Página 1 de 1

Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 28 Jul 2009, 19:03
por Apo
O comentário em amarelo é adendo meu.

- Enquadrando Deus( e derrubando algumas falácias crentes batidas... de forma polida :emoticon1: )

Hélio Schwartsman

Não, nunca fui submetido a abusos por parte de padres nem tive namorada que me trocou pelos Hare Krishna. Nasci e fui criado sem nenhuma religião --a qual nunca me fez falta. Embora eu tenha ascendência judaica --o que me torna um quase paradoxal caso de judeu ateu--, jamais ter frequentado a sinagoga não fez de mim um assassino ou estuprador.

As relações que travei com gente religiosa no curso da vida foram no geral muito boas. Tenho grande estima por muitas dessas pessoas.

Espero, com essas declarações, descartar as elucubrações daqueles leitores que atribuíram o caráter levemente ateu de minha coluna da semana passada a um trauma religioso ou algo parecido. Aproveito o ensejo para desculpar-me por não ter respondido a todos os e-mails que recebi, como exigiria a boa educação. O volume de mensagens gerado, entretanto, tornava a tarefa quase impossível. Pretendo hoje, no atacado, fazer o que não consegui no varejo.

Antes, porém, mais uma preliminar: não pretendi ofender ninguém com as passagens mais jocosas do texto anterior. Pessoas, de todos os credos e cores, têm o meu respeito, mas só as pessoas, não seus pensamentos. Uma ideia tola é tola não importa quem a tenha proferido. Num passado não tão longínquo, a noção de que pecadores deveriam ser queimados vivos para "salvar" suas "almas imortais" pareceu respeitável a boa parte da humanidade. Felizmente, a tese foi contestada e as ações que provocou são hoje contadas como mais um crime das religiões. Temos, portanto, excelentes motivos para questionar todas as teorias, doutrinas e sistemas que se nos apresentam. Nenhum ideia é sagrada demais para ficar ao abrigo do escrutínio da razão.

E isso nos leva a uma das questões levantadas pelo leitorado: é impossível provar que Deus não existe, de modo que o ateísmo não passa, como as religiões, de uma crença. Reconheço que não conseguimos demonstrar para além de qualquer dúvida seja a existência ou a inexistência de um ente supremo. Mas podemos levar a sérios as teses dos teólogos e, tomando-as como hipóteses científicas, estimar sua probabilidade ou pelo menos verossimilhança.

Bem, quais são as chances de uma pessoa nascer sem que sua mãe tenha mantido relações sexuais? Não são zero, mas são relativamente baixas. Ressurreição? Ainda menores. E quanto à união hipostática, isto é, um indivíduo ter ao mesmo tempo natureza humana e divina, ou, colocando em outros termos, ser simultaneamente ele mesmo e também seu pai? Supondo que isso faça algum sentido, acho que é melhor nem tentar calcular.

Passemos à escatologia. O catecismo 1.052 da Igreja Católica ensina que no dia da ressurreição as almas das pessoas mortas "na Graça de Cristo" serão novamente unidas a seus corpos. Não sou um patologista, mas parecem-me remotas as chances de reutilizar corpos mortos às vezes milhares de anos atrás. Pelo que sabemos, os átomos que compunham essas carcaças já terão se espalhado pela Terra e talvez até escapado de nossa atmosfera e viajado por onde nenhum homem jamais esteve. E o que pensar da reencarnação defendida por espíritas, hinduístas e budistas? Uma parte de nós (alma) que nem sequer é parte, porque não tem matéria, voa por aí penetrando corpos e definindo a essência de seres humanos e às vezes também de outros animais e vegetais antes mesmo de eles nascerem? Que tipo de informação pode o imaterial carregar?

Receio que nenhuma dessas ideias pare em pé senão como manifestações do tal cérebro espiritual ao qual aludi na semana passada.

