A REALIDADE QUÂNTICA
Enviado: 16 Dez 2005, 08:58
Assim como no tópico do Big Bang, mantive as divisões inalteradas, tal qual como foi originalmente postada.
Esta é uma oportunidade para os que ainda não conheciam este tópico, ver algumas coisas mais detalhadas sobre Mecânica Quântica, dentro de um modelo contemporâneo, bem como, para aqueles que já o conheciam, rever as explicações de como emerge o "nosso mundo cotidiano", o nosso Domínio Quase Clássico Familiar de uma Realidade Quântica, bem como o tão afamado papel da consciência e dos chamados Sistemas Adaptativos Complexos (SCUI), além de ficar claro a resolução do famoso Gato de Schrödinger e da existência de Efeitos Quânticos Macros.
Uma boa leitura a todos!
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[CENTER[A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Primeira parte.[/CENTER]
Quantas realidades podemos ter dentro do nosso mundo, seja mundo somente a Terra ou todo o universo observável?
É possível, e tem sentido, dizer que temos mais de uma realidade que comportam e são descritas por Leis Fundamentais diferentes?
Existem, é verdade, disciplinas ou ciências diferentes que são aplicadas em campos específicos altamente distintos, como Medicina e Engenharia, por exemplo, mas qual a representatividade do termo fundamental nessas disciplinas?
Engenharia nada mais é do que Física aplicada e quanto à Medicina, podemos dizer o mesmo, guardada as proporções, em relação à Biologia.
Isso significa que Física e Biologia tratam de assuntos, por assim dizer, mais fundamentais do que Engenharia e Medicina, mas isso está longe de afirmar que Física e Biologia são mais importantes do que Engenharia e Medicina.
Claro que nessa história toda de hierarquia das ciências há, de fato, relações reais entre os diferentes assuntos e meras convenções.
Nas palavras de Murray Gell-Mann, Nobel de Física em 1969:
“Se compararmos um simples Quark com um animal, por exemplo, um cachorro, veremos que eles se encontram quase nos extremos opostos da escala do que é fundamental. A Física de Partículas Elementares e a Cosmologia são as disciplinas científicas mais básicas, enquanto o estudo das coisas vivas, que são muito mais complexas, é muito menos básico, embora, obviamente, da maior importância.
Uma vez disseram-me que a Faculdade de Ciências de uma universidade francesa costumava discutir um tópico relacionando vários assuntos em uma ordem fixa: primeiro Matemática, depois Física, seguido de Química, Fisiologia e assim por diante. Ao meu ver, seja essa história verdadeira, esta maneira de agir com certeza, muitas vezes, negligenciou as preocupações dos biólogos franceses”.
Essa hierarquização das ciências se faz presente, também, entre os laureados com o prêmio Nobel, sendo listados os de Física em primeiro lugar, Química em segundo e a Fisiologia e Medicina em terceiro, mas há de fato algum fundamento nessa hierarquização ou somente estamos falando de meras convenções?
Vale lembrar que, até hoje, não são claras as razões do porque a Matemática ter sido omitida do testamento de Nobel e, conseqüentemente, da premiação.
Novamente, nas palavras de Gell-Mann:
“Essa hierarquia de assuntos pode, em parte, ser traçada até o filósofo francês do século XIX Auguste Comte, que afirmava ser a Astronomia o assunto científico mais fundamental, a Física o segundo e assim por diante, sendo que ele considerava a Matemática mais como uma ferramenta lógica do que ciência.
Mas a pergunta que se faz é: estaria ele correto? E se assim for, em que sentido? Ao se falar sobre esse assunto é mais que necessário colocar de lado questões de prestígio e tentar entender o que tal hierarquia realmente significa em termos científicos”
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[center]A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Segunda parte. [/center]
O critério sugerido por Gell-Mann, para a avaliação do quanto mais fundamental uma ciência A é em relação à outra B, segue dois ponto:
Ponto 1: As leis da Ciência A abrangem em princípio os fenômenos e as leis da Ciência B.
Ponto 2: As leis da Ciência A são mais gerais do que aquelas da Ciência B, isto é, as leis da Ciência B são válidas sob condições mais especiais, ou restritas, do que são as da Ciência A.
Se levarmos em conta esse critério de Gell-Mann, e considerarmos a Matemática como uma ciência, então ela é a mais fundamental do que qualquer outra.
Conforme conclui Gell-Mann:
“Todas as estruturas matemáticas concebíveis estão ao seu alcance (da Matemática), enquanto que, aquelas que são úteis para descrever os fenômenos naturais, constituem apenas um pequeno subconjunto das que são ou podem ser estudadas pelos matemáticos”.
Mas temos que ter em conta o que realmente pode-se falar a respeito das demais ciências e sobre suas verdadeiras relações.
Tomemos alguns exemplos e vamos ver como essas relações se apresentam:
A FÍSICA E A QUÍMICA DO ELÉTRON
Em 1928, Paul Adrien Maurice Dirac (prêmio Nobel de Física de 1933, dividido juntamente com Erwin Schrodinger) apresentou uma Equação Quântica Relativista** para o elétron.
** cabe aqui um comentário. Dirac foi o primeiro físico a conseguir a unificação da Mecânica Quântica com a Relatividade Restrita, sendo essa equação conhecida como Equação de Dirac.
A Mecânica Quântica mais tradicional, a mais conhecida quanto a referências à teoria na mídia ou em livros de divulgação, é a primeira versão, não relativista, desenvolvida por Heisenberg, Niels Bohr, Schrödinger e outros. Essa versão só é válida para partículas movendo-se a baixas velocidades, sendo a versão relativista mais abrangente do que a versão anterior.
Outro ponto que vale ressaltar é que até hoje ainda não foi possível unificar a Mecânica Quântica com a Relatividade Geral, ou seja, das quatro forças fundamentais da Natureza, apenas a Gravidade ainda não possui uma representação quântica, fato plenamente estabelecido para as demais forças da Natureza.
Nesse sentido, a Relatividade Geral é uma Teoria da Física Clássica, assim como a Mecânica Newtoniana. Historicamente falando, a Relatividade Geral foi a última das teorias clássicas e Albert Einstein o último dos grandes físicos clássicos.
O termo clássico foi adotado ainda na primeira metade do século XX para diferenciar a Física até então existente (Determinista) da nova Física Quântica (Não-Determinista).
Essa equação, que descreve o elétron em interação com o Campo Eletromagnético, deu origem, poucos anos depois, a uma Teoria Quântica Relativista detalhada do elétron e do eletromagnetismo, que ficou conhecida como QED ou Eletrodinâmica Quântica.
Desde então, a QED tem sido verificada experimentalmente com um enorme número de casas decimais, mostrando uma concordância impressionante entre a teoria e os resultados experimentais, de uma maneira nunca antes encontrado em qualquer outra proposta teórica.
Ao olharmos mais detalhadamente a Química, por exemplo, vemos que ela está principalmente preocupada com o comportamento de objetos como os átomos e moléculas, eles mesmos compostos por núcleos pesados e elétrons leves movendo-se ao redor desses núcleos.
Muitos fenômenos da Química são governados principalmente pelo comportamento dos elétrons em face aos efeitos eletromagnéticos.
Sob esse ângulo, a QED realmente explica uma grande parte da Química, sendo rigorosamente aplicável àqueles fenômenos em que os núcleos pesados podem ser considerados em uma aproximação como partículas pontuais fixas, portadoras de carga elétrica.
Extensões simples da QED permitem o tratamento dos movimentos nucleares, bem como dos tamanhos finitos dos núcleos.
Salvo as dificuldades inerentes, um físico teórico pode calcular, através da QED, o comportamento de qualquer sistema químico para o que a estrutura interna detalhada dos núcleos atômicos não é importante.***
*** Isso pelo motivo de que a QED não trata das forças envolvidas na coesão do Núcleo Atômico, na realidade, um sub-produto de uma força ainda mais fundamental, aquela que mantém os Quarks em permanente confinamento, também conhecida como Força Guônica.
A teoria que trata dessa força, suportada pelas cargas coloridas dos Quarks, é a Cromodinâmica Quântica e foi desenvolvida em anos posteriores, a partir da década de 70.
Voltando à QED, o que se nota é que, onde quer que cálculos de tais processos químicos possam ser feitos na prática, utilizando-se aproximações justificadas à QED, estes são bem-sucedidos na predição dos resultados das observações.
De fato, uma aproximação particular à QED se mostra mais que suficiente, aproximação conhecida como Equação de Schrodinger com Forças Coulombianas.****
**** Força Coulombianas são forças de origem eletrostática, estudadas por Charles de Coulomb. Erwin Schrodinger foi um dos criadores da versão ondulatória da Mecânica Quântica e laureado com o Nobel de Física em 1933.
Essa aproximação é aplicável quando o sistema químico é não-relativista, ou seja, os elétrons e os núcleos se movem muito lentamente quando comparados com a velocidade da luz, ou seja, quase que a totalidade dos sistemas químicos.xxx
Vale ressaltar que essa aproximação foi descoberta nos primórdios da Mecânica Quântica , três anos antes do aparecimento da Equação Relativista de Dirac.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[center]A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Terceira parte.[/center]
A FÍSICA E A QUÍMICA DO ELÉTRON - Continuação
Como vimos anteriormente, já nos primórdios da Mecânica Quântica, em 1925, havia sido deduzida uma fórmula específica para se fazer predições quanto a resultados da quase maioria dos sistemas químicos (não relativistas).
Afirmar que a Mecânica Quântica é hoje uma teoria isolada, cuja aplicação é somente válida para uma gama específica de fenômenos, apenas revela o total despreparo e desconhecimento de quem faz tal afirmação, até mesmo porque, trata-se de algo muito longe de um avanço recente, mas sim, uma ferramenta que foi desenvolvida há 79 anos e amplamente utilizada no mundo ao longo desses anos todos, seja por químicos profissionais, pesquisadores, estudantes e físicos, além de engenheiros e técnicos, quando de áreas correlatas.
Mas voltemos à conexão entre a Mecânica Quântica e a Química.
Por mais fundamental que seja a teoria física, deduzir as propriedades químicas a partir dela não é algo que se faça em um passe de mágica. Não adianta ter a ferramenta se não soubermos o que perguntar à teoria. Em outras palavras, é necessário se fazer “perguntas químicas” à teoria.
Devemos inserir nos cálculos não apenas as equações básicas, mas também as condições que caracterizam o sistema ou processo químico em questão.
Vamos a um exemplo:
Considerando-se dois átomos de Hidrogênio (H), o estado de mais baixa energia é a molécula de Hidrogênio (H2).
Uma questão importante em Química se refere ao valor da energia de ligação nessa molécula, ou seja, o quanto a energia da molécula é menor que a soma da energia dos dois átomos que a constituem.
Essa resposta pode ser obtida através da QED, mas primeiro é necessário se “perguntar à equação” a respeito das propriedades do estado mais baixo de energia daquela molécula em particular, uma vez que, as condições de baixa energia, sob as quais tais questões químicas surgem, não são universais. Dentro do Sol, a uma temperatura de milhões de graus, os átomos de hidrogênio são decompostos em seus constituintes, elétrons e prótons. Lá, nem átomos, nem moléculas, têm probabilidade significativa de estar presentes. Podemos afirmar que não há química dentro do Sol.
Se voltarmos ao início, e lembrarmos os dois pontos que Gell-Mann estabeleceu para classificar quão mais fundamental é uma ciência em relação a outras, podemos afirmar que a QED é mais fundamental do que a Química, uma vez que ela satisfaz os dois critérios.
As leis da Química podem, em princípio, ser deduzidas da QED, desde que as informações adicionais, que descrevem as condições químicas, sejam fornecidas às equações, uma vez que essas condições são especiais, ou seja, não valem para todo o universo.
A VISÃO DOS QUÍMICOS
Em geral, os cientistas de qualquer ramo estão acostumados a desenvolver teorias, que descrevem os resultados observacionais de um determinado campo de atividade, e não deduzi-los a partir de teorias de outros campos mais fundamentais.
No caso dos químicos, eles estão preocupados com os diferentes tipos de ligação entre os átomos, incluindo aí, o nosso exemplo da molécula de hidrogênio e sua ligação entre os dois átomos de hidrogênio.
No decurso de suas vivências, os químicos desenvolveram numerosas idéias práticas sobre as ligações químicas que lhes permitiram predizer o comportamento das mais diversas reações químicas.
Todavia, em um trabalho concomitante, químicos teóricos (sim, ele existem!!) se esforçam para deduzir e embasar essa idéias a partir de aproximações da QED. Apesar das grandes dificuldades advindas dos problemas de se encontrar soluções, mesmo que aproximadas, para as equações, nenhum deles duvidam de que, com ferramentas de cálculo suficientemente poderosas, poder de processamento à disposição e tempo, possam obter resultados bastante precisos.
Mas isso significa que iremos substituir a Química pela Física Quântica algum dia?
Vale relembrarmos as palavras de Linus Paulling, Nobel de Química de 1954 por vários trabalhos relacionados às ligações químicas e autor dos livros "Introduction to Quantum Mechanics" (1935) e "The Nature of the Chemical Bond" (1939).
“Apesar de não haver uma única parte da Química que não dependa, em sua teoria fundamental, dos princípios da Mecânica Quântica, os químicos podem ficar descansados, seus empregos não correm perigo”, diz, de uma maneira divertida.
“A Química e outras disciplinas sempre serão necessárias em seus respectivos campos, pois são estruturadas a possibilitar uma maneira mais prática e fácil de trabalhar, definindo, inclusive, conceitos próprios. Dizer que tais disciplinas serão substituídas pela Mecânica Quântica e seus derivados carece de qualquer fundamento, embora ache fundamentar firmar nossas estruturas, sempre possível, em teorias mais fundamentais.
O único problema que a Física de Partículas causa à Química é quando competimos pelos mesmos recursos de financiamento, mas não é uma situação diferente do que ocorre com a Física do Estado Sólido, por exemplo, e mesmo assim, quando concorremos por somas vultuosas de dinheiro. De uma maneira geral, a pesquisa em Química não só é voltada muito mais para o ser humano e o nosso dia a dia em geral, como obtém resultados mais cedo”.
REDUÇÃO
Como pudemos ver até aqui, embora a Química não nuclear ocupa um lugar “mais acima” do que a QED, tal qual degraus em uma escada, na maioria dos casos são desenvolvidas leis específicas para explicar e predizer resultados ao nível da própria Química, enquanto tentativas são feitas para se deduzir tais leis a partir do nível inferior da QED, ou seja, a Ciência é praticada em ambos os níveis e são empreendidos esforços para se construir ou obter escadas ou pontes de ligação entre eles.
