Inteligencia e grupos linguisticos

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Fenrir
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Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fenrir »

Me ocorreu uma ideia enquanto pesquisava sobre linguas dificeis e gostaria de compartilha-la com voces e saber a sua opiniao.

(extraido do meu post no CC:)
Ja me perguntei sobre qual seria a lingua mais dificil de aprender.
Parece haver uma unanimidade quanto ao Mandarim, mas tenho minhas duvidas.
Acho que seria mais dificil aprender uma lingua pouco conhecida, de familia, gramatica e pronuncia diferentes da sua lingua nativa (ate ai o mandarim esta OK), porem com poucos falantes, isolada geograficamente, provavelmente com pouco ou nenhum material disponivel, seja didatico ou nao (certamente nao em Portugues) e com ninguem com quem conversar, treinar a pronuncia, etc.

Nas minhas pesquisas na net, tive a impresao que as linguas do caucaso sao particularmente dificeis:

do idioma da Georgia:
CitarThe language contains some formidable consonant clusters, as may be seen in words like გვფრცქვნი gvprckvni ("You peel us") and მწვრთნელი mc'vrtneli ("trainer").

http://en.wikipedia.org/wiki/Northeast_ ... _languages
Citar...Tabasaran was once thought to be the language with the largest number of grammatical cases at 54, which could – depending on the analysis – as well be the Tsez language with 64)
Estas sao campeas
CitarAn alphabet is a set of characters used to represent the basic sounds of a language, technically known as phonemes. Languages vary "in the number of these basic sounds, from around 20 for Hawaiian and Japanese, to about 40 for English, and over 60 for several languages spoken in the Caucasus. One of the largest number of phonemes is found in the language spoken by a branch of the Southeast Asian people variously known as Hmong or Miao or Meo. The White Meo language has no fewer than 80 phonemes - 57 consonants, 15 vowels, and 8 tones" [7] - The relative height of pitch that is a phoneme of a languages. Being a phoneme, a tone distinguishes meaning.

http://en.wikipedia.org/wiki/Hmong_language
http://en.wikipedia.org/wiki/Pahawh_Hmong_script
os 5 tons do Mandarim ja sao dose... imaginem 7!


Agora, em termos de pronuncia, acho que nada se compara a isto:
http://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngu ... 3%B3%C3%B5

CitarBut if you want to know about Linguistically difficult languages you have to look outside the common ones, which are child's play to learn by comparison. Archi, a language of the Caucasus, has 1.6 million different forms for every single verb (there are about 30 different forms for each Russian verb). Pawnee, a language of the American plains, builds verbs that are up to 30 syllables long with as many as 20 different prefixes. The !Xoo language of South Africa has 125 different consonants, more than half of which are click sounds that are found in only a small number of languages of southern Africa. Many of the Australian languages divide their nouns up into a dozen different noun classes and each noun class uses a different set of common verbs, so that "to go" used with one noun class is a completely different verb than "to go" used with another noun class. Navajo and Apache have so many morphophonological processes that five prefixes at the beginning of a word might come out as only two or three syllables.



Reparei que muitas das linguas mais complexas sao encontradas em povos em estagio 'pre-tecnologico' (na falta de termo melhor), as vezes ate mesmo em grupos de cacadores-coletores.
Basta apenas citar dois exemplos: as linguas da familia Khoisan, da qual faz parte a lingua do povo !Kung (mostrados no filme "Os deuses devem estar loucos") e uma das que citei no post anterior de povos indigenas da america do norte.
Mandarim parece brincadeira de crianca quando comparado a estas linguas e sua riqueza fonologica faz o Portugues e o Ingles (que tem numero razoavel de fonemas) parecerem linguas com fonetica bem pobre.

Tambem ja pesquisei alguma coisa sobre QI e inteligencia e sei que ha um campo de pesquisa que tem apresentado resultados um tanto polemicos: que grupos em estagio 'pre-tecnologico', iletrados tendem a obter escores bem baixos em testes considerados culture-fair. De fato, estes escores (medias populacionais!) nao raro se aproximam do extremo superior do que se considera retardamento...
Para se ter uma ideia melhor do que significa isto, uma populacao media neste nivel implicaria em apenas 1 em cada 50 individuos com inteligencia normal ou acima...
Ora, os psicometristas que aceitam estes resultados, alegam que, justamente, por terem baixa inteligencia, estes povos nao progrediram e acabaram sendo dizimados ou dominados por outros tecnologicamente mais avancados (consequentemente mais inteligentes).
Nao e necessario dizer que este tipo de conclusao gera replicas bem inflamadas...
Haja vista o exemplo recente do premio Nobel James Watson ter declarado que Negros sao menos inteligentes que os Brancos.
Pesquisadores que endossam esta hipotese, como Arthur Jensen, alegam que suas conclusoes se baseam em fatos e evidencias e nao estao poluidas por ideologia ou racismo. Outros, como Stephen Ceci e Howard Gardner contestam estes dados e interpretam as diferencas de forma diferente atribuindo a causa a fatores ambientais e socio-economico-culturais.

