Muhammad Yunus e as empresas sociais
Enviado: 28 Jun 2008, 12:28
Ontem eu assisti a uma entrevista de Muhammad Yunus (Prêmio Nobel da Paz) sobre os negócios sociais que ele implementou, do mais famoso que é o sistema de microcrédito a outos como:
- um iogurte rico em nutrientes para combater a desnutrição em Bangladesh
- água mineral acessível para os moradores de Bangladesh, já que água de lá é contaminada por arsênico.
E outras...
Esta espécie de empresa tem o objetivo de crescer e resolver problemas sociais SEM precisar de doações de terceiros ou subsídio do governo, Yunus criou negócios que tentassem minimizar problemas sociais e, ao menos em Bangladesh, foi bem sucedido.
Segue uma outra entrevista com Yunus:
10 Perguntas para Muhammad Yunus
26.02.2008
"Empreender é parte da natureza humana"
O EMPREENDEDOR DOS POBRES
Yunus com moradores de Daca, em Bangladesh, em 2006. depois do Grameen Bank, ele criou outros negócios voltados para a população carente
Muhammad Yunus é um economista com idéias pouco convencionais. Nascido em Bangladesh e com Ph.D. pela Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos, defende que o acesso ao crédito deveria ser um direito universal do ser humano. Defende, também, que toda pessoa é empreendedora por natureza. A visão de que o empreendedorismo, e não a caridade, é a solução para a pobreza emergiu depois que Yunus decidiu, em meados dos anos 70, emprestar US$ 27 tirados do próprio bolso a 42 cidadãos pobres que viviam nas redondezas da Universidade de Chittagong, onde lecionava, em sua cidade natal. Ele não só recebeu seu dinheiro de volta como percebeu que os empréstimos melhoraram a vida daquelas pessoas. Com base na experiência, tentou convencer bancos tradicionais a emprestar dinheiro à população pobre de Bangladesh. Não conseguiu. Em 1983, criou o Grameen Bank - segundo sua própria definição, um banco para os pobres.
O Grameen Bank tem hoje 7,5 milhões de clientes em mais de 70 mil vilas em Bangladesh, sendo 97% mulheres, que usam o dinheiro para tocar pequenos empreendimentos. Os empréstimos são feitos sem garantias e a taxa de inadimplência não chega a 2%. A instituição já emprestou mais de US$ 6 bilhões e, atualmente, é mantida principalmente graças aos depósitos de seus clientes. Em 2006, Yunus e o Grameen Bank receberam o Prêmio Nobel da Paz, ampliando a visibilidade dos programas de microcrédito. Segundo ele, 64% das pessoas que tomam empréstimos no banco há cinco anos ou mais ultrapassaram a linha da pobreza. (Para deixar de compor o grupo dos pobres uma família precisa ter, entre outras coisas, uma casa com telhado, água potável e roupas de inverno.)
Desde 2006, Yunus coloca em prática outra idéia pouco convencional: a de que é possível criar "empresas sociais" em parceria com o setor privado. O modelo está sendo testado pelo Grameen Bank com a Danone. As duas organizações pretendem construir 50 fábricas de iogurte enriquecido com minerais em Bangladesh, com o objetivo de combater a desnutrição infantil. A primeira está pronta. Todo o lucro será usado para expandir o negócio - tanto o Grameen quanto a Danone concordaram em não retirar nenhum dividendo além do necessário para recuperar o capital investido. "Vamos criar também uma cadeia de hospitais oftalmológicos, no modelo de empresa social", disse Yunus a Época NEGÓCIOS, semanas antes de uma viagem ao Brasil para participar do Fórum Internacional de Energias Renováveis e Sustentabilidade, em Florianópolis, em novembro. Para esta entrevista especial, convidamos personalidades da economia e dos negócios para formular perguntas ao Prêmio Nobel da Paz 2006.
1 » A iniciativa privada pode ajudar no combate à fome e à desigualdade social no mundo? Se sim, de que maneira? Gustavo Valle, presidente da Danone no Brasil
O sistema de livre mercado, ou economia capitalista, contém um erro básico. Dentro da estrutura teórica da economia capitalista existe apenas um tipo de negócio - o negócio cujo objetivo é o lucro. Não há espaço para outros tipos de empreendimento. Por isso, as pessoas envolvidas nesse universo centram seus esforços em conseguir o maior lucro possível. Trata-se de uma interpretação completamente equivocada sobre o ser humano - ele é muito mais do que uma máquina de fazer dinheiro. Tem desejo profundo de fazer o bem aos outros e à sociedade, e isso não faz parte da teoria do capitalismo. Para conter todos os desejos do homem, seria necessário criar um novo tipo de negócio, com o objetivo de ajudar os outros sem esperar tirar nenhum proveito pessoal disso. A empresa social é esse novo tipo de negócio. Nela, o lucro é reinvestido de forma a aumentar seu alcance e a melhorar a qualidade do produto ou serviço oferecido. Os investidores do setor social podem obter de volta a quantia investida, mas não devem tirar dividendos. A empresa social é uma organização sem perdas e sem dividendos.