O que vemos hoje é que, desde que a QED foi desenvolvida, em 1930, a Física das Partículas Elementares cresceu muito, atualmente descrevendo não só o elétron e o eletromagnetismo, como todas as partículas elementares e seus respectivos campos. Portanto, a relação entre a QED e a parte da Química que trata com elétrons pode ser considerado apenas um caso especial da relação entre a Física de Partículas Elementares, como um todo, no nível mais fundamental, e a Química como um todo, incluindo, inclusive, a Química Nuclear, em um nível menos fundamental.
A esse processo de explicar um nível mais alto em termos de um nível mais baixo é chamado de Redução.
Nas palavras de Gell-Mann:
“Não conheço qualquer cientista sério que acredite na existência de forças químicas especiais que não se devem às forças físicas subjacentes”.
Todavia, uma lição deve ser aprendida. Embora asa diversas ciências realmente ocupem níveis diferentes, elas formam parte de uma única estrutura conexa, cuja unidade é cimentada pela relação entre as partes.
Embora uma ciência em um dado nível abranja as leis de outra menos fundamental, em um nível acima, esta por sua vez, sendo mais especial, exige informações adicionais além das leis da primeira. Sem esse detalhe, a noção de redução é incompleta”.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[center]A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Quarta parte. [/center]
REDUÇÃO – Continuação
REDUÇÃO DA BIOLOGIA – A INFORMAÇÃO EXIGIDA
Levando-se em conta as considerações que fizemos em relação à Química, podemos fazer o mesmo em relação à Biologia, por exemplo, que se apresenta em um outro nível de hierarquia tanto em relação à Física, quanto à própria Química?
Nos séculos passados , cientistas acreditavam que havia “forças vitais” particulares na Biologia que não eram de origem físico-química. Atualmente, se há pesquisadores e estudiosos sérios que pensam assim, devem ser em número bastante reduzido.
Praticamente, toda a Comunidade Científica está convencida de que a vida depende em princípio das leis da física e da Química, exatamente como no caso anterior, em que as leis da Química surgiam das leis da Física.
Nesse sentido, novamente vemos uma espécie de redução, com as ligações sendo cimentadas e desenvolvidas, mas exatamente como no caso da Química, a Biologia deve ser estudada com seus próprios termos e no seu próprio nível.
Deve-se levar em conta, todavia, que no caso da Biologia, que se refere aos sistemas vivos, a complexidade aumenta assustadoramente, portanto uma quantidade enorme de informação específica adicional deve ser fornecida, além das leis da Física e da Química, para se caracterizar os fenômenos biológicos terrestres.
Notem que, se um dia nos depararmos com sistemas vivos extraterrestres, a quantidade de informação específica cresce mais ainda. A medida em que deixamos o fundamental e nos dirigimos para o complexo, a quantidade de informação tende a crescer de uma maneira extremamente significativa.
De fato, muitas características comuns à todas as formas de vida sobre o planeta podem ser resultados de acidentes que ocorreram na história primitiva da vida sobre a Terra e que poderiam ter acontecido de forma distinta.
Nas palavras de Gell-Mann:
“Mesmo a regra de que os genes devem ser constituídos por quatro nucleotídeos A, C, G e T, que parece ser verdade para todas as formas de vida atual do nosso planeta, pode não ser universal em uma escala cósmica. Pode haver muitas outras regras possíveis que são obedecidas em outros planetas , ou mesmo seres que seres que obedeciam a outras regras e poderiam ter vivido sobre a Terra a uns poucos bilhões de anos, até que foram suplantados pela vida baseada em nossos nucleotídeos familiares”.
Seja como for, a questão sobre a unicidade da Bioquímica ainda está em aberto, até mesmo por não termos encontrado, ainda, um sistema vivo extraterrestre para ser comparado com os de nosso planeta.
Talvez a maior dúvida seja se a Bioquímica depende principalmente de se formular as perguntas corretas à Física, ou se depende também, de uma maneira significativa, de acidentes históricos.
Mesmo que a Bioquímica dependa pouco de acidentes históricos, ainda assim há uma enorme quantidade de complexidade efetiva na Biologia, muito mais do que em áreas como a Química ou a Física da Matéria Condensada.
Se considerarmos o número imenso de mudanças evolutivas que ocorreram durante os mais ou menos quatro bilhões de anos, desde a origem da vida na Terra; se considerarmos que mesmo uma pequena fração de acidentes históricos tiveram papéis preponderante no desenvolvimento subseqüente da vida no planeta e nas características das diversas formas de vida, veremos que, embora as leis da Biologia realmente dependam das leis da Física e Química, dependem, também, de uma vasta quantidade de informações adicionais sobre como esses acidentes aconteceram.
Podemos ver aqui, muito mais do que no caso da Física Nuclear, da Física da Matéria Condensada ou Estado Sólido, ou a Química, a grande diferença entre o tipo de redução às leis fundamentais da Física Quântica que é possível e o tipo trivial que a palavra “redução” pode despertar na mente de um leigo ou estudioso ingênuo.
A ciência da Biologia é muito mais complexa do que a Física fundamental, porque muitas das regularidades da Biologia terrestre surgem a partir de eventos ao caso (acidentes) e não apenas das leis fundamentais.
O caminho traçado até aqui não para. Os sistemas vivos dão origem a diversos outros níveis que estão acima da Biologia, como por exemplo, a Psicologia dos animais, e especialmente, do animal com a psicologia mais complexa de todos, o ser humano.
Aqui, novamente, deve ser raro o cientista contemporâneo que acredita que existam “forças mentais” particulares que não são biológicas e, em última análise, de natureza bioquímica.
Mas exatamente como antes, embora consigamos através da redução, deduzir a psicologia humana partir dos princípios da neurofisiologia, da endocrinologia, dos neurotransmissores e assim por diante, a quantidade de informação adicional às leis fundamentais da Física é extremamente elevada e complexa.
Aventar a possibilidade sequer de se substituir uma ciência com esse nível de complexidade pelas leis fundamentais da Mecânica Quântica carece de qualquer sentido, independente se no nível último, a realidade seja quântica.
Ainda conforme Gell-Mann, um dos grandes desafios da ciência contemporânea é identificar a mistura de simplicidade e complexidade, regularidade e randomicidade, ordem e desordem, desde o primeiro degrau da escada hierárquica, a Física das Partículas Elementares e a Cosmologia, até o reino dos sistemas adaptativos complexos como os organismos vivos.
Neste ponto, encerro esta breve introdução voltada a mostrar a total falta de sentido e conhecimento em se acreditar e afirmar que:
1- A Mecânica Quântica é uma teoria isolada que só serve para responder perguntas muito específicas dentro da sua área de atuação.
2- Sendo a natureza quântica, a Física Quântica deveria substituir todas as outras ciências, como a Química, Biologia, Medicina, etc.
Tal afirmação, não só revela um total desconhecimento dos conceitos básicos da Física Quântica, como também da inteiração da Mecânica Quântica com as demais Ciências. Também mostra, na minha opinião, um desrespeito para centenas de milhares de profissionais, pesquisadores e estudantes que atuam em todas essa disciplinas.
A partir deste ponto, na próxima parte, começarei a expor a Visão Contemporânea da Mecânica Quântica e como a nossa realidade, uma aproximação clássica, advém de uma Realidade Quântica mais fundamental.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 1[/center]
INTRODUÇÃO
Existe algum sentido em se afirmar que há duas Físicas para a nossa realidade?
Vejamos um exemplo ilustrativo, relativo à posição da Física no início do século XX.
Toda a concepção mecânica era dominada pela Física Newtoniana, onde conceitos como espaço e tempo absolutos, velocidades infinitas e instantâneas eram aceitos normalmente.
Todavia, com o advento da Relatividade Restrita, muitos desses conceitos foram abalados, se não todos.
Porém, essa nova maneira de se ver o mundo só se tornava aparente, quando confrontada com a realidade de nosso dia a dia, quando corpos se deslocavam próximos à velocidade da luz.
Mesmo assim, contrariando o senso comum, tais efeitos foram plenamente comprovados ao longo dos anos, cada vez com maior precisão.
Mas o fato desses efeitos só se tornarem significativos para corpos que se deslocassem à velocidades extremas, não implicava que havia dois mundos, duas realidades, uma relativista e outra newtoniana. A Realidade é uma só, e essa realidade, no caso, é Relativista.
Vale lembrar que, neste exemplo, estamos falando exclusivamente de Física Clássica, uma vez que a Relatividade Restrita, assim como a Geral, são ambas teorias clássicas, por sinal, as últimas delas.
Pelo que sei, nunca ninguém defendeu tal hipóteses, mas imaginemos que alguém o tivesse feito.
Um argumento que esse alguém poderia ter utilizado seria:
“Se a Realidade é relativista, deveríamos, então, utilizar a Relatividade em substituição de outras Ciências ou Ciências Técnicas”
Tal afirmação é um absurdo, seria o mesmo que pegarmos o exemplo de Pauling, quando ele se referia à afirmação de que a Química seria substituída pela Mecânica Quântica e substituir a Engenharia pela Relatividade.
A título de exemplo, vejamos uma fórmula básica da Mecânica de Newton:
F = m . a (1)
Ou seja, Força é igual à massa vezes a aceleração, lembrando que aqui estaremos omitindo os símbolos flechas que mostram que tanto F, assim como a são grandezas vetoriais
Para sermos mais exatos, essa fórmula é escrita de uma maneira mais genérica da seguinte maneira:
dF = m . dv/dt (2), sempre lembrando que estamos omitindo o símbolo de vetor.
Na Mecânica de Newton, a massa é uma constante, um dos conceitos que caiu por terra na Relatividade, onde Einstein mostrou que a massa de um corpo cresce com a velocidade com a qual esse corpo se desloca.
A maneira com a qual a massa se relaciona com a velocidade na Relatividade é dada pela fórmula:
m = m0 / {1-(v*2/c*2)}*1/2 (3)
Ou seja, a massa de um corpo a uma dada velocidade v é igual à massa desse corpo em repouso, dividido pela raiz quadrada de 1 menos a razão entre o quadrado da velocidade v e o quadrado da velocidade da luz c.
Caso substituamos essa relação (3) em (2), teremos:
dF = m0 / {1-(v*2/c*2)}*1/2 . dv/dt
Como podemos ver, quando v é muito menor que c (a velocidade da luz), o termo v*2/c*2 se reduz a zero e a fórmula retorna à tradicional da Mecânica Newtoniana.
Em outras palavras, a Mecânica de Newton é uma caso especial da Mecânica Relativista, ou seja, uma aproximação conveniente para as condições do nosso dia a dia.
O fato dos efeitos relativistas serem pequenos, desprezíveis, na maioria das situações do nosso cotidiano, não significa que eles não existem na nossa vida diária a baixas velocidades.
Em outras palavras, neste nosso exemplo, a Realidade é Relativista a todos os níveis; o mundo ao nosso redor, que vivemos no nosso dia a dia, é simplesmente uma aproximação quase newtoniana, mas não existem duas Físicas, não existe uma fronteira que delimita o Mundo Newtoniano do Mundo Einsteniano, existe apenas o Mundo Einsteniano, sendo a aproximação Newtoniana uma ferramenta útil para aplicações aproximadas.
Com o advento da Física Quântica, também chamada de Física Nova, adotou-se o termo “Clássica” para se referir à Física Velha, ou anterior à Mecânica Quântica.
Novamente aqui, não há sentido em se referir a um domínio quântico, onde impera as leis da Mecânica Quântica, e a um domínio clássico, onde imperam as leis da Mecânica Clássica.
Assim como não há duas Físicas diferentes, não há duas realidades diferentes; há apenas a Realidade Quântica a todos os níveis.
O que nossos sentidos vêem em nosso dia a dia é uma aproximação quase clássica do comportamento de objetos macros e é isso que começaremos a mostrar a partir da próxima parte.
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[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 2[/center]
Toda exposição a seguir está baseada no trabalho pioneiro de Murray Gell-Mann e James Hartle.
Após a apresentação desse trabalho em 1986, uma centena de outros foram publicados e ainda o são. O somatória desses trabalhos representa hoje a visão mais contemporânea e geral da Mecânica Quântica.
A MECÂNICA QUÂNTICA E A APROXIMAÇÃO CLÁSSICA
Quando a Mecânica Quântica foi descoberta, as pessoas ficaram impressionadas pelo contraste entre seu caráter probabilístico e as certezas da Física Clássica, na qual a informação exata e completa sobre uma situação inicial permitiria em princípio calcular a especificação exata e completa da situação final.
Um determinismo desse tipo nunca é perfeitamente aplicável à Mecânica quântica, mas ele muitas vezes se aplica de maneira aproximada às condições que freqüentemente são encontradas na maioria das experiências do nosso dia a dia, ou ao mundo que observamos normalmente, o chamado Domínio Quase Clássico, onde a Física Clássica é aproximadamente correta.
Esse domínio pode ser grosseiramente caracterizado como aquele que envolve o comportamento de objetos que possuem massa muito grande, quando comparados à massa dos objetos atômicos.
Por exemplo, o movimento dos planetas em torno do Sol pode ser calculado , na prática, sem quaisquer correções quânticas, que são completamente desprezíveis em tal tipo de problema.
Devemos ter em mente que, se o Domínio Quase Clássico não fosse relevante, os físicos nunca teriam desenvolvido e utilizado a Física Clássica , e teorias como as de Maxwell e Einstein não teriam obtido seus sucessos maravilhosos ao predizer resultados de observações.
Este é um caso típico onde o velho paradigma, como Kunh o teria chamado, não é descartado quando um novo é adotado, mas permanece como uma aproximação válida em um limite conveniente, como a Teoria da Gravitação de Newton, que ainda é imensamente útil como uma aproximação à de Einstein, quando as velocidades são pequenas quando comparadas à da luz, ou quando trabalhamos com fracos Campos Gravitacionais.
Ainda assim, a Física Clássica , em realidade, é apenas uma aproximação, enquanto que a Mecânica Quântica, até onde sabemos, é absolutamente correta. A Mecânica Quântica passou incólume a todos os testes aos quais ela foi submetida, ao longo de quase oitenta anos. Em nenhuma única vez houve desacordo entre o que previa a teoria e os resultados obtidos, sendo que em alguns casos, a concordância passava da décima casa decimal, feito jamais repetido por qualquer outra obra da intelectualidade humana.
