2 MILHÕES DE FAMÍLIAS JÁ SAÍRAM DO BOLSA FAMÍLIA
Enviado: 05 Jul 2007, 14:11
Rosani Cunha, Secretária Nacional de Renda de Cidadania, do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
O Bolsa Família atende 11 milhões de famílias (46 milhões de pessoas) em todos os municípios brasileiros. Segundo Rosani, esse número é fixo desde 2006. Há substituição de famílias. A média mensal é de cerca de 100 mil famílias que saem e dão lugar a outras 100 mil famílias no programa.
Segundo Rosani, deixam o programa as famílias que atingem uma renda mensal acima de R$ 120.
O Presidente Lula anunciou que os benefícios do Bolsa Família vão sofrer uma recomposição de 18,25% e vão passar de R$ 62 para R$ 72 por mês. Isso significa um acréscimo de gastos de R$ 400 milhões. Rosani disse que o Bolsa Família foi criado em 2003 e nunca houve uma recomposição de valor.
Custo total do Bolsa Família para 2007, com a recomposição de 18,25%, é de R$ 9 bilhões. Esse valor representa menos de 0,3% do PIB.
“Vários estudos mostram isso. O Bolsa Família tem um impacto no PIB muito baixo, menos de 0,3% e uma grande contribuição para reduzir a desigualdade no país”, disse Rosani Cunha.
A PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2005 mostra que 21% da queda da desigualdade social no Brasil se deu por causa do Bolsa Família.
“Isso é muito expressivo: 21% num programa que tem um impacto fiscal de menos de 0,3% do PIB. Não é a toa que a gente é acompanhado hoje pelo mundo inteiro”, disse Rosani.
Leia a íntegra da entrevista com Rosani Cunha:
Paulo Henrique Amorim – O governo anunciou, na verdade o presidente Lula anunciou numa solenidade em Fortaleza que os rendimentos do benefício do Bolsa Família vai aumentar 18,25%, vai passar de R$ 62 para R$ 72 por mês, isso significa um aumento, um acréscimo de gastos de R$ 400 milhões. Para discutir essa questão eu vou conversar com Rosani Cunha, secretária Nacional de Renda de Cidadania, do Ministério de Desenvolvimento Social, dirigido pelo ministro Patrus Ananias. Rosani Cunha, como vai? Tudo bem?
Rosani Cunha – Tudo bem.
Paulo Henrique Amorim – Rosani Cunha, em primeiro lugar, de onde vem esses R$ 400 milhões?
Rosani Cunha – Na verdade não é nem o reajuste, é uma recomposição de valor do benefício do Bolsa Família. Ele foi criado em 2003 e nunca houve qualquer atualização de valor. O debate sobre esse assunto foi colocado desde o início do ano passado, quando nós também reajustamos a linha de pobreza que o programa considera, além de tudo, o Bolsa Família dá ao governo essa possibilidade de reajustar tanto a linha de pobreza como o valor do benefício.
Paulo Henrique Amorim – O que é linha de pobreza?
Rosani Cunha – O critério que nós utilizamos para selecionar as famílias do programa Bolsa Família.
Paulo Henrique Amorim – Até que limite superior a pessoa pode ter direito a Bolsa Família?
Rosani Cunha – O programa consegue benefícios pra famílias com até R$ 120 por pessoa da família por mês. Nós consideramos como extremamente pobres aquelas que têm até R$ 60 de renda e como pobres aquelas que têm entre R$ 60 e R$ 120. E como eu dizia, o debate da linha de pobreza do programa ele aconteceu no início ano passado junto com a proposta de recompor o valor do benefício do Bolsa Família. Então, já era um tema que o governo tinha pautado, que já existia uma discussão com a área econômica de previsão orçamentária, até porque os estudos vários mostram isso: o Bolsa Família tem um impacto no PIB muito baixo, de menos de 0,3% e uma grande contribuição para reduzir a desigualdade no país.
Paulo Henrique Amorim – Então deixa eu fazer algumas perguntas. Primeiro lugar: quantas famílias ou quantas pessoas se beneficiam hoje do Bolsa Família?
Rosani Cunha – Nós temos 11 milhões e 100 mil famílias no programa em todo o país, em todos os municípios brasileiros.
Paulo Henrique Amorim – Esse número tem aumentado ou esse número tem diminuído?
