A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

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Res Cogitans
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A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Res Cogitans »

A metáfora espírita da antena para relação mente corpo é mais ou menos esta:

O cérebro é uma espécie de equipamento que “recebe os sinais” enviados pelo o espírito. Somente o espírito é dotado consciência, inteligência, moral e intencionalidade. O cérebro é um mero instrumento do espírito.

Casos de degeneração moral e intelectual bastante estudados são menosprezados pelos espíritas como provas de importância do cérebro na causação dos nossos estados mentais.

Para os espíritas, o que ocorre seria análogo a um rádio quebrado, apesar do sinal estar perfeito o instrumento não funciona bem, como resultado você tem um som ruim.

O problema dessa abordagem é para que ela fosse verdadeira teríamos que satisfazer a seguinte condição:

O espírito tem a intenção de fazer X porém seu cérebro faz ~X.

Só que a experiência subjetiva nos diz outra coisa:

Não só fazemos ~X, como temos a intenção de fazer ~X. Como, segundo o próprio espiritismo, a “matéria” não pode ser dotada de intencionalidade e consciência própria temos um grande problema.

Como a ÚNICA pessoa para quem eu apresentei este problema e o entendeu de primeira foi o Manuel/Azathoth, segue uma transposição didática:

Digamos que Martin Luther Gandhi Betinho de Calcutá, que é uma cara gente boa, sofra um acidente cerebral parecido com o de Phineas Gage, a partir de então se torne um completo canalha. Pelos pressupostos do espiritismo, o espírito gente boa do Martin Luther Gandhi Betinho de Calcutá está enviando ‘sinais’ para ações positivas mas o receptor deficiente está interpretando as ações de maneira errada. Só que esta não é a experiência subjetiva do Martin, ele não só faz canalhices como QUER FAZER canalhices. Ele não tem a experiência subjetiva de querer fazer algo bom e seu corpo sair de controle, se essa é a experiência subjetiva que seu espírito tem então ele não é mesma pessoa que seu espírito.
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

*Deus deixou seu único filho morrer pendurado numa cruz, imagine o que ele fará com você.

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Fernando Silva
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Fernando Silva »

Res Cogitans escreveu:Ele não tem a experiência subjetiva de querer fazer algo bom e seu corpo sair de controle, se essa é a experiência subjetiva que seu espírito tem então ele não é mesma pessoa que seu espírito.

Verdade. O espírito tem uma mente complexa, resultado da experiência e da visão do universo acumuladas em "trocentas" reencarnações neste planeta e em outros.

Quando ele se encarna num Zé Mané qualquer, ele será, enquanto viver, uma pessoa limitadíssima em relação ao que era enquanto espírito. Suas ações serão as dessa pessoa limitadíssima, talvez com um modo de pensar inteiramente oposto ao seu.

Se ainda por cima sofrer um dano cerebral, pode mudar mais ainda e passar a fazer coisas que aumentarão sua dívida, em vez de reduzi-la, o que seria uma "retrogradação", que os espíritas dizem que não acontece.

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Res Cogitans
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Res Cogitans »

Fernando Silva escreveu:Verdade. O espírito tem uma mente complexa, resultado da experiência e da visão do universo acumuladas em "trocentas" reencarnações neste planeta e em outros.

Quando ele se encarna num Zé Mané qualquer, ele será, enquanto viver, uma pessoa limitadíssima em relação ao que era enquanto espírito. Suas ações serão as dessa pessoa limitadíssima, talvez com um modo de pensar inteiramente oposto ao seu.

Se ainda por cima sofrer um dano cerebral, pode mudar mais ainda e passar a fazer coisas que aumentarão sua dívida, em vez de reduzi-la, o que seria uma "retrogradação", que os espíritas dizem que não acontece.


E se isso fosse verdade, várias propagandas espíritas de "vida após a morte" simplesmente ficam sem sentido. Porque não é você que permanece após a morte e sim uma entidade completamente diferente.
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user f.k.a. Cabeção
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por user f.k.a. Cabeção »



Por que um espírita não pode dizer que o cérebro danificado também distorce a interpretação que você dá para as intenções do espírito, e não somente para as ações?