Todavia, apesar de tamanho sucesso, e de já ter passado muitas décadas desde a descoberta da Mecânica Quântica em 1924, somente agora os físicos estão chegando a uma interpretação satisfatória, que permite uma compreensão profunda de como o Domínio Quase Clássico de nossa experiência cotidiana surge do caráter quântico subjacente da natureza.
A MECÂNICA QUÂNTICA APROXIMADA DE SISTEMAS MENSURÁVEIS
Quando a Mecânica Quântica foi formulada pela primeira vez por seus descobridores, ela era apresentada de um modo curiosamente restritivo e antropocêntrico, e até hoje, freqüentemente, ainda é assim.
Uma situação experimental, por exemplo, o decaimento radioativo de um tipo específico de núcleo, é reproduzida de modo idêntico repetidas vezes. O resultado da experiência é registrado à cada vez, preferencialmente por um físico utilizando um mesmo equipamento.
Um fato importante é que se pressupõe que tanto o físico, quanto o equipamento, sejam externos ao sistema que está sendo estudado.
Como procedimento, são registradas as freqüências com que os possíveis e diferentes resultados ocorrem, por exemplo, os tempos de decaimento.
À medida que o número de tentativas cresce sem limite, essas freqüências tendem a se aproximar das probabilidades previstas pela teoria quântica de se obter os vários resultados possíveis.
A probabilidade do decaimento radioativo em função do tempo é intimamente relacionada à fração de núcleos que permanecem sem decair depois de decorridos vários intervalos de tempo.
É nítido o fato de que esta interpretação original da Mecânica Quântica, restrita a experiências repetíveis realizadas por observadores externos, é demasiada particular para ser aceita hoje em dia como sua caracterização fundamental, especialmente porque tem ficado cada vez mais claro que a Mecânica Quântica é válida para todo o Universo.
Vale destacar que a interpretação original não está errada, mas é válida apenas para as situações para as quais ela foi desenvolvida.
Ale disso, num contexto mais amplo, esta interpretação deve ser considerada não apenas como particular, mas também como aproximada, podendo ser referida como a “Mecânica Quântica Aproximada dos Sistemas que podem ser medidos”.
A ABORDAGEM MODERNA
Para descrever o Universo, uma interpretação mais geral da Mecânica Quântica é evidentemente necessária, já que, para observar as muitas cópias do Universo, não existe qualquer observador ou equipamento externo ao mesmo, além do fato de que não há a menor chance de se repetir o experimento ou a medida.
De qualquer modo, se presume que o Universo não se importe se seres humanos evoluírem ou não em algum planeta obscuro para estudar a sua história; ele, o Universo, segue obedecendo às leis da Física Quântica sem levar em consideração as observações feitas pelos físicos.
Esta é uma das razões pelas quais a chamada Interpretação Moderna da Mecânica Quântica vem sendo desenvolvida nas últimas duas décadas. A outra é a necessidade de se compreender mais claramente a relação entre a Mecânica Quântica e a descrição clássica aproximada do mundo que nos cerca.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 3[/center]
A ABORDAGEM MODERNA – segunda parte
Nas primeiras discussões sobre a Mecânica Quântica muitas vezes estava implícito, e algumas vezes explicitamente afirmado, que havia um Domínio Clássico separado de um Domínio Quântico, de tal modo que a teoria física básica de alguma forma exigiria Leis Clássicas além das Leis Quânticas.
Pata toda uma geração educada com as noções da Física Clássica, este arranjo deve ter parecido satisfatório, mas hoje, para a maioria de nós, parece tão bizarro quanto desnecessário.
Na interpretação moderna da Mecânica Quântica, propõe-se que o Domínio Quase Clássico surge a partir das Leis da Mecânica Quântica, incluindo-se aí a condição inicial no começo da expansão do Universo. O grande desafio para essa nova abordagem foi compreender como se dá esse surgimento.
O trabalho pioneiro que levou à nova abordagem foi proposto pelo falecido Hugh Everett III, um dos estudantes de pós-graduação de John A. Wheeler em Princenton e mais tarde membro do Grupo de Avaliação de Sistemas de Armamento do Pentágono.
Muitos físicos teóricos têm trabalhado nesse modelo desde então, incluindo-se, como comentado no início:
Murray Gell-Mann, professor emérito de Física Teórica do Instituto de tecnologia da Califónia – CALTECH, Prêmio Nobel de Física em 1969 e um dos fundadores do Instituto Santa Fé, onde trabalha atualmente. Os profissionais desse instituto se dedicam a trabalhos teóricos que abrangem desde mecânica Quântica, até tópicos sobre a Sistema Imunológico de Mamíferos, a Evolução das Línguas Humanas e a Economia Global como Sistemas Complexos em Evolução.
Gell-Mann, por seu trabalho em prol do meio ambiente mundial foi nomeado um dos quinhentos Globais pelo Programa para o Meio Ambiente das Nações Unidas, tendo recebido o Prêmio Lindberg em 1993, por seus esforços em promover o equilíbrio entre o avanço tecnológico e a preservação do meio ambiente.
E James Hartle, da universidade da Califórnia em Santa bárbara e do Instituto Santa Fé. Notável cosmólogo teórico e especialista na Teoria Geral da Gravitação de Einstein.
Foi orientando de Gell-Mann em seu doutoramento, no início dos anos 60 e sua tese foi sobre a Teoria das Partículas Elementares. Mais tarde, juntamente com Stephen Hawking, publicou um artigo considerado seminal, intitulado A FUNÇÃO DE ONDA DO UNIVERSO.
Trabalhando conjuntamente com Gell-Mann, desde 1986, para clarificar como a Mecânica Quântica deveria ser concebida, particularmente em relação ao Domínio Quase Clássico, elaborou, novamente em parceria com Stephan Hawking a Conjectura de Inexistência de Fronteiras para o Universo.
O ponto de partida de Gell-Mann e Hartle, como dito, foi o trabalho de Everett, porém muito ainda havia para ser feito, a começar pela escolha de terminologia de Everett, como também, a dos comentaristas de seu trabalho, que contribuiu significativamente para a confusão que se seguiu.
Por exemplo, a interpretação de Everett é muitas vezes descrita em termos de “muitos mundos”, enquanto Gell-Mann e Hartle acreditam que o melhor deva ser “as muitas histórias alternativas do universo”. O mesmo se dá quanto à descrição dos “muitos mundos”, referidos como ‘todos igualmente reais”, enquanto Gell-Mann e Hartle preferem falar de, por acreditar que seja menos confuso, “muitas histórias, todas tratadas da mesma forma pela teoria, exceto por suas probabilidades diferentes”.
Nas palavras de Gell-Mann:
“Usar a linguagem que recomendamos é referir-se à noção familiar de que um determinado sistema pode ter diferentes histórias possíveis, cada uma delas com a sua devida probabilidade. Com isso, evitamos a necessidade de se conceber os muitos ‘Universos Paralelos” como sendo todos igualmente reais”.
“Um físico notável, bem versado em Mecânica Quântica, inferiu a partir de certos comentários sobre a interpretação de Everett que qualquer um que aceitasse deveria jogar Roleta-Russa para valer, porque em alguns desses mundos “igualmente reais”, o jogador sobreviveria e ficaria rico!” – completa jocosamente.
Outro problema lingüístico, levantado por Gell-Mann e Hartle, é que Everett evitou a palavra PROBABILIDADE na maioria das seqüências lógicas, utilizando em seu lugar a noção menos familiar, mas matematicamente equivalente, de MEDIDA, o que em momento algum ´proporcionava qualquer vantagem na abordagem.
Problemas lingüísticos, porém, não eram as principais preocupações de Gell-Mann e Hartle, conforme ele expõe com suas próprias palavras:
“Palavras e lingüística à parte, o fato é que Everett deixou muitas questões importantes sem respostas, e o principal desafio, não é uma questão de linguagem, mas sim preencher espaços vazios na nossa compreensão da Mecânica Quântica”.
Juntamente comigo e Jim Hartle, há todo um grupo internacional de teóricos, que tentam de diversas formas, construir uma interpretação moderna da Mecânica Quântica.
Entre os que têm feito contribuições notáveis, estão Robert Griffiths e Roland Omnès, particularmente no conceito de Histórias; bem como Erich Joos, Dieter Zeh e Wojciech Zurek, com alguns pontos de vista um pouco diferentes.
A Mecânica Quântica em termos de Histórias foi desenvolvido por Richard Feynmann, apoiado em um trabalho anterior de Paul Dirac.
Essa formulação não ajuda apenas a classificar a interpretação moderna; ela é também particularmente útil para descrever a Mecânica Quântica sempre que a Gravitação Einsteniana for levada em consideração, como na Cosmologia.
Nessas situações, quando a Geometria do Espaço-tempo fica submetida à indeterminação quântica, o método baseado em Histórias dá conta do recado perfeitamente bem“.
O ESTADO QUÂNTICO DO UNIVERSO
Um ponto fundamental para qualquer tratamento da Mecânica Quântica é a noção de Estado Quântico.
Vamos considerar uma visão simplificada do Universo, onde cada partícula não tem outro atributo a não ser sua posição e seu momento, sendo que a indistinguibilidade de todas as partículas de um mesmo tipo, da qual a permutabilidade de todos os elétrons é um exemplo, será deixada de lado.
Para entendermos o significado de um Estado Quântico para todo o Universo, devemos, a fim de facilitar, começar a discutir o Estado Quântico de uma única partícula, depois o de duas partículas e assim por diante.
O ESTADO QUÂNTICO DE UMA PARTÍCULA
Na Física Clássica, teria sido válido especificar exatamente, e ao mesmo tempo, ambos os atributos, ou seja, tanto a posição, quanto o momento de uma determinada partícula.
As coisas não se passam bem assim quando tratamos com a Mecânica Quântica. Graças à famosa indeterminação da Natureza, expressa através do Princípio da Incerteza de Heisenberg, se especificarmos exatamente a posição de uma partícula, seu momento será completamente indeterminado.
Esta situação caracteriza um tipo particular de Estado Quântico de uma única partícula, um estado de posição definida.
Em outro tipo de Estado Quântico, acontece o inverso, quando o momento é exatamente especificado e a posição é completamente indeterminada.
Vale lembrar que há, também, uma variedade infinita de outros Estados Quânticos possíveis, para uma única partícula, nos quais nem a posição, nem o momento são exatamente especificados, tendo apenas uma distribuição espalhada de probabilidades para cada um.
Como exemplo, podemos falar do átomo de Hidrogênio, que consiste em um único elétron, carregado negativamente, no campo elétrico de um próton, carregado positivamente.
Nesse caso, o elétron pode se encontrar no Estado Quântico energia mais baixa, no qual a sua posição se espalha sobre uma região cujo tamanho é da ordem do tamanho do átomo, sendo que a mesma situação distribuída acontece para seu momento.
Aqui vale destacar que a incerteza na posição do elétron, assim como em seu momento, abrange um espaço da mesma ordem de grandeza do átomo de Hidrogênio, o que mostra quão significativa é a indeterminação quântica a esse nível.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 4[/center]
O ESTADO QUÂNTICO DE DUAS PARTÍCULAS
Vamos considerar, agora, um universo com dois elétrons. Embora seja possível que o estado quântico desse universo seja tal que cada um dos elétrons se encontre em um Estado Quântico definido, isso não ocorre com freqüência, uma vez que os dois elétrons interagem, principalmente por meio da repulsão elétrica mútua.
Por exemplo, no átomo de Hélio, o qual consiste de dois elétrons em um campo de um núcleo central com carga positiva dupla. Para o estado de energia mais baixo do átomo de Hélio, não é verdade que cada um dos elétrons esteja em um Estado Quântico definido próprio, embora essa situação seja às vezes considerada uma aproximação.
Em vez disso, como conseqüência da interação entre os elétrons, seu Estado Quântico conjunto é aquele no qual os estados dos dois elétrons estão correlacionados um com o outro.
Caso estejamos interessados em apenas um dos elétrons, devemos proceder a uma “soma” de todas as posições, ou os momentos, ou os valores de qualquer outro atributo, do segundo elétron. Isso se traduz no Estado Quântico do primeiro elétron, ou seja, ele não apresenta um estado definido (puro); ao contrário, apresenta um conjunto de probabilidades para os vários Estados Quânticos Puros de um único elétron.
Em Mecânica Quântica, se diz que o nosso elétron em questão está num Estado Quântico Misto.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTADO QUÂNTICO DO UNIVERSO
Pelo que vimos até agora, se o Universo está em um Estado Quântico Puro, esse é um estado tal que os estados individuais das partículas que ele contém estão entrelaçados uns com os outros.
O Universo como um todo pode estar em um Estado Quântico Puro. Foi exatamente essa hipótese que James Hartle e Stephem Hawking lançaram, propondo uma forma particular de estado puro que teria existido próximo ao início da expansão do Universo.
Tal hipótese, convenientemente generalizada para uma Teoria Unificada de Partículas elementares, não só especifica esse estado Quântico Inicial do Universo, bem como determina como esse estado varia no tempo.
Todavia, mesmo uma especificação completa do Estado Quântico de todo o Universo, não apenas inicialmente, mas para todos os instantes de tempo, não fornece uma interpretação para a Mecânica Quântica.
Para entendermos, devemos ver o Estado Quântico do Universo como um livro que contém as respostas de uma variedade infinita de questões. É fácil perceber que, um livro desse tipo é inútil sem uma lista de perguntas que devem ser feitas.
A interpretação moderna da Mecânica Quântica está sendo construída através de uma discussão sobre as perguntas relevantes que devem ser feitas sobre o Estado Quântico do Universo.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 5[/center]
PERGUNTAS SOBRE O ESTADO QUÂNTICO DO UNIVERSO
O primeiro ponto que devemos considerar é que, uma vez que a Realidade Quântica é probabilística, e não determinística, as perguntas são inevitavelmente sobre probabilidades.
Gel-Mann e Hartle, assim como Griffiths e Omnès partem do princípio que, em última instância, as perguntas sempre se relacionam com as Histórias alternativas do Universo.
Deve ficar claro que aqui, o termo História não se refere a enfatizar o Passado às custas do Futuro, muito menos se refere aos registros da História Humana.
Neste caso, História significa apenas uma narrativa de uma seqüência temporal de eventos, passados, presentes e futuros.
As perguntas sobre as Histórias Alternativas do Universo podem ser do tipo:
“Qual a probabilidade de ocorrência desta História em particular do Universo e não de outras?”
Ou mesmo:
“Dadas estas asserções sobre uma determinada História possível do Universo, qual a probabilidade de determinadas outras afirmações adicionais serem verdadeira?
