivo implica na existencia de um "relojoeiro cosmico" ou o sofisticado funcionamento das leis na sociedade induz a conclusao de que elas derivam de algum "relojoeiro social".

Ainda que seja evidente que a explicacao da existencia de certa complexidade a partir da pre-existencia de uma racionalidade criativa ainda mais complexa e insatisfatoria, resta mostrar como estruturas complicadas de ordem podem emergir espontaneamente. Trata-se de um comum engano atribuir a Charles Darwin o pioneirismo no desmonte dessa falacia, mas o exemplo que ele produziu de um mecanismo de ordem espontanea (a "selecao natural") na evolucao biologica e sem duvida alguma de simplicidade e elegancia impares. Mas mesmo assim muitas pessoas ainda resistem a um argumento tao bem construido e tao consistente com os fatos.

Eu especulo (embora nunca tenha lido nada serio a respeito) que isso talvez seja algum condicionamento evolutivo do nosso intelecto, que provavelmente e util para entender coisas simples e com finalidades claras, como uma ferramenta ou uma casa, mas que dificulta bastante a compreensao do comportamento sofisticado emergentes de sistemas de informacao onde existem muitos agentes individuais (que de modo algum fazia parte dos problemas com os quais nossos primitivos ancestrais lidavam quando nosso cerebro evoluiu).
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Sim, provavelmente uma "aposta instintiva" ou intuitivamente aprendida, e pouco arriscada, para um animal tão social como o ser humano é que algo é de tal forma porque alguém assim fez. E devem tender a generalizar mais do que deviam nessa resposta.

Mas o mais importante de tudo é que, ainda que existam processos que façam a ordem emergir espontâneamente, não significa que eles sejam superiores ao planejamento propriamente dito. Não é com os próprios seres vivos em praticamente todos sentidos, talvez com exceção da parte bioquímica, algo que ainda não se tem conhecimento ou tecnologia para inventar algo significativamente melhor ou igual. Mas para isso e para todo o resto, podem existir coisas tão abaixo do ótimo quanto for possível para que os seres se reproduzam.

Transpor isso para o nível de organização social (se é realmente o que você está sugerindo, não sei, espero que não) seria essencialmente o mesmo. Cada um faz o que quer, e vamos ver no que dá. Se houver uma próxima geração, façam o que fizerem, está bom.

Sem falar no ponto que o próprio estado é uma emergência espontânea de organização. Não houve de fato um momento onde alguém disse "pára tudo, está tudo errado... vamos fazer algo... chamemos isso de contrato social... então... agora, vou determinar alguns poderes arbitrários a algumas pessoas e vamos então continuar mais ou menos de onde paramos, mas a partir dessa hierarquia arbitrária que eu inventei".

E os problemas que critica no estado podem muito bem ser vistos como análogos aos problemas resultantes da falta de planejamento da seleção natural. Preservações de estruturas que podem até ter servido a alguma função, mas deixaram de servir. Parasitas, que também originam-se espontaneamente e compõem a maior parte dos seres.


user f.k.a. Cabeção escreveu:[color=#0080ff][b]Alias, isso nao e apenas teorica mas tambem factualmente questionavel. Se as experiencias socialistas recentes provaram alguma coisa foi que a despeito da crenca generalizada nesse sentido, a lei nao e uma massa de modelar das elites dominantes, sejam elas bem ou mal intencionadas. Que as tentativas do Estado de reformar o Homem sao fadadas ao fracasso porque a lei nao e uma emanacao da burocracia superior, mas que e algo mais intrinseco a realidade humana.


Então o fato das sociedades ditas "mais desenvolvidas" serem menos violentas, mais prósperas e até mais "humanas" do que as selvagens, em estágio mais próximo a uma anarquia, ou a emergências espontâneas de organização social inevitáveis, é na verdade uma coincidência estranha, ou até mesmo um erro? Que na verdade o "nobre selvagem" não é um mito?

Steven Pinker faz um bom caso a favor da noção de que as instituições foram ao longo da história "humanizando" o homem, não o tornando mais violento.

http://www.ted.com/index.php/talks/stev ... lence.html



user f.k.a. Cabeção escreveu:[...]

Ainda apegado a algum tipo de animismo criacionista moral, o minarquista e apenas um tipo de socialista que acredita que tais poderes arbitrarios devem ser designados, mas discorda desse ultimo com relacao a extensao desses poderes. Contudo, ambos concordam com relacao ao criterio legitimo para decidir a extensao desses poderes, e o minarquista fica em maus lencois quando tenta questionar a etica socialista com base na sua propria, pois ambas sao equivalentes.

A etica anarquista, por outro lado, e diferente. Ao negar a legitimidade de qualquer iniciativa coerciva, ela nao esta sujeita a cair na mesma armadilha. A lei emerge naturalmente a partir da interacao voluntaria das pessoas, tal qual os mecanismos que preservam essa lei. O Estado nao e a origem da civilizacao mas um legado da barbarie.


Pode até ser eticamente melhor simplesmente propor que ninguém use coerção contra ninguém, mas é uma fantasia ainda maior do que o mais delirante sonho de organização top-down comunista esperar que as pessoas simplesmente ajam assim, sem que ninguém nunca fosse usar de coerção. Também é de se perguntar se pode realmente ser melhor, se não lida com o mundo real?

Crítica comum ao comunismo/socialismo/esquerdismo que é uma linha de pensamento ou política que vai contra a natureza humana, mas esperar que pudesse existir uma anarquia livre de qualquer coerção consegue ser ainda mais contrário à natureza humana, de animal social.

Se essa "anarquia" não é realmente uma anarquia, mas algo não-utópico, meramente uma emergência espontânea de hierarquias não-arbitrárias, o estado já pode ser visto dessa forma, ou, pode-se dizer que viria a existir "algo" que fosse na prática muito parecido com o estado naquilo que faz, de qualquer forma.

Mas ainda assim, me parece bastante defensável que estados não surgiram arbitrariamente, com todos vivendo numa anarquia perfeita, quando de repente decidiram acatar designações arbitrárias de poderes que um cara começou a gritar de cima de um banco.

Hierarquias surgiram espontaneamente, e evoluíram também com uma certa espontâneidade, com emergências naturais, históricas, e é argumentável que é a falta de planejamento, e não a de espontaneidade, o fator mais responsável por arbitraridades criticáveis que existam em qualquer organização.

E eticamente apenas, também não sei se essa "anarquia-não-coerciva" é lá essas coisas. Talvez seja melhor aceitar a coerção como mecanismo válido para evitar a coerção, do que simplesmente esperar que isso deixe de existir por si só, ou lavar as mãos para qualquer forma de coerção que emergir espontâneamente, como se fosse eticamente superior a omissão nesses casos. Quero dizer, se fosse possível algo assim, se dissesse para os presos, "pessoal, o negócio é seguinte: de agora em diante ninguém pode usar coerção, então vocês podem ir embora se assim quiserem; mas se forem, lembrem-se que não não podem mais usar de coerção para obter nada, hein... está combinado..." e isso funcionasse, beleza. Mas a realidade não é essa. E a não-aceitação de coerção seria simplesmente aceitar a posição de vítima de quem quer que se colocasse como agressor. Não me parece muito ético.
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Tarcísio
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Tarcísio »

Que bom que arrumou um tempo pro fórum.
Cabeção, pode me explicar dois pontos que abordou?

Toda a logica e etica da propriedade privada consiste na contraposicao a ideia natural de que aquele que controla mais poder de gerar violencia tem a palavra final.


sou contra a legalização do casamento gay

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Apo
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Apo »

cabeção escreveu:A melhor definicao para o Estado com certeza foi elaborada por Frederic Bastiat:

"L’État, c'est la grande fiction à travers laquelle tout le monde s’efforce de vivre aux dépens de tout le monde."


Simples e verdadeiro, com um porém. Uma pequena parte des ta ficção não é ficção, é um serviço do qual dependemos através da necessidade de uma diretriz básica, sem a qual o primitivo humano faria tudo de acordo com seus interesses ( escusos ou não, mas seus, já que somos diferentes, mesmo vivendo em sociedade).
Se o ser humano não pensasse diversamente um do outro, nem estaríamos discutindo Estado Mínimo. Ele se alastra insidiosamente porque acabamos por desistir de negociar mais do que de viver.

Mas acho interessante que, quando algo com a decisão pessoal acerca de certas ações é levada a debate ( o que evoluiria para uma negociação se fôssemos às vias de consenso para a ação de fato), o Estado é sempre trazido à baile.. através das leis.
Explico: quando uma mulher, casal ou família precisam decidir sobre interrupção da gravidez ou eutanásia, a resposta costuma ser:
- Está na Lei, logo...não se discute.
Mas e a negociação e as diferenças pessoais onde ficam?
Aborto e eutanásia não são questões de mercado? São sim, já que muitas decisões sobre a vida e a morte envolvem processos econômicos em cascata. A menos que o capital seja abstraído aqui, o que parece me auto-engano ou boicote ideológico.
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zumbi filosófico
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por zumbi filosófico »

Todos são iguais na anarquia, mas alguns são mais iguais que outros.
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user f.k.a. Cabeção
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


Ou rapaz, quanto tempo! Outro dia mesmo eu comentei que voce tinha sumido...

Novamente eu fico satisfeito com a sua participacao, afinal voce costuma assumir e expor, com bastante competencia e precisao, praticamente todos os posicionamentos que eu procuro atacar.


zumbi filosófico escreveu:E qual seria a alternativa, para se ter lei e ordem, ao mesmo tempo em que não se tem os famigerados vigilantes arbitrários?


De um modo bastante geral, seria a auto-vigilancia.

Nas circunstancias onde essa nao fosse possivel ou fosse ineficiente, que fossem contratados servicos privados de mediacao, arbitragem, certificacao, reparacao e seguranca.

Como alias ocorre o tempo todo. As pessoas costumam superestimar os efeitos dos trabalhos realizados por burocratas mesmo em sociedades onde eles sao pervasivos, como a nossa. Burocratas contribuem muito mais para o caos social do que para a ordem, como procurarei explicitar adiante.


zumbi filosófico escreveu:Mas o mais importante de tudo é que, ainda que existam processos que façam a ordem emergir espontâneamente, não significa que eles sejam superiores ao planejamento propriamente dito. Não é com os próprios seres vivos em praticamente todos sentidos, talvez com exceção da parte bioquímica, algo que ainda não se tem conhecimento ou tecnologia para inventar algo significativamente melhor ou igual. Mas para isso e para todo o resto, podem existir coisas tão abaixo do ótimo quanto for possível para que os seres se reproduzam.



O problema filosofico aqui e mais sutil.

Nao e uma questao de comparar a eficiencia da ordem espontanea e da ordem planejada. A questao e que num sentido amplo sequer faz algum sentido falar de planejamento.

Alem disso, o que chamamos de "planejamento racional" nada mais e do que um fenomeno de ordem espontanea que nos chamamos de consciencia, que nos permite agir e organizar coisas visando atingir certos objetivos.

A acao humana individual pode ser planejada. A acao de um grupo coeso que comunga em certos objetivos tambem pode ser planejada dentro de certos limites. Alias, esse tipo de postura muito provavelmente era a dominante quando o homem habitava cavernas em grupos de poucas familias. Os objetivos ali eram poucos e comuns. A mentalidade coletivista e planejadora era adequada aquela situacao especifica.

Mas na medida que o homem desenvolveu maior conhecimento tecnico, seus grupos se expandiram e entraram em contato mais estreito com outros grupos, e as hostilidades iniciais com o tempo deram lugar a relacoes de trocas mutuamente beneficas, que so foram possiveis gracas a aparicao de elementos primitivos da etica individualista.

As comunidades de subisistencia com o tempo foram se dissolvendo em familias e individuos, e a "grande sociedade" cada vez menos podia ser associada a um conjunto claro e especifico de objetivos que pudesse dar sentido a algum planejamento central, que por outro lado se tornava cada vez mais impossivel devido ao aumento da complexidade da estrutura de informacao daquela sociedade crescente em numero e heterogeneidade de individuos.



    As circunstancias mais proximas de um objetivo claro e comungado por uma vasta maioria foram os esforcos de guerra e de resistencia. Nao e atoa que esses episodios sempre contribuiram para o crescimento do poder politico e da ideologia coletivista, e que de tempos em tempos os politicos se empenharam em lancar mao desses artificios para conservar ou ampliar seus privilegios.


As leis nao sao planejadas visando objetivos sociais, isso e uma visao animista-criacionistas analoga a ideia do criador racional que antecede logicamente a criatura.

Como F. A. Hayek colocou, as leis e a moral sao fenomenos racionais, e que possivelmente engendram varios elementos universais, mas que nao intencionais ou planejados, nem mesmo podem, ja que "a mente nao pode antever seu proprio avanco".


zumbi filosófico escreveu:Transpor isso para o nível de organização social (se é realmente o que você está sugerindo, não sei, espero que não) seria essencialmente o mesmo. Cada um faz o que quer, e vamos ver no que dá. Se houver uma próxima geração, façam o que fizerem, está bom.


E evidente que nao.

A Lei e justamente o que define o que cada um pode fazer, e como.

Ser contra a existencia de leis e ser contra a civilizacao. O que eu estou questionando e a falacia popular de que identifica a Lei ao Estado, e que para a existencia da primeira o segundo seja imprescindivel ou mesmo apenas conveniente.

Que a relacao mais manifesta entre Estado e Lei e de antagonismo e nao de harmonia.


zumbi filosófico escreveu:Sem falar no ponto que o próprio estado é uma emergência espontânea de organização. Não houve de fato um momento onde alguém disse "pára tudo, está tudo errado... vamos fazer algo... chamemos isso de contrato social... então... agora, vou determinar alguns poderes arbitrários a algumas pessoas e vamos então continuar mais ou menos de onde paramos, mas a partir dessa hierarquia arbitrária que eu inventei".



Aqui de uma certa forma voce tem razao, apesar de observar o problema do angulo errado.

Eu nunca questionei a espontaneidade do processo de formacao das entidades institucionais hoje conhecidas por Estado.

Eu questiono a ma filosofia daqueles que identificam o Estado a Lei, a ma filosofia de quem acredita que tudo precisa ser planejado, quando nem mesmo o Estado o e.

Mas a ideia de que o Estado e uma estrutura emergente pode dar uma falsa impressao, devido a uma definicao imprecisa do termo. Se o Estado for considerado o complexo conjunto de instituicoes atuais que determinam como certas pessoas governaram certos aspectos da vida de outras pessoas, ha que se concordar que esses elementos emergiram espontaneamente. Agora se o Estado for considerado apenas como o elemento etico de comando na sociedade, ele nao emergiu espontaneamente do processo social, mas esteve presente desde a sua origem primitiva. (Obviamente ele emergiu da competicao biologica entre os bandos animais que deram origem a nossa especie.)

Assim o Estado e uma reliquia da nossa organizacao ultra-coletivista primordial.

A ideia de que o estado da natureza e a Anarquia, portanto, e profundamente enganadora. O Estado da Natureza e o totalitarismo coletivista. E a lei do mais forte, pois na ausencia de outras leis, e esta que vigora.

A Anarquia se produz quando a etica individualista emergente e levada as suas ultimas consequencias logicas.


zumbi filosófico escreveu:E os problemas que critica no estado podem muito bem ser vistos como análogos aos problemas resultantes da falta de planejamento da seleção natural. Preservações de estruturas que podem até ter servido a alguma função, mas deixaram de servir. Parasitas, que também originam-se espontaneamente e compõem a maior parte dos seres.


Mas veja que a selecao natural tem seus meios para corrigir esses residuos e vestigios que perderam suas funcoes. Se esses apendices apenas parasitam os organismos, diminuindo sua eficiencia biologica, mutacoes que os atrofiem ou eliminem, sem afetar outras funcoes significativamente serao selecionadas.