Rosani Cunha – Não, esse número é fixo desde junho do ano passado. Tem havido substituição de famílias. Algumas famílias entram, outras famílias saem. A média mensal é de cerca de 100 mil famílias que entram em função da saída de outras 100 mil famílias. Essas 11 milhões e 100 mil famílias é uma estimativa de famílias pobres no Brasil feitas a partir de dados da PNAD de 2004 a partir de uma metodologia desenvolvida pelo Ipea e pelo IBGE.
Paulo Henrique Amorim – E isso atinge quantas pessoas?
Rosani Cunha – Nós temos em torno, uma média de 4,2 pessoas por família. Então, a gente está falando de 46 milhões de pessoas.
Paulo Henrique Amorim – E o custo total do programa qual é?
Rosani Cunha – O custo total no ano de 2007, com essa recomposição de valor, vai ser de R$ 9 bilhões.
Paulo Henrique Amorim – Outra coisa, qual é o critério para as pessoas saírem do programa?
Rosani Cunha – Bom, nós consideramos como critério a renda, a operação da renda da família. Se ela passa a receber mais de R$ 120 ela sai do programa. E aí até é bom perguntar isso porque quando eu disse que nós temos 11 milhões e 100 mil famílias sem aumento, na verdade, já saíram do programa 1 milhão e 800 mil famílias desde o início do Bolsa Família. Saíram ou porque alteraram a renda legitimamente ou também por mecanismos de controle que o ministério implementou.
Paulo Henrique Amorim – Entendi. Agora, você falou que o Bolsa Família começou no ano de 2003. O presidente Fernando Henrique Cardoso publicou no domingo passado nos jornais “O Estado de São Paulo” e “O Globo” um artigo em que assume a paternidade do Bolsa Família. Quem é que é o pai do Bolsa Família? É o presidente Lula ou o presidente Fernando Henrique?
Rosani Cunha – Olha, o Bolsa Família tem na sua origem diferentes experiências. E eu acho que isso é muito bom até porque eu posso dizer que o povo brasileiro construiu o programa como Bolsa Família. Nós fizemos o programa Bolsa Escola em Campinas, que é o mais antigo surgiu ainda na década de 80, tivemos o Bolsa Escola depois em Brasília, vários programas municipais, tivemos o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, portanto, o que eu acho que o que está por trás do Bolsa Família é uma série de experiências e eu acho que é importante que a gente entenda programas de transferência de renda como estratégia para reduzir pobreza e desigualdade e que tem que se assumida como política de Estado. E acho isso está muito claro no Bolsa Família. É um programa que tem que ser aperfeiçoado...
Paulo Henrique Amorim – Ou seja, o Bolsa Família é uma consolidação de diferentes programas de transferência de renda que também já havia no passado. É isso?
Rosani Cunha – Mais do que consolidação eu acho ele traz avanços a esse programa.
Paulo Henrique Amorim – Quais avanços?
Rosani Cunha – O grande avanço, por exemplo, é trabalhar com toda a família. O programa Bolsa Escola, por exemplo, trabalhava apenas com três crianças da família. Se tivesse uma quarta criança no trabalho infantil, a família não respondia por isso porque se as três estivessem na escola, tudo ok. Pro Bolsa Família toda a família tem responsabilidade, toda a família tem direito de usar esse programa, essa eu diria que é uma das inovações. Tem os critérios de seleção, tivemos mudanças acho que muito grande no cadastro único, mas eu diria que o Bolsa Família ele é uma consolidação, sim, de uma estratégia, de transferir renda, com avanços nessa estratégia.
Paulo Henrique Amorim – Outra crítica do presidente Fernando Henrique, é uma crítica muito comum entre analistas de tendência conservadora, é dizer que o Bolsa Família eterniza o assistencialismo, não estimula o trabalho – e é uma crítica que se fez também no passado a programas de transferência de renda que havia nos Estado Unidos –, ele vicia o trabalhador, vicia as famílias no subsídio e não estimula a busca do trabalho. Como responder a essa acusação?