Em muitos casos, este último tipo de pergunta assume uma forma um pouco diferente, sendo inquisitiva mais especificamente a respeito do estado futuro do Universo, como vemos abaixo:
“Dadas estas asserções sobre o passado ou o presente , qual a probabilidade destas afirmações sobre o futuro se tornarem verdadeiras?”
Analisemos, então, um exemplo prático.
HISTÓRIAS ALTERNATIVAS EM CORRIDAS DE CAVALOS
Na pista de corridas de cavalos é um lugar onde encontramos probabilidades que estão relacionadas com o que podemos chamar de chances reais.
Se as chances reais de que um cavalo não vença uma corrida são de 3 para 1, então a probabilidade de que este cavalo vença é de ¼.
Caso as chances reais contrárias são de 2 para 1, então a probabilidade de vencer é 1/3.
Vamos supor uma corrida em que há 10 cavalos disputando. De fato, cada um deles possui uma probabilidade positiva de vencer ou nula, no caso de um cavalo desesperadamente ruim, e a soma das probabilidades de vitória dos participantes é igual a 1, uma vez que, no caso de corridas de cavalos deve haver exatamente um vencedor entre os 10 cavalos.
Os 10 resultados alternativos são então mutuamente exclusivos – apenas um pode ocorrer (não se está levando em conta, para simplificação, a possibilidade de empate) – e exaustivos – um deles vai ocorrer.
Uma propriedade óbvia das 10 probabilidades é que elas são aditivas. Por exemplo, a probabilidade de que o terceiro ou o quarto cavalo vença é simplesmente a soma das duas probabilidades individuais de vitória de cada um.
Um paralelo mais próximo entre o exemplo das corridas de cavalo e as Histórias do universo pode ser obtido considerando-se uma seqüência de corridas, por exemplo oito corridas com dez cavalos em cada uma.
Novamente por simplicidade, vamos considerar apenas a possibilidade de vitória, desconsiderando possíveis, embora raros, empates, e que sempre haverá um vencedor, ou seja, não há cancelamento de corridas.
Temos então que cada possível lista de oito vencedores é um tipo de História para cada corrida e essas Histórias são mutuamente exclusivas e exaustivas, exatamente como no caso anterior de uma única corrida.
Para este “Universo de Corridas de Cavalos” o número de Histórias alternativas é o produto de oito fatores de dez, um para cada corrida, ou seja, um total de uma centena de milhões.
A probabilidade para as diferentes seqüências de vitória tem a mesma propriedade aditiva que os cavalos individuais têm de vencer uma única corrida: a probabilidade de que uma ou outra seqüência particular de vitória ocorra é a soma das probabilidades individuais para as duas seqüências.
Uma situação em que uma ou outra seqüência ocorre é chamada de Histórias Combinadas.
Sendo A e B duas Histórias Alternativas individuais, a propriedade aditiva exige que a probabilidade das Histórias Combinadas, A ou B, seja a probabilidade de A mais a probabilidade de B.
Em outras palavras, a probabilidade de que, no próximo dia 23/10, eu vá ao Segundo Encontro do RV SP ou fique em casa é a soma da probabilidade de que eu compareça ao encontro com a probabilidade de que eu fique em casa.
Vale lembra que uma quantidade que não obedeça à essa regra não é uma probabilidade.
HISTÓRIAS ALTERNATIVAS NA MECÂNICA QUÂNTICA
Suponha que um conjunto de Histórias Alternativas do Universo seja especificado, e que essas Histórias sejam mutuamente exclusivas e exaustivas. Podemos afirmar que a Mecânica Quântica pode atribuir sempre uma probabilidade a cada uma delas?
A resposta é não; nem sempre, surpreendentemente, poderemos atribuir tais probabilidades.
Em vez disso, a Mecânica Quântica atribuirá a cada par dessas Histórias uma quantidade que chamaremos de D, e fornecerá a regra para o seu cálculo em termos do Estado Quântico do Universo.
As duas Histórias que formam um determinado par podem ser diferentes, como as alternativas A e B, do exemplo anterior, ou podem ser iguais, digamos A e A. O valor D, então, será indicado por uma expressão do tipo D(A,B), que se lê D de A e B.
Se as duas Histórias que formam o par são ambas A, temos, então, D(A,A); caso ambas sejam a História Combinada de A ou B, então o valor de D é dado por
D(A ou B,A ou B).
Quando duas Histórias que formam o par são as mesmas, D é um número entre zero (0) é um (1), tal qual uma probabilidade.
Realmente, sob certas condições, D pode ser interpretado como a probabilidade de ocorrência da História. Vejamos quais condições são essas.
Vamos examinar a relação entre as seguintes quantidades:
1- D(A ou B,A ou B)
2- D(A,A)
3- D(B,B)
4- D(A,B) mais D(B,A)
Pelo exposto acima, quando as Histórias do par são as mesmas, temos que as três primeiras quantidades apresentam valores entre zero e um, portanto, lembram probabilidades.
Já a última quantidade pode ser positiva, negativa ou zero e, conseqüentemente, não é uma probabilidade.
Todavia, a regra definida pela Mecânica Quântica para o cálculo de D é de tal forma que o valor da primeira quantidade é a soma das outras três, ou seja:
D(A ou B,A ou B) = D(A,A) + D(b,B) + D(A,B) mais D(B,A).
Temos também que, se A e B são Histórias diferentes, então a última quantidade, D(A,B) mais D(B,A) é sempre zero, o que implica, então, que D(A ou B, A ou B) é simplesmente a soma de D(A,A) com D(B,B).
Em outras palavras, se D é sempre zero quando duas Histórias são diferentes, então D (de uma História e dessa mesma História) possuía a propriedade aditiva e pode, portanto, ser interpretado como a probabilidade para essa História.
Vale destacar que a quarta quantidade da lista acima é chamada de Termo de Interferência entre as Histórias A e B. Caso esse termo não seja diferente de zero para cada par de Histórias, a Mecânica Quântica não pode atribuir probabilidades a essas Histórias, uma vez que elas interferem uma com a outra.
Como em qualquer situação a Mecânica Quântica só pode atribuir probabilidades, ela não pode fazer nada no caso em que Histórias interfiram uma com a outra. Tais Histórias são úteis apenas para construir Histórias Combinadas que não interferem.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 6[/center]
HISTÓRIAS DO UNIVERSO FINAMENTE GRANULADAS
Por definição, Histórias Completas do Universo Finamente Granuladas são Histórias que dão uma discrição tão completa quanto possível de todo o Universo, em todos os instantes de tempo.
Para podermos perceber o que a Mecânica Quântica pode dizer a respeito delas, continuaremos a utilizar o modelo de Universo no qual as partículas possuem apenas os atributos de posição e momento, descartando todos as demais, inclusive a indistinguibilidade entre partículas de mesmo tipo.
Convém lembrar que, se a Física Clássica determinista fosse exatamente correta, poderíamos especificar, em todos os instantes de tempo, exatamente a posição e o momento de cada partícula.
A Dinâmica Clássica poderia, por conseqüência, predizer com certeza as posições e os momentos de todas as partículas em instantes de tempo futuros.
Mesmo em se levando em conta o fenômeno do Caos, que produz situações em que a menor imprecisão na posição e momento inicial leva a incertezas arbitrariamente grandes nas predições futuras, na teoria Clássica, o determinismo perfeito ainda seria correto e obteríamos uma informação perfeita.
Todavia, na Mecânica Quântica, para a qual a Física Clássica é apenas uma aproximação, de imediato temos que já não faz mais sentido especificar tanto a posição como o momento, de maneira exata, para o mesmo instante de tempo, conforme mostrado pelo Princípio da Incerteza de Heisenberg.
Na Mecânica Quântica, portanto, a condição do nosso Universo simplificado poderia ser caracterizada apenas especificando-se as posições de todas as partículas, ou especificando-se todos os seus momentos, ou por infinitas combinações diferentes de se especificar a posição de algumas e o momento de outras.
Um exemplo de História Completa de Granulação Fina do nosso Universo simplificado, na Mecânica Quântica, poderia consistir nas posições das partículas desse Universo em todos os instantes de tempo.
Seria de se esperar, uma vez que a Mecânica Quântica é probabilística e não determinística, como a Mecânica Clássica aproximada, que ela nos fornecesse uma probabilidade para cada História Finamente Granulada, mas não é este o caso, uma vez que os Termos de Interferência entre Histórias Finamente Granuladas normalmente não desaparecem e, portanto, como vimos anteriormente, não é possível atribuir probabilidades a tais Histórias.
Todavia, nas pistas de corridas, os apostadores não têm que se preocupar com Termos de Interferência entre uma seqüência de vencedores e outra.
A pergunta que cabe é: por que não?
Como é possível que os apostadores tratem com probabilidades reais que se somam de modo apropriado, enquanto que a Mecânica Quântica fornece, no nível de Histórias Finamente Granuladas, apenas quantidades para as quais a adição é atrapalhada pelos Termos de Interferência?
A resposta é que, para termos probabilidades reais, é necessário considerar Histórias que possuem uma Granulação Suficientemente Grosseira.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 7[/center]
HISTÓRIAS COM GRANULAÇÃO GROSSEIRA
A seqüência de oito corridas de cavalo serve, além de uma metáfora, como um exemplo real de uma História do Universo com uma granulação muito grosseira.
Como apenas a lista de vencedores é considerada, a Granulação Grosseira consiste em:
1- Ignorar todos os instantes de tempo da História do Universo, exceto aqueles nos quais as corridas são vencidas.
2- Nos instantes de tempo considerados, acompanhar apenas os cavalos que participam das corridas e ignorar todos os outros objetos do universo.
3- Destes cavalos, acompanhar apenas aquele que vence a corrida e ignorar todas as partes do cavalo, exceto a ponta de seu focinho.
Para Histórias do Universo na Mecânica Quântica, a Granulação Grosseira tipicamente significa acompanhar certas coisas, em certos instantes de tempo, e somente até um certo nível de detalhe.
Uma História com Granulação Grosseira pode ser considerada uma classe de Histórias Alternativas Finamente Granulada., todas concordando sobre um relato particular do que está sendo acompanhado, mas diferindo sobre todos os comportamentos possíveis do que não está sendo acompanhado, e que devem ser somados.
No exemplo das corridas de cavalo, cada História com Granulação Grosseira é a classe de todas as Histórias Finamente Granulada que têm a mesma seqüência de oito vencedores, naquele dia em particular e naquela pista específica, embora as Histórias Finamente Granuladas na classe variem sobre todas as possíveis alternativas para o que acontece com quaisquer outras características da História do Universo.
Dessa forma, todas as Histórias Finamente Granuladas do Universo são agrupadas em classes de tal maneira que cada uma delas pertencem a uma e somente uma classe.
Essas classes, exaustivas e mutuamente exclusivas, são as Histórias com uma Granulação Grosseira, exatamente como as diferentes seqüências possíveis de vencedores dos oito páreos quando não há empate.
Suponhamos que uma determinada classe contenha apenas duas Histórias Finamente Granuladas, J e K.
A História com Granulação Grosseira será, então, apenas (J ou K), o que implica que acontece ou J, ou K.
Da mesma forma, se uma classe contém muitas Histórias Finamente Granuladas, a História com Granulação Grosseira será a História combinada na qual qualquer uma dessas Histórias Finamente Granulada acontece.
Em Matemática, essas Histórias com Granulação Grosseiras são chamadas de Classes Equivalentes de Histórias Finamente Granuladas. Cada História Finamente Granulada pertence a uma e apenas uma Classe de Equivalência, sendo os membros de uma classe tratados como equivalentes.
Para exemplificar o exposto acima, vamos imaginar que as únicas coisas no Universo sejam os cavalos nas oito corridas e um certo número de moscas que os acompanham, e que tudo o que um cavalo pode fazer é vencer ou não.
Dessa forma, nesse mundo fantasticamente simplificado, cada História Finamente Granulada consiste de uma seqüência de cavalos vencedores e de alguma História particular sobre as moscas.
Se as Histórias com granulação Grosseira acompanham apenas os cavalos e suas vitórias, e ignoram as moscas, então cada uma dessas Histórias de Granulação grosseira será o conjunto das Histórias Finamente Granuladas, na qual existe uma seqüência particular de cavalos vencedores e um destino qualquer para as moscas.
De um modo geral, cada História com Granulação Grosseira é uma Classe Equivalente de Histórias Finamente Granuladas caracterizadas por uma narrativa particular que descreve os fenômenos acompanhados e por qualquer das possíveis narrativas alternativas que descrevem tudo aquilo que é ignorado.
A GRANULAÇÃO GROSSEIRA PODE DESCARTAR OS TERMOS DE INTERFERÊNCIA
Neste ponto, a pergunta em questão é:
Como pode, para as Histórias Quânticas do Universo, o agrupamento de Histórias Finamente Granuladas em Classes Equivalentes conduzir a Histórias com Granulação Grosseira com probabilidades verdadeiras?
Ou seja, como é possível que Histórias com Granulação Grosseira convenientes não tenham Termos de Interferência entre elas?
A resposta é que o Termo de Interferência entre duas Histórias com granulação grosseira é a soma de todos os Termos de Interferência entre pares de Histórias Finamente Granuladas que pertencem a essas duas Histórias.
A soma de todos esses Termos, com seus sinais algébricos positivos e negativos, pode produzir uma grande quantidade de cancelamentos e dar um resultado pequeno, com qualquer um dos sinais ou zero.
Vale lembrar, como visto na parte 5, que a Mecânica Quântica atribui uma quantidade D a cada par de Histórias e que D de uma História e da própria História {D(A,A), por exemplo} está sempre entre zero (0) e um (1), tal qual uma probabilidade real e, portanto, quando somadas, não podem se cancelar.
Qualquer comportamento de qualquer coisa no Universo que seja ignorado nas Histórias de Granulação Grosseira pode ser considerado como “somado” no processo de adição.
Todos os detalhes deixados de lado nas Histórias Grosseiramente Granuladas, todos os tempos, lugares e objetos que não são acompanhados, são somados.
Por exemplo, as Classes Equivalentes poderiam agrupar todas as Histórias Finamente Granuladas em que certas partículas têm posição especificada em todos os instantes, enquanto todas as outras partículas no Universo Simplificado podem estar em qualquer parte ou lugar.
Diríamos, então, que as posições do primeiro conjunto são acompanhadas em cada instante, enquanto aquelas do segundo, são ignoradas ou somadas.
Uma Granulação Grosseira maior poderia consistir em acompanhar as posições do primeiro conjunto de partículas apenas em certos instantes de tempo, de modo que tudo o que acontece nos outros instantes, seria somado.