2 » O que o motivou a criar o Grameen Bank? Época NEGÓCIOS
Eu percebia que as coisas ao meu redor não funcionavam. Nada funciona em Bangladesh. Há pobreza extrema, há fome. Sentia também que não poderia me esconder atrás da teoria econômica tradicional. Se pudesse mudar a vida de uma pessoa apenas, ainda que fosse apenas por um dia, já ficaria muito feliz. Comecei a emprestar dinheiro para os pobres que viviam na região da universidade. Descobri que, apesar da oposição dos bancos tradicionais, esse sistema funcionava. Para garantir sua continuidade, decidi que deveríamos criar um banco. Consegui a licença e criei um banco para os pobres, no qual eles são também os donos do negócio. A motivação veio daí - de ver o que acontecia com as pessoas e de perceber que aquilo dava certo.
3 » De lá para cá, muitos outros negócios - em setores como telecomunicações e energia - foram criados. Como isso aconteceu? Época NEGÓCIOS
Esses negócios surgiram do mesmo interesse. A tecnologia da informação, por exemplo, me interessava muito, porque eu imaginava que ela poderia mudar a vida dos pobres. Criei uma empresa provedora de serviços de internet como um primeiro passo na tentativa de levar a eles tecnologia da informação. É hoje uma das maiores companhias de seu setor. Mais tarde, quando o governo de Bangladesh estava distribuindo licenças para novas empresas de telefonia celular, conseguimos uma e criamos a Grameen Phone. Atualmente é a maior empresa de telefonia de Bangladesh, com mais de 16 milhões de assinantes, e é também o maior pagador de impostos do país. A Grameen Phone é uma empresa com fins lucrativos. Eu a criei, mas não sou o dono dela. Suas ações são reservadas para as mulheres pobres de Bangladesh. Como elas são as donas do Grameen Bank, estamos fazendo de maneira a que possam ser também as proprietárias da Grameen Phone. Além disso, temos uma empresa de energia solar chamada Grameen Shakti. Há dois meses, atingimos o marco de 100 mil sistemas de energia solar instalados em casas de Bangladesh. Há ainda muitas outras empresas em atividade, como a Grameen Fisheries e a Grameen Agriculture. No total, são mais de 2 mil companhias. Muitas, como a Grameen Shakti, não têm fins lucrativos. São negócios sociais. Outras, como a Grameen Phone, têm fins lucrativos, porque muitas vezes há parceiros envolvidos e eles preferem que seja dessa maneira. Mas, mesmo nesses casos, eu não sou o dono. As ações são sempre de alguma organização sem fins lucrativos do grupo Grameen. Nosso interesse principal não é ganhar dinheiro, é ajudar as pessoas.
4 » Em que medida a "bancarização" dos mais pobres modifica o comportamento dessas pessoas e acende sua esperança de sucesso numa economia controlada pelos mercados, competitiva e eficiente, mas vista como injusta? Antônio Delfim Netto, ex-ministro e economista
Acreditamos que o microcrédito dá dignidade a quem o recebe. Mulheres que nunca administraram dinheiro antes se transformam em empreendedoras confiantes. O impacto na imagem delas, dentro da própria família e da comunidade onde vivem, é positivo.
5 » Por que a preferência em emprestar dinheiro para mulheres? Época NEGÓCIOS
Eu era contra os bancos convencionais. Considerava-os injustos, porque eles não emprestam dinheiro para os pobres nem para as mulheres. Nesses bancos, elas representam menos de 1% dos tomadores de empréstimos. Quando comecei, decidi que 50% dos empréstimos seriam dados a mulheres. Levamos seis anos para atingir essa meta. Começamos a observar o que acontecia e percebemos que, quando o empréstimo era dado às mulheres, os benefícios para as famílias eram muito maiores. Por isso decidimos nos concentrar no público feminino. Hoje, dos 7,5 milhões de clientes do Grameen Bank em Bangladesh, 97% são mulheres.
