Cambistas e o direito de propriedade

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Apo
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Re: Cambistas e o direito de propriedade

Mensagem por Apo »

Já pensei muito na questão, emocionalmente, friamente, eticamente e mercadologicamente.
A figura do atravessador é muito mal vista mesmo em sistemas de livre mercado. Mas a cadeia produtiva toda, salvo exceções acaba por contar com atravessadores sempre ( só que são chamados de revendedores, ou distribuidores ou algo não pejorativo) só que selecionados e contratados para tal pelo último elo da cadeia, seja a indústria ou qualquer um que produza e não queira distribuir e nem vender direto ao público.

A meu ver, o problema com o que chamamos de atravessador ou cambista, é quando ele adquire grandes lotes do produto assim que ou até antes de ser colocado à venda, impelindo o consumidor final a pagar muito mais pelo que não estaria disposto. Lembro de alguns shows e partidas de futebol em que as bilheterias estavam fechadas já poucas horas depois, pois tinham vendido quase tudo para cambistas. O que deixava as pessoas muito brabas, pois a notícia era a seguinte: está tudo na mão dos cambistas.
Parece que depois disto há algum tipo de acordo com percentuais a serem vendidos para cambistas devidamente cadastrados. Mas não sei detalhes.


O consumidor que paga por um produto muito mais do que o preço de custo + margem de lucro ( padrão ao cobrado normalmente), está mostrando que está disposto a elevar preços a um patamar que talvez inviabilize aos demais compradores a aquisição num próximo evento. Mas o mercado reagiria não comprando e ninguém tem interesse em inviabilizar negócios.

Seria como ir a um supermercado que anuncia uma promoção de um produto, comprar todo o estoque e montar uma lojinha em frente ao varejo para revender o estoque por muito mais que o valor tido como justo e já com lucro embutido. O cliente compraria se aquele produto fosse o único, como é no caso de um evento?

Logo, voltamos ao ponto: se o mercado aceita uma máfia que inflaciona os preços, não vejo por que o Estado deva se meter.

Hoje em dia é comum que amigos comprem pequenos lotes de entradas em shows para revender em escolas ou para amigos que querem conforto, mesmo pagando um pouquinho mais. Na verdade, os realizadores de shows e festas bonificam com alguns ingressos quando alguém conhecido compra um lote antecipado. E na outra ponta, compra deles quem quer.
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user f.k.a. Cabeção
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Re: Cambistas e o direito de propriedade

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »


O seu direito de entrar no espetáculo não necessariamente é transferível.

Você contratou com uma empresa um espaço mas se nos termos desse contrato estava estabelecido que você não estaria autorizado a revender esse direito, ou ao menos não com fins comerciais (i.e. com um preço mais alto do que aquele que você pagou), ao operar como cambista você estará violando um contrato.

Se esse tipo de contrato é ou não viável, é algo que pode ser discutido, mas em princípio não há nada de errado ou de incompatível com a noção de propriedade privada.

A única propriedade privada é o estabelecimento e a produção do espetáculo, os ingressos são contratos determinando a prestação de um serviço, e como contratos eles podem ser intransferíveis a priori.

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Apo
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Re: Cambistas e o direito de propriedade

Mensagem por Apo »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
O seu direito de entrar no espetáculo não necessariamente é transferível.

Você contratou com uma empresa um espaço mas se nos termos desse contrato estava estabelecido que você não estaria autorizado a revender esse direito, ou ao menos não com fins comerciais (i.e. com um preço mais alto do que aquele que você pagou), ao operar como cambista você estará violando um contrato.

Se esse tipo de contrato é ou não viável, é algo que pode ser discutido, mas em princípio não há nada de errado ou de incompatível com a noção de propriedade privada.

A única propriedade privada é o estabelecimento e a produção do espetáculo, os ingressos são contratos determinando a prestação de um serviço, e como contratos eles podem ser intransferíveis a priori.



A priori, algo só pode ser classificado como intransferível se for nominal. O tal "contrato" inexiste, assim me parece...
Caso contrário, documentos que dão direito a uso de bens e serviços não teriam identificação do contratante, pois o "contrato" entre as partes seria considerado "contrato" apenas se no documento constasse um simples frase dizendo: pessoal e instransferivel. Não é assim que as coisas funcionam. Além do documento, e caso não haja identificação por foto ou digital, é necessário apresentar comprovante de que o portador é o contratante inicial.

Mas qual a diferença entre entrar num espetáculo e usar uma máquina comprada no varejo? Por que deve-se obrigar a pessoa que comprou a entrar no show se ela não quiser, e outra pessoa pode ir no lugar dela?