Recentemente andei lendo Armas, Germes e Aco do Jared Diamond onde se discute o porque das diferencas tecnologicas e culturais entre os povos ditos 'civilizados' e os considerados 'nao-civilizados'. Quem leu o livro percebeu que Jared nao apoiaria a hipotese de Jensen ou de Watson e suas explicacoes parecem bem convincentes.
De acordo com Jared, as diferencas entre estes povos se deveriam a diferencas ambientais e nao geneticas e que os mesmos seriam, na media, tao inteligentes como qualquer outro Homo sapiens 'civilizado'.
Quem ja leu 'Enterrem meu Coracao na Curva do Rio' tambem percebeu que os indigenas norte-americanos, passado o choque inicial do contato, estavam bem cientes do que queria o homem branco. Eles nao eram bobalhoes, muito pelo contrario e expressavam suas opinioes com uma eloquencia digna de quem conhece bem a arte da retorica.
Acredito que os indigenas 'menos evoluidos' ditos cacadores-coletores como os 'nossos' indios, tambem sejam tao inteligentes quantos seus primos do norte e certamente o mesmo se aplica as tribos da africa e da polinesia. Jared da mostras claras disso em seu livro.
Imagino que se se colocasse um homem 'urbano' em seu ambiente e o pedissem para que se virasse sozinho fora de seu ambiente, qualquer indigena pensaria estar diante de alguem bem estupido.
Outros exemplos que me ocorrem sao a historia de superacao de Frederick Douglas (relatado no mundo assombrado pelos demonios, de Carl Sagan) e da linguagem Cherokee, inventada por Sequoyah (relatada no livro de Jared Diamond). Ora, diriam, mas estes sao individuos isolados e estamos falando de medias populacionais!
Eu retrucaria dizendo que encontrar individuos obviamente altamente inteligentes em populacoes em que a media se aproxime de retardo seria em evento estatisticamente bem raro.

E o que isto tem a ver com linguas?
Simples, me ocorreu que pareceria um absurdo supor que formas de comunicacao tao complexas fossem desenvolvidas entre individuos cuja inteligencia media(!) se encontra pouca coisa acima do nivel de retardo! Quem tem algum parente ou amigo com sindrome de down deve saber a
dificuldade que estas pessoas enfrentam no seu dia-a-dia ( ja ouvi falar de casos fantasticos de superacao ). Minha esposa tem um irmao que, embora nao seja portador da s. de Down, tem a cognicao comprometida devido provavelmente a problemas no parto. Minha esposa acompanhou de perto a luta dele para que se alfabetizasse, infelizmente sem sucesso.
Entao, pergunto de novo: como esperar que pessoas com cognicao inferior desenvolvam e sejam capazes de se comunicar em linguas como a do povo !kung?
Pensei tambem se esta hipotese seria algum NonSequitur, do tipo do DI, que todos aqui conhecem bem: 'se o universo é complexo, logo foi criado por um designer' -->
'se !Xõõ e uma lingua complexa, logo quem a criou tem que ser altamente inteligente'
Nao sei. Ainda penso que deve ter algo a ver e que a visao que o 'homem civilizado medio' tem destes povos esta bem equivocada.
Provavelmente os tais testes nao sao culture-fair como se pensa (é o que alegam varios pesquisadores) ou então que o que eles medem não constutui a totalidade do que se entende por inteligencia (como sugere Howard Gardner e Robert Sternberg).
Pensei se a hipotese de Sapir-Worf teria alguma coisa a ver com a primeira divagacao. Se a forma como pensamos é influenciada pela linguagem, seria absurdo supor que testes desenvolvidos para medir a capacidade verbal (testes de QI medem o raciocinio logico-matematico, espacial e verbal) de povos oriundos de culturas baseadas principalmente em linguas da familia das
linguas Indo-europeias sejam culture-fair, quando aplicados a populacoes de grupos linguisticos com caracteristicas radicalmente distintas. Divagando ainda mais, talvez mesmo a parte logico-matematica e espacial destes testes tenha um viés cultural.
Alguns retrucariam dizendo que Judeus, Hungaros, Arabes, Japoneses e Chineses nao pertencem ao grupo linguistico Indo-Europeu e nao obstante, obtem escores altos em testes.
Eu responderia afirmando que Judeus, Arabes e Hungaros ja estao suficientemente familiarizados com o mundo Indo-Europeu para se sentirem a vontade com suas demandas (Ad Hoc?).
No caso dos Japoneses e Chineses, penso que minha explicacao nao seria satisfatoria e pesariam outros fatores do tipo que Jared examinou em seu livro.
Ha que se considerar que as diferencas tecnologicas entre os povos devem ser algo 'poli-memetico' se por 'meme' eu puder entender alguma caracteristica cultural que se propaga a maneira dos genes
(nao li nada sobre memes), portanto nao proponho que diferencas linguisticas sejam o unico fator, mas sim mais um fator a se considerar em todos os estudos onde se comparam variaveis como inteligencia e grau tecnologico entre povos culturalmente diferentes.