Alguns leitores me perguntaram porque sempre falo de religião. Já que não creio em Deus, dizem, eu deveria calar sobre o assunto. Minhas reiteradas recaídas no tema indicariam uma vontade secreta de converter-me. "Non sequitur". Meu interesse pela matéria tem caráter sobretudo científico-antropológico. A religião é um fenômeno interessantíssimo. É a única matriz de pensamentos que leva pessoas inteligentes e normalmente racionais a agir como crianças à espera de Papai Noel na noite de 24 de dezembro. E acrescento que as chances de haver um velhote que se veste de vermelho e distribui presentes a bordo de um trenó puxado por renas voadoras parecem significativamente maiores do que as de existir uma inteligência infinita que criou o Universo e se interessa pelo destino individual de cada um dos 7 bilhões de terrestres, aos quais conhece desde criancinhas e de quem exige que não trabalhem aos sábados.

De minha parte, não tenho a pretensão nem o desejo de convencer ninguém a abandonar o seio de sua religião. Imagino que muitos estejam perfeitamente felizes onde estão. Tampouco considero todos os fiéis imbecis apenas por acreditarem. Podem até sê-lo, mas por outras razões. Ao que tudo indica, a fé religiosa tem base neurológica. Ela faria parte de uma rede de ativações neuronais que é independente das conexões do cérebro racional. Pedir para a alguém que abandone suas convicções religiosas ou espirituais não faria muito sentido. "Mutatis mutandis", seria como cobrar de uma pessoa que não sinta emoções como raiva, nojo etc. É algo que não está em seu poder fazer.

Poder-se-ia ver aí mais um argumento para eu desistir de vez de falar de religião. Ocorre que os cérebros racional e espiritual, embora independentes, podem relacionar-se. Eles, afinal, fazem parte da mesma massa encefálica. A razão por si só não vai me fazer parar de sentir medo, mas pode perfeitamente contribuir para modular esse tipo de sensação. Não vamos deixar de temer tudo, mas, com o recurso a terapias de extinção de fobia ou mesmo a drogas, podemos nos livrar de certos medos irracionais.

De modo análogo, o exame crítico das religiões pode servir para que as pessoas percebam que sua espiritualidade é algo mais genérico do que os rituais e condicionamentos de uma determinada igreja. Embora a busca pela transcendência esteja se expressando numa religião em particular, as especificidades deste ou daquele credo não são tão importantes. Pode parecer meio bobo até, mas é um ponto fundamental para que se construa uma religiosidade mais tolerante.

Não devemos, é claro, nutrir ilusões. Homens sempre se mataram e provavelmente sempre se matarão. Se não for pelo Deus para o qual se reza, será pela cor da pele, pelas ideias políticas ou sabe-se lá o quê. Mas mesmo essa tendência irrefreável à barbárie pode ser modulada pela razão. A humanidade é hoje menos violenta do que foi no passado. Quanto menos pretextos tivermos para assassinar o próximo, melhor.

*Hélio Schwartsman, 44, é articulista da Folha. Bacharel em filosofia, publicou "Aquilae Titicans - O Segredo de Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001. Escreve para a Folha Online às quintas.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/pens ... 8859.shtml

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 30 Jul 2009, 00:59
por docdeoz
Sobre a ressurreição devo esclarecer que Stephen Hawking perdeu uma aposta- nem um buraco negro destrói a informção- ela fica por aí alhures e não tenho cabedal para entender...

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 30 Jul 2009, 07:29
por Fernando Silva
docdeoz escreveu:Sobre a ressurreição devo esclarecer que Stephen Hawking perdeu uma aposta- nem um buraco negro destrói a informção- ela fica por aí alhures e não tenho cabedal para entender...

O que tem a ressurreição a ver com o buraco negro?
Alma é espírito e buraco negro é matéria.
Buracos negros engolem almas?

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 31 Jul 2009, 21:05
por Ayyavazhi

Um bom texto.

Coerente em muitos aspectos, tem seu ponto alto nesta frase: “uma idéia tola é tola não importa quem a tenha proferido”. Concordo com o autor em muitas outras passagens além dessa. Mas ele também comete alguns erros lógicos, como era de se esperar em quem se deixa levar por “distrações” (pegando o gancho da colega do outro tópico).
Não, nunca fui submetido a abusos por parte de padres nem tive namorada que me trocou pelos Hare Krishna. Nasci e fui criado sem nenhuma religião --a qual nunca me fez falta. Embora eu tenha ascendência judaica --o que me torna um quase paradoxal caso de judeu ateu--, jamais ter frequentado a sinagoga não fez de mim um assassino ou estuprador.