Algo similar ocorre na economia de mercado e na sociedade. Se instituicoes que ja tiveram seu sentido perderem sua razao de ser, as pessoas que nao incorrerem nos custos necessarios para a sua manutencao terao vantagens comparativas em relacao as demais. E claro que essa percepcao surge da racionalizacao individual e local a respeito de problemas individuais e locais. Pois esses sao os unicos problemas bem postos na sociedade, aqueles que para os quais e possivel executar planos racionais.

A historia do planejamento central tem sido a historia da arrogancia e do fracasso da razao. Os sucessos e avancos que contribuem para todos os individuos na sociedade tem sido consistemente elaborados pelo planejamento e pela razao individual.



zumbi filosófico escreveu:Então o fato das sociedades ditas "mais desenvolvidas" serem menos violentas, mais prósperas e até mais "humanas" do que as selvagens, em estágio mais próximo a uma anarquia, ou a emergências espontâneas de organização social inevitáveis, é na verdade uma coincidência estranha, ou até mesmo um erro? Que na verdade o "nobre selvagem" não é um mito?

Steven Pinker faz um bom caso a favor da noção de que as instituições foram ao longo da história "humanizando" o homem, não o tornando mais violento.

http://www.ted.com/index.php/talks/stev ... lence.html



Eu nao li Steven Pinker e nao sei exatamente como ele conduz esse argumento de que instituicoes humanizaram o homem.

Mas a ideia de que sociedades selvagens estao mais proximadas da anarquia e bastante questionavel e nao pode ser associada ao meu argumento, que na verdade e o exato oposto.

Isso deriva da falacia de associar Anarquia a ausencia de leis, quando a palavra e um constructo etimologico intencional, que quer dizer ausencia de comando.

O conceito de Anarquia que eu e a maioria dos anarquistas defende e o imperio absoluto das leis, e nao dos reis. Existe uma propensao comum as diversas categorias de nao-anarquistas* de presumir um rei para toda lei, e exatamente essa propensao que eu ataco aqui.

---
*estou ciente que a dupla negacao soa muito mal, mas ela foi empregada para nao usar os ideologicamente carregados termos socialista ou estatista, que parecem ferir os sentimentos de alguns "nao-anarquistas"


zumbi filosófico escreveu:Pode até ser eticamente melhor simplesmente propor que ninguém use coerção contra ninguém, mas é uma fantasia ainda maior do que o mais delirante sonho de organização top-down comunista esperar que as pessoas simplesmente ajam assim, sem que ninguém nunca fosse usar de coerção. Também é de se perguntar se pode realmente ser melhor, se não lida com o mundo real?


Como pode ser delirante se e a base operacional da etica que eu, voce e a maioria das pessoas empregamos no nosso dia a dia?

Que todos os desvios dessa norma sao considerados, corretamente, unanimamente, como atos vis e criminais?

Ja parou para pensar so um pouquinho nisso?

Nao e uma questao de que essa "pode" ser a etica dominante. Ela ja E. E apenas ela que permite a enorme prosperidade derivada da extensiva e descentralizada divisao do trabalho. Ela que permite a gestao de informacao em niveis maiores que os concebiveis por mentes individuais.

A ideia de necessidade uma autoridade central para o fenomeno social e que e um mito. Um mito perigoso.

"Welcome to the real world."


zumbi filosófico escreveu:Crítica comum ao comunismo/socialismo/esquerdismo que é uma linha de pensamento ou política que vai contra a natureza humana, mas esperar que pudesse existir uma anarquia livre de qualquer coerção consegue ser ainda mais contrário à natureza humana, de animal social.


Pois e.

A civilizacao dentro dessa filosofia e uma forma de superar a natureza humana, que certamente e animal.


zumbi filosófico escreveu:Se essa "anarquia" não é realmente uma anarquia, mas algo não-utópico, meramente uma emergência espontânea de hierarquias não-arbitrárias, o estado já pode ser visto dessa forma, ou, pode-se dizer que viria a existir "algo" que fosse na prática muito parecido com o estado naquilo que faz, de qualquer forma.


Recapitulando o que eu ja disse, isso apenas ocorre porque voce se confunde usando duas definicoes de Estado.

Em certas ocasioes, voce considera, em sintonia comigo, o Estado como elemento de violencia coercitiva e imposicao.

Em outras, voce considera o Estado como qualquer manifestacao de lei abstrata.

De uma certa forma voce se prende a "verdade" nada trivial de se demonstrar que essas duas definicoes sao analogas, ou pelo menos na pratica, ja que voce diz que na "pratica viria a existir 'algo' [= a Lei] que fosse muito parecido com o estado naquilo que ele faz [= iniciar violencia]"

Assim, como eu ataco apenas a primeira concepcao, e nao a segunda, voce diz que o Estado existe dentro da minha concepcao etica tambem.

Espero ter caracterizado a clara falacia desse procedimento.


zumbi filosófico escreveu:Mas ainda assim, me parece bastante defensável que estados não surgiram arbitrariamente, com todos vivendo numa anarquia perfeita, quando de repente decidiram acatar designações arbitrárias de poderes que um cara começou a gritar de cima de um banco.


Perfeitamente.

zumbi filosófico escreveu:Hierarquias surgiram espontaneamente, e evoluíram também com uma certa espontâneidade, com emergências naturais, históricas, e é argumentável que é a falta de planejamento, e não a de espontaneidade, o fator mais responsável por arbitraridades criticáveis que existam em qualquer organização.


A primeira afirmacao e verdadeira, mas nao se pode encontrar nenhuma ligacao logica com a conclusao vista a seguir.

Alias, a segunda afirmacao e ainda mais precaria pois como vimos acima e uma tarefa perturbadoramente complicada encontrar algum significado para o conceito de planejamento social centralizado.


zumbi filosófico escreveu:E eticamente apenas, também não sei se essa "anarquia-não-coerciva" é lá essas coisas. Talvez seja melhor aceitar a coerção como mecanismo válido para evitar a coerção, do que simplesmente esperar que isso deixe de existir por si só, ou lavar as mãos para qualquer forma de coerção que emergir espontâneamente, como se fosse eticamente superior a omissão nesses casos.


Veja que existe uma complicacao aqui.

E evidente que a forca pode e deve ser usada para evitar a coercao. Quando legitimamos o uso da forca contra a coercao nao estamos legitimando a coercao contra a coercao.

Coercao e o ato de iniciar violencia, nao de responder a ela.

Uma forca de seguranca ou de justica, seja ela estatal ou nao, nao e necessariamente coercitiva e ilegitima portanto, operando ela dentro da lei, que por sua vez nao e uma emanacao dos burocratas, como vimos.

O meu argumento e o de que a forca monopolizada pelo estado se encontra sobre fortes incentivos para escapar ao controle da lei, e isso ocorre o tempo todo.

Essa e a fonte das confusoes. O Estado controla monopolisticamente os mais visiveis mecanismos de emprego de forca contra a coercao, e mentalmente somos condicionados a achar que o Estado e esses mecanismos sao identificaveis.

E mais ou menos como se o Estado fabricasse monopolisticamente sapatos e acreditassemos que para estarmos calcados (ainda que precariamente) e necessaria a pre-existencia de um Estado sapateiro.

E portanto um mito.


zumbi filosófico escreveu:Quero dizer, se fosse possível algo assim, se dissesse para os presos, "pessoal, o negócio é seguinte: de agora em diante ninguém pode usar coerção, então vocês podem ir embora se assim quiserem; mas se forem, lembrem-se que não não podem mais usar de coerção para obter nada, hein... está combinado..." e isso funcionasse, beleza. Mas a realidade não é essa. E a não-aceitação de coerção seria simplesmente aceitar a posição de vítima de quem quer que se colocasse como agressor. Não me parece muito ético.



Eu nunca disse que uma sociedade sem Estado nao precisaria se defender de malfeitores.

Nao sei se com "instituicoes penitenciarias-correcionais" como as mantidas pelo Estado atualmente, ou com outros metodos de punicao e reparacao.

Mas responder a uma agressao nao e coercao. Coercao e iniciar a agressao. A Etica e contra a coercao, nao contra a defesa.
"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem

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user f.k.a. Cabeção
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Tarcísio escreveu:Que bom que arrumou um tempo pro fórum.
Cabeção, pode me explicar dois pontos que abordou?



Vou tentar explicar mais detalhadamente os pontos gerais. Mas seria bom que voce expusesse o que exatamente te perturbou com relacao a esses pontos especificos.


Toda a logica e etica da propriedade privada consiste na contraposicao a ideia natural de que aquele que controla mais poder de gerar violencia tem a palavra final.



Aqui a situacao e a seguinte.

Existem recursos escassos e agentes individuais que pretendem dar fins concorrentes aqueles recursos.

Para sair da abstracao, pense num carro e duas pessoas querendo ir para lugares diferentes. Se houvesse dois carros nao haveria escassez. Se as duas pessoas quisessem ir para o mesmo lugar os fins nao concorreriam (supondo que as duas coubessem no carro e que elas nao se odiassem mortalmente). Tudo bem simples.

Essa e uma ultra-simplificacao do problema de ordem social.

Como decidir o que fazer?

Existem duas solucoes. Uma delas, a mais natural num certo sentido, e a pessoa que conseguir destruir a outra, ou mostrar que e capaz de destrui-la se quiser, ficar com o carro para ela. Essa e ordem de comando. O problema e que essa ordem pode funcionar em bandos primitivos de poucas pessoas, mas deixa de ser operacional numa sociedade aberta com uma infinidade de individuos e possibilidades. Os custos de ser o mais forte o tempo todo sao proibitivos demais.

A outra e a de se estabelecer previamente uma relacao entre objetos e individuos, uma relacao de propriedade. O indivduo proprietario decide o que fazer com o bem em questao. E exatamente essa solucao e que estabelece as bases da etica que permitem a existencia de uma sociedade aberta.

A ruina certa de longo prazo da estrategia da violencia conduz a adocao da estrategia de nao violencia mesmo pelos individuos que sao mais fortes do que a media ou do que a maioria, na proporcao em que a sociedade em que viverem for grande e complexa em numero e variedade de individuos.


sou contra a legalização do casamento gay




Nao sou contra a cohabitacao voluntaria de dois adultos do mesmo sexo.

Sou contra as medidas que procuram identificar instituicoes onde elas nao existem. Dois homens, ou duas mulheres, ou tres homens, quatro mulheres e dois gorilas, que dividem um mesmo teto sao individuos titulares de seus direitos individuais apenas (exceto pelos "animais de estimacao" eventuais).

Nao ha qualquer direito individual ao reconhecimento, e a instituicao do casamento e familia tradicional e exatamente o reconhecimento do valor daquela uniao dentro de uma tradicao importante da civilizacao ocidental.

Isso nao existe ainda para as cohabitacoes gays, mas nao afirmo que nao possa vir a exisitir um dia. Mas, assim como foi com o matrimonio monogamico de origens judaico cristas, isso so pode ocorrer com o passar do tempo e com a aquisicao de confianca das demais pessoas.

Essas tentativas de legitimacao forcada nada mais sao do que expediente revolucionario camuflado em uma retorica patetica de igualdade de direitos.

PS: se quiser dar prosseguimento ao debate desse ponto especifico eu preferiria que o fizesse em outro topico.
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carlo
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por carlo »

ÔRRA CABEÇA, CÊ É DOIDÃO DEMAIS , CARA!!! CÊ FUMOU UNZINHO, IGUAL QUE NEM AQUELE MENINO DA JAMAICA? E POR FAVOR NÃO APELE COMIGO, SENÃO VAMOS DISCUTIR SE AQUELA ATA DE MONT PELLÉRIN, ERA OU NÃO SECRETA!!!!! POR FALAR NISTO NISTO, SE ELA ERA ABERTA, PORQUE SÓ ELES ASSINARAM??????????

:emoticon12: :emoticon12: :emoticon12: :emoticon12:
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NOSSA SENHORA APARECIDA!!!!

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zumbi filosófico
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Ou rapaz, quanto tempo! Outro dia mesmo eu comentei que voce tinha sumido...

Novamente eu fico satisfeito com a sua participacao, afinal voce costuma assumir e expor, com bastante competencia e precisao, praticamente todos os posicionamentos que eu procuro atacar.



Bastante tempo. Fico honrado em poder representar tão bem a verdadeira essência do Mal, a perfídia intrínseca ao comunismo, e a selvageria inominável da sodomia e do abortismo, em sintetizar tudo aquilo que vai contra o que é bom, decente e correto.





zumbi filosófico escreveu:E qual seria a alternativa, para se ter lei e ordem, ao mesmo tempo em que não se tem os famigerados vigilantes arbitrários?


De um modo bastante geral, seria a auto-vigilancia.

Nas circunstancias onde essa nao fosse possivel ou fosse ineficiente, que fossem contratados servicos privados de mediacao, arbitragem, certificacao, reparacao e seguranca.

Como alias ocorre o tempo todo. As pessoas costumam superestimar os efeitos dos trabalhos realizados por burocratas mesmo em sociedades onde eles sao pervasivos, como a nossa. Burocratas contribuem muito mais para o caos social do que para a ordem, como procurarei explicitar adiante.


Por coincidência há algum tempo atrás eu mesmo estava meio entusiasmado com idéias mais ou menos anarco-capitalistas, ainda que o lado "anarco" na minha visão acabe sendo praticamente eliminado, porque necessariamente alguma hierarquia sempre emerge. É isso o "algo muito parecido com o estado", e realmente me parece meio confuso com a coerção e a lei, que acho um pouco indissociáveis. Meu "buffer" mental não me permite lidar com tudo que foi dito mais tarde (adiante) na mensagem anterior aqui, como talvez fosse melhor, então vou só fazer esses comentários breves e ver se no fim resulta algo suficientemente coerente, edito no que sobrar e etc. Em suma, mais adiante nessa mensagem retomo esse ponto.


zumbi filosófico escreveu:Mas o mais importante de tudo é que, ainda que existam processos que façam a ordem emergir espontâneamente, não significa que eles sejam superiores ao planejamento propriamente dito. Não é com os próprios seres vivos em praticamente todos sentidos, talvez com exceção da parte bioquímica, algo que ainda não se tem conhecimento ou tecnologia para inventar algo significativamente melhor ou igual. Mas para isso e para todo o resto, podem existir coisas tão abaixo do ótimo quanto for possível para que os seres se reproduzam.



O problema filosofico aqui e mais sutil.

Nao e uma questao de comparar a eficiencia da ordem espontanea e da ordem planejada. A questao e que num sentido amplo sequer faz algum sentido falar de planejamento.

Alem disso, o que chamamos de "planejamento racional" nada mais e do que um fenomeno de ordem espontanea que nos chamamos de consciencia, que nos permite agir e organizar coisas visando atingir certos objetivos.


Não se pode desconsiderar o planejamento feito pelo cérebro como "igual" a qualquer outro fenômeno espontâneo, de qualquer forma. Se quer um carro, não vai ficar sentado parado diante das peças esperando que elas se organizem espontâneamente, iria planejar a montagem, ou, melhor ainda, comprar um já pronto, que foi planejado por uma outra pessoa e construído por um processo planejado por outras e etc.

Enquanto o ponto for que, o planejamento não é sempre o melhor meio de se organizar um processo, não discordo. Mas está longe de ser desprezível, e pode ser vantajoso. É bastante razoável supor que empresas, que tem vários graus de planejamento, são mais eficientes que todos os seus funcionários trabalhando independentemente, sem uma coordenação central. Nem, sempre, mas é bem provável que seja verdade em boa parte do tempo, ou as empresas talvez nem tivessem vindo a existir, ou tenderiam a se "desintegrar" em uma complexa rede de freelancers, na medida em que, ao fazer isso, se tornassem mais eficientes e competitivas.




A acao humana individual pode ser planejada. A acao de um grupo coeso que comunga em certos objetivos tambem pode ser planejada dentro de certos limites. Alias, esse tipo de postura muito provavelmente era a dominante quando o homem habitava cavernas em grupos de poucas familias. Os objetivos ali eram poucos e comuns. A mentalidade coletivista e planejadora era adequada aquela situacao especifica.