(Sendo mais claro a respeito do meu uso provavelmente incorreto do termo 'meme': pensei em 'meme' como sendo 'caracteristicas ambientais que se propagam entre geracoes' tal como podemos considerar genes mais ou menos como 'caracteristicas biologicas/fisiologicas que se propagam entre geracoes', ou seja o meme estaria para a influencia ambientais (fenotipo menos genotipo) como o gene estaria para influencias geneticas (genotipo).
E assim como hoje os geneticistas comportamentais estudam a influencia da genetica na inteligencia posso imaginar um 'memeticista' comportamental fazendo o mesmo com relacao as influencias do ambiente na inteligencia!)
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Res Cogitans »

Sternberg tem uma boa contrargumentação contra a aplicação intercultural dos testes de QI, ver Psicologia Cognitiva - Robert Sterberg.
Eu estou citando fonte para você pesquisar, não como apelo a autoridade. Não sei se você tem algum livro no vível de graduação em psicologia, tem alguns detalhes psicometricos que não são fáceis de lidar somente com discussão em fóruns.
Esse é um tema que vale a pena discutir e você atualmente deve ser o único forista cujo objetivo neste fórum não seja o escárnio, mas tenho pouco tempo disponível para me ausentar de minhas responsabilidades.
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

*Deus deixou seu único filho morrer pendurado numa cruz, imagine o que ele fará com você.

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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fenrir »

Res,
O pouco que sei a respeito da psicometria e de coisas correlatadas adquiri em minhas perambulacoes pela Net e pela leitura de dois livros:

O 'Inteligencia - Multiplas Perspectivas' de Howard Gardner - nao confundir este livro com os livros que expom a teoria das 'inteligencias multiplas', do proprio autor.
No primeiro, Gardner analisa a inteligencia sobre varios aspectos e apresentando varias teorias, de forma honesta a abrangente.

O outro foi 'On Intelligence ... more or less: A bio-ecological treatise on intellectual development' de Stephen Ceci.

Tambem andei lendo algum material do Anders Ericsson
www.psy.fsu.edu/faculty/ericsson.dp.html
que consegui no site dele ou por e-mail.

O que conheco do Sternberg (ou deveria conhecer, porca memoria)vem da leitura destes dois livros. Ainda nao li nada dele - grato pela sugestao.

Ja tem algum tempo que li estes livros e tenho que me certificar que nao os interpretei de forma incorreta e lapidar as ideias do texto. Seria bom rele-los e examinar a sua sugestao, mas como voce, estou numa guerra contra o tempo!

Algum dia vou dar uma espiada tambem no livro do Jensen e no polemico 'The Bell Curve', para examinar os argumentos do pessoal do lado 'nature' da disputa ( 'nature x 'nurture').

Quanto a responsabilidade nao esquenta, tambem estou correndo contra o tempo, apagando os incendios de um projeto problematico de TI... (ontem sai do servico as 1h)
Se interessar, continuamos depois por aqui.
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Res Cogitans »

OK, quando chegar em casa vejo um tempinho pra fazer um resumãããããão de alguns pontos principais nessa discussão.
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Res Cogitans »

A aplicação de testes de inteligência interculturais tem uma série de problemas metodológicos. As pessoas de diferentes culturas têm necessidades diferentes e até mesmo valores para oq é definido como comportamento inteligente ou não. Um caso clássico é os do kpelle, eles foram considerados “burros” porque não conseguiam resolver ‘corretamente’ um teste de inteligência nos nossos critérios, até o pesquisador teve a idéia de perguntar aos kpelle “como uma pessoa idiota resolveria este problema?” e a resposta deles foi a que julgamos correta.

Os testes “culturalmente justos” não existem, mesmo em culturas relativamente próximas. Henry Goddard classificou imigrantes italianos, húngaros e russos eram em sua maioria (cerca de 80%) retardados. O intrigante é que as gerações que se seguiram a estes imigrantes tiveram um aumento substancial de QI ao longo do tempo, uma coisa que fica difícil de justificar por componentes hereditários. Também é pouco crível que a cultura norte-americana tenha um efeito incrementador de inteligência.
Os próprios norte-americanos variaram seu QI com o tempo como é demosntrado pelo Efeito Flynn, tal efeito consiste no aumento relativo do QI da população mundial. Alguns países apresentam um aumento de até 30 pontos. Se você aplicasse um teste hoje numa cidade norte-americana dos anos 20, 45% da população marcaria menos de 75 pontos, como comenta o próprio Flynn: “Se o QI de uma pessoa corresponde a sua inteligência, teríamos que concluir que metade das pessoas que viveram nos EUA no início do século eram retardadas”.
OBS: Você deve ter lido que os testes de QI são ajustados periodicamente para que a média seja 100, ou seja, 100 é por definição a média do teste de QI.

Alguns testes culturalmente justos se baseiam em figuras geométricas, mas mesmo assim não consiste num teste muito bom, afinal temos uma cadeira de geometria e faz parte do nosso cotidiano escolar trabalhar com problemas geométricos. Não se pode considerar que um estudante inglês e um caçador coletor tenham desempenhos semelhantes na análise de padrões de quadrados, círculos, ...