Um ateu que não é assassino ou estuprador? Legal. Vou desconsiderar esse começo infeliz, em respeito ao restante do texto que, apesar dos tais erros lógicos, nos oferece pensamentos mais elevados.
As relações que travei com gente religiosa no curso da vida foram no geral muito boas. Tenho grande estima por muitas dessas pessoas.

Comentário estranho. O que ele esperava? Assassinos e estupradores? Melhor seguir...
Espero, com essas declarações, descartar as elucubrações daqueles leitores que atribuíram o caráter levemente ateu de minha coluna da semana passada a um trauma religioso ou algo parecido.

Ah, ok. Explicado.
Aproveito o ensejo para desculpar-me por não ter respondido a todos os e-mails que recebi, como exigiria a boa educação. O volume de mensagens gerado, entretanto, tornava a tarefa quase impossível. Pretendo hoje, no atacado, fazer o que não consegui no varejo.

Só por falar e demonstrar boa educação, já o vejo com bons olhos. E não precisam me lembrar que ele dispensa minha aprovação, blá, blá, blá. Eu sei, eu sei. Estou só comentando.
Antes, porém, mais uma preliminar: não pretendi ofender ninguém com as passagens mais jocosas do texto anterior. Pessoas, de todos os credos e cores, têm o meu respeito, mas só as pessoas, não seus pensamentos.

Isso é muito confuso. Talvez seja apenas um defesa pronta, sem corresponder à verdade. Sei lá. Já vi esse tipo de argumento ser usado aqui no RV. Como se pode respeitar alguém, e não seus pensamentos? O que sobra do homem, subtraindo-lhe seus pensamentos, suas idéias? Um assassino ou estuprador chegou a esse ponto por ter bons pensamentos? Não foram exatamente seus maus pensamentos que o levaram a essa condição? A ser verdadeiro o que disse o autor, ele respeitaria a pessoa de um assassino, mas não suas idéias. Estou exagerando, mas com o intuito de expor o elo fraco dessa idéia que, a meu ver, é bastante incoerente. Posso finalizar dizendo que “somos o que pensamos”. Daí que não é possível dissociar uma coisa da outra.

Em off: escrever isso me fez lembrar dos desafios criados pelo Res Cogitans. Eram momentos muito bons, onde nossos valores eram testados e tínhamos que rever nossos conceitos. Res, se estiver lendo isso, por favor, traga-nos novamente suas construtivas idéias. Fazem falta.
Uma idéia tola é tola não importa quem a tenha proferido. Num passado não tão longínquo, a noção de que pecadores deveriam ser queimados vivos para "salvar" suas "almas imortais" pareceu respeitável a boa parte da humanidade. Felizmente, a tese foi contestada e as ações que provocou são hoje contadas como mais um crime das religiões. Temos, portanto, excelentes motivos para questionar todas as teorias, doutrinas e sistemas que se nos apresentam. Nenhum idéia é sagrada demais para ficar ao abrigo do escrutínio da razão.

Concordo cem por cento. Reforço, apenas, que seria muito bom se todas as idéias, absolutamente todas, fossem escrutinadas pela razão.
E isso nos leva a uma das questões levantadas pelo leitorado: é impossível provar que Deus não existe, de modo que o ateísmo não passa, como as religiões, de uma crença. Reconheço que não conseguimos demonstrar para além de qualquer dúvida seja a existência ou a inexistência de um ente supremo. Mas podemos levar a sérios as teses dos teólogos e, tomando-as como hipóteses científicas, estimar sua probabilidade ou pelo menos verossimilhança.