Mas na medida que o homem desenvolveu maior conhecimento tecnico, seus grupos se expandiram e entraram em contato mais estreito com outros grupos, e as hostilidades iniciais com o tempo deram lugar a relacoes de trocas mutuamente beneficas, que so foram possiveis gracas a aparicao de elementos primitivos da etica individualista.

As comunidades de subisistencia com o tempo foram se dissolvendo em familias e individuos, e a "grande sociedade" cada vez menos podia ser associada a um conjunto claro e especifico de objetivos que pudesse dar sentido a algum planejamento central, que por outro lado se tornava cada vez mais impossivel devido ao aumento da complexidade da estrutura de informacao daquela sociedade crescente em numero e heterogeneidade de individuos.


Eu não vejo uma importância fundamental na genealogia do estado, ou do mercado. O que importa, penso, é se funciona bem ou não. Se fosse um legado do barbarismo, mas fosse considerável como bom, pouco importaria sua origem. Se tivesse sua origem na bondade humana, mas tivesse culminado em algo perverso, também não deveria se deixar de questionar os pontos que o tornaram ruim. Importa mais o que é, atualmente, e quais são suas falhas.




    As circunstancias mais proximas de um objetivo claro e comungado por uma vasta maioria foram os esforcos de guerra e de resistencia. Nao e atoa que esses episodios sempre contribuiram para o crescimento do poder politico e da ideologia coletivista, e que de tempos em tempos os politicos se empenharam em lancar mao desses artificios para conservar ou ampliar seus privilegios.


As leis nao sao planejadas visando objetivos sociais, isso e uma visao animista-criacionistas analoga a ideia do criador racional que antecede logicamente a criatura.

Como F. A. Hayek colocou, as leis e a moral sao fenomenos racionais, e que possivelmente engendram varios elementos universais, mas que nao intencionais ou planejados, nem mesmo podem, ja que "a mente nao pode antever seu proprio avanco".


Não entendi bem o ponto. Acho que talvez esteja sugerindo que as leis são como leis da física, descobertas, não inventadas. Em qualquer caso, me parece que elas não são tão evidentes quanto "as coisas caem", e muito menos tão forçosamente atuantes quanto a ação de cair. Ou seja, as pessoas conseguem facilmente não agir de acordo com o que quer que se proponha serem, ou que sejam, as leis. A menos numa acepção um pouco diferente de anarquia daquela que você está adotando, que seria de mundo sem lei.

E por isso, precisa haver algo "como o estado", para garantir o exercício das leis. Não precisa ser "o estado", de fato, e talvez fosse até melhor que não fosse mesmo. Como disse antes, há algum tempo, acho que nesse fórum mesmo, estava meio empolgado com idéias mais ou menos assim. Mas a conclusão (acho que foi bem exposta pelo Huxley) é que no fim dá quase no mesmo, emerge uma hierarquia, e apenas algo bastante abstrato dos seus fundamentos é que difere, e pouca coisa dos aspectos práticos. Tanto o estado, quanto algo que o suplantasse em suas funções, podem sofrer dos mesmos problemas. Ainda que possivelmente hajam algumas vantagens e desvantagens um pouco mais aparentemente prováveis de cada lado, também não são inevitáveis no outro.



Mas veja que a selecao natural tem seus meios para corrigir esses residuos e vestigios que perderam suas funcoes. Se esses apendices apenas parasitam os organismos, diminuindo sua eficiencia biologica, mutacoes que os atrofiem ou eliminem, sem afetar outras funcoes significativamente serao selecionadas.

Algo similar ocorre na economia de mercado e na sociedade. Se instituicoes que ja tiveram seu sentido perderem sua razao de ser, as pessoas que nao incorrerem nos custos necessarios para a sua manutencao terao vantagens comparativas em relacao as demais. E claro que essa percepcao surge da racionalizacao individual e local a respeito de problemas individuais e locais. Pois esses sao os unicos problemas bem postos na sociedade, aqueles que para os quais e possivel executar planos racionais.

A historia do planejamento central tem sido a historia da arrogancia e do fracasso da razao. Os sucessos e avancos que contribuem para todos os individuos na sociedade tem sido consistemente elaborados pelo planejamento e pela razao individual.

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Saindo um pouco da analogia com os seres vivos. O problema básico do estado talvez seja que, uma pessoa no seu cargo está relativamente mais segura do que um análogo na iniciativa privada. Um "impeachment" ou boa parte das demissões de cargos públicos são consideravelmente mais complicadas e raras do que uma demissão por ineficiência no exercício da função no setor privado, ou por se ter um outro candidato melhor capacitado, ou mesmo pela própria função ser vista como supérflua. Uns vêem isso como que na iniciativa privada, o "organismo" é de tal forma que permite um fluxo de informações mais eficiente. Bastante verdade, podem existir exceções e análogos na iniciativa privada, mas acho que na maior parte do tempo o estado é mais sujeito a algo análogo (ou à propria) "lei de Parkinson", uma tendência a aumentar desnecessariamente e se tornar "dependente" desse aumento, do que a iniciativa privada.

Do outro lado, a desvantagem é bastante sintetizada no que o Bill Gates disse para Steve Jobs no filme "piratas do vale do silício", quando em resposta a ele ter afirmado que os produtos da Apple são melhores que os da MS, "humpf! Você não vê? Isso simplesmente não importa."

É bem análogo a seleção natural e a necessidade única da perpetuação; o organismo não precisa ser melhor em nenhum sentido absoluto, só precisa se reproduzir mais. Para que uma empresa se sobressaia, só precisa ser melhor em vender seu produto que as outras empresas, o seu produto não precisa ser nem um pouco melhor.



Termino de responder mais tarde... mas para resumir.. não vejo como uma "anarquia" poderia ser muito diferente de algo mais ou menos como EUA Inc, "nosso negócio é a liberdade" e Canadá Inc., "nosso negócio é o bem estar social", só umas relações burocráticas/abstratas de propriedade diferindo. Nesse sentido acabaria sendo muito como o estado mesmo, ainda que pudesse ter suas vantagens (acho que de fato teria). Se não fosse isso, só imagino algo muito pior, mais como o "anarco-capitalismo" dos traficantes de drogas nas periferias.
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Valmor
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Valmor »

Essa discussão está uma delicia de acompanhar.

Zumbi, a ordem emerge do caos.
É bem verdade que a MS é inferior a Apple em produtos e que ainda assim se mantenha superior enquanto empresa lucrativa. Entenda isso por caos, um caos de onde a ordem ainda não emergiu.
O mito é achar que necessitamos de uma entidade burrocrática central para atuar na criação da ordem.
O problema existente no mercado de softwares passa por fatores como a ignorância e ganância das partes evolvidas, isso muitas vezes é usado no argumento daqueles que julgam ser necessária a intervenção estatal, como se o estado de alguma forma pudesse ser menos ignorante ou ganancioso, como se ele pudesse ser um ente mais justo, competente e ético.

Quem é o juiz ultimo e decide que software comprar e por isso mesmo que empresa vai apoiar?
É o consumidor, uma das partes envolvidas de grande importância.
A idéia de que os empresários são gananciosos, os usuários burros e por isso o estado vai corrigir o problema é uma falácia.
O poder de decisão do consumidor ao efetuar uma compra, é um poder democrático análogo e mais direto e decisivo do que poder de voto do eleitor.
Se o consumidor é incapaz de escolher a empresa de quem deve comprar, também é incapaz de escolher o burocrata certo para solucionar o problema. Aqui já desaba o mito do estado como juiz mais capacitado que a ação direta do consumidor como juiz.

O estado é ainda pior juiz que o consumidor.
Quando você centraliza poder através do estado, você vai chamar a atenção justamente das pessoas gananciosas e vai fazer isso em duas esferas que se apóiam, a publica e a privada.
Tendo o burocrata poder de intervir, vai despertar o interesse de empresários gananciosos e canalhas que vão buscar corromper o burocrata de forma a comprar esse poder para si, de forma a prejudicar a concorrência e se fortalecer no mercado.
Tendo o empresário o poder econômico e gerando a demanda pelo poder estatal, desperta o interesse de burocratas gananciosos e canalhas que vão buscar usar do estado para oferecer seus serviços aos empresários desonestos.

Aqui se forma um sistema doente, quando o empresário canalha consegue esse poder, ele prejudica o bom empresário e o enfraquece e até elimina de forma injusta, ao mesmo passo ele apóia e ajuda a eleger o político desonesto, enfraquecendo e até eliminando o bom político.
A concentração de poder na forma de estado por isso sempre vai favorecer a ganância e os canalhas ao mesmo passo em que sempre vai penalizar a honestidade e o bom caráter.
O estado então é um ente que gera um sistema que dá poder justamente aos gananciosos, corruptos e canalhas, ele cria e amplia o pior, aquilo que ele supostamente deveria corrigir.

Na questão do planejamento centralizado o estado é outra catástrofe.
O primeiro ponto é que é muito grande o trabalho a ser feito, o que torna inviável que um estado centralizado faça todo o trabalho. O estado não consegue ser eficiente ao cuidar de tudo, transporte, saneamento, saúde, educação, telecomunicações, etc...
A iniciativa privada cria especialistas em cada um desses setores e melhor ainda, cria múltiplos especialistas em cada setor que vão competir entre si pela melhor solução e pelo melhor planejamento.
Não é necessário o estado para criar esse planejamento, o estado só atrapalha ao tentar arbitrar sobre algo que é da competência das partes especializadas envolvidas (empresas do setor e consumidores).

Enquanto existe bagunça em algum setor, temos o caos.
A ordem é sempre lucrativa, é sempre uma boa oportunidade de negocio e onde existe caos, existe incentivo para que algum ser egoísta observe e aprenda com o caos, planejando assim uma solução inteligente que transformará aquilo uma ordem lucrativa para ele. O melhor é que serão diversas soluções planejadas competido entre si sendo oferecidas ao consumidor por um preço, não uma única solução planejada por uma burocracia central que não tem o incentivo correto para buscar uma solução ideal, sendo enfiada goela abaixo do eleitor.
São os especialistas do setor os planejadores, são também os consumidores atentos e de espírito empreendedor que, ao lidar com o problema e observar o caos, aprendem e aproveitam a oportunidade.

Até o planejamento complexo entre setores distintos pode ser feito com a ajuda de empresas de consultoria especializadas em olhar mais de cima e conectar esses setores. Não é o estado o responsável pelo planejamento, ele surge de modo espontâneo em diversas frentes sempre que um problema se apresenta.

Na Amazônia estradas ilegais são criadas sem a ajuda do estado, no mercado negro é assim, todo o planejamento é feito sem a ajuda do estado e é eficiente em burlar o estado e suas leis.
A lei de fato independe do estado.
Não existe uma lei proibindo homossexuais de se beijarem em publico, mas socialmente essa é uma regra seguida sem a necessidade de ser imposta pelo estado, por outro lado existem diversas leis oficializadas pelo estado que simplesmente não são seguidas.
As leis emergem do caos, é o conflito entre as partes que determina as regras do jogo, e, se um dia o beijo gay deixar de ser mal visto pela população, essa regra social proibindo o beijo gay em qualquer local irá cair, mas não é o estado quem decide isso, essa lei (melhor chamar de regra) surge com espontaneidade, não diferente das regras de etiqueta e conduta social que seguimos no dia a dia.

Seguimos a lei sem nem ao menos conhecer de fato o código penal brasileiro. Quantos brasileiros conhecem realmente as leis do país? Seguimos de fato é a auto-regulamentação e as regras sociais aprendidas pela vivencia. Quem quebra essas regras sabe dos riscos, seja o de ser preso pela policia estatal, o de ser ilegalmente linchado por uma multidão enfurecida ou pego por um solitário cidadão revoltado (talvez a própria vitima).
É também observando o caos, observando o conflito entre as partes e sua diversidade, que evoluímos enquanto pessoas.

O Estado só atrapalha esse processo ao concentrar demasiado poder, justamente nas mãos das pessoas mais gananciosas e sem escrúpulo da sociedade.
Qualquer caos e até criminalidade em um sistema sem estado, gera demanda por uma solução elegante e que será muito lucrativa já que é muito esperada pelos ávidos consumidores.
Hoje as pessoas já buscam por proteção privada, dada a ineficácia do estado, só que o estado ao monopolizar o setor a ao ser visto como o pai protetor que tem a obrigação de cuidar disso, atrapalha o setor e da ao consumidor a ilusão de que o ineficiente serviço prestado pelo estado é gratuito, quando na verdade é muito caro (idem para educação, saúde e demais serviços prestados pelo estado e pagos pelos eleitores).

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user f.k.a. Cabeção
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


Essa "exemplo" da falha do mercado na competicao Mac vs Windows, Apple vs Microsoft e apenas besteirol ideologico.

O Mac nao dominou o mercado nao foi porque o mercado e burro e quis o "ruindows".

A filosofia de mercado do Windows era a de compatibilidade e portabilidade com as diversas opcoes de hardware, e intuitividade na interface com o usuario. Ainda que as custas de ser um sistema pouco eficiente em certos aspectos, como gestao de memoria ou seguranca.

A visao do Bill Gates, que mostrou-se correta, foi a de que os computadores rapidamente deixariam de ser ferramentas profissionais para se tornarem eletrodomesticos se eles deixassem de demandar tanto em custos (como os caros Macs) e/ou conhecimentos informaticos (Unix, GNU-Linux, BSD e etc), e que esse enorme mercado domestico acabaria criando uma demanda profissional tambem pelo mesmo sistema que estaria na casa de todos.

E verdade que se voce e um usuario mais avancado voce encontrara vantagens num sistema Unix, mas essas vantagens nao sao significativas se voce for um usuario casual. E as diversas versoes do Windows mostraram uma boa versatilidade para atender as necessidades dos usuarios casuais e dos profissionais voltados para esses usuarios, que acabaram se tornando a maior parte do mercado consumidor. E verdade que algumas versoes foram simplesmente ruins, mas nao foi por causa do Millenium ou do Vista que o Bill Gates virou o homem mais rico do mundo.

Ainda assim, em nichos especificos, como os profissionais de edicao de imagem e animacao os Macs dominavam, e entre os cientistas e computeiros os sistemas GNU-Linux ganharam o espaco.

Hoje em dia, com a Apple tendo migrado para a arquitetura Intel, deu-se a aparicao de recursos de compatibilidade com o Windows, ou mesmo a operacao do sistema em computadores Mac, via emulacao ou instalacao em particao do HD via bootcamp.

A decisao contribuiu para os Macintosh se tornarem mais populares entre usuarios menos profissionais ou de outros nichos que nao eram tao bem servidos assim pelos softwares exclusivos deles. Os resultados deles tem sido mais expressivos que os da Microsoft nos ultimos anos.

Isso tudo se deu sem que o governo precisasse decidir qual empresa era a melhor.

Em nenhum momento isso ocorreu. Apenas as forcas da competicao atuaram, e o consumidor nao saiu prejudicado em nenhum momento.

Se o governo tivesse declarado, como alguns parecem querer: "os produtos Apple sao claramente melhores e a Microsoft deve ser banida do mercado" o que teria acontecido seria que o consumidor sairia prejudicado, pois a Apple poderia praticar os precos que quisesse e inovar no ritmo que quisesse, pois estaria protegida da competicao.

E engracado que as pessoas entendem a variedade no mercado de automoveis mas nao entendem no mercado de computadores. Nem todos os carros sao feitos pensando em motoristas preocupados com desempenho, aderencia, rigidez estrutural e eficiencia aerodinamica. Nem todos os carros sao feitos para aqueles preocupados com o design. Nem todos os carros sao feitos para quem quer consumir menos combustivel, ou usar combustiveis alternativos.

E por isso que os carros sao colocados em categorias quando sao comparados.