Sternberg trabalha até mesmo a questão de tempo, nossa cultura louva as decisões rápidas, porém em outras culturas sábio é aquele que pensa bastante antes de tomar uma ação. Em testes rigorosamente cronometrados, como alguns de QI, levamos uma vantagem óbvia.

Bem, fico por aqui por hora...
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fenrir »

Res--
A aplicação de testes de inteligência interculturais tem uma série de problemas metodológicos. As pessoas de diferentes culturas têm necessidades diferentes e até mesmo valores para oq é definido como comportamento inteligente ou não. Um caso clássico é os do kpelle, eles foram considerados “burros” porque não conseguiam resolver ‘corretamente’ um teste de inteligência nos nossos critérios, até o pesquisador teve a idéia de perguntar aos kpelle “como uma pessoa idiota resolveria este problema?” e a resposta deles foi a que julgamos correta.

E seria um tanto ingenuo ou apressado interpretar a resposta deles como a resposta de alguem de baixa inteligencia baseando-se no fato de julgarem a resposta certa (para nos) como a resposta errada (para eles). Entao eles sabiam o que nos esperavamos que eles respondessem, so nao sabiam que nos esperavamos isso! (sera que fui claro aqui?)
Alguem com inteligencia no nivel das que alguem inadvertidamente atribuiria aos Kpelle (baixo) provavelmente nao teria nocao da resposta, mesmo que a considerasse incorreta!

Res--
Os testes “culturalmente justos” não existem, mesmo em culturas relativamente próximas. Henry Goddard classificou imigrantes italianos, húngaros e russos eram em sua maioria (cerca de 80%) retardados. O intrigante é que as gerações que se seguiram a estes imigrantes tiveram um aumento substancial de QI ao longo do tempo, uma coisa que fica difícil de justificar por componentes hereditários. Também é pouco crível que a cultura norte-americana tenha um efeito incrementador de inteligência.
Os próprios norte-americanos variaram seu QI com o tempo como é demosntrado pelo Efeito Flynn, tal efeito consiste no aumento relativo do QI da população mundial. Alguns países apresentam um aumento de até 30 pontos. Se você aplicasse um teste hoje numa cidade norte-americana dos anos 20, 45% da população marcaria menos de 75 pontos, como comenta o próprio Flynn: “Se o QI de uma pessoa corresponde a sua inteligência, teríamos que concluir que metade das pessoas que viveram nos EUA no início do século eram retardadas”.

Foi bom voce ter citado o efeito Flynn. Pense no absurdo de se extrapolar este efeito para seculos atras...
Talvez estas variacoes nao sejam lineares e sempre ascendentes, pode ser que oscilem e isto invalidaria estas extrapolacoes.
Tambem nao se sabe se o mesmo ocorreu e com qual variacao em outras populacoe, ou se foi um fenomeno restrito aos EUA ou a europa.

Res--
OBS: Você deve ter lido que os testes de QI são ajustados periodicamente para que a média seja 100, ou seja, 100 é por definição a média do teste de QI.

Sim, é desta forma que se normalizam os testes, nao é? Ha tambem o problema de se considerar escores proximos aos limites no qual o teste teria validade, como tambem o quanto estes escores estao afastados da media... como sao muito poucos os testees que obtem escores extremos (em ambos os lados da famosa curva de sino), o teste perde confiabilidade nestas faixas, dado que nelas sua calibracao se baseia numa estatistica com um numero amostral pequeno... isto quando existe alguma amostra.
Muitas vezes calculam os tais limites por extrapolacao.
Ha quem pense que os testes clinicos tem pouca fiabilidade fora de um intervalo +-2.5 sigma e escores 60-70 ja estao praticamente num extremo do tal intervalo.

Res--
Alguns testes culturalmente justos se baseiam em figuras geométricas, mas mesmo assim não consiste num teste muito bom, afinal temos uma cadeira de geometria e faz parte do nosso cotidiano escolar trabalhar com problemas geométricos. Não se pode considerar que um estudante inglês e um caçador coletor tenham desempenhos semelhantes na análise de padrões de quadrados, círculos, ...

Concordo. O erro estaria em pensar que estes constructos sao inatos, e sendo inatos seriam culture-fair.
No primeiro post me perguntei se grandes diferencas linguisticas influenciariam a 'justeza' dos testes culturalmente justos.
Estas diferencas devem, alem disso, comtribuir para o vies de quem aplica os testes aquelas populacoes e nao questionam os resultados supondo tacitamente que todo e qualquer ser humano é capaz de manipular padroes geometricos abstratos.

Res--
Sternberg trabalha até mesmo a questão de tempo, nossa cultura louva as decisões rápidas, porém em outras culturas sábio é aquele que pensa bastante antes de tomar uma ação. Em testes rigorosamente cronometrados, como alguns de QI, levamos uma vantagem óbvia.