Tipo, o espírito continuaria bom, com a intenção de fazer X, mas o corpo interpretaria o sinal como a vontade de fazer Y.

Como um viciado, que pode honestamente querer parar de se drogar, num nível superior de consciência, mas no nível que governa sua ação imediata e prazer ele pode agir em contradição com o seu espírito.


[edit: palavras sublinhadas tinham sido engolidas e o texto estava sem sentido]
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Valdisnnei
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Valdisnnei »

Res Cogitans escreveu:E se isso fosse verdade, várias propagandas espíritas de "vida após a morte" simplesmente ficam sem sentido. Porque não é você que permanece após a morte e sim uma entidade completamente diferente.

Na verdade já existe um problema análogo a esse ao se tratar de uma unica vida.
Não só mudamos o tempo todo ao longo da vida, como em diferentes momentos, mesmo em um unico dia, podemos ser pessoas completamente diferentes.
Não temos toda a nossa "biografia" carregada de uma só vez na mente o tempo todo e ficamos sob influencia de diferentes "quimicas" ao longo do dia.

Quantas vezes não nos lembramos de algo que há muito tempo não pensávamos e nos espantamos por ainda lembrar disso? Ou quantas vezes nos surpreendemos e até nos envergonhamos de coisas que fizemos, quando, as vezes por paixão, tesão, medo, cansaço, ou por qualquer outra sensação, agimos de forma contraria a que esperávamos que normalmente faríamos.
Temos são múltiplas personalidade mutantes que se revezam no controle do corpo e que compartilham algumas lembranças dando a ilusão de unidade e identidade.

Não parece realmente existir "identidade" em vida, ao questionar a identidade no após morte esse problema não aumenta, só fica mais fácil visualiza-lo.
Para o problema que você levanta ser real, seria preciso antes de tudo existir uma identidade em vida.
Um nome metido como Walt Disney, no Brasil pode virar Valdisnei.
O motivo disso eu não sei, só sei que sou o NadaSei.

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Valdisnnei
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Valdisnnei »

Res Cogitans escreveu:A metáfora espírita da antena para relação mente corpo é mais ou menos esta:

O cérebro é uma espécie de equipamento que “recebe os sinais” enviados pelo o espírito. Somente o espírito é dotado consciência, inteligência, moral e intencionalidade. O cérebro é um mero instrumento do espírito.

Casos de degeneração moral e intelectual bastante estudados são menosprezados pelos espíritas como provas de importância do cérebro na causação dos nossos estados mentais.

Para os espíritas, o que ocorre seria análogo a um rádio quebrado, apesar do sinal estar perfeito o instrumento não funciona bem, como resultado você tem um som ruim.

O problema dessa abordagem é para que ela fosse verdadeira teríamos que satisfazer a seguinte condição:

O espírito tem a intenção de fazer X porém seu cérebro faz ~X.

Só que a experiência subjetiva nos diz outra coisa:

Não só fazemos ~X, como temos a intenção de fazer ~X. Como, segundo o próprio espiritismo, a “matéria” não pode ser dotada de intencionalidade e consciência própria temos um grande problema.
(...)

Sim, verdade.
E ainda fica faltando explicar o que ganha um espírito vitima dessa "falha" fruto do acaso, como podem existir essas falhas e como então podem os espíritos aprender e evoluir sem nunca regredir estando sujeitos a acasos de toda sorte.

Essa explicação sobre "defeitos" é muito problemática para ser conciliada ao resto da doutrina.
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Res Cogitans
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Res Cogitans »

Valdisnnei escreveu:Na verdade já existe um problema análogo a esse ao se tratar de uma unica vida.
Não só mudamos o tempo todo ao longo da vida, como em diferentes momentos, mesmo em um unico dia, podemos ser pessoas completamente diferentes.
Não temos toda a nossa "biografia" carregada de uma só vez na mente o tempo todo e ficamos sob influencia de diferentes "quimicas" ao longo do dia.

Quantas vezes não nos lembramos de algo que há muito tempo não pensávamos e nos espantamos por ainda lembrar disso? Ou quantas vezes nos surpreendemos e até nos envergonhamos de coisas que fizemos, quando, as vezes por paixão, tesão, medo, cansaço, ou por qualquer outra sensação, agimos de forma contraria a que esperávamos que normalmente faríamos.
Temos são múltiplas personalidade mutantes que se revezam no controle do corpo e que compartilham algumas lembranças dando a ilusão de unidade e identidade.