Durante anos, Windows e Macs eram carros de categorias diferentes atentendo a mercados diferentes. O mercado do Windows era muito maior. Agora a Mac parece que esta tentando migrar para a mesma categoria do Windows, e tem obtido alguns ganhos competitivos nos ultimos anos.
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Valmor escreveu:Quem é o juiz ultimo e decide que software comprar e por isso mesmo que empresa vai apoiar?
É o consumidor, uma das partes envolvidas de grande importância.
A idéia de que os empresários são gananciosos, os usuários burros e por isso o estado vai corrigir o problema é uma falácia.
O poder de decisão do consumidor ao efetuar uma compra, é um poder democrático análogo e mais direto e decisivo do que poder de voto do eleitor.
Se o consumidor é incapaz de escolher a empresa de quem deve comprar, também é incapaz de escolher o burocrata certo para solucionar o problema. Aqui já desaba o mito do estado como juiz mais capacitado que a ação direta do consumidor como juiz.



Perfeito.

Eu tenho levantado essa bola aqui ha bastante tempo.

A mais singela duvida levantada contra a funcionalidade do processo de escolha de mercado deve ser multiplicada por 1000 quando reaplicada a funcionalidade do processo de escolha da democracia.

A democracia e um mercado so que muito mais problematico, pois os incentivos e custos sao todos indiretos e externos.

Alias, todo o resto da mensagem tambem e muito bom. Quando tiver mais tempo comento uns pontos.
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Jack Torrance »

Cabeção, talvez você tenha respondido o que vou te perguntar, mas não tenho condições e tempo de ler toda a discussão, então vou perguntar: num sistema anarquista, se alguém comete algum crime, como essa pessoa será repreendida ou coisa parecida?
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


Eu sei la.

Vai depender de que crime ela cometeu, em que condicoes e circunstancias, etc.

Acho que entrarao em jogo os mesmos fatores que entram hoje, porque a justica nao seria diferente, ela so deixaria de ser fornecida por uma entidade estatal, e passaria a ser privada.

Se voce quer saber como seria organizada a justica privada, da para se imaginar uma porcao possibilidades, inclusive com a ajuda dos mecanismos juridicos privados que ja existem, como cortes de arbitragem. As pessoas tambem poderiam ter muito mais contratos de seguro, e assim as proprias companias de seguro se encarregariam de punir seus clientes malfeitores, ou contratar alguem para cacar aqueles que atacaram um de seus clientes.

Mas eu nao tenho bola de cristal. Nao posso saber se uma dessas possibilidades se mostraria mais eficiente que as outras, ou se elas competiriam entre si, ou se uma outra nao imaginada viria a supera-las.
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Darkside »

O legal é que o anarquismo da Somália não é anarquismo, porque as pessoas lá não são amigas e não tem pensamentos felizes, então é algum outro tipo de regime não-burocrático caótico.
"Temos uma coisa muito mais extraordinária: não só se consegue que uma mesa se mova magnetizando-a, como também que fale. Interrogada, ela responde."

Alan Kardec, Obras Póstumas Pág. 237

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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Valmor »

Darkside escreveu:O legal é que o anarquismo da Somália não é anarquismo, porque as pessoas lá não são amigas e não tem pensamentos felizes, então é algum outro tipo de regime não-burocrático caótico.

O pais está dividido entre vários grupos que se pretendem governos e lutam entre si pelo controle. Na luta deixam certas areas negligenciadas.

O nome que se dá ao 'sistema' somaliano é guerra civil e isso não tem nada haver com anarquismo.

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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por zumbi filosófico »

Valmor escreveu:O mito é achar que necessitamos de uma entidade burrocrática central para atuar na criação da ordem.


Não quis sugerir isso.


O problema existente no mercado de softwares passa por fatores como a ignorância e ganância das partes evolvidas, isso muitas vezes é usado no argumento daqueles que julgam ser necessária a intervenção estatal, como se o estado de alguma forma pudesse ser menos ignorante ou ganancioso, como se ele pudesse ser um ente mais justo, competente e ético.


O meu ponto não é "os produtos mais vendidos não são necessariamente os melhores, logo é melhor o comunismo".

Voltando a analogia com seleção natural. O lucro, independe, ainda que possa ter uma boa relação com, o progresso, assim como a adaptação. Os seres só precisam ser melhores em se reproduzir, e não de qualquer forma "absoluta", e os produtos só precisam ser os que vendem mais para serem os mais vendidos.

Não quero com isso sugerir uma espécie de declive escorregadio combinado com falsa dicotomia, que o capitalismo tende a fazer com que tudo seja uma porcaria, logo o comunismo é melhor.

Apenas quero dizer que o mercado não é esse processo quase milagroso cujos resultados sejam sempre os melhores possíveis. E também não é o comunismo, que certamente é muito pior.


Quem é o juiz ultimo e decide que software comprar e por isso mesmo que empresa vai apoiar?
É o consumidor, uma das partes envolvidas de grande importância.
A idéia de que os empresários são gananciosos, os usuários burros e por isso o estado vai corrigir o problema é uma falácia.
O poder de decisão do consumidor ao efetuar uma compra, é um poder democrático análogo e mais direto e decisivo do que poder de voto do eleitor.
Se o consumidor é incapaz de escolher a empresa de quem deve comprar, também é incapaz de escolher o burocrata certo para solucionar o problema. Aqui já desaba o mito do estado como juiz mais capacitado que a ação direta do consumidor como juiz.


Eu nem tenho uma idéia bem clara na cabeça, estou apenas delineando pontos fracos de algo promovido essencialmente pelo lucro, bem como de um empreendimento "sem fins lucrativos", que pode ser, mas não necessariamente seria, o estado.

Uma comparação possível com um ponto fraco do mercado seria o método científico versus moda ou achismo popular. Pessoas não médicas, curandeiros e charlatões podem popularizar falsas curas e tratamentos inúteis, a despeito de sua ineficácia; o livro só precisa vender mais para ser best-seller, não precisa de um best-author. Paulo Coelho que o diga.

Aqui, a analogia do estado seria por exemplo, mas não necessariamente, de algo como o ministério da saúde, mas poderia ser uma versão análoga que fizesse meras recomendações, ou imposições/restrições dentro de um contrato mais explícito que o "contrato social". Médicos, com pesquisa baseada em evidência, são mais habilitados a discernir o que é de fato um tratamento científico, verdadeiro, do que o consumidor leigo. Não são os burocratas arbitrários e igualmente suscetíveis às falhas do mercado.

Não acho que apenas medicina seja um caso onde essa anaolgia é válida, e nem sei bem que implicações que isso poderia ter para o estado ou ausência dele, e qualquer outra forma de hierarquia que o substituísse. Só acho um ponto válido a considerar. Tenho que ler mais a respeito de tudo isso, são só umas pequenas ruminações minhas. Acho que vou começar por "tecnocracia" na wikipedia, talvez.




O estado é ainda pior juiz que o consumidor.
Quando você centraliza poder através do estado, você vai chamar a atenção justamente das pessoas gananciosas e vai fazer isso em duas esferas que se apóiam, a publica e a privada.
Tendo o burocrata poder de intervir, vai despertar o interesse de empresários gananciosos e canalhas que vão buscar corromper o burocrata de forma a comprar esse poder para si, de forma a prejudicar a concorrência e se fortalecer no mercado.
Tendo o empresário o poder econômico e gerando a demanda pelo poder estatal, desperta o interesse de burocratas gananciosos e canalhas que vão buscar usar do estado para oferecer seus serviços aos empresários desonestos.

Aqui se forma um sistema doente, quando o empresário canalha consegue esse poder, ele prejudica o bom empresário e o enfraquece e até elimina de forma injusta, ao mesmo passo ele apóia e ajuda a eleger o político desonesto, enfraquecendo e até eliminando o bom político.
A concentração de poder na forma de estado por isso sempre vai favorecer a ganância e os canalhas ao mesmo passo em que sempre vai penalizar a honestidade e o bom caráter.
O estado então é um ente que gera um sistema que dá poder justamente aos gananciosos, corruptos e canalhas, ele cria e amplia o pior, aquilo que ele supostamente deveria corrigir.


A conclusão a que chequei na minha fase mais empolgada com o anarco capitalismo, é que tanto os comunistas/similares quanto anarco-capitalistas ou simpatizantes/similares vêem diferenças meio "mágicas" nos "dois" sistemas, quando ambos podem apresentar exatamente as mesmas falhas. Mas acho que podem se contrabalançar, numa medida equilibrada de poder para cada lado.

Nada do que disse aí, seria impossível de existir, tirando o estado da equação de alguma forma. O "empresário ganancioso" pode não ter ajuda do estado, mas o mercado não é uma espécie de carma que só premia o mérito verdadeiro e os bons de coração, que vai impedí-lo de atingir quaisquer objetivos que a sociedade possa considerar indesejados, que pudesse atingir com ajuda do estado. E também não terá qualquer impedimento vindo do estado.

Digamos que uma empresa esteja poluindo a água de uma cidade. Meio como na história dramatizada no filme "Erin Brockovich". Sem estado, a quem se recorre? Vai lá se mendigar por justiça na porta da empresa? Ou simplesmente, as empresas que poluírem suas vizinhanças terão menos clientes saudáveis nas suas vizinhanças, logo menos lucro, eventualmente falindo, enquanto empresas não/menos-poluentes prosperam? Ou, isso eventualmente se torna público, e as pessoas, mesmo sem individualmente terem poder de influenciar a mídia como presumivelmente teria uma empresa, conseguem criar pressão popular-mercadológica para a empresa sanar esses problemas?

Enfim, não acho que se a empresa tendo que responder apenas ao mercado, se tem o melhor dos mundos. O ufka Cabeção, de qualquer forma, possivelmente dirá que esse cenário não é o que ele propõe, que poderiam existir leis ambientais e/ou de ressarcimento contra danos. Provavelmente isso teria que ser decidido por outra empresa ou uma série de empresas, não sei. O que, a princípio, quase que por definição, já deixa a coisa pendendo mais a favor da empresa do que às vítimas, a menos que fosse um sistema que não fosse comprável, como, teoricamente, mas nem sempre na prática, deveria ser o estado. Se fosse, bem, aí seria simplesmente chamar uma rosa por outro nome, em vez de admitir que tem perfume e espinhos, qualquer que seja o nome que se dê.



Na questão do planejamento centralizado o estado é outra catástrofe.
O primeiro ponto é que é muito grande o trabalho a ser feito, o que torna inviável que um estado centralizado faça todo o trabalho. O estado não consegue ser eficiente ao cuidar de tudo, transporte, saneamento, saúde, educação, telecomunicações, etc...
A iniciativa privada cria especialistas em cada um desses setores e melhor ainda, cria múltiplos especialistas em cada setor que vão competir entre si pela melhor solução e pelo melhor planejamento.
Não é necessário o estado para criar esse planejamento, o estado só atrapalha ao tentar arbitrar sobre algo que é da competência das partes especializadas envolvidas (empresas do setor e consumidores).


Uma posição intermediária aqui, mas discordando da afirmação central, sobre planejamento centralizado ser uma catástrofe. Mesmo as empresas, que se admite serem melhores, tem planejamento central. Muito provavelmente não fariam melhor com uma organização espontânea e anárquica de autônomos individuais.

Se admite-se isso, as diferenças entre estado e empresa praticamente desaparecem, uma vez que é possivelmente um ponto de comum acordo que uma mesma empresa poderia atuar eficientemente em diversas áreas. Se viesse o maior multi-trilionário de todos os tempos e comprasse todas as maiores empresas de cada setor de um país, e as unificasse sobre um mesmo rótulo, não seria apenas por isso que tudo começaria a colapsar. Mesmo que de alguma forma fosse feita alguma maior interligação entre elas, com os lucros de um setor ajudando na estrutura de outro que está mais defasado ou o que quer que fosse. Na verdade, teria justamente o potencial de torná-las mais eficientes do que seriam isoladas.

E da mesma forma não é porque várias administrações mais ou menos independentes podem existir sob o rótulo "governo" que está destinado ao colapso ou a um desempenho muito pior do que seria com administrações de independência mais claramente delineadas.

A principal diferença não é tanto a centralização, até porque pode-se ainda falar em "governo" ou "estado" em diversos níveis de centralização, melhores e piores (qualquer que seja a realidade), mas sim a questão do lucro no sentido mercadológico e do serviço à sociedade.



Enquanto existe bagunça em algum setor, temos o caos.
A ordem é sempre lucrativa, é sempre uma boa oportunidade de negocio e onde existe caos, existe incentivo para que algum ser egoísta observe e aprenda com o caos, planejando assim uma solução inteligente que transformará aquilo uma ordem lucrativa para ele. O melhor é que serão diversas soluções planejadas competido entre si sendo oferecidas ao consumidor por um preço, não uma única solução planejada por uma burocracia central que não tem o incentivo correto para buscar uma solução ideal, sendo enfiada goela abaixo do eleitor.


O empreendedor não precisa da solução ideal para o consumidor, só precisa da solução que vender mais. Pode ser o ideal, pode ser bastante próxima, mas não precisa ser. Não precisa nem ser exatamente uma solução, a bem da verdade.


São os especialistas do setor os planejadores, são também os consumidores atentos e de espírito empreendedor que, ao lidar com o problema e observar o caos, aprendem e aproveitam a oportunidade.

Até o planejamento complexo entre setores distintos pode ser feito com a ajuda de empresas de consultoria especializadas em olhar mais de cima e conectar esses setores. Não é o estado o responsável pelo planejamento, ele surge de modo espontâneo em diversas frentes sempre que um problema se apresenta.

Na Amazônia estradas ilegais são criadas sem a ajuda do estado, no mercado negro é assim, todo o planejamento é feito sem a ajuda do estado e é eficiente em burlar o estado e suas leis.
A lei de fato independe do estado.
Não existe uma lei proibindo homossexuais de se beijarem em publico, mas socialmente essa é uma regra seguida sem a necessidade de ser imposta pelo estado, por outro lado existem diversas leis oficializadas pelo estado que simplesmente não são seguidas.
As leis emergem do caos, é o conflito entre as partes que determina as regras do jogo, e, se um dia o beijo gay deixar de ser mal visto pela população, essa regra social proibindo o beijo gay em qualquer local irá cair, mas não é o estado quem decide isso, essa lei (melhor chamar de regra) surge com espontaneidade, não diferente das regras de etiqueta e conduta social que seguimos no dia a dia.


Mais um exemplo de como é só praticamente mudar os nomes das coisas. A opressão não precisa vir do estado, pode vir da esfera privada.


Seguimos a lei sem nem ao menos conhecer de fato o código penal brasileiro. Quantos brasileiros conhecem realmente as leis do país? Seguimos de fato é a auto-regulamentação e as regras sociais aprendidas pela vivencia. Quem quebra essas regras sabe dos riscos, seja o de ser preso pela policia estatal, o de ser ilegalmente linchado por uma multidão enfurecida ou pego por um solitário cidadão revoltado (talvez a própria vitima).
É também observando o caos, observando o conflito entre as partes e sua diversidade, que evoluímos enquanto pessoas.

O Estado só atrapalha esse processo ao concentrar demasiado poder, justamente nas mãos das pessoas mais gananciosas e sem escrúpulo da sociedade.
Qualquer caos e até criminalidade em um sistema sem estado, gera demanda por uma solução elegante e que será muito lucrativa já que é muito esperada pelos ávidos consumidores.
Hoje as pessoas já buscam por proteção privada,


Para se proteger contra a iniciativa privada.


dada a ineficácia do estado, só que o estado ao monopolizar o setor a ao ser visto como o pai protetor que tem a obrigação de cuidar disso, atrapalha o setor e da ao consumidor a ilusão de que o ineficiente serviço prestado pelo estado é gratuito, quando na verdade é muito caro (idem para educação, saúde e demais serviços prestados pelo estado e pagos pelos eleitores).



