Ninguém sabe mais o que é esquerda ou direita

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SickBoy
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Ninguém sabe mais o que é esquerda ou direita

Mensagem por SickBoy »

Gazeta do Povo, 10 de março de 2008



Um dos poucos “independentes” no Senado, Pedro Simon (PMDB-RS) garante que consegue a aprovação de seus projetos de moralização do processo eleitoral na Comissão de Constituição e Justiça. Mas não tem grandes esperanças de que eles vão tramitar com rapidez na Câmara dos Deputados. Para ele, só a discussão do tema já significa uma vitória, um “movimento para mudar”.

Aos 78 anos, o ex-governador gaúcho cumpre o quarto mandato como senador e está pessimista. Diz que só um governo que saia do eixo PT-PSDB pode mudar o panorama da política brasileira. Magoado com o próprio partido, é ácido nas críticas e econômico nos elogios. “Ninguém sabe mais o que é esquerda, direita, o que é linha partidária. O PT está mais à direita que o Fernando Henrique. E o PSDB mais à direita do que era o Sarney”, desabafou, em entrevista exclusiva concedida na última quinta-feira no cafezinho do Senado.

Segundo levantamento da Transparência Brasil, mais de 30% dos parlamentares têm problemas com a Justiça. Isso é culpa do eleitor ou do sistema eleitoral?

É culpa do modelo brasileiro em geral. O Brasil é o país da impunidade. Só ladrão de galinha vai para a prisão. Assim é o jogo. Tem muita gente digna, correta, sendo processada e que vai ser absolvida, mas nunca se chega ao final do processo. E tem muita gente que cometeu delito e que nunca é julgada em definitivo. É o caso do (deputado federal Paulo) Maluf, que está aí há 40 anos na mesma. Corrupção existe em todo o mundo, só que nos outros países a Justiça funciona, o cidadão é condenado ou absolvido. Foi assim na Itália durante a operação “Mãos Limpas”, em que cem parlamentares foram punidos, cassados, presos. No Brasil, o cidadão que tem dinheiro, um bom advogado, é processado, mas consegue se safar. Estamos propondo uma série de tentativas de mudar isso. Entre eles, esse projeto que pede a divulgação dos candidatos que estão sendo processados. O eleitor vai ficar sabendo que o “Pedro Simon” era réu de um processo na Justiça do Rio Grande do Sul, que esse processo subiu para o STF, porque “ele” roubou ou sei-lá-o-quê. É transparência.

Vale para todo e qualquer processo?

Estou falando de coisa que envolve dinheiro público ou quebra de decoro. Para que serve isso? Também para constranger. Se o cidadão é inocente, vai querer que o processo seja resolvido o mais rápido. O que diz a lei brasileira: o cara só não pode ser candidato se tiver sido condenado com sentença passada e julgada. Minha outra proposta é acabar com isso, se o sujeito foi julgado e condenado em segunda instância, não pode se candidatar. Por último, a idéia é que o candidato tenha reputação ilibada. Para ser funcionário público, isso já é exigência. Para eu ser deputado e senador, hoje em dia posso ter a reputação mais vagabunda.

O senhor acredita que esses seus projetos vão para frente?

Eu passo eles na Comissão de Constituição e Justiça. Lá na Câmara eu não sei. Mas acho que é interessante de qualquer jeito criar um movimento para mudar. A credibilidade do Congresso Nacional entre as pessoas era de 1,1% nas penúltimas eleições. Na última, baixou para 0,5%. Nessa situação, paga o bom pelo ruim. Falam do Congresso como se fosse todo mundo a mesma coisa, o que não é verdade.

Qual a radiografia ética que o senhor faz do Congresso Nacional?

Muito ruim. Nunca havíamos passado pelo que estamos passando. Tivemos oito anos de governo do PSDB e agora fecharemos outros oito de PT. Está havendo uma radicalização. A CPI das ONGs não funciona porque o PT quer apurar o que aconteceu no governo Fernando Henrique e o PSDB o que ocorre no governo Lula. É a mesma coisa com a CPI dos Cartões Corporativos. O normal é que se escolhessem relatores e presidente que não fossem nem do PT, nem do PSDB. Tinha que ser alguém neutro nessa questão.

O senhor é um dos senadores mais experientes...

(Interrompendo a pergunta) Será que sou? Estou aqui há 25 anos, participei de várias CPIs e agora meu partido não me bota nelas.

