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QUESTÃO DE CRISTOLOGIA II

Enviado: 30 Abr 2008, 19:46
por Apo
CONHECIMENTO HUMANO DE JESUS

1. O problema do conhecimento e do desconhecimento

Que tipo de conhecimento humano teve Jesus? Conhecimento perfeito ou conhecimento limitado?

Ao estudar o conhecimento humano de Jesus, tenha-se em mente dois poutos: trata-se do conhecimento do Filho de Deus, mas, por outro lado, o Verbo encarnado, pela quenose, não gozou, durante os dias terrenos, da "perfeição" (teleiòsis) (cf. Hb. 5,9), que assumiu ressuscitando. Mercê de sua identidade pessoal de Filho de Deus, algumas perfeições Jesus teve, sem dúvida.Não se esqueça, porém, de que ele manteve, pela quenose, a natureza humana como tal, carregando em sua existência humana imperfeições voluntariamente assumidas.(?)

Hipostaticamente unidas, as duas naturezas não se fundem. A natureza humana conserva-se integralmente. Com isso, as perfeições da natureza divina, no caso o conhecimento divino, não são comunicadas, diretamente, à natureza humana. Mas como as duas naturezas também não estão separadas uma da outra, o conhecimento de Jesus é o conhecimento do Filho de Deus. Em suma, as perfeições do conhecimento de Jesus não devem ser exageradas nem diminuídas, sem mais. Além disso, o estado quenótico da existência humana de Jesus deixa perceber que a glória divina (doxa) permanece recolhida em sua vida terrena, até a hora de sua glorificação. Deixa perceber também que o Verbo, tendo assumido plenamente a condição concreta do gênero humano, com exceção do pecado (cf. Hb. 4,15), participa de nossa situação, marcada por sofrimentos e até pela morte. Livremente, ele assumiu as seqüelas compatíveis do pecado, transformando-as em instrumento de salvação.

Evidencia-se, pois, que não tem base o "princípio absoluto de perfeições", tantas vezes aplicado à humanidade de Jesus, especialmente a seu conhecimento humano.

As perfeições humanas de Jesus são proporcionais a seu estado querótico e se prendem à sua missão. E é bom lembrar que a diferença entre o estado querótico de Jesus e seu estado glorioso reside numa transformação real. Só na ressurreição estará ele inteiramente de posse de seu poder messiânico e salvador. E quanto à sua missão, Jesus, em sua vida terrena, tinha as perfeições e os conhecimentos humanos necessários para cumpri-la.

Para ver como a tradição apostólica entendeu a humanidade de Jesus, é essencial retomar os evangelhos. Na realidade eles não testemunham só as perfeições surpreendentes do homem Jesus, mas também suas limitações: certos desconhecimentos, a tentação, a agonia no horto, o grito na cruz... constituem lances tanto mais confiáveis quanto mais dificuldades poderiam suscitar à fé em Jesus Cristo, fé que a tradição evangélica visava transmitir.

No fundo, a psicologia humana do Verbo encarnado na quenose constitui enorme mistério. Como juntar e conciliar nela elementos que parecem se contrapor e se anular um ao outro? Como afirmar, ao mesmo tempo, a ausência de pecado e a tentação real, a visão de Deus e o sentir-se por ele abandonado na cruz, a obediência à vontade do Pai em sua morte e a liberdade de sua autoentrega? Nisso tudo, são vãs e despropositadas as deduções apriorísticas. O necessário é não perder de vista a história de Jesus e de sua missão. De um lado, ele deve revelar o Pai (Jo 1,18); do outro, deve sofrer para a salvação da humanidade (Lc. 24,26).

Quanto aos conhecimentos de Jesus, a tradição evangélica relata sua extraordinária perfeição. Ele fala do Pai como alguém que o está vendo (Jo 1,18). Sua sabedoria espanta já aos doze anos, no Templo (Lc. 2,40). O povo fica estupefato com sua doutrina (Mt. 7,28), ele ensina com autoridade pessoal e única (Mc. 1,22). Revela maravilhosa intimidade com as Escrituras, sem tê-las estudado formalmente (Jo 7,15). Conhece os segredos dos corações (Lc. 6,8). Prediz o futuro, embora se deva tratar com cautela da predição de sua morte e ressurreição.