Bem, enfim, não estou defendendo um super-estado nem nada. Só comentando que o mercado não é esse processo super magnífico, infalível, realmente merecedor de toda essa mística que colocam sobre ele -- agora em vez de só "mão invisível", com também essa terminologia de sonoridade científica da teoria do caos. Pelo menos eu não fiz minha defesa usando a "teoria da relatividade", dizendo que "tudo é relativo" quanto a eficácia do estado ou algo parecido, "versus" mercado...

E o estado também não é "a solução" dessa forma binária, ambos sofrem ou potencialmente sofrem dos mesmos problemas. O próprio Adam Smith era crítico de grandes corporações, justamente por isso. Mas quem vai impedir grandes corporações? O estado com leis anti-truste ou algo do tipo? Uma empresa que de alguma forma lucre com isso? Sei lá. Acho que mais provavelmente algo muito parecido com isso que se chama de estado.

E, no que se refere a leis, bem, acho que tem sim que haver alguma delineação mais clara, e imposição coerciva, ou não, dependendo da acepção do termo ou fraseamento que se ache mais bonitinho para o que estiver se propondo. Não precisa ser algo tão exagerado como "crianças não devem usar cortes de cabelo estranho", mas também não acho que se pode confiar simplesmente na sabedoria que emergir das multidões.
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por zumbi filosófico »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Essa "exemplo" da falha do mercado na competicao Mac vs Windows, Apple vs Microsoft e apenas besteirol ideologico.

O Mac nao dominou o mercado nao foi porque o mercado e burro e quis o "ruindows".


O exemplo é debatível, mas o cerne da afirmação permanece. As coisas não precisam ser as melhores para venderem mais, só precisam vender mais.

Apenas dando como correta a premissa de que os SOs da apple são melhores que os da MS, sim, de fato os da MS tiveram a forte vantagem estratégica de não terem sido restritos a um hardware específico, mas isso não os faz melhores como SO, apenas tiveram um nicho mais favorável, por não ser auto-restrito pela estratégia burra de "venda-casada" da apple, puderam se aproveitar "comensalmente" do sucesso de fabricantes de hardware que por um motivo ou outro (provavelmente "modularidade" em vez de hardwares "fechados" que não permitem upgrade mais gradual, que imagino ser o caso com os apples) puderam ter mais sucesso.





user f.k.a. Cabeção escreveu:
A filosofia de mercado do Windows era a de compatibilidade e portabilidade com as diversas opcoes de hardware, e intuitividade na interface com o usuario. Ainda que as custas de ser um sistema pouco eficiente em certos aspectos, como gestao de memoria ou seguranca.

A visao do Bill Gates, que mostrou-se correta, foi a de que os computadores rapidamente deixariam de ser ferramentas profissionais para se tornarem eletrodomesticos se eles deixassem de demandar tanto em custos (como os caros Macs) e/ou conhecimentos informaticos (Unix, GNU-Linux, BSD e etc), e que esse enorme mercado domestico acabaria criando uma demanda profissional tambem pelo mesmo sistema que estaria na casa de todos. E verdade que se voce e um usuario mais avancado voce encontrara vantagens num sistema Unix, mas essas vantagens nao sao significativas se voce for um usuario casual. E as diversas versoes do Windows mostraram uma boa versatilidade para atender as necessidades dos usuarios casuais e dos profissionais voltados para esses usuarios, que acabaram se tornando a maior parte do mercado consumidor.


A parte de interface amigável ao usuário inexperiente não é inovação da MS, mas da Xerox, que vendeu essa relativa inovação nesse sentido para apple, e então foi xerocada pela MS, num nicho mais vantajoso. Os sistemas do apple, apesar de terem uma "base" unix ou "unixóide", acabam não tendo nada a ver com unix/linux e os sistemas menos "amigáveis" diversos, as vantagens defendem ter não são as mesmas dos defensores de linux, como mais liberdade de modificação, adaptação para necessidades/vontades particuluares, ao custo de ter que saber como fazer isso. São, como windows, sistemas para se pegar e sair usando sem nunca ter usado computador.

Tem até um vídeo no youtube, onde o som é de uma apresentação dos recursos do windows vista, mas a imagem que se vê na tela é um OSX ou qualquer coisa da apple, que já existia antes.

O estereótipo dos sistemas inclusive é que o apple é "computador de artista", e só linux e outros *nix que são de "sistema de engenheiro".


user f.k.a. Cabeção escreveu:

Isso tudo se deu sem que o governo precisasse decidir qual empresa era a melhor.

Em nenhum momento isso ocorreu. Apenas as forcas da competicao atuaram, e o consumidor nao saiu prejudicado em nenhum momento.

Se o governo tivesse declarado, como alguns parecem querer: "os produtos Apple sao claramente melhores e a Microsoft deve ser banida do mercado" o que teria acontecido seria que o consumidor sairia prejudicado, pois a Apple poderia praticar os precos que quisesse e inovar no ritmo que quisesse, pois estaria protegida da competicao.


O meu exemplo pretendia ser um pouco mais abstrato que isso, não sugerir que algo assim devesse ser feito. Apenas que "mais vendido" não é um sinônimo absoluto de "melhor", precisa ser "melhor em vendas".

Por exemplo, drogas altamente viciantes, podem vender muito, muito mesmo, apesar de ser bastante razoável se concordar não serem "boas". Por uma visão estritamente mercadológica, são ótimas, quase perfeitas, especialmente as que viciem pouco, tenham baixo risco de overdose e de colocar a usuário em comportamentos que possam levar a sua própria morte. Mas mesmo apesar de várias terem essas e outras falhas, mesmo as "piores" podem ser tão boas a ponto de conseguirem prosperar no mercado e serem rentáveis o suficiente para valer o custo de pequenos exércitos como parte da sua estrutura comercial.

E aqui aproveitei para dar uma criticada no estado, ou, mais especificamente, em certas medidas de regulação do mercado, implicitamente (não sou favorável à legalização das drogas, no entanto).

E acho que seria uma boa deixa para perguntar, então, com seria a solução análoga para o problema do tráfico numa anarquia nesses moldes que considera ideias. Vi em outra mensagem que, apesar de anarquias, seria favorável a leis como contra até o casamento homossexual (o que quer que isso signifique), então seria interessante talvez explicar um pouco mais na prática como algo assim daria, para uma questão mais realmente significativa, que é a do nicho mercadológico para as drogas, e a legislação sobre elas, sem estado, e etc.



user f.k.a. Cabeção escreveu:E engracado que as pessoas entendem a variedade no mercado de automoveis mas nao entendem no mercado de computadores. Nem todos os carros sao feitos pensando em motoristas preocupados com desempenho, aderencia, rigidez estrutural e eficiencia aerodinamica. Nem todos os carros sao feitos para aqueles preocupados com o design. Nem todos os carros sao feitos para quem quer consumir menos combustivel, ou usar combustiveis alternativos.


E o mercado de automóveis também é uma outra questão interessante quanto aos problemas do mercado, do estado, e etc. A mim parece bastante razoável supor que haveria um ganho tremendo em eficiência de transportes, e de muita coisa dependente disso, com uma utilização bem mais ampla do transporte coletivo. O que também pode servir de exemplo de inépcia estatal, de qualquer forma. Mas também não estou simplesmente defendendo o estado como a solução genérica, vaga, porém infalível para todos os problemas.

O ponto mais interessante é que, as pessoas tendem a preferir comprar carros com espaço para quatro ou mais passageiros, para irem sozinhas ao trabalho, e as ruas e avenidas ficam lotadas, talvez com médias de deslocamento absurdamente baixas se comparado ao que poderia ser feito com transporte coletivo. E acaba até sendo dificultado um nicho para o sucesso mercadológico do transporte coletivo, em virtude do preenchimento do nicho literal das estradas por automóveis particulares. Poderia criar a melhor empresa de transporte coletivo do mundo, e os ônibus iriam ficar numa lerdeza da mesma maneira, e muitas pessoas prefeririam em nos seus carros de qualquer forma. E assim o mercado e sua emergência espontânea de complexidade e organização acaba levando a uma situação que é quase um beco sem saída. Difícil "evoluir" para algo melhor.

Não deixa de ser interessante também que, o estado, por não ser talvez tão restrito por essas limitações, também não é capaz de resolver o problema. Ou, talvez teoricamente seja, apenas não fez de fato, talvez por não haver algo análogo ao incentivo do mercado, talvez por qualquer outra razão. Mas possivelmente uma empresa que de alguma forma tivesse um poder mais ou menos análogo ao do estado nesse cenário não fosse diferente. Não pudessem lucrar tanto com algo que fosse prejudicar o mercado de transporte particular, mesmo que o transporte nessa cidade-empresa em si melhorasse. Talvez a menos que outras cidade-empresas concorrentes já viessem fazendo isso, e tivessem oferta de residência e emprego. Mas se nenhuma fizesse, ou poucas fizessem, e não houvessem essas vagas de residência e emprego, ficaria tudo estagnado da mesma forma...

Essa é de qualquer forma uma situação para a qual parece que o planejamento é melhor do que origem espontânea de complexidade e organização. Se não me engano, Nova Iorque, apesar de não ser livre disso, tem esse problema em proporção absurdamente menor devido a um planejamento quase de visionário. E suspeito que tenha sido estatal, não por parte da propriedade privada, não que isso realmente importe (sério, não é sarcasmo; poderia ser que uma solução viesse uma espécie de êxodo gradual para "cidades-condomínio" com melhor pré-planejamento da estrutura de transportes).
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por zumbi filosófico »

Continuando a resposta à mensagem anterior, com sorte, mais breve do que tem sido minhas respostas anteriores.

user f.k.a. Cabeção escreveu:
Mas veja que a selecao natural tem seus meios para corrigir esses residuos e vestigios que perderam suas funcoes. Se esses apendices apenas parasitam os organismos, diminuindo sua eficiencia biologica, mutacoes que os atrofiem ou eliminem, sem afetar outras funcoes significativamente serao selecionadas.

Algo similar ocorre na economia de mercado e na sociedade. Se instituicoes que ja tiveram seu sentido perderem sua razao de ser, as pessoas que nao incorrerem nos custos necessarios para a sua manutencao terao vantagens comparativas em relacao as demais. E claro que essa percepcao surge da racionalizacao individual e local a respeito de problemas individuais e locais. Pois esses sao os unicos problemas bem postos na sociedade, aqueles que para os quais e possivel executar planos racionais.

A historia do planejamento central tem sido a historia da arrogancia e do fracasso da razao. Os sucessos e avancos que contribuem para todos os individuos na sociedade tem sido consistemente elaborados pelo planejamento e pela razao individual.



Bem, concordo e discordo ao mesmo tempo. As "características", a organização que vier da seleção natural ou do mercado pode em boa parte do tempo ser corrigida, mas nada garante que vá, nem é exatamente isso "a regra", talvez mais para a biologia do que para o mercado, mas não sei.

Resumidamente, acho que podem sim existir diversos problemas graves provenientes simplesmente de "algo dar mais lucro para alguém, e assim vender mais", que implícito nesse processo não estão soluções de tudo. Boa parte do tempo, não deve ser o fim do mundo também. Na verdade o fim do mundo é mais esperado de uma guerra mundial entre governos do que algo do tipo, acho.

Apesar disso, um bom jeito de lidar com esse tipo de coisa seria as pessoas se juntarem, e, de comum acordo, verem o que cada um quer fazer, as conseqüências que o que cada um quer fazer pode ter para com os outros, e daí talvez combinarem restrições que todos considerem justas no que cada um pode fazer.

É o que eu consideraria a essência do "estado", ainda que na prática possa não funcionar muito bem muitas vezes mesmo. Parece melhor algo assim, de modo geral, do que não existir isso, e estar valendo praticamente qualquer coisa que qualquer um faça, desde que tenha dinheiro para fazer.

Mas pelo que parece, isso de "anarquia" também teria algo mais ou menos assim. Mas ainda está tudo muito vago exatamente o que e como viria a ser, e no que diferiria de apenas ter um estado menos interventivo, mas não inexistente. Talvez o que eu chamo de essência do estado você esteja chamando de essencia da lei. Acho que até pode ser visto assim, com a ressalva que acho que para que algo assim fosse realmente efetivo, acabaria eventualmente tendo que ficar mais do que só no acordo de cavalheiros, infelizmente. Algo que vigiasse pelo cumprimento da lei teria que existir, para que uns não agissem de alguma maneira lucrativa, mas ilegal. Talvez não se precise chamar isso de "estado", talvez fosse melhor outro termo, mas é no mínimo prático fazê-lo enquanto não sei sobre outro termo mais adequado.



Como pode ser delirante se e a base operacional da etica que eu, voce e a maioria das pessoas empregamos no nosso dia a dia?

Que todos os desvios dessa norma sao considerados, corretamente, unanimamente, como atos vis e criminais?

Ja parou para pensar so um pouquinho nisso?

Nao e uma questao de que essa "pode" ser a etica dominante. Ela ja E. E apenas ela que permite a enorme prosperidade derivada da extensiva e descentralizada divisao do trabalho. Ela que permite a gestao de informacao em niveis maiores que os concebiveis por mentes individuais.

A ideia de necessidade uma autoridade central para o fenomeno social e que e um mito. Um mito perigoso.

"Welcome to the real world."


Aí é que está... parece ter muito de jogo de palavras nisso, e poucas diferenças para o que se coloca como alternativas dramaticamente distintas.

Bem... no mundo real, há, apesar de uma grande área de consenso sobre o que é certo e errado, uma área também não exatamente desprezível de desacordo. Dizer "estado!" não é uma solução mágica e automática para isso, de qualquer forma. Mas a ausência dele dá entender que, nesses casos, cada um segue sua lei. E cada um que se vir prejudicado com uma ação que considera ilegal, age como for que considerar legal para ser ressarcido, ou vingar-se, se considerar isso legal.

No fim das contas os mais poderosos, acabam prevalecendo. Talvez não seja tão diferente do estado, mas vejo o estado mais ou menos como uma forma disso se desenrolar de forma um tanto mais civilizada do que sugere para a maioria das pessoas, talvez errôneamente, a palavra "anarquia". Não sei se realmente é; em todo caso, uma vez que isso ocorresse, acho que seria provável que os vitoriosos resolvessem definir melhor as leis quanto as áreas de discordância, para a infelicidade dos outros. Talvez com concessões, para manutenção da paz. Mas no fim, não sei dizer se o que resultou é algo que se pudesse dizer "puxa vida, minha nossa senhora, mas como é diferente de «estado» essa anarquia que temos".



zumbi filosófico escreveu:Se essa "anarquia" não é realmente uma anarquia, mas algo não-utópico, meramente uma emergência espontânea de hierarquias não-arbitrárias, o estado já pode ser visto dessa forma, ou, pode-se dizer que viria a existir "algo" que fosse na prática muito parecido com o estado naquilo que faz, de qualquer forma.


Recapitulando o que eu ja disse, isso apenas ocorre porque voce se confunde usando duas definicoes de Estado.

Em certas ocasioes, voce considera, em sintonia comigo, o Estado como elemento de violencia coercitiva e imposicao.

Em outras, voce considera o Estado como qualquer manifestacao de lei abstrata.

De uma certa forma voce se prende a "verdade" nada trivial de se demonstrar que essas duas definicoes sao analogas, ou pelo menos na pratica, ja que voce diz que na "pratica viria a existir 'algo' [= a Lei] que fosse muito parecido com o estado naquilo que ele faz [= iniciar violencia]"

Assim, como eu ataco apenas a primeira concepcao, e nao a segunda, voce diz que o Estado existe dentro da minha concepcao etica tambem.

Espero ter caracterizado a clara falacia desse procedimento.


Bem, na verdade, acho que talvez o trecho anterior esclareça. Penso que as leis, nesse sentido do que deveriam ser, não são 100% consensuais, e na medida que visões sobre o que deveriam ser leis conflitassem de forma que não fosse possível algum acordo entre as partes envolvidas, alguma das visões acabaria usando de força para impor a sua. As leis não "são" o estado, o "estado" (ou algo bem próximo disso) é apenas aquele que conseguiu impor suas leis a todos. Estado e lei não são a mesma coisa, o estado é só o nome que se dá ao "dono" abstrato das leis que prevalecem.


zumbi filosófico escreveu:E eticamente apenas, também não sei se essa "anarquia-não-coerciva" é lá essas coisas. Talvez seja melhor aceitar a coerção como mecanismo válido para evitar a coerção, do que simplesmente esperar que isso deixe de existir por si só, ou lavar as mãos para qualquer forma de coerção que emergir espontâneamente, como se fosse eticamente superior a omissão nesses casos.