Nao sabia das consideracoes de Sternberg neste sentido. Ja tinha sim lido que o tempo e um fator a se considerar, dado que nao me parece correto supor que dois testees com o mesmo nivel "real" de QI (do qual o resultado do teste
e sempre uma aproximacao) teriam o mesmo escore, dado o mesmo teste e o mesmo intervalo de tempo para cada um.
Pode ser que um deles precise de um pouco mais de tempo que o outro para se chegar aos mesmos resultados, embora tenham o mesmo QI.

P.S. Deveria ter um jeito mais facil de quebrar citacoes em pedacos menores.
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zumbi filosófico
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por zumbi filosófico »

Volta e meia me ocorrem umas especulações meio "Sappir-Whorf em esteróides", e de vez em quando leio algumas coisas nesse sentido. Um exemplo que li há algum tempo mas não vou encontrar o link é que idiomas como o japonês e talvez uns chineses principais (não me lembro), tem o "nome dos números" de forma mais lógica que em idiomas como o português e o inglês. Se o português fosse ter os nomes dos números de forma mais lógica, "onze", "doze", "treze", "catorze", e "quinze", seriam "dezeum", "dezedois", "dezetres", "dezequatro", "dezecinco", mantendo a mesma lógica dos seguintes. Para o inglês, só vale para eleven e twelve, mas era esse o principal idioma comparado, naquilo que vi. Havia mais coisas que uns julgam poder ajudar a explicar uma certa superioridade dos asiáticos na matemática.


Outras coisas mais recentes, agora com citações e links:

Thinking in Chinese vs. Thinking in English
Posted by Nicholas Gruen on Monday, September 20, 2010
By: Li King King (Strategic Interaction Group, Max Planck Institute of Economics, Jena)

This paper investigates whether language priming activates different cultural identities and norms associated with the language communicated; bilingual subjects are given Chinese instructions in the Chinese treatment and English instructions in the English treatment. The main findings are: (1) in social preference games involving strategic interactions, e.g., the trust game, subjects in the Chinese treatment are more trusting and trustworthy than in the English treatment. However, (2) in individual choice games about social preference, such as the dictator game, while there is no treatment difference, subjects exhibit in-group favoritism only in the Chinese treatment. Further, (3) subjects in the Chinese treatment expect others to be more risk seeking, and prefer to pick Chinese lucky numbers in a lottery game. These findings support the hypothesis that languages are associated with cultural frames and that communicating in a particular language increases the cognitive accessibility of norms associated with that language.

http://clubtroppo.com.au/2010/09/20/thi ... n-english/


Talvez tenha mais coisas interessantes nos comentários, ainda não li.


Mas o mais interessante, particularmente para a especulação de hipotéticos testes de QI inventados por outros povos, é o caso de alguns idiomas que parecem fazer das pessoas verdadeiras bússolas humanas:

[...] In recent years, various experiments have shown that grammatical genders can shape the feelings and associations of speakers toward objects around them. In the 1990s, for example, psychologists compared associations between speakers of German and Spanish. There are many inanimate nouns whose genders in the two languages are reversed. A German bridge is feminine (die Brücke), for instance, but el puente is masculine in Spanish; and the same goes for clocks, apartments, forks, newspapers, pockets, shoulders, stamps, tickets, violins, the sun, the world and love. On the other hand, an apple is masculine for Germans but feminine in Spanish, and so are chairs, brooms, butterflies, keys, mountains, stars, tables, wars, rain and garbage. When speakers were asked to grade various objects on a range of characteristics, Spanish speakers deemed bridges, clocks and violins to have more “manly properties” like strength, but Germans tended to think of them as more slender or elegant. With objects like mountains or chairs, which are “he” in German but “she” in Spanish, the effect was reversed.

In a different experiment, French and Spanish speakers were asked to assign human voices to various objects in a cartoon. When French speakers saw a picture of a fork (la fourchette), most of them wanted it to speak in a woman’s voice, but Spanish speakers, for whom el tenedor is masculine, preferred a gravelly male voice for it. More recently, psychologists have even shown that “gendered languages” imprint gender traits for objects so strongly in the mind that these associations obstruct speakers’ ability to commit information to memory.

Of course, all this does not mean that speakers of Spanish or French or German fail to understand that inanimate objects do not really have biological sex — a German woman rarely mistakes her husband for a hat, and Spanish men are not known to confuse a bed with what might be lying in it. Nonetheless, once gender connotations have been imposed on impressionable young minds, they lead those with a gendered mother tongue to see the inanimate world through lenses tinted with associations and emotional responses that English speakers — stuck in their monochrome desert of “its” — are entirely oblivious to. Did the opposite genders of “bridge” in German and Spanish, for example, have an effect on the design of bridges in Spain and Germany? Do the emotional maps imposed by a gender system have higher-level behavioral consequences for our everyday life? Do they shape tastes, fashions, habits and preferences in the societies concerned? At the current state of our knowledge about the brain, this is not something that can be easily measured in a psychology lab. But it would be surprising if they didn’t.

