Rede pública paga quase igual à particular
Estudo mostra que renda média de professores é pouco menor na rede pública, mas benefícios na aposentadoria são maiores
Diferença a favor de docentes da rede privada varia apenas de 4,9% no caso da pré-escola para 11% no caso do ensino médio
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
Um estudo que será divulgado na segunda-feira contesta um dos mitos mais disseminados da educação brasileira: o de que o ensino público vai mal quando comparado ao particular por causa dos baixos salários dos professores.
Feito pelos pesquisadores Samuel Pessoa, Fernando de Holanda Barbosa Filho e Luís Eduardo Afonso, da FGV e da USP, o trabalho mostra que a renda média de professores da rede privada é quase a mesma dos seus colegas da rede pública. A diferença não passa de 11%, no caso dos que trabalham no ensino médio.
No entanto, se forem considerados os benefícios da aposentadoria no setor público, a situação se inverte em favor dos professores estaduais, municipais e federais.
O estudo será apresentado no seminário Remuneração do Professor, Gestão e Qualidade da Educação, realizado pela Fundação Lemann, pelo Instituto Futuro Brasil (IFB) e pelo Ibmec para discutir as causas do fracasso do ensino público.
No Saeb (exame do MEC que avalia a qualidade da educação básica), os resultados da rede privada no 3º ano do ensino médio são significativamente superiores aos da rede pública. Numa escala de 0 a 500, as médias na rede privada foram de 307 pontos em matemática e 333 em português. No setor público, elas caem, respectivamente, para 249 e 260.
O Enem (outro exame do MEC restrito ao ensino médio) mostra o mesmo quadro. De 0 a 100, a média nas escolas particulares foi de 52,7, enquanto nas públicas ficou em 39,5.
Essa diferença de desempenho, para os autores do estudo, tem muito pouco ou nada a ver com o salário dos professores. Para chegar a essa conclusão, eles compararam pelo Censo 2000 do IBGE a renda média de professores da rede pública com os da rede privada em todos os níveis de ensino.
Levando em conta apenas a renda, a diferença a favor da rede privada variou apenas de 4,9% no caso da pré-escola para 11% no caso do ensino médio.
Os autores do estudo, no entanto, ampliaram essa análise levando em conta também o regime de contribuição previdenciária e aposentadoria em cada rede. Ao fazer isso, perceberam que os rendimentos pagos na rede pública são melhores do que os da rede privada se, nessa análise, forem considerados os descontos que os trabalhadores fazem para contribuir para a previdência e o valor dos rendimentos após aposentados.
No caso das mulheres -que se aposentam mais cedo que os homens-, os contratos na rede pública são mais vantajosos em todos os níveis de ensino. No caso dos homens, isso é verdade para professores de pré-escola e do ensino fundamental.
"Os diferenciais de salários dos professores entre a rede pública e a privada não favorecem o setor privado como tanto advogado tem defendido muitas vezes em debates acalorados. Com exceção do ensino secundário, os professores da rede pública recebem uma remuneração superior ou igual à paga aos da rede privada", afirmam os autores no estudo.
O presidente do sindicato dos professores da rede privada em São Paulo, Luiz Antonio Barbagli, concorda com a tese de que os contratos na rede pública são mais vantajosos: "Se formos trabalhar com a média e pensarmos a longo prazo, pode ter certeza absoluta de que na maioria dos casos o contrato é melhor na rede pública do que na rede privada. É preciso, no entanto, considerar que os salários nas escolas particulares variam bastante".
Juçara Dutra Vieira, presidente da (CNTE) Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, diz que o fato de o diferencial ser maior ou menor entre as duas redes não significa que o salário seja adequado. "Entendemos que é importante pagar um salário digno ao professor, mas achamos que isso não basta para melhorar a qualidade do ensino. No que diz respeito ao professor, é fundamental também investir na formação e na carreira."