Rosani Cunha – Bom, eu te dei o número que eu acho que é bastante expressivo: quase 2 milhões de pessoas saíram do programa já desde a sua origem. Então, a melhor resposta é justamente esse número. O Bolsa Família na verdade trabalha com três perspectivas. Ele trabalha com alívio da pobreza, de maneira imediata e, por isso, transfere renda, e eu acho que ninguém hoje critica essa estratégica, ela garante segurança alimentar nutricional, enfim, está reduzindo a desigualdade, a pobreza, várias instituições de pesquisa, organismos de cooperação multilateral atestam isso. Está bem focalizado. Mas esse é um eixo do programa. O segundo, ele tem perspectiva de médio prazo, pra reduzir pobreza entre as gerações. E é basicamente pelo atendimento em saúde, pela freqüência escolar que nós acompanhamos. Então, só como exemplo, alguns costumam dizer que com o Bolsa Escola a gente acompanhava a freqüência. Com o Bolsa Família, não. Na verdade, com o Bolsa Escola, o máximo que nós tivemos de freqüência acompanhada foi por escola e não por aluno individualmente, chegando a ter 19% das escolas tomando freqüência. Isso já em 2003. Hoje nós acompanhamos individualmente a freqüência com mais de 90% das escolas...
Paulo Henrique Amorim – Vocês acompanham a freqüência de cada aluno?
Rosani Cunha – Individualmente. A gente chega a saber o motivo da não freqüência. Tem criança que não vai à escola por situação de abuso sexual, de violência doméstica, de trabalho infantil. Essas pra gente são famílias de risco e que precisa de estratégias de acompanhamento individual. Mas, enfim, esse é o Bolsa Família na perspectiva de médio prazo, ao investir em redução de pobreza entre gerações. E o terceiro eixo é a sua integração com diferentes políticas pra desenvolver... Nós temos uma série de ações. Temos trabalho com economia solidária, com incubadoras produtivas, temos estratégias de capacitação profissional, geração de trabalho e renda. Eu vou te dar um exemplo: eu estou agora no Ceará e ontem eu visitei algumas cidades aqui no interior do Ceará. É que hoje estamos trabalhando junto com o bloco do Nordeste com microcrédito orientado para famílias do Bolsa Família. Então, é uma experiência, mais do que o microcrédito genericamente, nós estamos organizando grupos de famílias, dando apoio com agentes de crédito, dando assistência técnica, enfim, então, acho que tem aí uma série de políticas que trabalham com essas famílias, mas também, e é preciso admitir, tem famílias que estão numa situação de tal vulnerabilidade, de tal exclusão que elas não vão sair do programa no curto prazo. Tem famílias que nós estamos apoiando as estratégias de alfabetização de adultos. Então, o tempo das famílias são diferentes, ma eu acho que as estratégias do governo são complexas. É preciso coordenar as políticas para chegar até elas, mas estão sendo bastante efetivas.
Paulo Henrique Amorim – O que você já sabe sobre o trabalho do Bolsa Família de 2003 pra cá com relação a três questões. Uma, índices de saúde das pessoas, algum indicador sobre se as crianças estão sendo de fato, efetivamente sendo vacinadas e cuidadas. Outro é a melhoria no rendimento escolar e terceiro no comportamento do índice de Gini, que mede a desigualdade de renda do Brasil. Vocês tem alguma medida disso aí?
Rosani Cunha – Vou responder os três.
Paulo Henrique Amorim – Vamos por partes, como dizia o esquartejador.
Rosani Cunha – Vamos por partes. O primeiro, saúde. Nós temos algumas pesquisas que mostram em especial o impacto do programa pra reduzir desnutrição infantil. E as pesquisas que mostram o impacto pra reduzir a situação de insegurança alimentar de maneira geral, mas eu vou citar uma. Nós tivemos a chamada nutricional com 15 mil crianças no semi-árido o final de 2005. E nós percebemos que as crianças que estão no programa Bolsa Família elas têm três vezes menos desnutrição infantil a partir dos seis meses de idade, que é quando elas começam a deixar o aleitamento materno... três vezes menos desnutrição do que as crianças que não estão no programa. Então, eu vou citar um exemplo: tem estudos que nós fazemos para acompanhar, também temos uma avaliação de redução de internação por desnutrição em crianças também na região Nordeste. Então, enfim, a questão da saúde é basicamente o impacto que o programa tem em relação ao acesso à alimentação e a garantia do direito humano à alimentação adequada. Em relação à escola, eu acho que o principal resultado que temos acompanhado e precisamos aprofundar o estudo sobre ele é a redução da evasão escolar. As crianças que estão no programa, a história delas, assim, das suas famílias, é de deixarem a escola muito cedo. Em média as crianças pobres abandonam a escola de maneira definitiva com 13 anos de idade. Isso tem um impacto na pobreza do país para várias gerações. E nós temos avaliações que mostram que as crianças do programa elas têm evadido menos, elas permanecem mais na escola do que quando não estavam no programa.