Na síntese de João, Jesus conhecia tudo (Jo 16,30); e Lucas afirma que o menino Jesus era "cheio de sabedoria" (2,40). Por outro lado, contudo, a tradição evangélica atesta que Jesus ganhou experiência e "crescia em sabedoria" (Lc. 2,52). Também saboreava surpresas, fazia perguntas e chegou a admitir desconhecimentos (Mt. 24,36; Mc. 13,32).

Convencidos da falência das deduções apriorísticas, classificadas de "míticas" por K. Rahner; deveríamos buscar na tradição evangélica o rumo para uma teologia do conhecimento humano de Jesus. Por certo, algumas perfeiçães hão de ser reconhecidas nele. Certamente, sabia de sua identidade pessoal de Filho de Deus e deve ter tido especial conhecimento do Pai para revelá-lo. Mas que conhecimento foi esse?

Nem se pode negar, a priori, os limites do saber de Jesus, evidentes nos Evangelhos, como alguns desconhecimentos e dúvidas, o seu progresso e suas limitações.

Partindo do "princípio absoluto das perfeições", a teologia divisou em Jesus três espécies de conhecimento humano perfeito e universal: a visão beatifica dos bem-aventurados no céu, o conhecimento infuso (angélico) e o saber da experiência. Jesus, como homem, sabia tudo de três maneiras diferentes!

Contra tal idealização "mítica", deve-se objetar, primeiro, que é absurdo atribuir a Jesus a visão dos bem-aventurados se, durante a vida terrena, ele ainda não atingira o "fim" de sua caminhada, mas a estava percorrendo. Em segundo lugar, o Verbo de Deus fez-se homem, não anjo (Hb. 2,16). E, por último, é uma contradição terminológica um conhecimento total gerado pela experiência.

De resto, se Jesus tivesse gozado da visão beatifica durante a vida inteira, como poderíamos falar do mistério de seu sofrimento e agonia? Distinguir em seu íntimo de homem "níveis" diferentes e afirmar "o ápice" no gozo da visão beatifica, enquanto "o plano mais baixo" ficava sujeito à dor, significa dotar Jesus de uma "psicologia artificial de diversos planos" que, no final das contas, não explica nada, já que a visão beatifica invade, essencialmeute, toda a psicologia humana da pessoa.

Qual a diretriz, no dogma cristológico, para solucionar o problema da psicologia humana de Jesus? Se o 3º Concílio de Constantinopla apontou, expressamente, "duas vontades naturais e duas operações naturais" em Cristo, nenhum concílio cristológico sentenciou algo parecido em termos de conhecimento duplo: o divino e o humano. Mas a presença em Jesus de um conhecimento humano faz parte da doutrina de fé, porque decorrente da integridade da natureza humana. Aplica-se aqui também o princípio fixado, primeiramente, pela "Tomus" de São Leão e depois retomado pelo 3º Concílio de Constantinopla: "Cada natureza realiza em comunhão com a outra o que lhe é próprio, ou seja, o Verbo opera o que é do Verbo e a carne o que é da carne".

Neste século, no contexto do modernismo, um decreto do Santo Ofício, em 1918, declarou que não se pode afirmar com segurança (tuto) que não há nenhuma prova evidente (non constat) de que a alma de Jesus, em sua vida terrestre, tenha tido a visão beatífica dos eleitos (comprehensores). Esse decreto disciplinar visava à catequese pública. Não pretendia pôr fim ao debate entre os estudiosos da Cristologia. Antes, tencionava atribuir a Jesus uma visão "imediata" do Pai, distinta da visão beatifica dos bem-aventurados. O que importava era o modo pelo qual Jesus conhecia o Pai e não os efeitos que acompanham a visão dos bem-aventurados que atingiram o fim da jornada terrena e, com isso, a fruição definitiva de Deus.

A mesma interpretação vale também para a encíclica Mystici Corporis, de 1943, em que se confere a Jesus a "visão beatífica" (visio beata) também em sua existência terrena.

2. Por uma solução do problema

...segue.


Jacques Dupuis
"Introdução à Cristologia" - ed. Loyola - pp. 162 - 175

Re: QUESTÃO DE CRISTOLOGIA II

Enviado: 01 Mai 2008, 16:05
por Fernando Silva
Aaaarghh!
Tantas palavras vazias para discutir se alguém que não sabemos se existiu estava mais ou menos ligado a uma entidade espiritual que muito menos ainda sabemos se existe. E que era ele mas, ao mesmo tempo, também não era ele.