Esta é uma oportunidade para os que ainda não conheciam este tópico, ver algumas coisas mais detalhadas sobre Mecânica Quântica, dentro de um modelo contemporâneo, bem como, para aqueles que já o conheciam, rever as explicações de como emerge o "nosso mundo cotidiano", o nosso Domínio Quase Clássico Familiar de uma Realidade Quântica, bem como o tão afamado papel da consciência e dos chamados Sistemas Adaptativos Complexos (SCUI), além de ficar claro a resolução do famoso Gato de Schrödinger e da existência de Efeitos Quânticos Macros.
Uma boa leitura a todos!
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[CENTER[A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Primeira parte.[/CENTER]
Quantas realidades podemos ter dentro do nosso mundo, seja mundo somente a Terra ou todo o universo observável?
É possível, e tem sentido, dizer que temos mais de uma realidade que comportam e são descritas por Leis Fundamentais diferentes?
Existem, é verdade, disciplinas ou ciências diferentes que são aplicadas em campos específicos altamente distintos, como Medicina e Engenharia, por exemplo, mas qual a representatividade do termo fundamental nessas disciplinas?
Engenharia nada mais é do que Física aplicada e quanto à Medicina, podemos dizer o mesmo, guardada as proporções, em relação à Biologia.
Isso significa que Física e Biologia tratam de assuntos, por assim dizer, mais fundamentais do que Engenharia e Medicina, mas isso está longe de afirmar que Física e Biologia são mais importantes do que Engenharia e Medicina.
Claro que nessa história toda de hierarquia das ciências há, de fato, relações reais entre os diferentes assuntos e meras convenções.
Nas palavras de Murray Gell-Mann, Nobel de Física em 1969:
“Se compararmos um simples Quark com um animal, por exemplo, um cachorro, veremos que eles se encontram quase nos extremos opostos da escala do que é fundamental. A Física de Partículas Elementares e a Cosmologia são as disciplinas científicas mais básicas, enquanto o estudo das coisas vivas, que são muito mais complexas, é muito menos básico, embora, obviamente, da maior importância.
Uma vez disseram-me que a Faculdade de Ciências de uma universidade francesa costumava discutir um tópico relacionando vários assuntos em uma ordem fixa: primeiro Matemática, depois Física, seguido de Química, Fisiologia e assim por diante. Ao meu ver, seja essa história verdadeira, esta maneira de agir com certeza, muitas vezes, negligenciou as preocupações dos biólogos franceses”.
Essa hierarquização das ciências se faz presente, também, entre os laureados com o prêmio Nobel, sendo listados os de Física em primeiro lugar, Química em segundo e a Fisiologia e Medicina em terceiro, mas há de fato algum fundamento nessa hierarquização ou somente estamos falando de meras convenções?
Vale lembrar que, até hoje, não são claras as razões do porque a Matemática ter sido omitida do testamento de Nobel e, conseqüentemente, da premiação.
Novamente, nas palavras de Gell-Mann:
“Essa hierarquia de assuntos pode, em parte, ser traçada até o filósofo francês do século XIX Auguste Comte, que afirmava ser a Astronomia o assunto científico mais fundamental, a Física o segundo e assim por diante, sendo que ele considerava a Matemática mais como uma ferramenta lógica do que ciência.
Mas a pergunta que se faz é: estaria ele correto? E se assim for, em que sentido? Ao se falar sobre esse assunto é mais que necessário colocar de lado questões de prestígio e tentar entender o que tal hierarquia realmente significa em termos científicos”
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[center]A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Segunda parte. [/center]
O critério sugerido por Gell-Mann, para a avaliação do quanto mais fundamental uma ciência A é em relação à outra B, segue dois ponto:
Ponto 1: As leis da Ciência A abrangem em princípio os fenômenos e as leis da Ciência B.
Ponto 2: As leis da Ciência A são mais gerais do que aquelas da Ciência B, isto é, as leis da Ciência B são válidas sob condições mais especiais, ou restritas, do que são as da Ciência A.
Se levarmos em conta esse critério de Gell-Mann, e considerarmos a Matemática como uma ciência, então ela é a mais fundamental do que qualquer outra.
Conforme conclui Gell-Mann:
“Todas as estruturas matemáticas concebíveis estão ao seu alcance (da Matemática), enquanto que, aquelas que são úteis para descrever os fenômenos naturais, constituem apenas um pequeno subconjunto das que são ou podem ser estudadas pelos matemáticos”.
Mas temos que ter em conta o que realmente pode-se falar a respeito das demais ciências e sobre suas verdadeiras relações.
Tomemos alguns exemplos e vamos ver como essas relações se apresentam:
A FÍSICA E A QUÍMICA DO ELÉTRON
Em 1928, Paul Adrien Maurice Dirac (prêmio Nobel de Física de 1933, dividido juntamente com Erwin Schrodinger) apresentou uma Equação Quântica Relativista** para o elétron.
** cabe aqui um comentário. Dirac foi o primeiro físico a conseguir a unificação da Mecânica Quântica com a Relatividade Restrita, sendo essa equação conhecida como Equação de Dirac.
A Mecânica Quântica mais tradicional, a mais conhecida quanto a referências à teoria na mídia ou em livros de divulgação, é a primeira versão, não relativista, desenvolvida por Heisenberg, Niels Bohr, Schrödinger e outros. Essa versão só é válida para partículas movendo-se a baixas velocidades, sendo a versão relativista mais abrangente do que a versão anterior.
Outro ponto que vale ressaltar é que até hoje ainda não foi possível unificar a Mecânica Quântica com a Relatividade Geral, ou seja, das quatro forças fundamentais da Natureza, apenas a Gravidade ainda não possui uma representação quântica, fato plenamente estabelecido para as demais forças da Natureza.
Nesse sentido, a Relatividade Geral é uma Teoria da Física Clássica, assim como a Mecânica Newtoniana. Historicamente falando, a Relatividade Geral foi a última das teorias clássicas e Albert Einstein o último dos grandes físicos clássicos.
O termo clássico foi adotado ainda na primeira metade do século XX para diferenciar a Física até então existente (Determinista) da nova Física Quântica (Não-Determinista).
Essa equação, que descreve o elétron em interação com o Campo Eletromagnético, deu origem, poucos anos depois, a uma Teoria Quântica Relativista detalhada do elétron e do eletromagnetismo, que ficou conhecida como QED ou Eletrodinâmica Quântica.
Desde então, a QED tem sido verificada experimentalmente com um enorme número de casas decimais, mostrando uma concordância impressionante entre a teoria e os resultados experimentais, de uma maneira nunca antes encontrado em qualquer outra proposta teórica.
Ao olharmos mais detalhadamente a Química, por exemplo, vemos que ela está principalmente preocupada com o comportamento de objetos como os átomos e moléculas, eles mesmos compostos por núcleos pesados e elétrons leves movendo-se ao redor desses núcleos.
Muitos fenômenos da Química são governados principalmente pelo comportamento dos elétrons em face aos efeitos eletromagnéticos.
Sob esse ângulo, a QED realmente explica uma grande parte da Química, sendo rigorosamente aplicável àqueles fenômenos em que os núcleos pesados podem ser considerados em uma aproximação como partículas pontuais fixas, portadoras de carga elétrica.
Extensões simples da QED permitem o tratamento dos movimentos nucleares, bem como dos tamanhos finitos dos núcleos.
Salvo as dificuldades inerentes, um físico teórico pode calcular, através da QED, o comportamento de qualquer sistema químico para o que a estrutura interna detalhada dos núcleos atômicos não é importante.***
*** Isso pelo motivo de que a QED não trata das forças envolvidas na coesão do Núcleo Atômico, na realidade, um sub-produto de uma força ainda mais fundamental, aquela que mantém os Quarks em permanente confinamento, também conhecida como Força Guônica.
A teoria que trata dessa força, suportada pelas cargas coloridas dos Quarks, é a Cromodinâmica Quântica e foi desenvolvida em anos posteriores, a partir da década de 70.
Voltando à QED, o que se nota é que, onde quer que cálculos de tais processos químicos possam ser feitos na prática, utilizando-se aproximações justificadas à QED, estes são bem-sucedidos na predição dos resultados das observações.
De fato, uma aproximação particular à QED se mostra mais que suficiente, aproximação conhecida como Equação de Schrodinger com Forças Coulombianas.****
**** Força Coulombianas são forças de origem eletrostática, estudadas por Charles de Coulomb. Erwin Schrodinger foi um dos criadores da versão ondulatória da Mecânica Quântica e laureado com o Nobel de Física em 1933.
Essa aproximação é aplicável quando o sistema químico é não-relativista, ou seja, os elétrons e os núcleos se movem muito lentamente quando comparados com a velocidade da luz, ou seja, quase que a totalidade dos sistemas químicos.xxx
Vale ressaltar que essa aproximação foi descoberta nos primórdios da Mecânica Quântica , três anos antes do aparecimento da Equação Relativista de Dirac.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[center]A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Terceira parte.[/center]
A FÍSICA E A QUÍMICA DO ELÉTRON - Continuação
Como vimos anteriormente, já nos primórdios da Mecânica Quântica, em 1925, havia sido deduzida uma fórmula específica para se fazer predições quanto a resultados da quase maioria dos sistemas químicos (não relativistas).
Afirmar que a Mecânica Quântica é hoje uma teoria isolada, cuja aplicação é somente válida para uma gama específica de fenômenos, apenas revela o total despreparo e desconhecimento de quem faz tal afirmação, até mesmo porque, trata-se de algo muito longe de um avanço recente, mas sim, uma ferramenta que foi desenvolvida há 79 anos e amplamente utilizada no mundo ao longo desses anos todos, seja por químicos profissionais, pesquisadores, estudantes e físicos, além de engenheiros e técnicos, quando de áreas correlatas.
Mas voltemos à conexão entre a Mecânica Quântica e a Química.
Por mais fundamental que seja a teoria física, deduzir as propriedades químicas a partir dela não é algo que se faça em um passe de mágica. Não adianta ter a ferramenta se não soubermos o que perguntar à teoria. Em outras palavras, é necessário se fazer “perguntas químicas” à teoria.
Devemos inserir nos cálculos não apenas as equações básicas, mas também as condições que caracterizam o sistema ou processo químico em questão.
Vamos a um exemplo:
Considerando-se dois átomos de Hidrogênio (H), o estado de mais baixa energia é a molécula de Hidrogênio (H2).
Uma questão importante em Química se refere ao valor da energia de ligação nessa molécula, ou seja, o quanto a energia da molécula é menor que a soma da energia dos dois átomos que a constituem.
Essa resposta pode ser obtida através da QED, mas primeiro é necessário se “perguntar à equação” a respeito das propriedades do estado mais baixo de energia daquela molécula em particular, uma vez que, as condições de baixa energia, sob as quais tais questões químicas surgem, não são universais. Dentro do Sol, a uma temperatura de milhões de graus, os átomos de hidrogênio são decompostos em seus constituintes, elétrons e prótons. Lá, nem átomos, nem moléculas, têm probabilidade significativa de estar presentes. Podemos afirmar que não há química dentro do Sol.
Se voltarmos ao início, e lembrarmos os dois pontos que Gell-Mann estabeleceu para classificar quão mais fundamental é uma ciência em relação a outras, podemos afirmar que a QED é mais fundamental do que a Química, uma vez que ela satisfaz os dois critérios.
As leis da Química podem, em princípio, ser deduzidas da QED, desde que as informações adicionais, que descrevem as condições químicas, sejam fornecidas às equações, uma vez que essas condições são especiais, ou seja, não valem para todo o universo.
A VISÃO DOS QUÍMICOS
Em geral, os cientistas de qualquer ramo estão acostumados a desenvolver teorias, que descrevem os resultados observacionais de um determinado campo de atividade, e não deduzi-los a partir de teorias de outros campos mais fundamentais.
No caso dos químicos, eles estão preocupados com os diferentes tipos de ligação entre os átomos, incluindo aí, o nosso exemplo da molécula de hidrogênio e sua ligação entre os dois átomos de hidrogênio.
No decurso de suas vivências, os químicos desenvolveram numerosas idéias práticas sobre as ligações químicas que lhes permitiram predizer o comportamento das mais diversas reações químicas.
Todavia, em um trabalho concomitante, químicos teóricos (sim, ele existem!!) se esforçam para deduzir e embasar essa idéias a partir de aproximações da QED. Apesar das grandes dificuldades advindas dos problemas de se encontrar soluções, mesmo que aproximadas, para as equações, nenhum deles duvidam de que, com ferramentas de cálculo suficientemente poderosas, poder de processamento à disposição e tempo, possam obter resultados bastante precisos.
Mas isso significa que iremos substituir a Química pela Física Quântica algum dia?
Vale relembrarmos as palavras de Linus Paulling, Nobel de Química de 1954 por vários trabalhos relacionados às ligações químicas e autor dos livros "Introduction to Quantum Mechanics" (1935) e "The Nature of the Chemical Bond" (1939).
“Apesar de não haver uma única parte da Química que não dependa, em sua teoria fundamental, dos princípios da Mecânica Quântica, os químicos podem ficar descansados, seus empregos não correm perigo”, diz, de uma maneira divertida.
“A Química e outras disciplinas sempre serão necessárias em seus respectivos campos, pois são estruturadas a possibilitar uma maneira mais prática e fácil de trabalhar, definindo, inclusive, conceitos próprios. Dizer que tais disciplinas serão substituídas pela Mecânica Quântica e seus derivados carece de qualquer fundamento, embora ache fundamentar firmar nossas estruturas, sempre possível, em teorias mais fundamentais.
O único problema que a Física de Partículas causa à Química é quando competimos pelos mesmos recursos de financiamento, mas não é uma situação diferente do que ocorre com a Física do Estado Sólido, por exemplo, e mesmo assim, quando concorremos por somas vultuosas de dinheiro. De uma maneira geral, a pesquisa em Química não só é voltada muito mais para o ser humano e o nosso dia a dia em geral, como obtém resultados mais cedo”.
REDUÇÃO
Como pudemos ver até aqui, embora a Química não nuclear ocupa um lugar “mais acima” do que a QED, tal qual degraus em uma escada, na maioria dos casos são desenvolvidas leis específicas para explicar e predizer resultados ao nível da própria Química, enquanto tentativas são feitas para se deduzir tais leis a partir do nível inferior da QED, ou seja, a Ciência é praticada em ambos os níveis e são empreendidos esforços para se construir ou obter escadas ou pontes de ligação entre eles.