6 » Recentemente, a revista inglesa The Economist publicou uma reportagem dizendo que há duas questões relevantes para ampliarmos a inclusão social: educação e crédito.Como essas duas questões podem ser conjugadas na agenda econômica e qual o equilíbrio entre elas? Fabio Barbosa, presidente do Banco Real
Educação e crédito não são conceitos excludentes. O acesso ao crédito permite que as famílias tenham acesso a outros serviços essenciais, como educação e saúde. Por isso, minha proposta era transformar o crédito em um dos direitos do homem, uma vez que isso ajudaria a garantir mais facilmente os outros direitos. Se uma pessoa consegue gerar renda, consegue também garantir a comida e a moradia. Além disso, aumentar o acesso à renda, especialmente para mulheres, aumenta o bem-estar da família como um todo. O resultado disso é que as crianças passam a freqüentar a escola. Assim, a segunda geração é içada para fora do ciclo da pobreza.
Há muitos anos o Grameen Bank vem sendo objeto de estudos. Livros foram escritos sobre esse projeto. E todos chegaram à conclusão de que o nível de renda está aumentando, criando oportunidades e capacitação. Isso tira as pessoas da pobreza. Um estudo do Banco Mundial mostrou que 5% das pessoas que tomam empréstimo do Grameen superam a linha da pobreza a cada ano. Isso significa que, a cada dia e a cada semana, mais famílias atingem essa meta. Nossas pesquisas internas dão conta que 64% dos devedores do nosso banco, dentre aqueles que estão conosco há cinco anos ou mais, deixaram de ser pobres em 2006. As estatísticas e os resultados do microcrédito mostram que o modelo funciona.
7 » Quais são as condições necessárias para que esse modelo possa ser replicado em grande escala e em diferentes culturas? Roberto Salas, presidente da Amanco
Os programas de microcrédito funcionam em toda parte. Isso ocorre porque, em qualquer lugar, a população mais pobre encontra dificuldade em ter acesso a financiamentos cujas regras sejam razoáveis. Para que os programas funcionem com eficácia, é preciso criar um ambiente que permita a existência do microcrédito. Isso significa estabelecer uma estrutura reguladora e jurídica adequada, assim como mecanismos acertados de financiamento. Da mesma forma que Bangladesh, vários países colocaram em prática essa estrutura jurídica que facilita o microcrédito. O resultado é que essa idéia está prosperando. Em alguns países, as organizações de microcrédito não conseguem garantir uma quantidade suficiente de depósitos, e isso as impede de se auto-sustentar. Os intermediários financeiros devem ter a liberdade de determinar os juros sobre empréstimos e depósitos, de forma a ter um "spread" que os permita operar de maneira sustentável.
8 » No livro Presença, Peter Senge afirma: "A idéia de visão se popularizou em anos recentes, porém, seu significado essencial muitas vezes se perdeu. Visões não são sentimentos elevados ou frases inspiradoras, são ferramentas práticas. No sentido mais singelo, uma visão é simplesmente a imagem daquilo que tencionamos criar". Qual é sua visão e que papel as empresas e as lideranças podem exercer para concretizá-la? Luiz Ernesto Gemignani, presidente da Promon
Eu gostaria de convencer os jovens e os empreendedores de todo o mundo a serem empreendedores sociais inovadores, a extrair sua motivação empreendedora mais da contribuição que podem dar para resolver os problemas da humanidade do que simplesmente do objetivo de maximizar lucros. E estou certo que empresas que fazem isso podem se sair melhor do ponto de vista financeiro, porque estimulam um tipo de motivação mais saudável entre seus funcionários.
9 » O senhor já disse que todas as pessoas são empreendedoras, mas muitas nunca descobrem esse talento. Por quê? Época NEGÓCIOS
O empreendedorismo é parte da natureza humana. Foi graças a ele que a vida humana evoluiu neste planeta. O problema é que criamos uma sociedade que não enfatiza essa qualidade. Quando vão à escola, os alunos aprendem que devem estudar para conseguir um emprego no futuro. Não aprendem que podem explorar suas potencialidades para criar novos negócios e empregos para outros. O empreendedorismo precisa de um ambiente favorável para que possa florescer. Quando começamos a emprestar dinheiro para as mulheres em Bangladesh, elas não sabiam o que fazer com ele. Hoje elas se tornaram empreendedoras.