Veja que existe uma complicacao aqui.

E evidente que a forca pode e deve ser usada para evitar a coercao. Quando legitimamos o uso da forca contra a coercao nao estamos legitimando a coercao contra a coercao.

Coercao e o ato de iniciar violencia, nao de responder a ela.

Uma forca de seguranca ou de justica, seja ela estatal ou nao, nao e necessariamente coercitiva e ilegitima portanto, operando ela dentro da lei, que por sua vez nao e uma emanacao dos burocratas, como vimos.


Bem, pessoalmente não conheço/adoto essa definição mais restrita de coerção, penso que a ameaça de retaliação perante o descumprimento da lei é sim, coerção, mesmo que legítima. Mas que "não seja", tanto faz. Ainda fica nublada a distinção tão incrível e desejável do que se teria "sem o estado" e com ele.



O meu argumento e o de que a forca monopolizada pelo estado se encontra sobre fortes incentivos para escapar ao controle da lei, e isso ocorre o tempo todo.

Essa e a fonte das confusoes. O Estado controla monopolisticamente os mais visiveis mecanismos de emprego de forca contra a coercao, e mentalmente somos condicionados a achar que o Estado e esses mecanismos sao identificaveis.

E mais ou menos como se o Estado fabricasse monopolisticamente sapatos e acreditassemos que para estarmos calcados (ainda que precariamente) e necessaria a pre-existencia de um Estado sapateiro.

E portanto um mito.
[/quote]

Não acho que é exatamente uma boa analogia para a "confusão", que nem estou certo que realmente exista.

Enquanto que a sapataria é "quem produz sapatos", o estado talvez possa ser definido como "quem determina e impõe a lei", o que acaba sendo implicitamente quem tem o poder coercivo (ou "anti-coercivo") para tal, na maior parte do tempo, não é uma confusão besta de associação. O problema parece ser que, para você, a definição de "estado" talvez fosse mais adequadamente "um bando de burocratas metidos a besta metendo o bedelho onde não são chamados, e usando de força para suas imposições arbitrárias".

Entendo o sentido de que não precisa ser "o estado", no sentido de algo teoricamente análogo ao "acordo entre cavalheiros" que coloquei no começo da mensagem; poderia ser uma gangue de traficantes, por exemplo, que de certa forma acaba sendo um poder, um estado paralelo dentro do estado, em algumas regiões.

E concordo no ponto geral implícito de que o estado muitas vezes pode fazer intervenções em situações onde seria melhor que não fizesse. Só me parece que é um preciosismo a distinção entre o que chama de anarquia e estado mínimo.
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Darkside escreveu:O legal é que o anarquismo da Somália não é anarquismo, porque as pessoas lá não são amigas e não tem pensamentos felizes, então é algum outro tipo de regime não-burocrático caótico.



Para mim, o caso da Somalia mostra que tentativas de governo mais ou menos totalitarias nao evitaram o caos social, assim como sucessivas intervencoes externas. Muito pelo contrario, contribuiram para ele. O caso somali mostra muito mais a falencia dos principios estatistas do que dos principios anarquistas, quando o excesso de intervencao e governo reduziram a fragil civilizacao existente a selvageria total.

E preciso entender que apesar de na maioria das circunstancias a palavra anarquia ser sinonimo de caos social e ausencia de lei, e evidente que nenhum anarquista serio emprega o termo nesse sentido, nem mesmo o socialista que o cunhou, Joseph Proudhon.

O anarquismo ficou associado a baderna gracas a imagem popular gerada por movimentos de oposicao a civilizacao, como o anarco-sindicalismo que tomou conta da Catalunha nos anos 30, a contra-cultura americana dos anos 60 ou o movimento punk ingles dos anos 70. Todos com fortes inspiracoes socialistas.

Eu nao preciso nem comentar o que eu acho de cada uma dessas ideologias.
"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem

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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

zumbi filosofico escreveu:Não se pode desconsiderar o planejamento feito pelo cérebro como "igual" a qualquer outro fenômeno espontâneo, de qualquer forma. Se quer um carro, não vai ficar sentado parado diante das peças esperando que elas se organizem espontâneamente, iria planejar a montagem, ou, melhor ainda, comprar um já pronto, que foi planejado por uma outra pessoa e construído por um processo planejado por outras e etc.



Talvez eu tenha me expressado mal.

Eu nunca defendi que ordem espontanea equivalesse a nao fazer nada. A ordem espontanea social e gerada justamente pela acao planejadora e consciente de varios individuos de uma sociedade. Individuos que sabem que querem carros e como devem proceder para consegui-los.

Eu disse e que certos fenomenos complexos nao sao controlaveis pela acao humana, e nao sao sujeitos a planjementos objetivos. Um deles e exatamente a sociedade.

A sociedade nao e um empreendimento. Os individuos nao buscam objetivos comuns em geral. Mas quando dois individuos ou mais percebem que podem obter vantagens mutuas atraves da cooperacao, eles podem estabelecer uma parceria, um contrato. A ideia comum e a de que o Estado que governa certas alocacoes na sociedade e produto de uma vasta parceria, um "contrato social" que visa entregar a certas autoridades o poder para planejar aquilo que deve ser planejado na sociedade.

E essa ideia que eu ataco. O Estado nao e resultado de um contrato, nem mesmo de um abstrato ou tacito. Se fosse, essa empresa ja teria encerrado suas atividades ha muito tempo, ou ao menos seriam reduzidas a minusculas celulas governamentais de uns poucos individuos, como os kibbutz israelenses, que alias sao a mais clara prova do quanto a nocao de um Estado coletivista e igualitario, baseado em acordo voluntario, limitaria a civilizacao a pouco mais que a subsistencia. E olha que eles ja tem mais de mais de um seculo de tecnologia politica (sem contar os milenios de tradicao judaica que esses sionistas alegam corroborar com o seu movimento), e esse know how nao parece ter adiantado muito. E claro que mesmo que ainda que todo judeu e muitos nao judeus sejam aceitos nesses kibbutz, e que em Israel os filhos dessas comunidades sejam tradicionalmente muito respeitados (e politicamente favorecidos tambem), menos que 5% dos israelenses escolhem esse tipo de vida, e em geral apenas temporariamente.

(Outros exemplos sao comunidades de fanaticos religiosos como amish nos EUA, mas eu prefiro os kibbutz pois eles fizeram mais sucesso entre a esquerda da decada de 60 e 70.)

Essa experiencia ancestral deve dar uma amostra aproximativa de quantos de nos sao realmente motivados por um espirito coletivista voluntario.

E por isso que eu costumo entrar na questao da genealogia do Estado. Para que fique claro que ele nao e resultado logico da associacao de individuos preocupados com a gestao dos problemas coletivos, mas que sao uma heranca de uma mentalidade primitiva que nao tem mais lugar no mundo civilizado.

Que os Estados atuais nao fazem nada a nao ser atritar contrariamente ao impulso de cada individuo de buscar a realizacao de seu potencial, e que qualquer um que compreenda como a civilizacao emerge da etica individualista precisa logicamente se opor ao Estado.


zumbi filosofico escreveu:Enquanto o ponto for que, o planejamento não é sempre o melhor meio de se organizar um processo, não discordo. Mas está longe de ser desprezível, e pode ser vantajoso. É bastante razoável supor que empresas, que tem vários graus de planejamento, são mais eficientes que todos os seus funcionários trabalhando independentemente, sem uma coordenação central. Nem, sempre, mas é bem provável que seja verdade em boa parte do tempo, ou as empresas talvez nem tivessem vindo a existir, ou tenderiam a se "desintegrar" em uma complexa rede de freelancers, na medida em que, ao fazer isso, se tornassem mais eficientes e competitivas.



A verdade e que uma sociedade pode ser planejada por um comite central, desde que ela seja suficientemente pequena e simplificada, e que todos ali partilhem dos mesmos objetivos, em geral comer e dar de comer aos filhos e rezar para algum Deus. Ela funcionaria como uma empresa onde os administradores conheceriam bem cada parte do capital fisico e humano, que de uma maneira geral seriam bem homogeneos. No final, todos dividiriam o resultado da lavoura que alguns trabalharam, enquanto outros se ocuparam em repor o capital gasto (sejam as rusticas ferramentas e instalacoes de madeira, que o carpinteiro e ferreiro cuidariam, sejam as criancas que no futuro viriam a repor a forca de trabalho, que as maes se ocupariam).

Mas a prosperidade material das sociedades modernas so foi possivel gracas a descentralizacao das decisoes e da divisao do trabalho em niveis tao grandes que tornam impossivel dizer quem participou da fabricacao de um simples lapis. Provavelmente milhares de pessoas desconhecidas entre si, trabalhando em paises distantes e falando linguas estranhas, extrairam a madeira de florestas subtropicais, a processaram em serrarias, extrairam o grafite de minas, e o latex da borracha de selvas equatoriais, os pigmentos, as resinas e etc.

Ninguem sozinho possui todo o conhecimento necessario para produzir um lapis a partir das materias brutas. Nem mesmo uma empresa ou corporacao. Mas a acao coordenada de gente que nunca se viu antes, e que nao segue as mesmas religioes, que nao obedece ao mesmo conjunto de leis estatais se produziu.

Ninguem precisou planejar como cada uma delas executaria as suas tarefas, e ninguem seria capaz de tal proeza. O fato do lapis ter sido fabricado e funcionar perfeitamente foi resultado da magica do sistema de precos, e o sistema de precos e apenas um outro nome para a ordem espontanea da informacao na sociedade, da qual eu venho falando.

E essa magica que nao pode ser substituida por um planejamento detalhado central. E ela hoje esta em todo lugar, veja que o exemplo do lapis e ainda mais conveniente pois e talvez o objeto mais simples que usamos no dia a dia. Ele foi exposto pela primeira vez no ensaio I, Pencil - My family tree as told by Leonard E. Read. Vale a pena ler.


zumbi filosofico escreveu:Eu não vejo uma importância fundamental na genealogia do estado, ou do mercado. O que importa, penso, é se funciona bem ou não. Se fosse um legado do barbarismo, mas fosse considerável como bom, pouco importaria sua origem. Se tivesse sua origem na bondade humana, mas tivesse culminado em algo perverso, também não deveria se deixar de questionar os pontos que o tornaram ruim. Importa mais o que é, atualmente, e quais são suas falhas.



A genealogia institucional que eu emprego tem como finalidade combater a ideia comum de que os estados sao grandes cooperativas, kibbutz ou comunidades amish enormes, quando nao sao.

Os kibbutz e comunidades amish tem exatamente o tamanho otimo atingivel atraves da administracao central coletivista, qual seja, algumas duzias de familias vivendo em subsistencia (ainda que essas comunidades nao sejam completamente isoladas dos avancos externos e em virtude disso possam com o tempo crescer em numero, mas nunca exponencialmente como se viu no mundo capitalista).

Os Estados modernos nao sao resultado de uma escolha de organizacao que deu certo. A investigacao da sua genealogia tem por finalidade explicar como eles surgiram e assumiram a forma que tem hoje.


zumbi filosofico escreveu:Não entendi bem o ponto. Acho que talvez esteja sugerindo que as leis são como leis da física, descobertas, não inventadas. Em qualquer caso, me parece que elas não são tão evidentes quanto "as coisas caem", e muito menos tão forçosamente atuantes quanto a ação de cair. Ou seja, as pessoas conseguem facilmente não agir de acordo com o que quer que se proponha serem, ou que sejam, as leis. A menos numa acepção um pouco diferente de anarquia daquela que você está adotando, que seria de mundo sem lei.


Essa e exatamente a acepcao que eu estou negando.

Anarquismo nao e a negacao da lei. Anarquismo e a descrenca no governo central como instrumento eficaz para a se fazer valer a lei.

Vou apenas adaptar a linguagem que eu venho usando para construir uma analogia conveniente.

A minha visao do anarquismo pode ser vista como uma especie de ateismo. Existe uma religiao que cre no Deus Governo como a fonte magica da prosperidade e da ordem, e existem aqueles mais ou menos fanaticos (toda o espectro politico: da esquerda radical (os fanaticos) que dizem que tudo deve ser interpretado a luz do Estado, ao libertarianismo minarquista (os mais moderados, nao praticantes, dissidentes entre os crentes), que veem Deus, digo, o Governo, como um principio organizador geral e abstrato, e admitem maior autonomia para os individuos).

Nessa estoria, o anarquista e o ateu. Perceba as semelhancas:

A afirmacao de que o governo central existe porque uma entidade chamada Estado existe e tao fraca quanto a afirmacao de que Deus existe porque a Igreja existe.

E o fato do Estado monopolizar alguns mecanismos mais visiveis de mantencao da ordem social, como a justica ou a policia, diz tanto quanto fato da Igreja no passado ja ter monopolizado varios desses mecanismos, assim como as instituicoes de ensino e pesquisa cientifica. A existencia de producao cientifica no passado era uma "prova da existencia de Deus", assim como a producao de defesa e justica por orgaos estatais provam a existencia do governo central.

O ateu sabe das coisas boas que a Igreja ja fez, assim como reconhece varios membros da Igreja como sendo pessoas bem intencionadas e as vezes ate como sendo grandes homens. Sabe que as instituicoes mantidas pela Igreja muitas vezes funcionam. Isso nao o transforma num teista, muito menos num teocrata. Ele nao ve a funcionalidade da Igreja como sendo prova da acao de Deus (podendo vir a aceitar alegoricamente a afirmacao), muito menos ve necessidade de impor a religiao sobre os pagaos.

O mesmo vale para o anarquista. Ele reconhece que algumas instituicoes e mecanismos estatais funcionam, mas isso nao prova a existencia do fantasma do governo que anima a maquina. A justica e a policia operam na base dos principios que emergiram espontaneamente do fenomeno social, e a oficialidade estatal e na melhor das hipoteses uma alegoria para as leis, mas em geral costuma ser mesmo e um artificio para algumas pessoas conseguiem vantagens particulares, atraves da ingnorancia animista da maioria das pessoas. Muito similar a forma que o ateu ve a religao.

O anarquista apenas percebe que a relegiao estatista estabeleceu a sua teocracia, cujo Deus louvado por todos, ao qual todos pedem oferendas e sao obrigados a pagar dizimos para a sua Igreja, e no qual todos procuram justificar seus atos..

E claro que o ateu nao quer por fim a religiao da mesma forma que o anarquista quer por fim ao Estado, mas isso porque na verdade o que o anarquista quer e por fim a teocracia da religiao do Deus Governo. Ele nao quer por um fim a essa religiao em si, mas a imposicao dela sobre todos. Ele quer ser livre das implicacoes criadas por essa crenca mistica e irracional.

No final, um anarquista nao vai ser contra comunidades voluntariamente organizadas em torno do culto aos planejamentos centrais, como os kibbutz ou os amish, ou mesmo versoes menos radicais. Ele so nao admite que essa crenca que considera irracional e atrasada (no sentido de ser contraria a civilizacao) lhe seja imposta, como de fato vem sendo.


continua...
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Valmor
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Valmor »

zumbi filosófico escreveu:
Voltando a analogia com seleção natural. O lucro, independe, ainda que possa ter uma boa relação com, o progresso, assim como a adaptação. Os seres só precisam ser melhores em se reproduzir, e não de qualquer forma "absoluta", e os produtos só precisam ser os que vendem mais para serem os mais vendidos.

As soluções da iniciativa privada nem sempre podem ser melhores, podem ser tão ruins quanto as do estado. Eu entendi seu ponto, mas tentei explicar que em primeiro lugar o Estado é uma parte do processo que não faz sentido.