Quando uma pessoa vai à bilheteria e compra ingressos para alguns amigos, o que interessa se ela negociar com os amigos pelo "serviço" prestado? Ninguém tem nada a ver com isto.

E se eu quiser presentear alguém ou fazer filantropia, doando ou cobrando metade do valor? Daí pode?
Acho que a questão acaba sendo moral mesmo e sempre de cunho financeiro. Ganhar dinheiro não pode, perder, daí é problema meu.
Posso usar o plano de saúde 1 vez por ano, mesmo pagando o correspondente a muito mais do que isto, mas não posso deixar que outra pessoa use em meu lugar pois seria considerado quebra de contrato.

Desculpa a confusão na escrita, mas sábado de manhã eu inexisto. :emoticon12:
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Herf
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Re: Cambistas e o direito de propriedade

Mensagem por Herf »

user f.k.a. Cabeção escreveu:
O seu direito de entrar no espetáculo não necessariamente é transferível.

Você contratou com uma empresa um espaço mas se nos termos desse contrato estava estabelecido que você não estaria autorizado a revender esse direito, ou ao menos não com fins comerciais (i.e. com um preço mais alto do que aquele que você pagou), ao operar como cambista você estará violando um contrato.

Mas aí o "cambicismo" em si não seria uma violação de contrato, pois este seria um contrato à parte entre o cambista e o comprador, sobre o qual o vendedor primário dos ingressos não poderia interferir. O máximo que este poderia fazer seria criar meios para impedir que um comprador de segunda mão entrasse no evento e para impedir que uma única pessoa compre mais de um ingresso (ingressos nominais, por exemplo).

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zumbi filosófico
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Mensagem por zumbi filosófico »

Apo escreveu:
user f.k.a. Cabeção escreveu:
O seu direito de entrar no espetáculo não necessariamente é transferível.

Você contratou com uma empresa um espaço mas se nos termos desse contrato estava estabelecido que você não estaria autorizado a revender esse direito, ou ao menos não com fins comerciais (i.e. com um preço mais alto do que aquele que você pagou), ao operar como cambista você estará violando um contrato.

Se esse tipo de contrato é ou não viável, é algo que pode ser discutido, mas em princípio não há nada de errado ou de incompatível com a noção de propriedade privada.

A única propriedade privada é o estabelecimento e a produção do espetáculo, os ingressos são contratos determinando a prestação de um serviço, e como contratos eles podem ser intransferíveis a priori.



A priori, algo só pode ser classificado como intransferível se for nominal. O tal "contrato" inexiste, assim me parece...
Caso contrário, documentos que dão direito a uso de bens e serviços não teriam identificação do contratante, pois o "contrato" entre as partes seria considerado "contrato" apenas se no documento constasse um simples frase dizendo: pessoal e instransferivel. Não é assim que as coisas funcionam. Além do documento, e caso não haja identificação por foto ou digital, é necessário apresentar comprovante de que o portador é o contratante inicial.


No caso de outros bens e serviços a identificação pode ser mais necessária. Para o caso de ingressos, o que quer que haja de aviso expresso já deve ser considerado suficiente.


Mas qual a diferença entre entrar num espetáculo e usar uma máquina comprada no varejo?


As condições de compra que o vendedor acredita serem convenientes.


Por que deve-se obrigar a pessoa que comprou a entrar no show se ela não quiser, e outra pessoa pode ir no lugar dela?


Não sei nada sobre se obrigar a alguém que comprou a ir no evento. Acho que uma pessoa pode muito bem comprar um monte de ingressos e distribuir de graça para quem quiser e nunca aparecer lá.


Quando uma pessoa vai à bilheteria e compra ingressos para alguns amigos, o que interessa se ela negociar com os amigos pelo "serviço" prestado? Ninguém tem nada a ver com isto.


Se você promove um evento ou qualquer coisa com ingressos, pode, por diversas razões, considerar prejudicial que eles sejam vendidos a preços diferentes daqueles que você já considerava ideais, e então ter como condição de venda que não se pode revendê-los.


Acho que a questão acaba sendo moral mesmo e sempre de cunho financeiro. Ganhar dinheiro não pode, perder, daí é problema meu.


Quem não acha um bom negócio comprar ingressos que não podem ser revendidos, que não compre.

Se você estivesse por trás de qualquer evento, e considerasse que pudesse perder dinheiro com por causa dos cambistas, mas fosse de alguma proibida por lei de estipular como condição de venda a impossibilidade de revenda, diria também algo como "ganhar dinheiro com o meu trabalho todo mundo pode, mas se eu perder, aí é problema só meu".
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Trancado