O que vemos hoje é que, desde que a QED foi desenvolvida, em 1930, a Física das Partículas Elementares cresceu muito, atualmente descrevendo não só o elétron e o eletromagnetismo, como todas as partículas elementares e seus respectivos campos. Portanto, a relação entre a QED e a parte da Química que trata com elétrons pode ser considerado apenas um caso especial da relação entre a Física de Partículas Elementares, como um todo, no nível mais fundamental, e a Química como um todo, incluindo, inclusive, a Química Nuclear, em um nível menos fundamental.
A esse processo de explicar um nível mais alto em termos de um nível mais baixo é chamado de Redução.
Nas palavras de Gell-Mann:
“Não conheço qualquer cientista sério que acredite na existência de forças químicas especiais que não se devem às forças físicas subjacentes”.
Todavia, uma lição deve ser aprendida. Embora asa diversas ciências realmente ocupem níveis diferentes, elas formam parte de uma única estrutura conexa, cuja unidade é cimentada pela relação entre as partes.
Embora uma ciência em um dado nível abranja as leis de outra menos fundamental, em um nível acima, esta por sua vez, sendo mais especial, exige informações adicionais além das leis da primeira. Sem esse detalhe, a noção de redução é incompleta”.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]INTRODUÇÃO[/center]
[center]A HIERARQUIA DAS CIÊNCIAS – Quarta parte. [/center]
REDUÇÃO – Continuação
REDUÇÃO DA BIOLOGIA – A INFORMAÇÃO EXIGIDA
Levando-se em conta as considerações que fizemos em relação à Química, podemos fazer o mesmo em relação à Biologia, por exemplo, que se apresenta em um outro nível de hierarquia tanto em relação à Física, quanto à própria Química?
Nos séculos passados , cientistas acreditavam que havia “forças vitais” particulares na Biologia que não eram de origem físico-química. Atualmente, se há pesquisadores e estudiosos sérios que pensam assim, devem ser em número bastante reduzido.
Praticamente, toda a Comunidade Científica está convencida de que a vida depende em princípio das leis da física e da Química, exatamente como no caso anterior, em que as leis da Química surgiam das leis da Física.
Nesse sentido, novamente vemos uma espécie de redução, com as ligações sendo cimentadas e desenvolvidas, mas exatamente como no caso da Química, a Biologia deve ser estudada com seus próprios termos e no seu próprio nível.
Deve-se levar em conta, todavia, que no caso da Biologia, que se refere aos sistemas vivos, a complexidade aumenta assustadoramente, portanto uma quantidade enorme de informação específica adicional deve ser fornecida, além das leis da Física e da Química, para se caracterizar os fenômenos biológicos terrestres.
Notem que, se um dia nos depararmos com sistemas vivos extraterrestres, a quantidade de informação específica cresce mais ainda. A medida em que deixamos o fundamental e nos dirigimos para o complexo, a quantidade de informação tende a crescer de uma maneira extremamente significativa.
De fato, muitas características comuns à todas as formas de vida sobre o planeta podem ser resultados de acidentes que ocorreram na história primitiva da vida sobre a Terra e que poderiam ter acontecido de forma distinta.
Nas palavras de Gell-Mann:
“Mesmo a regra de que os genes devem ser constituídos por quatro nucleotídeos A, C, G e T, que parece ser verdade para todas as formas de vida atual do nosso planeta, pode não ser universal em uma escala cósmica. Pode haver muitas outras regras possíveis que são obedecidas em outros planetas , ou mesmo seres que seres que obedeciam a outras regras e poderiam ter vivido sobre a Terra a uns poucos bilhões de anos, até que foram suplantados pela vida baseada em nossos nucleotídeos familiares”.
Seja como for, a questão sobre a unicidade da Bioquímica ainda está em aberto, até mesmo por não termos encontrado, ainda, um sistema vivo extraterrestre para ser comparado com os de nosso planeta.
Talvez a maior dúvida seja se a Bioquímica depende principalmente de se formular as perguntas corretas à Física, ou se depende também, de uma maneira significativa, de acidentes históricos.
Mesmo que a Bioquímica dependa pouco de acidentes históricos, ainda assim há uma enorme quantidade de complexidade efetiva na Biologia, muito mais do que em áreas como a Química ou a Física da Matéria Condensada.
Se considerarmos o número imenso de mudanças evolutivas que ocorreram durante os mais ou menos quatro bilhões de anos, desde a origem da vida na Terra; se considerarmos que mesmo uma pequena fração de acidentes históricos tiveram papéis preponderante no desenvolvimento subseqüente da vida no planeta e nas características das diversas formas de vida, veremos que, embora as leis da Biologia realmente dependam das leis da Física e Química, dependem, também, de uma vasta quantidade de informações adicionais sobre como esses acidentes aconteceram.
Podemos ver aqui, muito mais do que no caso da Física Nuclear, da Física da Matéria Condensada ou Estado Sólido, ou a Química, a grande diferença entre o tipo de redução às leis fundamentais da Física Quântica que é possível e o tipo trivial que a palavra “redução” pode despertar na mente de um leigo ou estudioso ingênuo.
A ciência da Biologia é muito mais complexa do que a Física fundamental, porque muitas das regularidades da Biologia terrestre surgem a partir de eventos ao caso (acidentes) e não apenas das leis fundamentais.
O caminho traçado até aqui não para. Os sistemas vivos dão origem a diversos outros níveis que estão acima da Biologia, como por exemplo, a Psicologia dos animais, e especialmente, do animal com a psicologia mais complexa de todos, o ser humano.
Aqui, novamente, deve ser raro o cientista contemporâneo que acredita que existam “forças mentais” particulares que não são biológicas e, em última análise, de natureza bioquímica.
Mas exatamente como antes, embora consigamos através da redução, deduzir a psicologia humana partir dos princípios da neurofisiologia, da endocrinologia, dos neurotransmissores e assim por diante, a quantidade de informação adicional às leis fundamentais da Física é extremamente elevada e complexa.
Aventar a possibilidade sequer de se substituir uma ciência com esse nível de complexidade pelas leis fundamentais da Mecânica Quântica carece de qualquer sentido, independente se no nível último, a realidade seja quântica.
Ainda conforme Gell-Mann, um dos grandes desafios da ciência contemporânea é identificar a mistura de simplicidade e complexidade, regularidade e randomicidade, ordem e desordem, desde o primeiro degrau da escada hierárquica, a Física das Partículas Elementares e a Cosmologia, até o reino dos sistemas adaptativos complexos como os organismos vivos.
Neste ponto, encerro esta breve introdução voltada a mostrar a total falta de sentido e conhecimento em se acreditar e afirmar que:
1- A Mecânica Quântica é uma teoria isolada que só serve para responder perguntas muito específicas dentro da sua área de atuação.
2- Sendo a natureza quântica, a Física Quântica deveria substituir todas as outras ciências, como a Química, Biologia, Medicina, etc.
Tal afirmação, não só revela um total desconhecimento dos conceitos básicos da Física Quântica, como também da inteiração da Mecânica Quântica com as demais Ciências. Também mostra, na minha opinião, um desrespeito para centenas de milhares de profissionais, pesquisadores e estudantes que atuam em todas essa disciplinas.
A partir deste ponto, na próxima parte, começarei a expor a Visão Contemporânea da Mecânica Quântica e como a nossa realidade, uma aproximação clássica, advém de uma Realidade Quântica mais fundamental.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 1[/center]
INTRODUÇÃO
Existe algum sentido em se afirmar que há duas Físicas para a nossa realidade?
Vejamos um exemplo ilustrativo, relativo à posição da Física no início do século XX.
Toda a concepção mecânica era dominada pela Física Newtoniana, onde conceitos como espaço e tempo absolutos, velocidades infinitas e instantâneas eram aceitos normalmente.
Todavia, com o advento da Relatividade Restrita, muitos desses conceitos foram abalados, se não todos.
Porém, essa nova maneira de se ver o mundo só se tornava aparente, quando confrontada com a realidade de nosso dia a dia, quando corpos se deslocavam próximos à velocidade da luz.
Mesmo assim, contrariando o senso comum, tais efeitos foram plenamente comprovados ao longo dos anos, cada vez com maior precisão.
Mas o fato desses efeitos só se tornarem significativos para corpos que se deslocassem à velocidades extremas, não implicava que havia dois mundos, duas realidades, uma relativista e outra newtoniana. A Realidade é uma só, e essa realidade, no caso, é Relativista.
Vale lembrar que, neste exemplo, estamos falando exclusivamente de Física Clássica, uma vez que a Relatividade Restrita, assim como a Geral, são ambas teorias clássicas, por sinal, as últimas delas.
Pelo que sei, nunca ninguém defendeu tal hipóteses, mas imaginemos que alguém o tivesse feito.
Um argumento que esse alguém poderia ter utilizado seria:
“Se a Realidade é relativista, deveríamos, então, utilizar a Relatividade em substituição de outras Ciências ou Ciências Técnicas”
Tal afirmação é um absurdo, seria o mesmo que pegarmos o exemplo de Pauling, quando ele se referia à afirmação de que a Química seria substituída pela Mecânica Quântica e substituir a Engenharia pela Relatividade.
A título de exemplo, vejamos uma fórmula básica da Mecânica de Newton:
F = m . a (1)
Ou seja, Força é igual à massa vezes a aceleração, lembrando que aqui estaremos omitindo os símbolos flechas que mostram que tanto F, assim como a são grandezas vetoriais
Para sermos mais exatos, essa fórmula é escrita de uma maneira mais genérica da seguinte maneira:
dF = m . dv/dt (2), sempre lembrando que estamos omitindo o símbolo de vetor.
Na Mecânica de Newton, a massa é uma constante, um dos conceitos que caiu por terra na Relatividade, onde Einstein mostrou que a massa de um corpo cresce com a velocidade com a qual esse corpo se desloca.
A maneira com a qual a massa se relaciona com a velocidade na Relatividade é dada pela fórmula:
m = m0 / {1-(v*2/c*2)}*1/2 (3)
Ou seja, a massa de um corpo a uma dada velocidade v é igual à massa desse corpo em repouso, dividido pela raiz quadrada de 1 menos a razão entre o quadrado da velocidade v e o quadrado da velocidade da luz c.
Caso substituamos essa relação (3) em (2), teremos:
dF = m0 / {1-(v*2/c*2)}*1/2 . dv/dt
Como podemos ver, quando v é muito menor que c (a velocidade da luz), o termo v*2/c*2 se reduz a zero e a fórmula retorna à tradicional da Mecânica Newtoniana.
Em outras palavras, a Mecânica de Newton é uma caso especial da Mecânica Relativista, ou seja, uma aproximação conveniente para as condições do nosso dia a dia.
O fato dos efeitos relativistas serem pequenos, desprezíveis, na maioria das situações do nosso cotidiano, não significa que eles não existem na nossa vida diária a baixas velocidades.
Em outras palavras, neste nosso exemplo, a Realidade é Relativista a todos os níveis; o mundo ao nosso redor, que vivemos no nosso dia a dia, é simplesmente uma aproximação quase newtoniana, mas não existem duas Físicas, não existe uma fronteira que delimita o Mundo Newtoniano do Mundo Einsteniano, existe apenas o Mundo Einsteniano, sendo a aproximação Newtoniana uma ferramenta útil para aplicações aproximadas.
Com o advento da Física Quântica, também chamada de Física Nova, adotou-se o termo “Clássica” para se referir à Física Velha, ou anterior à Mecânica Quântica.
Novamente aqui, não há sentido em se referir a um domínio quântico, onde impera as leis da Mecânica Quântica, e a um domínio clássico, onde imperam as leis da Mecânica Clássica.
Assim como não há duas Físicas diferentes, não há duas realidades diferentes; há apenas a Realidade Quântica a todos os níveis.
O que nossos sentidos vêem em nosso dia a dia é uma aproximação quase clássica do comportamento de objetos macros e é isso que começaremos a mostrar a partir da próxima parte.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 2[/center]
Toda exposição a seguir está baseada no trabalho pioneiro de Murray Gell-Mann e James Hartle.
Após a apresentação desse trabalho em 1986, uma centena de outros foram publicados e ainda o são. O somatória desses trabalhos representa hoje a visão mais contemporânea e geral da Mecânica Quântica.
A MECÂNICA QUÂNTICA E A APROXIMAÇÃO CLÁSSICA
Quando a Mecânica Quântica foi descoberta, as pessoas ficaram impressionadas pelo contraste entre seu caráter probabilístico e as certezas da Física Clássica, na qual a informação exata e completa sobre uma situação inicial permitiria em princípio calcular a especificação exata e completa da situação final.
Um determinismo desse tipo nunca é perfeitamente aplicável à Mecânica quântica, mas ele muitas vezes se aplica de maneira aproximada às condições que freqüentemente são encontradas na maioria das experiências do nosso dia a dia, ou ao mundo que observamos normalmente, o chamado Domínio Quase Clássico, onde a Física Clássica é aproximadamente correta.
Esse domínio pode ser grosseiramente caracterizado como aquele que envolve o comportamento de objetos que possuem massa muito grande, quando comparados à massa dos objetos atômicos.
Por exemplo, o movimento dos planetas em torno do Sol pode ser calculado , na prática, sem quaisquer correções quânticas, que são completamente desprezíveis em tal tipo de problema.
Devemos ter em mente que, se o Domínio Quase Clássico não fosse relevante, os físicos nunca teriam desenvolvido e utilizado a Física Clássica , e teorias como as de Maxwell e Einstein não teriam obtido seus sucessos maravilhosos ao predizer resultados de observações.
Este é um caso típico onde o velho paradigma, como Kunh o teria chamado, não é descartado quando um novo é adotado, mas permanece como uma aproximação válida em um limite conveniente, como a Teoria da Gravitação de Newton, que ainda é imensamente útil como uma aproximação à de Einstein, quando as velocidades são pequenas quando comparadas à da luz, ou quando trabalhamos com fracos Campos Gravitacionais.
Ainda assim, a Física Clássica , em realidade, é apenas uma aproximação, enquanto que a Mecânica Quântica, até onde sabemos, é absolutamente correta. A Mecânica Quântica passou incólume a todos os testes aos quais ela foi submetida, ao longo de quase oitenta anos. Em nenhuma única vez houve desacordo entre o que previa a teoria e os resultados obtidos, sendo que em alguns casos, a concordância passava da décima casa decimal, feito jamais repetido por qualquer outra obra da intelectualidade humana.
Todavia, apesar de tamanho sucesso, e de já ter passado muitas décadas desde a descoberta da Mecânica Quântica em 1924, somente agora os físicos estão chegando a uma interpretação satisfatória, que permite uma compreensão profunda de como o Domínio Quase Clássico de nossa experiência cotidiana surge do caráter quântico subjacente da natureza.