Por exemplo, eu voto em fulano para ele resolver o problema do monopólio da MS, mas essa parte do processo é desnecessária, uma vez que basta eu usar do meu poder democrático de consumidor e comprar da Apple e não da MS.
Em segundo lugar, as soluções do estado e da iniciativa privada pendem em direções opostas, a iniciativa privada tende a maior eficiência e o Estado tende a burocracia, corrupção (duas coisas que também ocorrem na iniciativa privada) e maior ineficiência, isso ocorre pela própria natureza da centralização do poder que dá ao burocrata o poder de interferir nos negócios de milhares de pessoas em todos os setores da economia.

No livre-mercado o empresário X não tem o poder de obrigar os cinemas a trabalhar com sistema de cadeira numerada, nem de obrigar todo o setor a permitir meia entrada para quem apresenta carterinha de estudante, nem de obrigar a pagar 13, salário mínimo, etc...
Já com o poder estatal, um imbecil que nem sabe o valor do salário mínimo, pode obrigar todas as empresas do Brasil a arcar com custos que elas muitas vezes não podem arcar, pode congelar preços e fazer todo tipo de coisa.

Lembro novamente do problema da associação entre empresários e políticos com todo esse poder, no livre mercado isso não tem como ocorrer pelo simples fato de que nenhum empresário teria poder para dizer como o outro deve trabalhar e quanto deve cobrar.

E no mais, o poder do consumidor é muito maior que o poder do eleitor, um consumidor consciente tem mais poder que um eleitor consciente, já que mexe diretamente no bolso da empresa afetando seu lucro como recompensa ou punição. Com o voto esse poder pode ser anulado já que o político precisa de um X para se eleger e seu voto a menos pode não fazer diferença e passar despercebido uma vez que ele já atingiu o número de votos que precisava. Já no comércio, um real a menos é sempre um real a menos, o impacto é imediato.
zumbi filosófico escreveu:Uma comparação possível com um ponto fraco do mercado seria o método científico versus moda ou achismo popular. Pessoas não médicas, curandeiros e charlatões podem popularizar falsas curas e tratamentos inúteis, a despeito de sua ineficácia; o livro só precisa vender mais para ser best-seller, não precisa de um best-author. Paulo Coelho que o diga.

Aqui, a analogia do estado seria por exemplo, mas não necessariamente, de algo como o ministério da saúde, mas poderia ser uma versão análoga que fizesse meras recomendações, ou imposições/restrições dentro de um contrato mais explícito que o "contrato social". Médicos, com pesquisa baseada em evidência, são mais habilitados a discernir o que é de fato um tratamento científico, verdadeiro, do que o consumidor leigo. Não são os burocratas arbitrários e igualmente suscetíveis às falhas do mercado.

Não acho que apenas medicina seja um caso onde essa anaolgia é válida, e nem sei bem que implicações que isso poderia ter para o estado ou ausência dele, e qualquer outra forma de hierarquia que o substituísse. Só acho um ponto válido a considerar. Tenho que ler mais a respeito de tudo isso, são só umas pequenas ruminações minhas. Acho que vou começar por "tecnocracia" na wikipedia, talvez.

Um conselho privado de medicina pode cuidar disso, como já foi dito, não estamos falando sobre ausência de leis, apenas sobre o Estado ser um etapa desnecessária nesse processo, uma etapa que tende a ter soluções piores que a da iniciativa privada, principalmente porque na iniciativa privada sempre existe a concorrência.


zumbi filosófico escreveu:Nada do que disse aí, seria impossível de existir, tirando o estado da equação de alguma forma. O "empresário ganancioso" pode não ter ajuda do estado, mas o mercado não é uma espécie de carma que só premia o mérito verdadeiro e os bons de coração, que vai impedí-lo de atingir quaisquer objetivos que a sociedade possa considerar indesejados, que pudesse atingir com ajuda do estado. E também não terá qualquer impedimento vindo do estado.

Sem o poder do burocrata fica infinitamente mais difícil para o empresário ganancioso.
Você ainda não atentou para um ponto fundamental, o burocrata tem um PODER que nenhum empresário sozinho têm. No livre-mercado o poder é pulverizado, no sistema atual o poder é concentrado nas mãos do estado e seus burocratas. Com esse poder concentrado deixando de existir, ou seja, sendo pulverizado e voltado a população, o empresário ganancioso não consegue reunir o mesmo tipo de poder e não tera tanta força quanto pode ter hoje em dia.
zumbi filosófico escreveu:Digamos que uma empresa esteja poluindo a água de uma cidade. Meio como na história dramatizada no filme "Erin Brockovich". Sem estado, a quem se recorre? Vai lá se mendigar por justiça na porta da empresa? Ou simplesmente, as empresas que poluírem suas vizinhanças terão menos clientes saudáveis nas suas vizinhanças, logo menos lucro, eventualmente falindo, enquanto empresas não/menos-poluentes prosperam? Ou, isso eventualmente se torna público, e as pessoas, mesmo sem individualmente terem poder de influenciar a mídia como presumivelmente teria uma empresa, conseguem criar pressão popular-mercadológica para a empresa sanar esses problemas?

Teremos uma policia privada aplicando a lei, ou melhor, muitas policias privadas aplicando a lei.
E sim, nós pagaremos por ela, assim como pagamos pela policia que temos hoje.
zumbi filosófico escreveu:Enfim, não acho que se a empresa tendo que responder apenas ao mercado, se tem o melhor dos mundos. O ufka Cabeção, de qualquer forma, possivelmente dirá que esse cenário não é o que ele propõe, que poderiam existir leis ambientais e/ou de ressarcimento contra danos. Provavelmente isso teria que ser decidido por outra empresa ou uma série de empresas, não sei. O que, a princípio, quase que por definição, já deixa a coisa pendendo mais a favor da empresa do que às vítimas, a menos que fosse um sistema que não fosse comprável, como, teoricamente, mas nem sempre na prática, deveria ser o estado. Se fosse, bem, aí seria simplesmente chamar uma rosa por outro nome, em vez de admitir que tem perfume e espinhos, qualquer que seja o nome que se dê.

Esse é o ponto, empresas privadas competindo entre si não concentram o mesmo poder que o estado.
Estamos falando de cidadãos empreendedores que criam empresas para oferecer serviços na construção de infraestrutura, segurança, etc...
Com o estado se temos uma policia corrupta e incompetente, temos uma policia corrupta e incompetente.
Na iniciativa privada se temos uma empresa corrupta e incompetente, temos também seus concorrentes, um deles tende a ser mais honesto e mais competente.
No pior cenário todas as empresas seriam tão ruins quanto a policia estatal, mas a tendência natural é que sejam melhores e, mais uma vez, o consumidor tem poder democrático imediato na escolha da empresa.

A tendência na livre-iniciativa é sempre mais positiva que no modelo estatal.


zumbi filosófico escreveu:Uma posição intermediária aqui, mas discordando da afirmação central, sobre planejamento centralizado ser uma catástrofe. Mesmo as empresas, que se admite serem melhores, tem planejamento central. Muito provavelmente não fariam melhor com uma organização espontânea e anárquica de autônomos individuais.

No modelo estatal, temos um planejamento central do estado.
Na Iniciativa cada empresa tem seu planejamento central, mais no mercado, são vários planejadores independentes, o que significa que o planejamento não é central. (ele só é central em cada empresa).
O planejamento central NA EMPRESA especifica é bom, mas uma unica iniciativa central é ruim.

Veja o blu-ray e o HDTV, varias empresas projetaram vários sistemas, dois deles eram tecnologias muito boas e competiram, no fim um deles venceu no mercado (a melhor tecnologia, o blu-ray).
O planejamento do blu-ray foi, na empresa, foi centralizado, mas no mercado ele competiu com outras tecnologias, o que resulta que a tecnologia que usaremos daqui pra frente, não teve um planejamento central na iniciativa privada ou no mercado como um todo.
Se fôssemos depender do estado, talvez ele tivesse desenvolvido o HDTV ou coisa pior, mas com um planejamento central, aquela seria nossa unica opção e nada mais.

zumbi filosófico escreveu:Se admite-se isso, as diferenças entre estado e empresa praticamente desaparecem, uma vez que é possivelmente um ponto de comum acordo que uma mesma empresa poderia atuar eficientemente em diversas áreas. Se viesse o maior multi-trilionário de todos os tempos e comprasse todas as maiores empresas de cada setor de um país, e as unificasse sobre um mesmo rótulo, não seria apenas por isso que tudo começaria a colapsar. Mesmo que de alguma forma fosse feita alguma maior interligação entre elas, com os lucros de um setor ajudando na estrutura de outro que está mais defasado ou o que quer que fosse. Na verdade, teria justamente o potencial de torná-las mais eficientes do que seriam isoladas.

Mesmo imaginando o pior cenário, sim existem pontos negativos e positivos em megas corporações.
Empresas assim se tornam muito burocratica, principalmente quanto trabalhando em conjunto com empresas tercerizadas. Isso é bom para a concorrência que pode atacar nesse ponto.
Por outro lado o monopólio pode dificultar o trabalho da concorrência e o apoio de empresas pode trazer certos benefícios.

Ainda assim não é igual ao estado pois não tem o poder do estado de interferir em outras empresas, o incentivo do burocrata e do empresário também são diferentes e uma empresa para crescer tanto, já teria que demonstrar eficiência nas funções exercidas o que significa que na pior das hipóteses ela seria comparavel a um bom estado, a um estado eficiente, mas ainda assim sem o mesmo poder do estado.

zumbi filosófico escreveu:E da mesma forma não é porque várias administrações mais ou menos independentes podem existir sob o rótulo "governo" que está destinado ao colapso ou a um desempenho muito pior do que seria com administrações de independência mais claramente delineadas.

A principal diferença não é tanto a centralização, até porque pode-se ainda falar em "governo" ou "estado" em diversos níveis de centralização, melhores e piores (qualquer que seja a realidade), mas sim a questão do lucro no sentido mercadológico e do serviço à sociedade.

O pior no estado é a concentração de poder, mesmo o estado mais eficiente e menos eficiente que um ente análogo na iniciativa privada. Isso se deve a vários motivos, um é o incentivo de cada ente, a estrutura central não competitiva não gera os mesmo incentivos e punições da iniciativa privada, outro ponto é a administração, na estrutura estatal um governante pode chegar e mudar tudo (as velhas reformas) o incentivo para isso ocorrer é constante no estado, por fim o tipo de pessoas que acabam indo parar no estado para tomar as decisões, os burocratas agem por interesses financeiros e eleitoreiros e o tipo de gente tende a ser esse devido a concentração de poder.

zumbi filosófico escreveu:O empreendedor não precisa da solução ideal para o consumidor, só precisa da solução que vender mais. Pode ser o ideal, pode ser bastante próxima, mas não precisa ser. Não precisa nem ser exatamente uma solução, a bem da verdade.

Ele precisa da solução ideal para seu publico alvo, quem vai decidir o que quer e o que precisa é o consumidor. Se a solução não é a ideal, isso é incentivo a concorrência, tanto em alertar e esclarecer o consumidor em suas peças publicitárias, quanto em demonstrar que sua solução é melhor e a um custo que o consumidor quer ou pode pagar.

Veja que no mercado soluções concorrentes coexistem.
Falamos sobre MS e Apple, bem, temos acesso as duas soluções e a outras mais, todas coexistindo, mesmo que a preferia do publico seja a pior.
Vale lembrar que no inicio as coisas tendem a não funcionar bem mesmo. Tudo o que é novo é mais dificultoso, Monteiro Lobato se deu muito mal em sua empreitada na maior editora do país até então, uma seca em São Paulo fez a eletricidade sumir e ele só podia trabalhar dois dias por semana enquanto suas dividas acumulavam.
Hoje os PCs travam e a internet cai o tempo todo.
O tempo se encarrega de melhorar as coisas e muita gente está trabalhando para isso, inclusive em conscientizar o consumidor.

zumbi filosófico escreveu:Para se proteger contra a iniciativa privada.

Sim.
Na iniciativa privada podemos nos proteger contra a própria iniciativa privada, já contra o Estado se ele quiser não existe proteção, basta baixar uma lei e os terroristas (ou suspeitos inocentes) vão pra cadeia para serem torturados sem direito a julgamento.
O Estado é um mecanismo de coerção por si só, é um agressor do qual eu não posso me defender, tenho que dar meu dinheiro e não tenho pra onde correr, não posso contratar ninguém para me ajudar nem mandar prender os burocratas que além de tudo, tem poder sobre meu negocio, sobre minha propriedade.

O governo nos protege contra a iniciativa privada, mas não contra ele próprio.

zumbi filosófico escreveu:
Bem, enfim, não estou defendendo um super-estado nem nada. Só comentando que o mercado não é esse processo super magnífico, infalível, realmente merecedor de toda essa mística que colocam sobre ele -- agora em vez de só "mão invisível", com também essa terminologia de sonoridade científica da teoria do caos. Pelo menos eu não fiz minha defesa usando a "teoria da relatividade", dizendo que "tudo é relativo" quanto a eficácia do estado ou algo parecido, "versus" mercado...

E o estado também não é "a solução" dessa forma binária, ambos sofrem ou potencialmente sofrem dos mesmos problemas. O próprio Adam Smith era crítico de grandes corporações, justamente por isso. Mas quem vai impedir grandes corporações? O estado com leis anti-truste ou algo do tipo? Uma empresa que de alguma forma lucre com isso? Sei lá. Acho que mais provavelmente algo muito parecido com isso que se chama de estado.

E, no que se refere a leis, bem, acho que tem sim que haver alguma delineação mais clara, e imposição coerciva, ou não, dependendo da acepção do termo ou fraseamento que se ache mais bonitinho para o que estiver se propondo. Não precisa ser algo tão exagerado como "crianças não devem usar cortes de cabelo estranho", mas também não acho que se pode confiar simplesmente na sabedoria que emergir das multidões.

O Mercado não é infalível, o ponto é a diferença entre o Estado e a iniciativa privada.
O Estado é sempre um passo desnecessário e naturalmente tende a ineficiência, já a iniciativa privada tem a tendência oposta, menos poder concentrado e no pior das hipóteses vai ser tão ineficiente quanto o governo. Aqui com a diferença que o poder do consumidor em corrigir isso é sempre maior, bem como o da concorrência em aproveitar a ineficiência de tal empresa, então a solução do problema está também sempre a mão.
O estado coloca barreiras na solução dos problemas que a iniciativa privada não coloca, pelo contrario na iniciativa privada a solução do problema é sempre a tendência natural.

Hoje muito do que fazem os políticos em seu super pacotes e planejamentos para 'incentivar' isso e melhorar aquilo, é justamente derrubar barreiras erguidas pelo próprio estado.
Veja o plano da construção de 1 milhão de casas, estão derrubando dois ou três impostos para 'estimular' o setor 'derrubar' os preços. Ou seja estão derrubando algumas poucas barreiras que o estado cria, para deixar a iniciativa privada trabalhar melhor.

Sem o estado todas essas barreiras são inexistentes e nas barreiras existentes, não existe uma entidade como o estado, impedindo que elas sejam derrubadas, basta achar a solução e derruba-la, ninguém vai mandar a policia e te prender por isso... já aqui meu amigo, o estado te coloca em cana.
Na iniciativa privada o máximo que pode acontecer é a concorrência tentar te derrubar, mas não é proibido fazer se você conseguir, ou tentar fazer.

No fim a organização que vai surgir disso, ganha todas as funções do estado, mas todas feitas de forma mais eficiente, com instituições concorrentes e com os custos pagos pelos consumidores específicos e pelos empreendedores, além de tudo ocorrer com o poder pulverizado. É um ente anárquico sem a mesma concentração de poder e por isso sem os mesmos problemas.

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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »

Continuando o ponto anterior.

De fato, as leis morais nao sao como leis da fisica, ja que podem ser "quebradas".