10 » Que lições as empresas sociais podem dar às empresas tradicionais? Época NEGÓCIOS
As empresas sociais mostram que é possível fazer negócios com objetivos sociais. Essa é a lição
- um iogurte rico em nutrientes para combater a desnutrição em Bangladesh
- água mineral acessível para os moradores de Bangladesh, já que água de lá é contaminada por arsênico.
E outras...
Esta espécie de empresa tem o objetivo de crescer e resolver problemas sociais SEM precisar de doações de terceiros ou subsídio do governo, Yunus criou negócios que tentassem minimizar problemas sociais e, ao menos em Bangladesh, foi bem sucedido.
Segue uma outra entrevista com Yunus:
10 Perguntas para Muhammad Yunus
26.02.2008
"Empreender é parte da natureza humana"
O EMPREENDEDOR DOS POBRES
Yunus com moradores de Daca, em Bangladesh, em 2006. depois do Grameen Bank, ele criou outros negócios voltados para a população carente
Muhammad Yunus é um economista com idéias pouco convencionais. Nascido em Bangladesh e com Ph.D. pela Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos, defende que o acesso ao crédito deveria ser um direito universal do ser humano. Defende, também, que toda pessoa é empreendedora por natureza. A visão de que o empreendedorismo, e não a caridade, é a solução para a pobreza emergiu depois que Yunus decidiu, em meados dos anos 70, emprestar US$ 27 tirados do próprio bolso a 42 cidadãos pobres que viviam nas redondezas da Universidade de Chittagong, onde lecionava, em sua cidade natal. Ele não só recebeu seu dinheiro de volta como percebeu que os empréstimos melhoraram a vida daquelas pessoas. Com base na experiência, tentou convencer bancos tradicionais a emprestar dinheiro à população pobre de Bangladesh. Não conseguiu. Em 1983, criou o Grameen Bank - segundo sua própria definição, um banco para os pobres.
O Grameen Bank tem hoje 7,5 milhões de clientes em mais de 70 mil vilas em Bangladesh, sendo 97% mulheres, que usam o dinheiro para tocar pequenos empreendimentos. Os empréstimos são feitos sem garantias e a taxa de inadimplência não chega a 2%. A instituição já emprestou mais de US$ 6 bilhões e, atualmente, é mantida principalmente graças aos depósitos de seus clientes. Em 2006, Yunus e o Grameen Bank receberam o Prêmio Nobel da Paz, ampliando a visibilidade dos programas de microcrédito. Segundo ele, 64% das pessoas que tomam empréstimos no banco há cinco anos ou mais ultrapassaram a linha da pobreza. (Para deixar de compor o grupo dos pobres uma família precisa ter, entre outras coisas, uma casa com telhado, água potável e roupas de inverno.)
Desde 2006, Yunus coloca em prática outra idéia pouco convencional: a de que é possível criar "empresas sociais" em parceria com o setor privado. O modelo está sendo testado pelo Grameen Bank com a Danone. As duas organizações pretendem construir 50 fábricas de iogurte enriquecido com minerais em Bangladesh, com o objetivo de combater a desnutrição infantil. A primeira está pronta. Todo o lucro será usado para expandir o negócio - tanto o Grameen quanto a Danone concordaram em não retirar nenhum dividendo além do necessário para recuperar o capital investido. "Vamos criar também uma cadeia de hospitais oftalmológicos, no modelo de empresa social", disse Yunus a Época NEGÓCIOS, semanas antes de uma viagem ao Brasil para participar do Fórum Internacional de Energias Renováveis e Sustentabilidade, em Florianópolis, em novembro. Para esta entrevista especial, convidamos personalidades da economia e dos negócios para formular perguntas ao Prêmio Nobel da Paz 2006.
1 » A iniciativa privada pode ajudar no combate à fome e à desigualdade social no mundo? Se sim, de que maneira? Gustavo Valle, presidente da Danone no Brasil
O sistema de livre mercado, ou economia capitalista, contém um erro básico. Dentro da estrutura teórica da economia capitalista existe apenas um tipo de negócio - o negócio cujo objetivo é o lucro. Não há espaço para outros tipos de empreendimento. Por isso, as pessoas envolvidas nesse universo centram seus esforços em conseguir o maior lucro possível. Trata-se de uma interpretação completamente equivocada sobre o ser humano - ele é muito mais do que uma máquina de fazer dinheiro. Tem desejo profundo de fazer o bem aos outros e à sociedade, e isso não faz parte da teoria do capitalismo. Para conter todos os desejos do homem, seria necessário criar um novo tipo de negócio, com o objetivo de ajudar os outros sem esperar tirar nenhum proveito pessoal disso. A empresa social é esse novo tipo de negócio. Nela, o lucro é reinvestido de forma a aumentar seu alcance e a melhorar a qualidade do produto ou serviço oferecido. Os investidores do setor social podem obter de volta a quantia investida, mas não devem tirar dividendos. A empresa social é uma organização sem perdas e sem dividendos.