The area where the most striking evidence for the influence of language on thought has come to light is the language of space — how we describe the orientation of the world around us. Suppose you want to give someone directions for getting to your house. You might say: “After the traffic lights, take the first left, then the second right, and then you’ll see a white house in front of you. Our door is on the right.” But in theory, you could also say: “After the traffic lights, drive north, and then on the second crossing drive east, and you’ll see a white house directly to the east. Ours is the southern door.” These two sets of directions may describe the same route, but they rely on different systems of coordinates. The first uses egocentric coordinates, which depend on our own bodies: a left-right axis and a front-back axis orthogonal to it. The second system uses fixed geographic directions, which do not rotate with us wherever we turn.

We find it useful to use geographic directions when hiking in the open countryside, for example, but the egocentric coordinates completely dominate our speech when we describe small-scale spaces. We don’t say: “When you get out of the elevator, walk south, and then take the second door to the east.” The reason the egocentric system is so dominant in our language is that it feels so much easier and more natural. After all, we always know where “behind” or “in front of” us is. We don’t need a map or a compass to work it out, we just feel it, because the egocentric coordinates are based directly on our own bodies and our immediate visual fields.

But then a remote Australian aboriginal tongue, Guugu Yimithirr, from north Queensland, turned up, and with it came the astounding realization that not all languages conform to what we have always taken as simply “natural.” In fact, Guugu Yimithirr doesn’t make any use of egocentric coordinates at all. The anthropologist John Haviland and later the linguist Stephen Levinson have shown that Guugu Yimithirr does not use words like “left” or “right,” “in front of” or “behind,” to describe the position of objects. Whenever we would use the egocentric system, the Guugu Yimithirr rely on cardinal directions. If they want you to move over on the car seat to make room, they’ll say “move a bit to the east.” To tell you where exactly they left something in your house, they’ll say, “I left it on the southern edge of the western table.” Or they would warn you to “look out for that big ant just north of your foot.” Even when shown a film on television, they gave descriptions of it based on the orientation of the screen. If the television was facing north, and a man on the screen was approaching, they said that he was “coming northward.” [...]

http://www.nytimes.com/2010/08/29/magaz ... ted=2&_r=1


A matéria é bem maior que isso.


[/necromante]
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por zumbi filosófico »

Reading Arabic 'hard for brain'

By Katie Alcock
Science reporter, BBC News

Israeli scientists believe they have identified why Arabic is particularly hard to learn to read.

http://www.bbc.co.uk/news/health-11181457
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Fernando Silva
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fernando Silva »

Fenrir escreveu:Reparei que muitas das linguas mais complexas sao encontradas em povos em estagio 'pre-tecnologico' (na falta de termo melhor), as vezes ate mesmo em grupos de cacadores-coletores.

Há uma enorme variedade de línguas entre os grupos de caçadores-coletores do sul da África. Algumas são gramaticalmente complexas, outras têm "trocentos" fonemas. Não parece haver uma regra sobre complexidade das línguas.

No máximo, dá a impressão de que uma língua mais complexa num sentido é mais simples em outro.

Por outro lado, eu diria que deve ser difícil aprender a língua de um povo com um modo de pensar muito diferente do nosso. Não bastaria aprender as palavras e seus significados: seria preciso também aprender a pensar como eles.
Por exemplo, há uma tribo americana que não tem palavras para 'ontem' e 'amanhã'. Para eles, todo dia é o mesmo dia, nascido de novo.

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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fernando Silva »

Do livro "Speak - a short history of languages" - por Tore Janson
In their details languages differ greatly, as is well known. It is
not true that all languages are equally dificult at all levels, a fact
easy to observe by any language learner. For example, the
English language has a highly elaborated system of vowels and
diphthongs, while Spanish has only five basic vowels.

On the other hand, the verbs in Spanish have many more forms
than the verbs in English. Any attempt to make a comprehensive
assessment of the dificulty or the "development" of these two
languages would entail a decision about whether vowels contribute
more to dificulty than verb forms, or vice versa.

It is very hard to find criteria for such decisions. In their
totality, both languages are highly complex and very dif?cult
to master. This does not necessarily mean that all languages
are at exactly the same level when it comes to dificulty or
development in this sense, but it is hard to find major differences.

The Khoisan languages all have very complex sound systems.
They have more vowels and many more consonants than is
found in any European language. This is partly because all these
languages have special consonants, called clicks; they are used as
speech sounds only in southern Africa. In addition, they use
more consonants than we do even if the clicks are not counted.

One Khoisan language, called !Xóõ, has a larger number of
speech sounds than any other known language. There are more
than a hundred distinctive sounds, as compared with thirty or
forty in most other languages.

On the other hand, both in !Xóõ and in many other Khoisan
languages the number of different forms for each verb is small,
and the rules for sentence formation are mostly simple.
So those language systems are dificult as far as the sounds are
concerned, but fairly simple in other ways.

This is not true for languages used among gatherers and
hunters in other parts of the world. The Australian Aborigines
spoke many different languages when the Europeans arrived.

Most of these are very simple as far as the sound systems are
concerned. Several of them have less than twenty distinctive
sounds, which is about as low as is reported for any human lan-
guage. But their systems for inflecting words are very advanced,
so that one single complex verb may sometimes express a mean-
ing that has to be rendered by several clauses in English.