O fato de matar ser considerado errado nao impede que assassinatos ocorram, mas a lei da gravidade impede macas de "cairem para cima".

Nao e esse tipo de paralelo que eu queria construir. Para mim, existem elementos absolutos que devem fazer parte das leis de um sistema de agentes com as nossas caracteristicas particulares. Esses elementos se manifestam no fato de que as leis que emergem nao seguem um padrao arbitrario em cada sociedade isolada, pelo contrario, cada uma delas parece descobrir com o tempo os mesmos valores eticos, com certas diferencas esteticas na sua apreciacao.

Esses valores fazem parte do que se convencionou chamar de Lei ou Direito Natural, que nao tem nada a ver com o estado natural de selvageria sem leis, mas pelo fato de que essas leis emergem naturalmente da interacao de seres humanos racionais. Que o processo de civilizacao de certa maneira e a descoberta, compreensao e assimilacao desses principios, e nao sua invencao.


zumbi filosofico escreveu:E por isso, precisa haver algo "como o estado", para garantir o exercício das leis. Não precisa ser "o estado", de fato, e talvez fosse até melhor que não fosse mesmo. Como disse antes, há algum tempo, acho que nesse fórum mesmo, estava meio empolgado com idéias mais ou menos assim. Mas a conclusão (acho que foi bem exposta pelo Huxley) é que no fim dá quase no mesmo, emerge uma hierarquia, e apenas algo bastante abstrato dos seus fundamentos é que difere, e pouca coisa dos aspectos práticos. Tanto o estado, quanto algo que o suplantasse em suas funções, podem sofrer dos mesmos problemas. Ainda que possivelmente hajam algumas vantagens e desvantagens um pouco mais aparentemente prováveis de cada lado, também não são inevitáveis no outro.



Nao surgira algo como o Estado na medida que esse algo nao for imposto.

Veja, eu tenho para mim que um mundo anarquista nao seria completamente diferente de um mundo com Estado, ou que de alguma maneira deveria ser inicializado do zero. Eu tenho esse tipo de ideia na mais baixa conta dos idealismos construtivistas quase infantis.

Eu nao acho que a sociedade esta toda errada e precisa ser reconcebida corretamente. Pelo contrario, eu admiro as conquistas da civilizacao. Mas isso nao me impede de apontar certas posturas e posicionamentos irracionais e primitivos, que se encontram em flagrante conflito com os principios que permitiram a emergencia e a prosperidade enorme dessa civilizacao.

Numa sociedade sem Estado ainda haveria quase todo tipo de problemas e situacoes lamentaveis que existem hoje, exceto aqueles proprios do Estado.

Eu acho que um dos grandes fatores para me convencerem a adotar uma atitude anarquista foi exatamente a constatacao de que nao so as coisas nao precisariam ser completamente diferentes, como o fato da ordem social atual nao ser o produto da manifestacao de um governo, disso ser apenas uma ilusao, um misticismo muito comum.

Quanto a organizacao dos servicos hoje controlados pelo Estado, eu recentemente discuti uma possibilidade que ainda me parece bastante interessante, que e a nocao geral de condominio. Esses seriam corporacoes locais que forneceriam determinados servicos vinculados as propriedades daquela regiao, em termos contratualmente estabelecidos na titulacao daquela propriedade. Como num condominio de um edificio atual, mas com um escopo mais abrangente.

Essa solucao me parece interessante primeiro porque ela ja existe e aplicada com sucesso na solucao de questoes menores de legislacao de interferencia vicinal, gestao de areas comuns de acesso e instalacoes. E uma solucao completamente privada, ao menos em teoria. Existem legislacoes condominiais estatais, mas parece ser bastante claro que nao e por causa delas que todos condominios nao viram caos.

Eu acho que condominios poderiam proliferar-se e interpenetrar-se. Por exemplo, voce poderia fazer parte de um condominio para as suas instalacoes eletricas, outro para a agua, outro para a gestao de ruido na area residencial onde voce vive. Cada um desses servicos poderia assim assumir as proporcoes otimas de clientes para que o atendimento fosse realizado com o menor custo possivel (a competicao capitalista entre os condominios os forcaria a se adaptarem).

Nao vejo limitacoes intrinsecas a abrangencia desse tipo de solucao para os problemas de externalidade comumente considerados area de atuacao do Estado.

Tambem nao vejo grandes diferencas com relacao ao servico ja prestado pelo Estado, o funcionamento seria similar, exceto que haveria competicao, nao haveria imposicao, e as empresas gestoras desses condominios teriam a escala correta para que os custos ficassem reduzidos.

Outra vantagem dessa ideia e que ela permite uma privatizacao menos "traumatica". As pessoas continuariam conservando pelos seus condominios varias das idiossincrasias que tem sobre o governo, provavelmente muitos nomes de instituicoes seriam mantidos tambem.


zumbi filosofico escreveu:Saindo um pouco da analogia com os seres vivos. O problema básico do estado talvez seja que, uma pessoa no seu cargo está relativamente mais segura do que um análogo na iniciativa privada. Um "impeachment" ou boa parte das demissões de cargos públicos são consideravelmente mais complicadas e raras do que uma demissão por ineficiência no exercício da função no setor privado, ou por se ter um outro candidato melhor capacitado, ou mesmo pela própria função ser vista como supérflua. Uns vêem isso como que na iniciativa privada, o "organismo" é de tal forma que permite um fluxo de informações mais eficiente. Bastante verdade, podem existir exceções e análogos na iniciativa privada, mas acho que na maior parte do tempo o estado é mais sujeito a algo análogo (ou à propria) "lei de Parkinson", uma tendência a aumentar desnecessariamente e se tornar "dependente" desse aumento, do que a iniciativa privada.


O Estado sempre luta com esse problema de crescimento exacerbado de funcoes sem que orgaos inuteis sejam eliminados justamente porque ele mata o mecanismo que os elimina. E a competicao pela eficiencia de mercado que faz o servico.

E claro que o governo cresce demais e fica obvio para qualquer observador externo que uma determinada reparticao nao faz absolutamente nada, qualitativamente falando. Mas no mercado voce pode quantificar o quanto cada operacao e util atravez do lucro ou das perdas que ela gera. Enquanto que no Estado uma operacao de perda pode ser indefinidamente mantida atraves da externalizacao dos seus custos, no mercado isso e muito mais dificil de se fazer.


zumbi filosofico escreveu:Do outro lado, a desvantagem é bastante sintetizada no que o Bill Gates disse para Steve Jobs no filme "piratas do vale do silício", quando em resposta a ele ter afirmado que os produtos da Apple são melhores que os da MS, "humpf! Você não vê? Isso simplesmente não importa."

É bem análogo a seleção natural e a necessidade única da perpetuação; o organismo não precisa ser melhor em nenhum sentido absoluto, só precisa se reproduzir mais. Para que uma empresa se sobressaia, só precisa ser melhor em vender seu produto que as outras empresas, o seu produto não precisa ser nem um pouco melhor.


Nao existe essa de um organismo melhor num sentido absoluto que nao seja o definido pela selecao natural.

E a selecao natural que da sentido a gradacao dos organismos em mais ou menos adaptados.

E a selecao de mercado que da algum sentido a gradacao de empresas eficientes.

Mas e verdade que nao e apenas o tamanho das vendas da empresa que contam para a sua saude ou sobrevivencia. Empresas podem assumir estrategias arriscadas e ficarem grandes demais para se manter. Outras podem ganhar espaco durante um certo momento, mas serem afetadas mais tarde, quando o publico descobre alguma outra coisa que os faz mudar de opiniao.

Alem de toda sorte de fenomenos aletorios, como modas ou tendencias, ou incidentes e acidentes, que acabam definindo as sortes de individuos e empresas, assim como tambem a de animais e plantas que competem. Os dinossauros nao estavam preparados para o meteoro quando dominavam a Terra. As baratas e os ancestrais dos camundongos sim.

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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Darkside »

user f.k.a. Cabeção escreveu:Para mim, o caso da Somalia mostra que tentativas de governo mais ou menos totalitarias nao evitaram o caos social, assim como sucessivas intervencoes externas. Muito pelo contrario, contribuiram para ele. O caso somali mostra muito mais a falencia dos principios estatistas do que dos principios anarquistas, quando o excesso de intervencao e governo reduziram a fragil civilizacao existente a selvageria total.

E preciso entender que apesar de na maioria das circunstancias a palavra anarquia ser sinonimo de caos social e ausencia de lei, e evidente que nenhum anarquista serio emprega o termo nesse sentido, nem mesmo o socialista que o cunhou, Joseph Proudhon.

O anarquismo ficou associado a baderna gracas a imagem popular gerada por movimentos de oposicao a civilizacao, como o anarco-sindicalismo que tomou conta da Catalunha nos anos 30, a contra-cultura americana dos anos 60 ou o movimento punk ingles dos anos 70. Todos com fortes inspiracoes socialistas.

Eu nao preciso nem comentar o que eu acho de cada uma dessas ideologias.


A Somália é um exemplo de sociedade que simplesmente se livrou do governo e não substituiu por nada, deixando as pessoas livres pra organizar o país como quisessem. O resultado foi que as pessoas se organizaram em grupos tentando tomar o poder, dividindo o território nacional em regiões dominadas pelos mais fortes. Enquanto isso, a população comum que só queria tocar as suas vidas teve que dar um jeito de fazer isso no meio do fogo cruzado, contratanto vigilantes em uma terra literalmente sem lei. Existem indústrias e empresas lá, e essas encontraram no anarquismo um obstáculo ao invés de uma oportunidade.

Se o anarquismo não termina em caos, eu só gostaria de saber como uma sociedade se defenderia dos três poderes em guerra entre si na Somália por exemplo, sem um Estado de Direito. Lá, temos civis organizados em milícias tentando dominar a maior quantidade de território na good and old lei do mais forte, temos um grupo terrorista fundamentalista islâmico estrangeiro tentando dominar o país e trasformar em mais uma teocracia, e temos a fraca e incapaz ajuda internacional da ONU, que tenta sozinha instaurar a ordem há anos sem sucesso.

O anarco-capitalismo não dá garantia nenhuma de que a população vivendo nele poderia se defender de qualquer uma dessas ameaças, mas presume que ele viria depois de um estado avançado de capitalismo, onde todas as pessoas já teriam aprendido a importância da liberdade e das leis morais que devem reger o ser humano em nome da boa convivência, e por isso uma situação assim não estaria "nos planos".

Mais uma utopia.
"Temos uma coisa muito mais extraordinária: não só se consegue que uma mesa se mova magnetizando-a, como também que fale. Interrogada, ela responde."

Alan Kardec, Obras Póstumas Pág. 237

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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por Valmor »

Darkside escreveu:A Somália é um exemplo de sociedade que simplesmente se livrou do governo e não substituiu por nada, deixando as pessoas livres pra organizar o país como quisessem. O resultado foi que as pessoas se organizaram em grupos tentando tomar o poder, dividindo o território nacional em regiões dominadas pelos mais fortes. Enquanto isso, a população comum que só queria tocar as suas vidas teve que dar um jeito de fazer isso no meio do fogo cruzado, contratanto vigilantes em uma terra literalmente sem lei. Existem indústrias e empresas lá, e essas encontraram no anarquismo um obstáculo ao invés de uma oportunidade.

Se o anarquismo não termina em caos, eu só gostaria de saber como uma sociedade se defenderia dos três poderes em guerra entre si na Somália por exemplo, sem um Estado de Direito. Lá, temos civis organizados em milícias tentando dominar a maior quantidade de território na good and old lei do mais forte, temos um grupo terrorista fundamentalista islâmico estrangeiro tentando dominar o país e trasformar em mais uma teocracia, e temos a fraca e incapaz ajuda internacional da ONU, que tenta sozinha instaurar a ordem há anos sem sucesso.

O anarco-capitalismo não dá garantia nenhuma de que a população vivendo nele poderia se defender de qualquer uma dessas ameaças, mas presume que ele viria depois de um estado avançado de capitalismo, onde todas as pessoas já teriam aprendido a importância da liberdade e das leis morais que devem reger o ser humano em nome da boa convivência, e por isso uma situação assim não estaria "nos planos".

Mais uma utopia.

Você entende a diferença entre anarquismo e guerra civil? Na Somalia não a ausência de governo e sim excesso de governo.
Eles chegaram a situação atual após décadas de guerra civil, após décadas de guerra entre o governo oficial reconhecido pelas nações unidas e outros grupos para-militares que se pretendem governos oficiais e tem tanto poder quanto o governo oficial.

A situação é levada assim já há tanto tempo que no vácuo de poder a sociedade se adapta e formam-se instituições que tentam funcionar sem a ajuda dos governos, essas são as instituições que dão a esse caos um semelhança com o que se poderia esperar de um anarquismo, isso surge pela necessidade de sobrevivência e adaptação de décadas de guerra civil, do contrario a situação seria insustentável.
Isso não significa que a Somália seja anarquista e deixe de estar em guerra civil ou de ter múltiplos governos, alguns declarando independência e decretando certas areas como um novo país soberano, mas em guerra com o país vizinho.

Entenda assim: A Somália nunca se livrou do governo, novos governos paralelos foram criados levando o país a uma guerra civil.

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user f.k.a. Cabeção
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Re: Breve paragrafo sobre a miseria filosofica do Estado minimo

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


Certamente voces dois (Darkside e Usuário deletado) nao entenderam direito o que venho dizendo.

Primeiro a Somalia.

Para comeco de conversa, ainda que apenas para fins argumentativos eu a aceitasse como exemplo valido de anarco-capitalismo, o fato e que muito ANTES da queda dos sucessivos regimes ela ja era um dos paises mais miseraveis e devastados pela violencia e fome no mundo. O pais ja era pobre e foi devastado pela guerra civil prolongada e pelos warlords, pela seca de 92, pela ocupacao americana e da ONU, pela ocupacao maometana teocratica, etc.

Para um pais que ja tinha tao pouca infraestrutura e capital humanao nao foi dificil perder tudo nessas singela sucessao de calamidades.

E ninguem aqui, a nao ser voce, esta dizendo que a proposta anarco-capitalista pretende gerar prosperidade instantanea no mais arido deserto, nas mais destrocadas ruinas.

O que alguns comentaristas e teoricos fizeram foi observar que dentro do caos social e do vacuo de poder que tomou conta da Somalia, no ambiente mais hostil possivel ao empreendedorismo, diversas solucoes que esses teoricos consideravam tipicas do anarco-capitalismo foram espontaneamente adotadas devido a ausencia do poder central que as impedisse. Eles inclusive argumentaram a respeito do impacto dessas solucoes em recentes registros de crescimento da producao agricola do pais.

E apenas desonesto tirar esses comentarios do contexto para atribuir a miseria lastimavel da Somalia ao anarco-capitalismo que teoricamente seria praticado por la. Capital e riquezas nao e algo que surge com uma mudanca de regime, ou com a abolicao de regimes, a menos que se acredite em magica. Alias, o mais comum e que eles sejam destruidos no processo de rebeliao e de resistencia.

No entanto, e bastante questionavel se a Somalia esta mesmo vivendo um estado de lei anarquica ou se simplesmente ela foi reduzida a uma miriade de governos locais violentos. Parece que ela esta num misto das duas situacoes.

E um caso interessante a se discutir, desde que certas atitudes sejam evitadas, como essa sua, de que os anarquistas querem "somalizar" o mundo, quando a Somalia ja estava bastante "somalizada" antes do suposto anarquismo aparecer.

Se a Inglaterra "derrubasse" o Estado e nao colocasse nada visivel no seu lugar, ela nao se reduziria a condicao de miseria da Somalia, pelo contrario, continuaria sendo aquilo que a Inglaterra e, pelo menos durante um certo tempo.

Se voce fosse esquerdista como o Abmael eu ia te acusar de conscientemente empregar desonestidade retorica. Mas vou usar um filtro ideologico conivente e cara-de-pau para interpretar isso como sendo uma simples confusao.
"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem

Trancado