2 » O que o motivou a criar o Grameen Bank? Época NEGÓCIOS
Eu percebia que as coisas ao meu redor não funcionavam. Nada funciona em Bangladesh. Há pobreza extrema, há fome. Sentia também que não poderia me esconder atrás da teoria econômica tradicional. Se pudesse mudar a vida de uma pessoa apenas, ainda que fosse apenas por um dia, já ficaria muito feliz. Comecei a emprestar dinheiro para os pobres que viviam na região da universidade. Descobri que, apesar da oposição dos bancos tradicionais, esse sistema funcionava. Para garantir sua continuidade, decidi que deveríamos criar um banco. Consegui a licença e criei um banco para os pobres, no qual eles são também os donos do negócio. A motivação veio daí - de ver o que acontecia com as pessoas e de perceber que aquilo dava certo.
3 » De lá para cá, muitos outros negócios - em setores como telecomunicações e energia - foram criados. Como isso aconteceu? Época NEGÓCIOS
Esses negócios surgiram do mesmo interesse. A tecnologia da informação, por exemplo, me interessava muito, porque eu imaginava que ela poderia mudar a vida dos pobres. Criei uma empresa provedora de serviços de internet como um primeiro passo na tentativa de levar a eles tecnologia da informação. É hoje uma das maiores companhias de seu setor. Mais tarde, quando o governo de Bangladesh estava distribuindo licenças para novas empresas de telefonia celular, conseguimos uma e criamos a Grameen Phone. Atualmente é a maior empresa de telefonia de Bangladesh, com mais de 16 milhões de assinantes, e é também o maior pagador de impostos do país. A Grameen Phone é uma empresa com fins lucrativos. Eu a criei, mas não sou o dono dela. Suas ações são reservadas para as mulheres pobres de Bangladesh. Como elas são as donas do Grameen Bank, estamos fazendo de maneira a que possam ser também as proprietárias da Grameen Phone. Além disso, temos uma empresa de energia solar chamada Grameen Shakti. Há dois meses, atingimos o marco de 100 mil sistemas de energia solar instalados em casas de Bangladesh. Há ainda muitas outras empresas em atividade, como a Grameen Fisheries e a Grameen Agriculture. No total, são mais de 2 mil companhias. Muitas, como a Grameen Shakti, não têm fins lucrativos. São negócios sociais. Outras, como a Grameen Phone, têm fins lucrativos, porque muitas vezes há parceiros envolvidos e eles preferem que seja dessa maneira. Mas, mesmo nesses casos, eu não sou o dono. As ações são sempre de alguma organização sem fins lucrativos do grupo Grameen. Nosso interesse principal não é ganhar dinheiro, é ajudar as pessoas.
4 » Em que medida a "bancarização" dos mais pobres modifica o comportamento dessas pessoas e acende sua esperança de sucesso numa economia controlada pelos mercados, competitiva e eficiente, mas vista como injusta? Antônio Delfim Netto, ex-ministro e economista
Acreditamos que o microcrédito dá dignidade a quem o recebe. Mulheres que nunca administraram dinheiro antes se transformam em empreendedoras confiantes. O impacto na imagem delas, dentro da própria família e da comunidade onde vivem, é positivo.
5 » Por que a preferência em emprestar dinheiro para mulheres? Época NEGÓCIOS
Eu era contra os bancos convencionais. Considerava-os injustos, porque eles não emprestam dinheiro para os pobres nem para as mulheres. Nesses bancos, elas representam menos de 1% dos tomadores de empréstimos. Quando comecei, decidi que 50% dos empréstimos seriam dados a mulheres. Levamos seis anos para atingir essa meta. Começamos a observar o que acontecia e percebemos que, quando o empréstimo era dado às mulheres, os benefícios para as famílias eram muito maiores. Por isso decidimos nos concentrar no público feminino. Hoje, dos 7,5 milhões de clientes do Grameen Bank em Bangladesh, 97% são mulheres.