Paulo Henrique Amorim – E esse número passou para quanto, Rosani?
Rosani Cunha – Desculpa, eu não te escutei.
Paulo Henrique Amorim – Esse número passou de 13 anos para quantos anos.
Rosani Cunha – Não, eu estou dizendo que as nossas séries históricas elas tendem a deixar a escola a partir dos 13 anos. O que nós estamos começando a observar é que elas permanecem mais na escola, eu não tenho um dado definitivo para te passar, com que idade elas estão saindo para te passar, mas os dados que nós temos a partir da PNAD, com estudos que o IPEA tem feito, nesse caso específico foi com Ricardo Pães de Barros, de começar a perceber uma tendência de permanência das crianças na escola. Também tem uma pesquisa do nosso Ministério com o Cedeplar que também mostra a mesma coisa, que as crianças têm permanecido mais o que acaba também, algumas vezes, fazendo com que aquela criança que antes saiam no início do ano e não saem mais ela foi ser reprovada, então a gente sabe também que é importante articular o atendimento à família, o compromisso da família de manter o seu filho na escola e acompanhar o seu filho com uma educação de qualidade que dê conta de atender as demandas da criança. Então, mas o dado objetivo é que as crianças que nós temos elas estão ficando mais na escola.
Paulo Henrique Amorim – E o chamado Coeficiente de Gini que o professor Ricardo Paes de Barros conhece tão bem?
Rosani Cunha – Acho que Gini acaba sendo o melhor indicador para que a gente possa acompanhar a desigualdade no país.
Paulo Henrique Amorim – Desigualdade da renda.
Rosani Cunha – O que nós estamos vendo é que o país está reduzindo a desigualdade de maneira muito consistente. Todos os anos a PNAD tem mostrado isso, nós percebemos, ainda somos um país muito desigual, eu acho que isso a gente precisa assumir. Mas nós temos reduzido um pouco a cada ano e também o IPEA, que tem sido um grande parceiro nosso, até porque têm vários pesquisadores, alguma independência, eles fizeram uma avaliação de qual contribuição o Bolsa Família deu nessa redução da desigualdade, monitorar os efeitos do Bolsa Família.
Paulo Henrique Amorim – E qual foi?
Rosani Cunha – E eles fizeram a avaliação de que aquela desigualdade, 21% dela a transferência de renda via Bolsa Família, isso é muito expressivo. 21% num programa que tem impacto fiscal de menos de, em torno de 0,3% do PIB. Tanto é que hoje a gente é acompanhado pelo mundo inteiro, vários países têm buscado trabalhar com o Brasil.
Paulo Henrique Amorim – Está muito bom. E esse dado de 21% derivado do programa Bolsa Família é um dado de quando, PNAD de quando?
Rosani Cunha – É a PNAD de 2005. A PNAD de 2006 sai no final desse ano, agora. Então nós esperamos, inclusive, aprofundar esses resultados. Por isso que recompor o valor do benefício é tão importante, ele mantém o poder de compra da família, mantém o acesso ao alimento, mas também é uma forma de que o Brasil continue essa redução da desigualdade porque eu acho que tem que ser compromisso de vários governos, da sociedade como um todo.
Paulo Henrique Amorim – Olha, Rosani, nós vamos aqui no nosso site vamos transformar isso num arquivo de áudio, num arquivo de texto e eu sugiro que depois que você tiver esse arquivo de texto você envie a Fundação Fernando Henrique Cardoso.
Rosani Cunha - ... Bom, eu não quero entrar nessa polêmica.
Paulo Henrique Amorim – Está bom.
Rosani Cunha – acho que...
Paulo Henrique Amorim – Não, não, foi uma provocação de alta intensidade você não precisa comentar.
Rosani Cunha – Eu acho que o Bolsa Família tem que ser apropriado pela sociedade brasileira...
Paulo Henrique Amorim – Todo mundo quer ser pai do Bolsa Família hoje, esse é que é o ponto. O Fernando Henrique, a Dona Ruth, o Cristóvão Buarque, todo mundo quer ser pai no Bolsa Família.
Rosani Cunha – E eu acho que todo mundo contribuiu um pouquinho, mas não tem um pai exclusivo. Na minha terra a gente diz que filho feio não tem pai. Então esse é um filho bonito e a sociedade brasileira tem que se apropriar dele.
FONTE: Conversa Afiada
Abraços,
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