A MECÂNICA QUÂNTICA APROXIMADA DE SISTEMAS MENSURÁVEIS
Quando a Mecânica Quântica foi formulada pela primeira vez por seus descobridores, ela era apresentada de um modo curiosamente restritivo e antropocêntrico, e até hoje, freqüentemente, ainda é assim.
Uma situação experimental, por exemplo, o decaimento radioativo de um tipo específico de núcleo, é reproduzida de modo idêntico repetidas vezes. O resultado da experiência é registrado à cada vez, preferencialmente por um físico utilizando um mesmo equipamento.
Um fato importante é que se pressupõe que tanto o físico, quanto o equipamento, sejam externos ao sistema que está sendo estudado.
Como procedimento, são registradas as freqüências com que os possíveis e diferentes resultados ocorrem, por exemplo, os tempos de decaimento.
À medida que o número de tentativas cresce sem limite, essas freqüências tendem a se aproximar das probabilidades previstas pela teoria quântica de se obter os vários resultados possíveis.
A probabilidade do decaimento radioativo em função do tempo é intimamente relacionada à fração de núcleos que permanecem sem decair depois de decorridos vários intervalos de tempo.
É nítido o fato de que esta interpretação original da Mecânica Quântica, restrita a experiências repetíveis realizadas por observadores externos, é demasiada particular para ser aceita hoje em dia como sua caracterização fundamental, especialmente porque tem ficado cada vez mais claro que a Mecânica Quântica é válida para todo o Universo.
Vale destacar que a interpretação original não está errada, mas é válida apenas para as situações para as quais ela foi desenvolvida.
Ale disso, num contexto mais amplo, esta interpretação deve ser considerada não apenas como particular, mas também como aproximada, podendo ser referida como a “Mecânica Quântica Aproximada dos Sistemas que podem ser medidos”.
A ABORDAGEM MODERNA
Para descrever o Universo, uma interpretação mais geral da Mecânica Quântica é evidentemente necessária, já que, para observar as muitas cópias do Universo, não existe qualquer observador ou equipamento externo ao mesmo, além do fato de que não há a menor chance de se repetir o experimento ou a medida.
De qualquer modo, se presume que o Universo não se importe se seres humanos evoluírem ou não em algum planeta obscuro para estudar a sua história; ele, o Universo, segue obedecendo às leis da Física Quântica sem levar em consideração as observações feitas pelos físicos.
Esta é uma das razões pelas quais a chamada Interpretação Moderna da Mecânica Quântica vem sendo desenvolvida nas últimas duas décadas. A outra é a necessidade de se compreender mais claramente a relação entre a Mecânica Quântica e a descrição clássica aproximada do mundo que nos cerca.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 3[/center]
A ABORDAGEM MODERNA – segunda parte
Nas primeiras discussões sobre a Mecânica Quântica muitas vezes estava implícito, e algumas vezes explicitamente afirmado, que havia um Domínio Clássico separado de um Domínio Quântico, de tal modo que a teoria física básica de alguma forma exigiria Leis Clássicas além das Leis Quânticas.
Pata toda uma geração educada com as noções da Física Clássica, este arranjo deve ter parecido satisfatório, mas hoje, para a maioria de nós, parece tão bizarro quanto desnecessário.
Na interpretação moderna da Mecânica Quântica, propõe-se que o Domínio Quase Clássico surge a partir das Leis da Mecânica Quântica, incluindo-se aí a condição inicial no começo da expansão do Universo. O grande desafio para essa nova abordagem foi compreender como se dá esse surgimento.
O trabalho pioneiro que levou à nova abordagem foi proposto pelo falecido Hugh Everett III, um dos estudantes de pós-graduação de John A. Wheeler em Princenton e mais tarde membro do Grupo de Avaliação de Sistemas de Armamento do Pentágono.
Muitos físicos teóricos têm trabalhado nesse modelo desde então, incluindo-se, como comentado no início:
Murray Gell-Mann, professor emérito de Física Teórica do Instituto de tecnologia da Califónia – CALTECH, Prêmio Nobel de Física em 1969 e um dos fundadores do Instituto Santa Fé, onde trabalha atualmente. Os profissionais desse instituto se dedicam a trabalhos teóricos que abrangem desde mecânica Quântica, até tópicos sobre a Sistema Imunológico de Mamíferos, a Evolução das Línguas Humanas e a Economia Global como Sistemas Complexos em Evolução.
Gell-Mann, por seu trabalho em prol do meio ambiente mundial foi nomeado um dos quinhentos Globais pelo Programa para o Meio Ambiente das Nações Unidas, tendo recebido o Prêmio Lindberg em 1993, por seus esforços em promover o equilíbrio entre o avanço tecnológico e a preservação do meio ambiente.
E James Hartle, da universidade da Califórnia em Santa bárbara e do Instituto Santa Fé. Notável cosmólogo teórico e especialista na Teoria Geral da Gravitação de Einstein.
Foi orientando de Gell-Mann em seu doutoramento, no início dos anos 60 e sua tese foi sobre a Teoria das Partículas Elementares. Mais tarde, juntamente com Stephen Hawking, publicou um artigo considerado seminal, intitulado A FUNÇÃO DE ONDA DO UNIVERSO.
Trabalhando conjuntamente com Gell-Mann, desde 1986, para clarificar como a Mecânica Quântica deveria ser concebida, particularmente em relação ao Domínio Quase Clássico, elaborou, novamente em parceria com Stephan Hawking a Conjectura de Inexistência de Fronteiras para o Universo.
O ponto de partida de Gell-Mann e Hartle, como dito, foi o trabalho de Everett, porém muito ainda havia para ser feito, a começar pela escolha de terminologia de Everett, como também, a dos comentaristas de seu trabalho, que contribuiu significativamente para a confusão que se seguiu.
Por exemplo, a interpretação de Everett é muitas vezes descrita em termos de “muitos mundos”, enquanto Gell-Mann e Hartle acreditam que o melhor deva ser “as muitas histórias alternativas do universo”. O mesmo se dá quanto à descrição dos “muitos mundos”, referidos como ‘todos igualmente reais”, enquanto Gell-Mann e Hartle preferem falar de, por acreditar que seja menos confuso, “muitas histórias, todas tratadas da mesma forma pela teoria, exceto por suas probabilidades diferentes”.
Nas palavras de Gell-Mann:
“Usar a linguagem que recomendamos é referir-se à noção familiar de que um determinado sistema pode ter diferentes histórias possíveis, cada uma delas com a sua devida probabilidade. Com isso, evitamos a necessidade de se conceber os muitos ‘Universos Paralelos” como sendo todos igualmente reais”.
“Um físico notável, bem versado em Mecânica Quântica, inferiu a partir de certos comentários sobre a interpretação de Everett que qualquer um que aceitasse deveria jogar Roleta-Russa para valer, porque em alguns desses mundos “igualmente reais”, o jogador sobreviveria e ficaria rico!” – completa jocosamente.
Outro problema lingüístico, levantado por Gell-Mann e Hartle, é que Everett evitou a palavra PROBABILIDADE na maioria das seqüências lógicas, utilizando em seu lugar a noção menos familiar, mas matematicamente equivalente, de MEDIDA, o que em momento algum ´proporcionava qualquer vantagem na abordagem.
Problemas lingüísticos, porém, não eram as principais preocupações de Gell-Mann e Hartle, conforme ele expõe com suas próprias palavras:
“Palavras e lingüística à parte, o fato é que Everett deixou muitas questões importantes sem respostas, e o principal desafio, não é uma questão de linguagem, mas sim preencher espaços vazios na nossa compreensão da Mecânica Quântica”.
Juntamente comigo e Jim Hartle, há todo um grupo internacional de teóricos, que tentam de diversas formas, construir uma interpretação moderna da Mecânica Quântica.
Entre os que têm feito contribuições notáveis, estão Robert Griffiths e Roland Omnès, particularmente no conceito de Histórias; bem como Erich Joos, Dieter Zeh e Wojciech Zurek, com alguns pontos de vista um pouco diferentes.
A Mecânica Quântica em termos de Histórias foi desenvolvido por Richard Feynmann, apoiado em um trabalho anterior de Paul Dirac.
Essa formulação não ajuda apenas a classificar a interpretação moderna; ela é também particularmente útil para descrever a Mecânica Quântica sempre que a Gravitação Einsteniana for levada em consideração, como na Cosmologia.
Nessas situações, quando a Geometria do Espaço-tempo fica submetida à indeterminação quântica, o método baseado em Histórias dá conta do recado perfeitamente bem“.
O ESTADO QUÂNTICO DO UNIVERSO
Um ponto fundamental para qualquer tratamento da Mecânica Quântica é a noção de Estado Quântico.
Vamos considerar uma visão simplificada do Universo, onde cada partícula não tem outro atributo a não ser sua posição e seu momento, sendo que a indistinguibilidade de todas as partículas de um mesmo tipo, da qual a permutabilidade de todos os elétrons é um exemplo, será deixada de lado.
Para entendermos o significado de um Estado Quântico para todo o Universo, devemos, a fim de facilitar, começar a discutir o Estado Quântico de uma única partícula, depois o de duas partículas e assim por diante.
O ESTADO QUÂNTICO DE UMA PARTÍCULA
Na Física Clássica, teria sido válido especificar exatamente, e ao mesmo tempo, ambos os atributos, ou seja, tanto a posição, quanto o momento de uma determinada partícula.
As coisas não se passam bem assim quando tratamos com a Mecânica Quântica. Graças à famosa indeterminação da Natureza, expressa através do Princípio da Incerteza de Heisenberg, se especificarmos exatamente a posição de uma partícula, seu momento será completamente indeterminado.
Esta situação caracteriza um tipo particular de Estado Quântico de uma única partícula, um estado de posição definida.
Em outro tipo de Estado Quântico, acontece o inverso, quando o momento é exatamente especificado e a posição é completamente indeterminada.
Vale lembrar que há, também, uma variedade infinita de outros Estados Quânticos possíveis, para uma única partícula, nos quais nem a posição, nem o momento são exatamente especificados, tendo apenas uma distribuição espalhada de probabilidades para cada um.
Como exemplo, podemos falar do átomo de Hidrogênio, que consiste em um único elétron, carregado negativamente, no campo elétrico de um próton, carregado positivamente.
Nesse caso, o elétron pode se encontrar no Estado Quântico energia mais baixa, no qual a sua posição se espalha sobre uma região cujo tamanho é da ordem do tamanho do átomo, sendo que a mesma situação distribuída acontece para seu momento.
Aqui vale destacar que a incerteza na posição do elétron, assim como em seu momento, abrange um espaço da mesma ordem de grandeza do átomo de Hidrogênio, o que mostra quão significativa é a indeterminação quântica a esse nível.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 4[/center]
O ESTADO QUÂNTICO DE DUAS PARTÍCULAS
Vamos considerar, agora, um universo com dois elétrons. Embora seja possível que o estado quântico desse universo seja tal que cada um dos elétrons se encontre em um Estado Quântico definido, isso não ocorre com freqüência, uma vez que os dois elétrons interagem, principalmente por meio da repulsão elétrica mútua.
Por exemplo, no átomo de Hélio, o qual consiste de dois elétrons em um campo de um núcleo central com carga positiva dupla. Para o estado de energia mais baixo do átomo de Hélio, não é verdade que cada um dos elétrons esteja em um Estado Quântico definido próprio, embora essa situação seja às vezes considerada uma aproximação.
Em vez disso, como conseqüência da interação entre os elétrons, seu Estado Quântico conjunto é aquele no qual os estados dos dois elétrons estão correlacionados um com o outro.
Caso estejamos interessados em apenas um dos elétrons, devemos proceder a uma “soma” de todas as posições, ou os momentos, ou os valores de qualquer outro atributo, do segundo elétron. Isso se traduz no Estado Quântico do primeiro elétron, ou seja, ele não apresenta um estado definido (puro); ao contrário, apresenta um conjunto de probabilidades para os vários Estados Quânticos Puros de um único elétron.
Em Mecânica Quântica, se diz que o nosso elétron em questão está num Estado Quântico Misto.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTADO QUÂNTICO DO UNIVERSO
Pelo que vimos até agora, se o Universo está em um Estado Quântico Puro, esse é um estado tal que os estados individuais das partículas que ele contém estão entrelaçados uns com os outros.
O Universo como um todo pode estar em um Estado Quântico Puro. Foi exatamente essa hipótese que James Hartle e Stephem Hawking lançaram, propondo uma forma particular de estado puro que teria existido próximo ao início da expansão do Universo.
Tal hipótese, convenientemente generalizada para uma Teoria Unificada de Partículas elementares, não só especifica esse estado Quântico Inicial do Universo, bem como determina como esse estado varia no tempo.
Todavia, mesmo uma especificação completa do Estado Quântico de todo o Universo, não apenas inicialmente, mas para todos os instantes de tempo, não fornece uma interpretação para a Mecânica Quântica.
Para entendermos, devemos ver o Estado Quântico do Universo como um livro que contém as respostas de uma variedade infinita de questões. É fácil perceber que, um livro desse tipo é inútil sem uma lista de perguntas que devem ser feitas.
A interpretação moderna da Mecânica Quântica está sendo construída através de uma discussão sobre as perguntas relevantes que devem ser feitas sobre o Estado Quântico do Universo.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 5[/center]
PERGUNTAS SOBRE O ESTADO QUÂNTICO DO UNIVERSO
O primeiro ponto que devemos considerar é que, uma vez que a Realidade Quântica é probabilística, e não determinística, as perguntas são inevitavelmente sobre probabilidades.
Gel-Mann e Hartle, assim como Griffiths e Omnès partem do princípio que, em última instância, as perguntas sempre se relacionam com as Histórias alternativas do Universo.
Deve ficar claro que aqui, o termo História não se refere a enfatizar o Passado às custas do Futuro, muito menos se refere aos registros da História Humana.
Neste caso, História significa apenas uma narrativa de uma seqüência temporal de eventos, passados, presentes e futuros.
As perguntas sobre as Histórias Alternativas do Universo podem ser do tipo:
“Qual a probabilidade de ocorrência desta História em particular do Universo e não de outras?”
Ou mesmo:
“Dadas estas asserções sobre uma determinada História possível do Universo, qual a probabilidade de determinadas outras afirmações adicionais serem verdadeira?
Em muitos casos, este último tipo de pergunta assume uma forma um pouco diferente, sendo inquisitiva mais especificamente a respeito do estado futuro do Universo, como vemos abaixo:
“Dadas estas asserções sobre o passado ou o presente , qual a probabilidade destas afirmações sobre o futuro se tornarem verdadeiras?”