É verdade... Enfim, o senhor se decepcionou com o caminho trilhado pela política brasileira?

Minha primeira mágoa foi há 13 anos, quando assumiu o Fernando Henrique. Eles eram de um movimento puro do PMDB, que não aceitavam (ex-governador de São Paulo Orestes) Quércia e essa turma estranha do partido. Eles tinham o Mário Covas, o José Richa e, no governo, não tiveram nada de social-democracia. Foram um partido de centro-direita, decepcionante. Aí veio o PT, um partido com uma história de lutas fantástica, pregando a transformação da sociedade brasileira. Fizeram pior do que o PSDB. Queira Deus que na próxima eleição não ganhe nenhum dos dois partidos. Que ganhe um mundo novo, uma nova realidade.

Como o senhor percebe a discussão ética entre os congressistas mais novos?

Eles estão vivendo um momento complicado. A tradição da política brasileira era o congressista mais novo sentar, olhar para o lado e aprender. Eu olhava para o Oswaldo Aranha. Até pouco tempo era o Ulysses Guimarães, Franco Montoro. Hoje você olha para o lado e não tem mais esses expoentes. Tenho pena desses novos parlamentares. Eles até podem tentar traçar uma linha, mas ficam perdidos entre 10 e 12 partidos. Ninguém sabe mais o que é esquerda, direita, o que é linha partidária. O PT está mais à direita que o Fernando Henrique. E o PSDB mais à direita do que era o (ex-presidente e atual senador pelo Amapá José) Sarney. Está difícil.

E o PMDB?

É uma colcha de retalhos. Tem de tudo, até o MDB. Eu sou um dos poucos dessa linha.

Quem mais está nessa linha?

O Jarbas Vasconcellos (senador por Pernambuco). Muita gente do Rio Grande do Sul. E o (governador do Paraná, Roberto) Requião.

O senhor vê bons exemplos no geral?

É complicado achar, mas tem gente. O ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias é um deles dentro do governo. Consegue estar acima de todas as coisas. Não é badalado. Todo o prestígio do governo Lula está em cima dele, mas ele não fica se aproveitando. O Lula, por outro lado, aproveita. É um exemplo de sujeito que merece respeito.

E no Congresso?

Tem gente boa, muita, mas eu prefiro nem citar. Não tem um Mário Covas, um Ulysses, um Montoro. Dentro do PMDB, por exemplo. O pessoal bom não tem poder. Ele está com outros, com o Sarney, que está no PMDB mas nunca foi MDB. Está com o Renan (Calheiros), com o Jáder (Barbalho). Nosso atual líder é lá de Rondônia (Valdir Raupp) ou não sei de onde. Eles não têm nenhuma representação, é um grupo que se adonou, pegaram o partido.

O senhor disse que o ideal para o país seria o surgimento de uma terceira força, além de PT e PSDB. Há essa perspectiva?

O Brasil vive um momento delicado. Não é bom para o país que o próximo presidente seja de São Paulo. Se for, são mais oito anos, que somam 24 anos, um quarto de século. O Brasil não vai gostar disso. O pingue-pongue PT–PSDB está no auge. Se ficar trocando sempre, não sei também como é que termina. O Lula até fala em uma candidatura tipo (ministro da Defesa, Nelson) Jobim, tipo o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, saindo do PSDB para o PMDB. É uma saída interessante. Só não sei até que ponto o Lula é sincero e tem condições de fazer isso. No fundo, no fundo, essa gente do PT quer mesmo um terceiro mandato. Vai ser ruim para ele mesmo. O Lula de agora mal e mal consegue caminhar por causa da popularidade. Com um terceiro mandato, vai se considerar um super-herói.

O Aécio pode então ser a melhor opção, desde que fora do PSDB?

Sim. Mas o Jobim é um outro nome que está indo bem.

O senhor tem bastante proximidade com o governador Roberto Requião...

(Interrompendo) Gosto muito dele, quero ele muito bem e acho um grande governador. O que eu acho é que ele fala demais. Poderia falar bem menos... Mas que ele trabalha bem, trabalha.

Ele seria um bom candidato a presidente?

Seria um baita candidato. Se ele falasse menos. O governo dele é muito bom. A Escolinha que ele fez, ao contrário do que possam imaginar, é de uma grandeza sensacional. Estão copiando lá no Rio Grande do Sul. Só que as pessoas em geral fazem muitas restrições a ele.

Trancado