Não parece realmente existir "identidade" em vida, ao questionar a identidade no após morte esse problema não aumenta, só fica mais fácil visualiza-lo.
Para o problema que você levanta ser real, seria preciso antes de tudo existir uma identidade em vida.


O problema para uma única vida é muito mais sutil e complexo do que o abordado. Quando se deixa rígido demais o conceito de identidade não a encontraremos em lugal algum, acontece o mesmo com o conceito de liberdade. E a peça chave dessa diferença é a referência autobiográfica e a simultaneidade ou não dos pensamentos da cosnciência, porém isto não é o tema deste tópico embora eu mesmo trabalhe com a hipótese de que pensamentos emergem à consciência e não existe de fato um "eu que pensa" e sim a mera consciência de pensamentos que acessaram uma parte privilegiada de processamento cerebral, não preciso trabalhar com esta hipótese para este tópico, pois mesmo na concepção cartesiana padrão ainda ocorrerá a problema. Como a concepção cartesiana é a hipótese de trabalho de quase todas as religiões ocidentais não preciso elaborar mais a questão e até prefiro, pois é uma quebra de paradigma que dificilmente se dá através de posts em fóruns. Para consultar evidências significativas de hipótese em que acredito porém não formulei aqui ver Multiplicidade de Rita Carter.
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Apo
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Apo »

A pergunta que permanece é a mesma de sempre:

Para que serve um corpo que não obedece o espírito? Qual o propósito da criação de um mundo com corpos que se desgovernam, se os espíritos poderiam evoluir ou empacar em sua evolução no mundo espiritual?
Facinho: a DE é maluca e criou esta viagem toda porque não aceita que a vida humana é finita. Nasceu, se ferrou. Pronto.
Editado pela última vez por Apo em 21 Fev 2010, 19:43, em um total de 1 vez.
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Luis Dantas
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Luis Dantas »

A idéia da existência de um espírito, alma ou essência realmente é problemática. Ao ser apresentada como algo distinto de e com pouca relação com o corpo físico, ela acaba levando a conclusões absurdas na linha de que a pessoa é, faz e parece ser alguma coisa, mas "na verdade" pode ser outra completamente diferente do que se observa.

Aliás, se há algo que se pode concluir sobre o que alguma pessoa "realmente é" a partir da observação, é que não há uma estabilidade verdadeira nessa suposta essência pessoal. Nossos interesses, reações, estados emocionais são largamente definidos pelas circunstâncias específicas em que nos encontramos, a ponto de sermos praticamente outra pessoa devido a inúmeras influências. Por exemplo:

- intoxicação por álcool
- fadiga ou fome
- mudança de interlocutores ou de assuntos em uma conversa
- sensações olfativas (principalmente, mas não exclusivamente, de feromônios)

A idéia de que haja um espírito já é difícil de sustentar diante dessas constatações. Que ele seja capaz de reencarnar, mais ainda. E a de que por algum tipo de busca de "justiça" haja transporte de méritos ou deméritos de uma encarnação para outra, já é pura fantasia.
"Faça da tua vida um reflexo da sociedade que desejas." - Mahatma Ghandi
"First they ignore you, then they laugh at you, then they fight you, then you win." - describing the stages of establishment resistance to a winning strategy of nonviolent activism


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Edson Jr
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Re: A falha da metáfora da antena para relação mente-cérebro

Mensagem por Edson Jr »

Essa metáfora, tirando as considerações espíritas, é show de bola. Poderíamos aproveitar o tema para explorarmos outras idéias e possibilidades. Poderíamos, por exemplo, especular coisas do tipo percepção extra-sensorial. Por alguma razão o cérebro possui alguma modificação estrutural que o possilita captar frequência de um outro mundo ou universo, por exemplo. Claro seria tudo especulação, mas como diversão e exercício de imaginação é legal viajar nessas coisas.
"Três paixões, simples mas irresistivelmente fortes, governam minha vida: o desejo imenso de amar, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão pelo sofrimento da humanidade." (Bertrand Russel)

Trancado