Analisemos, então, um exemplo prático.
HISTÓRIAS ALTERNATIVAS EM CORRIDAS DE CAVALOS
Na pista de corridas de cavalos é um lugar onde encontramos probabilidades que estão relacionadas com o que podemos chamar de chances reais.
Se as chances reais de que um cavalo não vença uma corrida são de 3 para 1, então a probabilidade de que este cavalo vença é de ¼.
Caso as chances reais contrárias são de 2 para 1, então a probabilidade de vencer é 1/3.
Vamos supor uma corrida em que há 10 cavalos disputando. De fato, cada um deles possui uma probabilidade positiva de vencer ou nula, no caso de um cavalo desesperadamente ruim, e a soma das probabilidades de vitória dos participantes é igual a 1, uma vez que, no caso de corridas de cavalos deve haver exatamente um vencedor entre os 10 cavalos.
Os 10 resultados alternativos são então mutuamente exclusivos – apenas um pode ocorrer (não se está levando em conta, para simplificação, a possibilidade de empate) – e exaustivos – um deles vai ocorrer.
Uma propriedade óbvia das 10 probabilidades é que elas são aditivas. Por exemplo, a probabilidade de que o terceiro ou o quarto cavalo vença é simplesmente a soma das duas probabilidades individuais de vitória de cada um.
Um paralelo mais próximo entre o exemplo das corridas de cavalo e as Histórias do universo pode ser obtido considerando-se uma seqüência de corridas, por exemplo oito corridas com dez cavalos em cada uma.
Novamente por simplicidade, vamos considerar apenas a possibilidade de vitória, desconsiderando possíveis, embora raros, empates, e que sempre haverá um vencedor, ou seja, não há cancelamento de corridas.
Temos então que cada possível lista de oito vencedores é um tipo de História para cada corrida e essas Histórias são mutuamente exclusivas e exaustivas, exatamente como no caso anterior de uma única corrida.
Para este “Universo de Corridas de Cavalos” o número de Histórias alternativas é o produto de oito fatores de dez, um para cada corrida, ou seja, um total de uma centena de milhões.
A probabilidade para as diferentes seqüências de vitória tem a mesma propriedade aditiva que os cavalos individuais têm de vencer uma única corrida: a probabilidade de que uma ou outra seqüência particular de vitória ocorra é a soma das probabilidades individuais para as duas seqüências.
Uma situação em que uma ou outra seqüência ocorre é chamada de Histórias Combinadas.
Sendo A e B duas Histórias Alternativas individuais, a propriedade aditiva exige que a probabilidade das Histórias Combinadas, A ou B, seja a probabilidade de A mais a probabilidade de B.
Em outras palavras, a probabilidade de que, no próximo dia 23/10, eu vá ao Segundo Encontro do RV SP ou fique em casa é a soma da probabilidade de que eu compareça ao encontro com a probabilidade de que eu fique em casa.
Vale lembra que uma quantidade que não obedeça à essa regra não é uma probabilidade.
HISTÓRIAS ALTERNATIVAS NA MECÂNICA QUÂNTICA
Suponha que um conjunto de Histórias Alternativas do Universo seja especificado, e que essas Histórias sejam mutuamente exclusivas e exaustivas. Podemos afirmar que a Mecânica Quântica pode atribuir sempre uma probabilidade a cada uma delas?
A resposta é não; nem sempre, surpreendentemente, poderemos atribuir tais probabilidades.
Em vez disso, a Mecânica Quântica atribuirá a cada par dessas Histórias uma quantidade que chamaremos de D, e fornecerá a regra para o seu cálculo em termos do Estado Quântico do Universo.
As duas Histórias que formam um determinado par podem ser diferentes, como as alternativas A e B, do exemplo anterior, ou podem ser iguais, digamos A e A. O valor D, então, será indicado por uma expressão do tipo D(A,B), que se lê D de A e B.
Se as duas Histórias que formam o par são ambas A, temos, então, D(A,A); caso ambas sejam a História Combinada de A ou B, então o valor de D é dado por
D(A ou B,A ou B).
Quando duas Histórias que formam o par são as mesmas, D é um número entre zero (0) é um (1), tal qual uma probabilidade.
Realmente, sob certas condições, D pode ser interpretado como a probabilidade de ocorrência da História. Vejamos quais condições são essas.
Vamos examinar a relação entre as seguintes quantidades:
1- D(A ou B,A ou B)
2- D(A,A)
3- D(B,B)
4- D(A,B) mais D(B,A)
Pelo exposto acima, quando as Histórias do par são as mesmas, temos que as três primeiras quantidades apresentam valores entre zero e um, portanto, lembram probabilidades.
Já a última quantidade pode ser positiva, negativa ou zero e, conseqüentemente, não é uma probabilidade.
Todavia, a regra definida pela Mecânica Quântica para o cálculo de D é de tal forma que o valor da primeira quantidade é a soma das outras três, ou seja:
D(A ou B,A ou B) = D(A,A) + D(b,B) + D(A,B) mais D(B,A).
Temos também que, se A e B são Histórias diferentes, então a última quantidade, D(A,B) mais D(B,A) é sempre zero, o que implica, então, que D(A ou B, A ou B) é simplesmente a soma de D(A,A) com D(B,B).
Em outras palavras, se D é sempre zero quando duas Histórias são diferentes, então D (de uma História e dessa mesma História) possuía a propriedade aditiva e pode, portanto, ser interpretado como a probabilidade para essa História.
Vale destacar que a quarta quantidade da lista acima é chamada de Termo de Interferência entre as Histórias A e B. Caso esse termo não seja diferente de zero para cada par de Histórias, a Mecânica Quântica não pode atribuir probabilidades a essas Histórias, uma vez que elas interferem uma com a outra.
Como em qualquer situação a Mecânica Quântica só pode atribuir probabilidades, ela não pode fazer nada no caso em que Histórias interfiram uma com a outra. Tais Histórias são úteis apenas para construir Histórias Combinadas que não interferem.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 6[/center]
HISTÓRIAS DO UNIVERSO FINAMENTE GRANULADAS
Por definição, Histórias Completas do Universo Finamente Granuladas são Histórias que dão uma discrição tão completa quanto possível de todo o Universo, em todos os instantes de tempo.
Para podermos perceber o que a Mecânica Quântica pode dizer a respeito delas, continuaremos a utilizar o modelo de Universo no qual as partículas possuem apenas os atributos de posição e momento, descartando todos as demais, inclusive a indistinguibilidade entre partículas de mesmo tipo.
Convém lembrar que, se a Física Clássica determinista fosse exatamente correta, poderíamos especificar, em todos os instantes de tempo, exatamente a posição e o momento de cada partícula.
A Dinâmica Clássica poderia, por conseqüência, predizer com certeza as posições e os momentos de todas as partículas em instantes de tempo futuros.
Mesmo em se levando em conta o fenômeno do Caos, que produz situações em que a menor imprecisão na posição e momento inicial leva a incertezas arbitrariamente grandes nas predições futuras, na teoria Clássica, o determinismo perfeito ainda seria correto e obteríamos uma informação perfeita.
Todavia, na Mecânica Quântica, para a qual a Física Clássica é apenas uma aproximação, de imediato temos que já não faz mais sentido especificar tanto a posição como o momento, de maneira exata, para o mesmo instante de tempo, conforme mostrado pelo Princípio da Incerteza de Heisenberg.
Na Mecânica Quântica, portanto, a condição do nosso Universo simplificado poderia ser caracterizada apenas especificando-se as posições de todas as partículas, ou especificando-se todos os seus momentos, ou por infinitas combinações diferentes de se especificar a posição de algumas e o momento de outras.
Um exemplo de História Completa de Granulação Fina do nosso Universo simplificado, na Mecânica Quântica, poderia consistir nas posições das partículas desse Universo em todos os instantes de tempo.
Seria de se esperar, uma vez que a Mecânica Quântica é probabilística e não determinística, como a Mecânica Clássica aproximada, que ela nos fornecesse uma probabilidade para cada História Finamente Granulada, mas não é este o caso, uma vez que os Termos de Interferência entre Histórias Finamente Granuladas normalmente não desaparecem e, portanto, como vimos anteriormente, não é possível atribuir probabilidades a tais Histórias.
Todavia, nas pistas de corridas, os apostadores não têm que se preocupar com Termos de Interferência entre uma seqüência de vencedores e outra.
A pergunta que cabe é: por que não?
Como é possível que os apostadores tratem com probabilidades reais que se somam de modo apropriado, enquanto que a Mecânica Quântica fornece, no nível de Histórias Finamente Granuladas, apenas quantidades para as quais a adição é atrapalhada pelos Termos de Interferência?
A resposta é que, para termos probabilidades reais, é necessário considerar Histórias que possuem uma Granulação Suficientemente Grosseira.
[center]A REALIDADE QUÂNTICA[/center]
[center]UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DA MECÂNICA QUÂNTICA – Parte 7[/center]
HISTÓRIAS COM GRANULAÇÃO GROSSEIRA
A seqüência de oito corridas de cavalo serve, além de uma metáfora, como um exemplo real de uma História do Universo com uma granulação muito grosseira.
Como apenas a lista de vencedores é considerada, a Granulação Grosseira consiste em:
1- Ignorar todos os instantes de tempo da História do Universo, exceto aqueles nos quais as corridas são vencidas.
2- Nos instantes de tempo considerados, acompanhar apenas os cavalos que participam das corridas e ignorar todos os outros objetos do universo.
3- Destes cavalos, acompanhar apenas aquele que vence a corrida e ignorar todas as partes do cavalo, exceto a ponta de seu focinho.
Para Histórias do Universo na Mecânica Quântica, a Granulação Grosseira tipicamente significa acompanhar certas coisas, em certos instantes de tempo, e somente até um certo nível de detalhe.
Uma História com Granulação Grosseira pode ser considerada uma classe de Histórias Alternativas Finamente Granulada., todas concordando sobre um relato particular do que está sendo acompanhado, mas diferindo sobre todos os comportamentos possíveis do que não está sendo acompanhado, e que devem ser somados.
No exemplo das corridas de cavalo, cada História com Granulação Grosseira é a classe de todas as Histórias Finamente Granulada que têm a mesma seqüência de oito vencedores, naquele dia em particular e naquela pista específica, embora as Histórias Finamente Granuladas na classe variem sobre todas as possíveis alternativas para o que acontece com quaisquer outras características da História do Universo.
Dessa forma, todas as Histórias Finamente Granuladas do Universo são agrupadas em classes de tal maneira que cada uma delas pertencem a uma e somente uma classe.
Essas classes, exaustivas e mutuamente exclusivas, são as Histórias com uma Granulação Grosseira, exatamente como as diferentes seqüências possíveis de vencedores dos oito páreos quando não há empate.
Suponhamos que uma determinada classe contenha apenas duas Histórias Finamente Granuladas, J e K.
A História com Granulação Grosseira será, então, apenas (J ou K), o que implica que acontece ou J, ou K.
Da mesma forma, se uma classe contém muitas Histórias Finamente Granuladas, a História com Granulação Grosseira será a História combinada na qual qualquer uma dessas Histórias Finamente Granulada acontece.
Em Matemática, essas Histórias com Granulação Grosseiras são chamadas de Classes Equivalentes de Histórias Finamente Granuladas. Cada História Finamente Granulada pertence a uma e apenas uma Classe de Equivalência, sendo os membros de uma classe tratados como equivalentes.
Para exemplificar o exposto acima, vamos imaginar que as únicas coisas no Universo sejam os cavalos nas oito corridas e um certo número de moscas que os acompanham, e que tudo o que um cavalo pode fazer é vencer ou não.
Dessa forma, nesse mundo fantasticamente simplificado, cada História Finamente Granulada consiste de uma seqüência de cavalos vencedores e de alguma História particular sobre as moscas.
Se as Histórias com granulação Grosseira acompanham apenas os cavalos e suas vitórias, e ignoram as moscas, então cada uma dessas Histórias de Granulação grosseira será o conjunto das Histórias Finamente Granuladas, na qual existe uma seqüência particular de cavalos vencedores e um destino qualquer para as moscas.
De um modo geral, cada História com Granulação Grosseira é uma Classe Equivalente de Histórias Finamente Granuladas caracterizadas por uma narrativa particular que descreve os fenômenos acompanhados e por qualquer das possíveis narrativas alternativas que descrevem tudo aquilo que é ignorado.
A GRANULAÇÃO GROSSEIRA PODE DESCARTAR OS TERMOS DE INTERFERÊNCIA
Neste ponto, a pergunta em questão é:
Como pode, para as Histórias Quânticas do Universo, o agrupamento de Histórias Finamente Granuladas em Classes Equivalentes conduzir a Histórias com Granulação Grosseira com probabilidades verdadeiras?
Ou seja, como é possível que Histórias com Granulação Grosseira convenientes não tenham Termos de Interferência entre elas?
A resposta é que o Termo de Interferência entre duas Histórias com granulação grosseira é a soma de todos os Termos de Interferência entre pares de Histórias Finamente Granuladas que pertencem a essas duas Histórias.
A soma de todos esses Termos, com seus sinais algébricos positivos e negativos, pode produzir uma grande quantidade de cancelamentos e dar um resultado pequeno, com qualquer um dos sinais ou zero.
Vale lembrar, como visto na parte 5, que a Mecânica Quântica atribui uma quantidade D a cada par de Histórias e que D de uma História e da própria História {D(A,A), por exemplo} está sempre entre zero (0) e um (1), tal qual uma probabilidade real e, portanto, quando somadas, não podem se cancelar.
Qualquer comportamento de qualquer coisa no Universo que seja ignorado nas Histórias de Granulação Grosseira pode ser considerado como “somado” no processo de adição.
Todos os detalhes deixados de lado nas Histórias Grosseiramente Granuladas, todos os tempos, lugares e objetos que não são acompanhados, são somados.
Por exemplo, as Classes Equivalentes poderiam agrupar todas as Histórias Finamente Granuladas em que certas partículas têm posição especificada em todos os instantes, enquanto todas as outras partículas no Universo Simplificado podem estar em qualquer parte ou lugar.
Diríamos, então, que as posições do primeiro conjunto são acompanhadas em cada instante, enquanto aquelas do segundo, são ignoradas ou somadas.
Uma Granulação Grosseira maior poderia consistir em acompanhar as posições do primeiro conjunto de partículas apenas em certos instantes de tempo, de modo que tudo o que acontece nos outros instantes, seria somado.