Aqui fica difícil, muito difícil. Lembro-me de algumas cerimônias de canonização, transmitidas pela TV. O Papa dizia algo como “fulano de tal (nome do santo) está agora ao lado de Deus”. Incrível, não? Como um homem tem esse poder? Como um homem pode promover alguém a uma condição – supondo verdadeira – muito mais elevada que a sua? E se o Papa não dissesse essas palavras, o cara não seria santo? Deus não tem nada a ver com isso? Eu nunca vou entender essas propostas onde Deus, sua existência ou inexistência, sua vontade, seja lá mais o que for, passem pela aprovação humana. O cientista fulano de tal (de preferência um nome pomposo) concluiu que é improvável. Beleza, então é.

Bem, o João da Silva concluiu o contrário. E, segundo o Da Silva...
Bem, quais são as chances de uma pessoa nascer sem que sua mãe tenha mantido relações sexuais? Não são zero, mas são relativamente baixas. Ressurreição? Ainda menores. E quanto à união hipostática, isto é, um indivíduo ter ao mesmo tempo natureza humana e divina, ou, colocando em outros termos, ser simultaneamente ele mesmo e também seu pai? Supondo que isso faça algum sentido, acho que é melhor nem tentar calcular.

Esse parágrafo restringe-se ao ideário cristão, o que, para mim, é uma limitação de quem tenta demonstrar a improbabilidade da existência de Deus. Mas essa é uma briga que eu não vou comprar, não aqui, depois de tudo o que eu já vi. Vamos voltar à lógica:

1 – Deus não existe. Ponto final. Tudo o que ele considerou como forte indício de inexistência confirmou-se.

2 – Deus existe. E? Qual a dúvida? Uma mulher não pode engravidar sem sexo, se Deus assim o quiser? Um morto não pode voltar a viver, se Deus assim o quiser? Etc, etc, etc...

Vejam bem, eu não estou defendendo o texto bíblico, de onde o autor buscou esses exemplos. Gostaria muito, aliás, de nunca precisa fazer essas ressalvas, mas elas serão sempre necessárias, infelizmente. Não fiz, sequer, afirmação de que Deus existe (muito embora isso seja, para mim, nada menos que realidade). Espero ter sido claro.
Passemos à escatologia. O catecismo 1.052 da Igreja Católica ensina que no dia da ressurreição as almas das pessoas mortas "na Graça de Cristo" serão novamente unidas a seus corpos. Não sou um patologista, mas parecem-me remotas as chances de reutilizar corpos mortos às vezes milhares de anos atrás. Pelo que sabemos, os átomos que compunham essas carcaças já terão se espalhado pela Terra e talvez até escapado de nossa atmosfera e viajado por onde nenhum homem jamais esteve.

Bom, perdoem-me os católicos, mas não dou a mínima ao que diz o catecismo 1.052, nem o 1.053, e nenhum dos anteriores ou posteriores. Mas o raciocínio aqui não é diferente do que eu acabei de defender, apesar de, particularmente, achar esse negócio de ressurreição das almas uma tremenda bobagem.

Vejam. Nada disso é importante. Naquelas tais buscas que eu tanto falava aos senhores, eu não pisei no assoalho desses templos, não abri as páginas de seus livros sagrados, não procurei por nenhum conceito preestabelecido. Descobri que é possível obter resultados, longe dessa babel religiosa. E nem estou vendendo esse peixe agora. A única tecla que estou martelando é: havendo um Deus, é tolice supor que isso ou aquilo Lhe seria impossível.

O ponto falho nessa linha de argumentação, é que ela tenta demonstrar a inverosimilhança da hipótese Deus, através da ridicularização de fenômenos ditos sobrenaturais, posto que os mesmos contrariam os conceitos científicos. Ora, os tais fenômenos só seriam possíveis, EXATAMENTE, se sustentados pela existência desse Ser. O argumento fica circular e infantil. Não sei se consegui ser claro.
E o que pensar da reencarnação defendida por espíritas, hinduístas e budistas? Uma parte de nós (alma) que nem sequer é parte, porque não tem matéria, voa por aí penetrando corpos e definindo a essência de seres humanos e às vezes também de outros animais e vegetais antes mesmo de eles nascerem? Que tipo de informação pode o imaterial carregar?

