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Primeiros clones primatas
Óvulo cujo núcleo será retirado pela pipeta da direita (Foto: Shoukhrat M. Mitalipov)

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O periódico científico britânico Nature publica hoje eletronicamente artigo de pesquisadores dos Estados Unidos (Oregon, Nebraska e Massachusetts) dando conta da obtenção das primeiras células-tronco embrionárias (CTEs) obtidas de um primata (macacos resos, no caso) por meio de clonagem - no jargão científico, transferência nuclear de célula somática (veja esquema abaixo, com legendas em inglês). Os autores, chefiados por Shoukhrat Mitalipov, da Universidade de Saúde e Ciência de Oregon, concluem que seu trabalho representa "uma prova de princípio para a clonagem terapêutica em primatas", abrindo caminho para que o mesmo seja feito com células humanas.
A idéia da clonagem terapêutica é usar células de um ser humano para criar embriões clonados, dos quais seriam derivadas e cultivadas CTEs. Como estas células podem dar origem a quase todos os tipos de células do corpo, poderiam ser enventualmente usadas em terapias celulares sem causar rejeição no paciente - isso quando a tecnologia estiver disponível, e se estiver.
Mitalipov e seu grupo fizeram o que já se faz rotineiramente com camundongos: retirar o núcleo de óvulos e fundir o gameta feminino desnucleado com células da pele (fibroblastos) e estimular a construção a se dividir, como um embrião natural (produzido pela união de um óvulo com um espermatozóide). Com primatas a coisa não vinha dando muito certo.
A Nature, escaldada pelo escândalo dos supostos clones e CTEs humanos criados por Woo-Suk Hwang na Coréia do Sul, uma fraude publicada no periódico concorrente americano Science, tomou certos cuidados. Pediu confirmação independente de que as CTEs eram mesmo fruto da clonagem, o que foi garantido por David Cram, Bi Song e Alan Trounson, da Universidade Monash, na Austrália.
A eficiência do método de transferência nuclear, no entanto, continua baixíssima. Mitalipov e seus colaboradores repetiram o procedimento com 304 óvulos obtidos de 14 macacas, mas obtiveram somente duas linhagens de CTEs. Uma taxa de sucesso de apenas 0,7%.
A publicação britânica também apresenta, em conexão com o estudo, um comentário assinado por Ian Wilmut (um dos criadores da ovelha Dolly) e Jane Taylor. Eles assinalam que, além do potencial para futuras terapias celulares, ainda incertas, a técnica fornecerá uma ferramenta importante para estudar a genética de doenças hmanas, se puder ser reproduzida com primatas humanos: "Em nossa pressa para usar em terapia células específicas de pacientes, no entanto, tendemos a desconsiderar que elas têm grande valor para a pesquisa básica e a descoberta de fármacos. Por exemplo, tais células podem fornecer novos meios de estudar doenças hereditárias", afirmam.
No Brasil, não seria possível testar o método de Mitalipov com células humanas. A Lei de Biossegurança (nº 11.105/2005) proíbe clonar embriões humanos. Mesmo o uso de embriões produzidos por fertilização in vitro (óvulos e espermatozóides reunidos fora do corpo) e descartados há mais de três anos, autorizado na lei, está sub judice. Depende ainda de um julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a ação direta de inconstitucionalidade (ADI nº 3.510) movida pela Procuradoria Geral da República contra esse uso, que considera - com apoio de grupos católicos conservadores - um atentado à dignidade e à inviolabilidade da vida. O julgamento está previsto para dezembro.
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Arte: Shoukhrat M. Mitalipov
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