Botanico escreveu:1) Ele foi um termo proposto, salvo engano em Atos, para designar os "seguidores de Cristo".
Sinceramente, acho que essa deveria ser a acepção considerada mais acertada.
No decorrer da sua argumentação nesse e nos outros posts, você demonstra considerar que, para ser cristão, é mais importante que um homem acredite na bíblia como interpretação literal e em uma ou outra seleção de dogmas do que o esforço que este faz para seguir a moral do Cristo.
Apesar dos argumentos históricos apresentados, ainda percebo esse pensamento como extremamente incoerente. Por ele, quanto mais seguirmos o Cristo, quanto mais nos esforçarmos por aprendermos e agirmos de acordo com Sua moral, menos seremos "cristãos". Logo, quanto mais cristão, menos cristão.

Nietzsche concordava que o único cristão que já existiu morreu na cruz. Por essa lógica, o Cristo é o único que nunca foi cristão de verdade.
Se fôssemos seguir à risca os mesmos argumentos históricos, talvez fosse melhor encontrar outro nome também para o Espiritismo. Durante o último século diversos falsos médiuns utilizaram o nome de espíritas. Muitos médiuns verdadeiros publicaram e publicam centenas de livros que não estão de acordo com os princípios doutrinários e que mesmo assim se apresentam como espíritas. Quando se faz uma visita por algumas dezenas de casas espíritas, percebemos que cada uma delas estuda e prega o Espiritismo bem à sua maneira, às vezes apenas idiossincrática, às vezes com preocupantes falhas doutrinárias. Fora isso, vivemos um espiritismo de grande palavrório acerca dos fenômenos (que substituíram com muita facilidade os dogmas no nosso hábito de religiosidade exterior) e de muito pouca ação e mudança interior, no que estamos perfeitamente de acordo com os que você chama "Cristãos". Se se argumentar que a fragmentação ainda não foi suficiente para descaracterizar o movimento espírita, pode-se dizer ao menos que estamos no caminho certo e que logo o termo "Espírita" terá a mesma validade que você confere ao termo "Cristão".
Botanico escreveu:5) Bem, chegando aos finalmentes: o politicamente correto. Sim, numa sociedade de maioria cristã, não pega bem pregar de uma religião que se diz abertamente não-cristã. Daí então, até para efeito de marketing se proclama cristã, seja lá o que esse termo queira significar...
6) Quando Kardec codificou o Espiritismo, fê-lo a prestação, aos poucos. Ao contrário dos profetas bíblicos e os dos fundadores de religiões, Kardec não tinha o privilégio de falar com o Divino e assim foi montando as coisas aos poucos. Há site, Criticando Kardec, onde o seu dono compara a primeira edição do LE, com a edição finalizada. Há mudanças doutrinárias entre uma versão e outra! Kardec, no início, imaginava o Espiritismo não como uma religião, mas como uma ferramenta filosófica que hipoteticamente poderia ser usada por QUALQUER religião. Inclusive ele nomeava como espíritas as pessoas que ACEITAVAM A IDÉIA DE QUE HÁ COMUNICAÇÃO COM OS ESPÍRITOS, INDEPENDENTE DA RELIGIÃO QUE PROFESSASSEM. Mas ao fim de sua missão, ele já não pensava mais assim: ele se conscientizou de que o Espiritismo também era uma religião e ainda por cima hostilizada pelas outras.
Então Kardec estabeleceu o Espiritismo como Cristão unicamente porque vivia numa sociedade de maioria cristã? Por pura questão de marketing, pois de outra forma ele não iria conseguir uma boa aceitação dessa nova religião e não iria conseguir novos adeptos? Mas, no item logo abaixo, você mesmo não destaca que ele não tinha a intenção inicial de criar uma nova religião? Então qual a utilidade da estratégia de marketing? Ou ela foi posterior? Então além de acusar Kardec de maria-vai-com-as-outras, você também vai acusá-lo de manipulador e de adaptar os princípios da codificação às necessidades do mercado de fiéis?!?!?!
Eu sei que você não quis dizer nada disso, apenas quis demonstrar o absurdo que enxergo nessa proposição. Entendo perfeitamente que inicialmente não era a intenção dele fundar uma nova religião. Afinal, porque um filósofo iria ter como meta criar uma religião? Para ele era muito mais lógico estabelecer uma ferramenta filosófica, mas ele não pôde seguir esse caminho. De qualquer maneira, tenho certeza que a moral cristã seria parte fundamental dessa ferramenta de aprimoramento, por que a verdade é que todo o Espiritismo desaba e não passa de mera fenomenologia vazia e inerte sem essa moral.
Mas a questão é: Kardec tinha o hábito de seguir o politicamente correto a ponto de interferir no corpo doutrinário para isso? Ou ele seguia as comunicações? Se ele estava propondo algo muito mais agressivo ao senso comum das religiões cristãs da época, como a comunicabilidade dos espíritos e a reencarnação, por que ele teria medo de propor uma religião fora do cristianismo se as comunicações indicassem esse como o caminho correto? Além disso, se as religiões cristãs estavam tão incomodadas com o fato de o Espiritismo não aceitar seus dogmas, o que gerou revides vigorosos, tirar o Espiritismo de dentro do Cristianismo não teria facilitado muito a vida de Kardec? Se ele tivesse essa escolha, não seria uma saída fácil para diminuir os ataques das outras religiões? A identificação da Doutrina com o Hinduísmo ou o Budismo, através da reencarnação, não eram muito maiores? Afinal, porque ele não tomou esse caminho? Para mim é óbvio que essa escolha não cabia a ele.
Por fim, se essa hipótese de que o Espiritismo só foi estabelecido como uma religião cristã pra ser politicamente correto fosse verdadeira, então Kardec e os Espíritos superiores (que são a verdadeira fonte da doutrina, como já li você afirmar) entenderiam essa associação como mera distração para as massas. Mas na verdade o que se observa, se você ler aquele capítulo do Livro dos Médiuns que citei no outro post, é que Kardec considerava fundamental essa associação e de certa forma previa as tentativas posteriores de separar da doutrina da moral cristã. Isso é natural, já que essa moral é intragável para nós no dia-a-dia. Por mim, fico com o Chico, que dizia que se tirassem Jesus do Espiritismo, ele sairia junto. E fico também com Lamennais, que fala na Revista espírita de novembro de 1860, numa mensagem chamada justamente "O Cristianismo": "...tudo quanto foi erguido fora do cristianismo caiu..."
Agora, contra Kardec, Chico e Lamennais, não é melhor você reavaliar o que afinal te incomoda tanto no cristianismo que não incomoda eles?
Botanico escreveu:É hora dos espíritas pararem de querer garimpar textos bíblicos querendo fazer com que eles falem Espiritismo.
Mas, apesar de todos os motivos que nós temos pra não aceitar uma interpretação literal da bíblia, ela é uma fonte de conhecimento muito válida e útil. Afinal, a espiritualidade superior não iria deixar o mundo sem nenhuma fonte de conhecimento durante 2 mil anos só esperando o Espiritismo, seria muita sacanagem.
Botanico escreveu:Seu Sonhante (sabe, eu costumo fazer umas brincadeiras com os nicks só para ver como seus donos reagem; é um jeito de saber se os caras levam a coisa na esportiva ou são desusadamente sisudos).
Não esquenta a cabeça não! Eu não passei em Anatomia vegetal, mas nem por isso vou levar as coisas pro lado pessoal.