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidi ... 200728.htm
Professor da rede pública tem maiores ganhos em SP
No Estado, rendimento de professora da rede pública pode ser 22% superior
Para especialistas, maior qualidade do ensino na rede privada vem do fato de essas escolas trabalharem com perfil segmentado
DA SUCURSAL DO RIO
O mesmo exercício comparativo entre os rendimentos de professores das redes privada e pública no Brasil foi repetido especificamente para São Paulo. A conclusão dos autores do estudo sobre diferenciais de salário entre os docentes é que, em São Paulo, o rendimento ao longo da carreira e levando em conta a aposentadoria são ainda mais vantajosos para a rede pública do que o verificado no resto do país.
No Brasil, quando incluídos os vencimentos na aposentadoria e os descontos previdenciários, os rendimentos de uma professora da rede pública de 1ª à 4ª série ao longo da vida são 12% superiores em relação a suas colegas da rede privada em uma das simulações feitas. Em São Paulo, esse diferencial sobe para 22%.
Para o mesmo perfil de professor, mas do sexo masculino, o diferencial a favor do setor público é de 7% em todo o Brasil. Especificamente em São Paulo, ele sobe para 18%.
Em São Paulo, assim como para todo o país, as médias da rede pública no Saeb e no Enem são piores do que as verificadas em escolas privadas.
Para a presidente da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), Juçara Dutra Vieira, é preciso considerar nessa análise também que boa parte do diferencial em termos de qualidade do ensino na rede privada vem do fato de essas escolas trabalharem com um perfil segmentado de aluno por serem pagas.
No caso do ensino público, pondera Vieira, as escolas atendem a todo o perfil de aluno, o que torna o trabalho do professor mais difícil.
"Achamos que não é muito científica a tese generalizada de que as escolas privadas são muito superiores às públicas. Além disso, há muita interferência de outros fatores que ajudam a explicar por que uma escola pública tem rendimento menor do que uma particular nos exames nacionais", diz.
Para o economista Samuel Pessoa, um dos autores do estudo, esse argumento faz sentido.
"O fato de a escola privada cobrar mensalidade faz com que muitos alunos, especialmente os mais problemáticos ou muito pobres, não se matriculem nela. Mas eu suspeito que, mesmo numa escola privada que atende ao mesmo perfil de aluno do que uma pública, os resultados vão ser melhores no setor particular, talvez por uma pressão maior exercida pelos pais dessas escolas", afirma.
Pessoa diz que, como o regime de trabalho é mais favorável ao professor na rede pública, era de se esperar que os resultados também fossem melhores. "Na rede pública, o professor tem estabilidade, pode faltar várias vezes e não é cobrado por desempenho. Suas condições de trabalho, nesse sentido, seriam até mais favoráveis."
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidi ... 200729.htm
Qualidade da rede privada varia conforme o perfil dos alunos
DA SUCURSAL DO RIO
Uma das razões que levam os professores da rede privada a terem desempenhos menores ou apenas ligeiramente superiores aos da rede pública é que, no setor particular, há muita diversidade de escolas, que atendem perfis diferenciados de alunos.
Uma prova disso é o ranking de salário de escolas particulares feito pelo Sindicato dos Professor de São Paulo. Essa lista mostra que há uma pequena quantidade de escolas de elite que conseguem pagar bons salários aos professores. De 1ª à 4ª série, por exemplo, o maior salário chegava a R$ 4.151 por meio turno de aula.
No outro extremo, no entanto, várias escolas pagavam apenas o piso salarial ou até menos do que ele, com vencimentos de apenas R$ 573, o que representa uma variação de 624%.
Para o presidente do sindicato, essa variação reflete o perfil de estudante que cada escola atende. "Há escolas na periferia de São Paulo cujas mensalidades são de apenas R$ 100 porque atendem alunos de menor renda. Outros cobram mais de R$ 2.000 dos alunos", diz Luiz Antonio Barbagli, presidente do sindicato de professores da rede privada.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidi ... 200730.htm