Taí duas coisas que eu nunca vi: alma voando por aí e penetrando corpos. A não ser que ele se refira às possessões, demoníacas ou não, tipo aquela do filme O Exorcista. Bom, sobre isso deixo a palavra para os espíritas. Sou leigo demais para dar pitaco. Mas, essa confusão que ele faz com alma, essência humana, animais e vegetais, demonstra que ele é mais leigo do que eu.

E quem disse que a alma é imaterial? Segundo estudos do Professor Da Silva (o mesmo que eu citei antes), a alma possui matéria, sim. Sutil, mas não deixa de ser matéria. Ah, não me peçam provas. O Dr. Da Silva me disse tudo isso, mas não deixou nada por escrito para comprovar seus estudos. (desculpem a brincadeira).
Receio que nenhuma dessas ideias pare em pé senão como manifestações do tal cérebro espiritual ao qual aludi na semana passada.

Essa parte eu perdi. E acho que não perdi muita coisa. Não estou desdenhando do autor, juro. Mas “cérebro espiritual” é bastante desencorajador.
Alguns leitores me perguntaram porque sempre falo de religião. Já que não creio em Deus, dizem, eu deveria calar sobre o assunto. Minhas reiteradas recaídas no tema indicariam uma vontade secreta de converter-me. "Non sequitur".

Bobagem dos leitores. Concordo.
Meu interesse pela matéria tem caráter sobretudo científico-antropológico. A religião é um fenômeno interessantíssimo. É a única matriz de pensamentos que leva pessoas inteligentes e normalmente racionais a agir como crianças à espera de Papai Noel na noite de 24 de dezembro.

Que a religião é um fenômeno interessantíssimo, isso não se discute. O restante do pensamento não expressa nada além do que preconceito. Nesse conceito ao qual ele se agarra, suas convicções a respeito de Deus são verdadeiras, contrariando suas próprias palavras no começo do texto, onde ele aceita que a inexistência ainda não foi provada.

Em debates anteriores, quanto eu dizia algo parecido, sempre aparecia alguém com a formidável pergunta: “ah, então só porque ninguém provou a inexistência, Deus existe?”. E onde foi que eu disse isso? Estou perguntando apenas, se o próprio autor reconhece que essa não é uma questão resolvida, encerrada, o que dá a ele suporte para afirmar que bilhões de seres humanos estão errados? Sua opinião pessoal é assim tão valiosa?
E acrescento que as chances de haver um velhote que se veste de vermelho e distribui presentes a bordo de um trenó puxado por renas voadoras parecem significativamente maiores do que as de existir uma inteligência infinita que criou o Universo e se interessa pelo destino individual de cada um dos 7 bilhões de terrestres, aos quais conhece desde criancinhas e de quem exige que não trabalhem aos sábados.

Desconsiderando a bobagem relativa ao sábado, o resto dessa afirmação é tão absurdo que não comporta comentários.

Ok. Muitos aqui discordam de mim, certo? Não é absurdo? A existência de Deus ou de um velhinho voando em um trenó puxado por renas estão no mesmo nível? Beleza. Grande argumento. Não vou dispensar tempo a tamanho devaneio. Podem considerar como fuga. Não importa.
De minha parte, não tenho a pretensão nem o desejo de convencer ninguém a abandonar o seio de sua religião. Imagino que muitos estejam perfeitamente felizes onde estão. Tampouco considero todos os fiéis imbecis apenas por acreditarem. Podem até sê-lo, mas por outras razões. Ao que tudo indica, a fé religiosa tem base neurológica. Ela faria parte de uma rede de ativações neuronais que é independente das conexões do cérebro racional. Pedir para a alguém que abandone suas convicções religiosas ou espirituais não faria muito sentido. "Mutatis mutandis", seria como cobrar de uma pessoa que não sinta emoções como raiva, nojo etc. É algo que não está em seu poder fazer.