An example from the Australian language Rembarrnga is yarran-
m??-ku?pi-popna-ni-yuwa. This form with six components is to
be understood, according to the leading authority, R. M. W.
Dixon, as "it [the kangaroo] might smell our sweat as we try to
sneak up on it." So the Australian languages are simple when it
comes to sounds, but dificult at other levels.

This shows that languages in cultures of gatherers and
hunters are just like other languages in terms of sounds and
grammar: they are simple in some ways, and complex in others,
just like English or Spanish or Arabic.

As far as the language systems are concerned, the languages
we speak are fully comparable with the languages spoken among
gatherers and hunters of today, and presumably with those spoken
by our ancestors when they were gatherers and hunters.

On average, languages do not become more or less complex. They just vary.

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Fenrir
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fenrir »

Fernando,
Tenho este livro, mas não comecei a ler! Tenho o habito de adquirir livros num ritmo mais rápido que minha leitura (e tempo livre) permitem...
Grato por ter postado o trecho aqui.

Atrevo-me (porque nao sou linguista) a discordar de Jansen.
Creio sim, que há diferenças em termos de complexidade entre as linguas.
O que me veio a cabeça após ler o trecho, é que estas diferenças devem ser menores do que eu imaginava, já que a complexidade num ponto pode ser contrabalançada por uma maior simplicidade noutro, mas que diferenças existem, existem.
Basta comparar Pirahã com, por exemplo, Sânscrito (ou Pahlavi); ou Ingles com qualquer língua do Cáucaso, Abkhaz, por exemplo. E estas últimas não são complexas apenas em sua fonética/fonologia, como são tambem em sua gramática.

Claro, há que se considerar tambem que o Cantonês parecerá a um falante de uma língua Sino-Tibetana, mais simples do que parece a nós, que falamos linguas Indo-Européias, portanto de parentesco bem mais distante.

Gosto de estudar línguas. Estes dias deparei-me com estas (todas extintas; nomes em ingles/pinyin):
Zhang-Zhung (gostei do nome)
Thumshuqese (deste tambem)
Buddhistic Hybrid Sanskrit
Tokharian A, B e C
e outras
E o mais legal é que deixaram registros escritos (excetuando-se Tokh. C) e em vários sistemas de escrita diferentes!

Quanto mais pesquiso, mais percebo que não sei coisa alguma.
Acho que não temos nem idéia do "tamanho do nosso desconhecimento". Traduzindo, daquilo que não sabemos existir, mas que já é conhecido.

P.S.
Quer estudar as linguas acima? Vai ter que aprender Alemão, Francês, Russo ou Mandarim antes... O material disponível é escasso mesmo em inglês! Em portugues sequer existe!
Não bastasse isto, o material é direcionado a linguistas, ou seja, não espere muita didática. Quem se aventurar vai ter que saber o be-a-bá da linguística tambem!
"Man is the measure of all gods"
(Fenrígoras, o sofista pós-socrático)

"The things are what they are and are not what they are not"
(Fenrígoras, o sofista pós-socrático)

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Fernando Silva
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fernando Silva »

Fenrir escreveu:Fernando,
Tenho este livro, mas não comecei a ler! Tenho o habito de adquirir livros num ritmo mais rápido que minha leitura (e tempo livre) permitem...

O livro é interessante porque não se preocupa tanto em dizer "como" as línguas evoluíram e sim "porque". Ele conta a história dos povos que as falavam e mostra quais fatos levaram às mudanças: quem invadiu quem, quem impôs tal língua a quem, o que aconteceu a esses povos para que as línguas mudassem ou desaparecessem etc.

Fenrir escreveu:Atrevo-me (porque nao sou linguista) a discordar de Jansen.
Creio sim, que há diferenças em termos de complexidade entre as linguas.

Acho que grande parte da aparente complexidade de uma língua se deve ao fato de que nossa realidade é muito diferente da realidade de quem a fala, inclusive o modo de pensar e de ver o mundo. Além de aprender as palavras e a gramática, temos que "entrar no clima".

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user f.k.a. Cabeção
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »



Topico interessante, algumas boas recomendacoes de livro que eu certamente vou pegar no formato audio para ouvir no metro.

Ainda que neuro-linguistica nao seja la o meu forte (eu fiz um curso de humanas obrigatorio nesse tema na faculdade), eu vou me permitir dar meus pitacos semi-ignorantes e atrevidos de semrpe.

Eu acho que se voce usar a complexidade e riqueza gramatical aparente de uma lingua como indicador da sofisticacao intelectual de um povo, voce esta provavelmente cometendo um equivoco basico.

Porque o fato e que idiomas de grandes civilizacoes, que sao submetidos a um processo de registro rigoroso (imprensa por exemplo), e universalizacao, cobrindo grandes regioes e populacoes, durante os seculos tendem a se simplificar gramaticalmente e foneticamente.