6 » Recentemente, a revista inglesa The Economist publicou uma reportagem dizendo que há duas questões relevantes para ampliarmos a inclusão social: educação e crédito.Como essas duas questões podem ser conjugadas na agenda econômica e qual o equilíbrio entre elas? Fabio Barbosa, presidente do Banco Real
Educação e crédito não são conceitos excludentes. O acesso ao crédito permite que as famílias tenham acesso a outros serviços essenciais, como educação e saúde. Por isso, minha proposta era transformar o crédito em um dos direitos do homem, uma vez que isso ajudaria a garantir mais facilmente os outros direitos. Se uma pessoa consegue gerar renda, consegue também garantir a comida e a moradia. Além disso, aumentar o acesso à renda, especialmente para mulheres, aumenta o bem-estar da família como um todo. O resultado disso é que as crianças passam a freqüentar a escola. Assim, a segunda geração é içada para fora do ciclo da pobreza.
Há muitos anos o Grameen Bank vem sendo objeto de estudos. Livros foram escritos sobre esse projeto. E todos chegaram à conclusão de que o nível de renda está aumentando, criando oportunidades e capacitação. Isso tira as pessoas da pobreza. Um estudo do Banco Mundial mostrou que 5% das pessoas que tomam empréstimo do Grameen superam a linha da pobreza a cada ano. Isso significa que, a cada dia e a cada semana, mais famílias atingem essa meta. Nossas pesquisas internas dão conta que 64% dos devedores do nosso banco, dentre aqueles que estão conosco há cinco anos ou mais, deixaram de ser pobres em 2006. As estatísticas e os resultados do microcrédito mostram que o modelo funciona.
7 » Quais são as condições necessárias para que esse modelo possa ser replicado em grande escala e em diferentes culturas? Roberto Salas, presidente da Amanco
Os programas de microcrédito funcionam em toda parte. Isso ocorre porque, em qualquer lugar, a população mais pobre encontra dificuldade em ter acesso a financiamentos cujas regras sejam razoáveis. Para que os programas funcionem com eficácia, é preciso criar um ambiente que permita a existência do microcrédito. Isso significa estabelecer uma estrutura reguladora e jurídica adequada, assim como mecanismos acertados de financiamento. Da mesma forma que Bangladesh, vários países colocaram em prática essa estrutura jurídica que facilita o microcrédito. O resultado é que essa idéia está prosperando. Em alguns países, as organizações de microcrédito não conseguem garantir uma quantidade suficiente de depósitos, e isso as impede de se auto-sustentar. Os intermediários financeiros devem ter a liberdade de determinar os juros sobre empréstimos e depósitos, de forma a ter um "spread" que os permita operar de maneira sustentável.
8 » No livro Presença, Peter Senge afirma: "A idéia de visão se popularizou em anos recentes, porém, seu significado essencial muitas vezes se perdeu. Visões não são sentimentos elevados ou frases inspiradoras, são ferramentas práticas. No sentido mais singelo, uma visão é simplesmente a imagem daquilo que tencionamos criar". Qual é sua visão e que papel as empresas e as lideranças podem exercer para concretizá-la? Luiz Ernesto Gemignani, presidente da Promon
Eu gostaria de convencer os jovens e os empreendedores de todo o mundo a serem empreendedores sociais inovadores, a extrair sua motivação empreendedora mais da contribuição que podem dar para resolver os problemas da humanidade do que simplesmente do objetivo de maximizar lucros. E estou certo que empresas que fazem isso podem se sair melhor do ponto de vista financeiro, porque estimulam um tipo de motivação mais saudável entre seus funcionários.
9 » O senhor já disse que todas as pessoas são empreendedoras, mas muitas nunca descobrem esse talento. Por quê? Época NEGÓCIOS
O empreendedorismo é parte da natureza humana. Foi graças a ele que a vida humana evoluiu neste planeta. O problema é que criamos uma sociedade que não enfatiza essa qualidade. Quando vão à escola, os alunos aprendem que devem estudar para conseguir um emprego no futuro. Não aprendem que podem explorar suas potencialidades para criar novos negócios e empregos para outros. O empreendedorismo precisa de um ambiente favorável para que possa florescer. Quando começamos a emprestar dinheiro para as mulheres em Bangladesh, elas não sabiam o que fazer com ele. Hoje elas se tornaram empreendedoras.
10 » Que lições as empresas sociais podem dar às empresas tradicionais? Época NEGÓCIOS
As empresas sociais mostram que é possível fazer negócios com objetivos sociais. Essa é a lição