Quando o argumento possui uma básica lógica, dá para discutir. Aqui ele volta para aquela coisa de “cérebro espiritual”. Tudo não passa de ativações neuronais, conexões, impulsos eletroquímicos, e um monte de outras terminologias que devem fazer tão bem ao “cérebro ateu”, quanto fé, milagre, graça, paraíso fazem ao “cérebro religioso”. Vamos deixar como está. O autor não tem a pretensão de convencer ninguém a abandonar sua religião e eu não tenho a pretensão de convencer ninguém a abandonar essas idéias.
Poder-se-ia ver aí mais um argumento para eu desistir de vez de falar de religião. Ocorre que os cérebros racional e espiritual, embora independentes, podem relacionar-se. Eles, afinal, fazem parte da mesma massa encefálica. A razão por si só não vai me fazer parar de sentir medo, mas pode perfeitamente contribuir para modular esse tipo de sensação. Não vamos deixar de temer tudo, mas, com o recurso a terapias de extinção de fobia ou mesmo a drogas, podemos nos livrar de certos medos irracionais.

De modo análogo, o exame crítico das religiões pode servir para que as pessoas percebam que sua espiritualidade é algo mais genérico do que os rituais e condicionamentos de uma determinada igreja. Embora a busca pela transcendência esteja se expressando numa religião em particular, as especificidades deste ou daquele credo não são tão importantes. Pode parecer meio bobo até, mas é um ponto fundamental para que se construa uma religiosidade mais tolerante.

Bem, aqui ele está dando, meio que... um conselho, através da observação de que os ritos são menos importantes do que o que realmente se busca numa igreja. Concordo com ele. Tanto assim que dispensei todas elas.
Não devemos, é claro, nutrir ilusões. Homens sempre se mataram e provavelmente sempre se matarão. Se não for pelo Deus para o qual se reza, será pela cor da pele, pelas ideias políticas ou sabe-se lá o quê. Mas mesmo essa tendência irrefreável à barbárie pode ser modulada pela razão. A humanidade é hoje menos violenta do que foi no passado. Quanto menos pretextos tivermos para assassinar o próximo, melhor.

Aqui ele disse tudo. Homens sempre se mataram e sempre se matarão. Não me perguntem porquê. Essa lição eu ainda não termnei. O fato é que o homem vai usar Deus, futebol, mulher, jogo de bolinha de gude, e qualquer outra desculpa para assassinar o próximo. Não existem guerras santas. São todas humanas.

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 31 Jul 2009, 21:29
por Apo
Há um senão importantíssimo que diferencia religiões, religiosos e pessoas "comuns".
Pessoas "comuns" não saem por aí pregando moral de cuecas. Não se autoproclamam libertas por serem filhas deste ou daquele ser todo poderoso. Não se beneficiam de uma suposta sabedoria enviada do além que os permite se manterem na linha ( mesmo não se mantendo a maior parte do tempo, pois comuns é que são, como todos os outros mortais ), ficando blindados contra quaisquer tentações ( mesmo admitindo que se sintam tentados, ou não seriam tentações ).

Isto é só a ponta do senão. Mas todo mundo sabe o resto. Desnecessário citar, ou podem se ofender e eu posso ser excomungada de onde nunca tive interesse em pertencer.

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 01 Ago 2009, 13:50
por Fernando Silva
Avatar escreveu:Já vi esse tipo de argumento ser usado aqui no RV. Como se pode respeitar alguém, e não seus pensamentos? O que sobra do homem, subtraindo-lhe seus pensamentos, suas idéias?

Este é um ponto complicado. Se você critica as idiotices de uma pessoa, critica indiretamente a pessoa que se agarra a elas.
Mas há uma ressalva: pessoas se enganam, pessoas têm certas opiniões porque nunca pararam para pensar a respeito etc.

Eu já fui católico. Será que eu era um idiota e agora não sou mais?
Depois de exposto à lógica, eu mudei de opinião. O que eu devo pensar de pessoas que se agarram a coisas que eu acho que são idiotas depois que eu lhes apresentei uma refutação que me parece lógica e elas dizem apenas coisas do tipo "você tem que ter fé" ou "eu sei que a minha religião é a única verdadeira" ?

Tudo bem, não vou chamar essas pessoas de idiotas, mas ...

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 01 Ago 2009, 16:21
por Ayyavazhi
Fernando Silva escreveu:Este é um ponto complicado. Se você critica as idiotices de uma pessoa, critica indiretamente a pessoa que se agarra a elas.

