Belo Monte será hidrelétrica menos produtiva e mais cara, dizem técnicosEles preveem que insegurança jurídica e ambiental vão complicar usina.
Leilão definiu grupo que tocará obra, formado por Chesf e construtoras.
Mariana Oliveira e Marília Juste
Do G1, em São Paulo
Xingu, Pará, será a usina que produzirá menos energia, proporcionalmente à capacidade de produção, e que terá maior custo para os investidores na comparação com outros empreendimentos de grande porte, em razão da intensidade dos impactos sociais e ambientais na região, na avaliação de especialistas na área consultados pelo G1.
Na terça (20), o governo realizou, em meio a uma batalha jurídica, o leilão que definiu o consórcio que fará a construção e venderá a energia de Belo Monte, o Norte Energia. O grupo é liderado pela Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), que tem 49,98% de participação, e mais oito empresas de construção e engenharia.
Após o leilão, algumas informações indicavam que a construtora Queiroz Galvão e a J. Malucelli pensavam em sair do consórcio, mas as empresas não confirmaram.
Embora tenha capacidade instalada de 11 mil MW, o que a tornará a segunda maior hidrelétrica do país, Belo Monte tem energia firme (que pode ser assegurada já prevendo os períodos de seca) de 4,4 mil MW, 40% da capacidade. Na maior usina do país, a binacional Itaipu, que tem 14 mil MW de capacidade, a energia firme representa 61%. Na segunda maior atualmente, Tucuruí - que perderá a posição para Belo Monte -, o percentual é de 49%.
A energia firme de Belo Monte é proporcionamente menor segundo dados do governo por conta das caracteríticas do Rio Xingu, cuja vazão fica bastante reduzida em épocas de seca. Para reduzir os impactos ambientais, Belo Monte não terá reservatório, será uma usina a fio d´água, ou seja, vai gerar energia conforme a quantidade de água existente no rio.
Em entrevista ao G1 no fim de março, Maurício Tolmasquim, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão do governo federal responsável pelo planejamento de energia, disse que o percentual menor de energia firme é um fator negativo. "Temos no Brasil um sistema interligado, onde uma usina complementa a outra. Uma hora chove mais no Sul, outra hora no Norte. Não se pode olhar números isoladamente", disse.
O Relatório de Impacto Ambiental (Rima) de Belo Monte diz que quando a hidrelétrica estiver cheia "vai ser possível guardar água nos reservatórios das usinas em outras regiões do país. Com os reservatótios cheios, essas usinas vão gerar mais energia quando Belo Monte estiver gerando pouca energia (na seca)".
Produtividade
Especialistas em energia elétrica destacam que Belo Monte é importante para atender ao crescimento da demanda de consumo prevista para os próximos anos, mas concordam que a produtividade da hidrelétrica é baixa.
Para o engenheiro Silvio Areco, da consultoria Andrade & Canellas, especializada em energia e com atuação direta em hidrelétricas, o percentual considerado bom para os investidores da energia firme em relação à capacidade instalada é de 55%.
"Se fizer uma relação entre a capacidade de gerar energia e a energia assegurada, a de Belo Monte é menor. Vai precisar instalar muito mais máquinas, mas vai produzir menos energia relativamente. Vai ter relativamente menos energia do que nas outras hidrelétricas e com preço similar", afirma Areco.
Areco afirma ainda que os custos para cumprir as condicionantes impostas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) para conceder a licença ambiental - que determina que o consórcio vencedor do leilão realize ações em prol da população e natureza local - podem ser mais altos do que os previstos.
O governo estima cerca de R$ 3 bilhões dos R$ 19 bilhões totais previstos para a construção. Especulações dão conta de que a obra total custe até R$ 30 bilhões.
"A usina está em um local longe e o primeiro problama é o acesso. Entra em território que não é reserva indígena, mas tem população indígena. Se conhece o terreno olhando de cima", acrescentou. Para o engenheiro, há muita coisa na construção da hidrelétrica que não se pode prever. "A complexidade disso é exatamente pelo porte da obra. Os problemas serão de magnitude e consequencias do porte da obra", afirma Areco.
O conhecimento dos problemas juntamente com o baixo preço estabelecido como máximo para o leilão pelo governo foram alguns dos motivos para as construtoras Camargo Corrêa e Odebrecht, que participaram dos estudos da hidrelétrica e conhecem melhor o local, desistirem de concorrer no leilão. Em nota, as construtoras afirmaram que não havia condições financeiras.
O preço máximo definido pelo leilão era de R$ 83 por MWh. O consórcio derrotado, formado pela Construtora Andrade Gutierrez, que também participou dos estudos da obra, ofereceu R$ 82,9 por MWh. O grupo vencedor, que entrou de última hora na disputa, ofereceu R$ 78.
Areco considerou que o valor é bem abaixo do que seria necessário para cobrir os gastos.
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