Quem estudou um pouco de latim sabe que os substantivos podiam variar segundo declinacoes, dependendo da funcao sintatica dele na frase. Certos povos indigenas isolados na amazonia, como os Pirahas possuem nocoes de aritimetica mais primitivas, tendo dificuldade com a adicao de quantidades de um digito, mas sua gramatica tambem e rica em casos e peculiaridades, usadas para distinguir fenomenos naturais comuns a sua realidade, alem de ser uma das poucas linguas que podem ser assobiadas. http://en.wikipedia.org/wiki/Pirah%C3%A3_language

Na evolucao natural das linguas, os verbos que nao sao usados frequentemente se regularizam num processo de decaimento estocastico exponencial (uma especie de meia-vida, como um atomo radioativo) e acabam se condensando em poucos casos padroes ( http://www.nature.com/nature/journal/v4 ... 06137.html ). As categorias gramaticais se tornam mais abrangentes na medida que o idioma lida com mais conceitos, aumentando em riqueza lexical, mas conservando estruturas gramaticais e etimologicas e dando assim uma logica quase algoritimica para a evolucao da lingua.

Essas complexidades desnecessarias sao abandonadas na evolucao linguistica, e a complexidade gramatical excessiva e regularizada e substituida por um vocabulario e estilo mais rico em formas de expressao e figuras de linguagem.


Um idioma sintaticamente complexo nao necessariamente transmite e abrange informacao de forma mais eficiente que um idioma sintaticamente simples. Haja vista a popularidade de sintaxes simples nas linguagens de programacao modernas, que incorporam no entanto abstracoes mais sofisticadas, como orientacao a objeto e outros mecanismos metalinguisticos que permitem ao usuario criar suas proprias categorias de objetos de maneira perfeitamente compreensivel para outros usuarios.


Linguistas computacionais se esforcam para simplificar as estruturas de sintaxe necessarias e ao mesmo tempo aumentar a liberdade conceitual dos programadores, e esse e mais ou menos o mesmo processo que atravessaram as linguas naturais, embora elas nao sejam diretamente desenhadas por ninguem, nem precisem que os cerebros sejam "recompilados" para que as modificacoes sejam aprendidas. De qualquer forma, as distancias linguisticas geracionais costumam evidenciar que o processo de aprendizado nao e perfeito.

No caso das linguagens de programacao, a vantagem e evidente. Uma lingua sintaticamente simples, como Perl ou Python, podem ser masterizadas em pouquissimo tempo por um programador competente em C++ ou Java. E os programas que ele escrevera serao mais limpos, claros, curtos e portanto de facil manutencao e alteracao.


"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem

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Fernando Silva
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fernando Silva »

user f.k.a. Cabeção escreveu:Certos povos indigenas isolados na amazonia, como os Pirahas possuem nocoes de aritimetica mais primitivas, tendo dificuldade com a adicao de quantidades de um digito, mas sua gramatica tambem e rica em casos e peculiaridades, usadas para distinguir fenomenos naturais comuns a sua realidade, alem de ser uma das poucas linguas que podem ser assobiadas. http://en.wikipedia.org/wiki/Pirah%C3%A3_language

Povos caçadores / coletores, que não acumulam propriedades e não precisam controlar estoques nem contabilizar transações comerciais, tendem a não desenvolver sistemas aritméticos complexos. Às vezes, sequer têm palavras para números maiores que 3.

Lembrei de uma tribo na Amazônia, perto da fronteira com a Colômbia, que tem formas verbais diferentes conforme a maneira em que você obteve a informação.

Por exemplo: em "Fulano está na sala", o verbo "está" vai variar conforme você tenha visto o Fulano na sala com seus próprios olhos, ou tenha ouvido a voz dele, ou tenha deduzido que ele está lá por meio de outros indícios, ou tenha ouvido de alguém etc.

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Fenrir
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Re: Inteligencia e grupos linguisticos

Mensagem por Fenrir »

Fernando Silva escreveu:Lembrei de uma tribo na Amazônia, perto da fronteira com a Colômbia, que tem formas verbais diferentes conforme a maneira em que você obteve a informação.

Por exemplo: em "Fulano está na sala", o verbo "está" vai variar conforme você tenha visto o Fulano na sala com seus próprios olhos, ou tenha ouvido a voz dele, ou tenha deduzido que ele está lá por meio de outros indícios, ou tenha ouvido de alguém etc.


Fantástico, não é?
Quechua tambem tem esta característica: veja em: http://en.wikipedia.org/wiki/Quechua_languages#Evidentiality
Pode-se dizer que línguas que empregam a evidencialidade são mais favoráveis a uma postura cética e menos sujeitas a falácias!
E não é curioso que tal característica esteja presente em línguas de povos que muitos consideram como meros selvagens?

Caso se interessem por linguística, deparei-me com um livro que, do pouco que li até agora e dentro do que me permite a ignorancia do assunto, parece ser muito bom: http://www.amazon.com/gp/product/0262513706/ref=ord_cart_shr?ie=UTF8&m=ATVPDKIKX0DER
É do MIT press e MIT é um acrônimo que impoe respeito!
"Man is the measure of all gods"
(Fenrígoras, o sofista pós-socrático)

"The things are what they are and are not what they are not"
(Fenrígoras, o sofista pós-socrático)

"As mentes mentem"
(Fenrir, o mentiroso)

Trancado