Exatamente. E talvez nem seja assim tão indiretamente. O pensamento de um homem não é uma questão periférica, onde se possa desferir um golpe contra um sem atingir, ou atingindo levemente o outro.
Fernando Silva escreveu:Mas há uma ressalva: pessoas se enganam, pessoas têm certas opiniões porque nunca pararam para pensar a respeito etc.

Corretíssimo.
Fernando Silva escreveu:Eu já fui católico. Será que eu era um idiota e agora não sou mais?
Depois de exposto à lógica, eu mudei de opinião. O que eu devo pensar de pessoas que se agarram a coisas que eu acho que são idiotas depois que eu lhes apresentei uma refutação que me parece lógica e elas dizem apenas coisas do tipo "você tem que ter fé" ou "eu sei que a minha religião é a única verdadeira" ?

Bem, aqui chegamos ao ponto onde, provavelmente, nunca iremos concordar. Veja, eu não associo Deus e religião. Religião é, por assim dizer, um amontoado de dogmas e ritos que o homem acredita o levará mais próximo a Deus. Religião é uma estrada cheia de falhas, posto que foi construída e mantida por seres igualmente falhos. Você, observando essas falhas, concluiu que Deus não existe. Eu, conclui que o homem jamais me daria as respostas que eu buscava. Foi o que me fez abandonar idéias prontas, antigas, e empreender minha própria jornada.

E, Fernando, quando eu digo “você observou os erros dos homens e concluiu que Deus não existe”, não estou subestimando tudo o que você viveu (e só você sabe) e que o levou às conclusões que hoje norteiam sua existência. É como condensar toda uma história que eu não conheço, em um pequeno resumo que posso, como alguma margem de acerto, inferir. Quero dizer que há uma lógica em pensar que suas conclusões são fruto de observações e análises, mesmo que reforçadas por experiências que vivem apenas em suas lembranças. O mesmo ocorre comigo, mas caminhei em direção oposta.

Voltando a falar dos religiosos, sim, é difícil, talvez impossível, demovê-los de suas idéias. São correntes que não podem ser quebradas com argumentos. A fé é um elemento sutil, mas poderoso, que preenche todas as lacunas deixadas pela imperfeição dos dogmas e das crendices. Se isso é ou não idiotice, acho que a questão é complexa demais para ser esboçada por meia dúzia de opiniões. Observo, apenas, e aprendo sempre.

Fernando Silva escreveu:Tudo bem, não vou chamar essas pessoas de idiotas, mas ...

Essa é uma decisão muito pessoal. Na postagem anterior eu não fiz qualquer menção ao respeito que se deve ou não ter com religiosos, ou com quaisquer outros grupos. Isso não é relevante, no momento. O ponto, único, é: Se eu digo que suas idéias são idiotas, estou afirmando o mesmo de você. Ao que tudo indica, nós concordamos nesse aspecto.

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 01 Ago 2009, 17:14
por docdeoz
Fernando Silva escreveu:
docdeoz escreveu:Sobre a ressurreição devo esclarecer que Stephen Hawking perdeu uma aposta- nem um buraco negro destrói a informção- ela fica por aí alhures e não tenho cabedal para entender...

O que tem a ressurreição a ver com o buraco negro?
Alma é espírito e buraco negro é matéria.
Buracos negros engolem almas?

Isso indica que a ressurreição não é uma impossiblidade física...l

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 01 Ago 2009, 17:15
por docdeoz
Alma não é espírito na minha crença, não com as conotações divinas de imortalidade...

Re: Enquadrando Deus - Hélio Schwartsman

Enviado: 01 Ago 2009, 17:51
por Apo
docdeoz escreveu:Alma não é espírito na minha crença, não com as conotações divinas de imortalidade...


Interessante como há várias opções sobre a natureza do que dizem ser a verdade. Como pode?
Será que cada um tem uma crença baseado no que pensa ser o seu espírito e a sua alma? Será que uns têm alma e outros espírito? Será que alguns têm os dois numa só coisa, sendo que uns são imortais e outros não? Será que a gente é imortal ou mortal apenas por opção?

Fico impressionada com as certezas humanas e a diversidade das existências.
Deus é mesmo um cara criativo.