POVO OU PLEBE?
Enviado: 05 Fev 2006, 22:25
05.02, 14h56
por Maria Lucia Victor Barbosa, socióloga
Como é comum em ano de eleições, curiosas teorias vão surgindo para justificar ou não essa ou aquela candidatura. Assim, na medida em que se volta a cogitar sobre a possibilidade da reeleição do candidato-presidente que parecia perdida no fundo do poço dos escândalos de corrupção, sua possível vitória é prevista quando se diz, por exemplo: “ele ganha porque é a cara do povo”.
Esta idéia nada mais é do que a repetição do que disse o próprio Luiz Inácio em um de seus mais recentes comícios, pois ele se vangloriou de ter a cara do povo e não das pessoas da zona sul ou da Avenida Paulista. Naturalmente escapa ao presidente da República e aos que o imitam, que povo significa o conjunto dos indivíduos que habitam um determinado território nacional, sem distinção de classe, raça, cor, religião, riqueza ou pobreza.
Em todo caso, tanto o discurso populista do presidente quanto a imaginação dos analistas de plantão, que certamente confundem a categoria povo com indivíduos da classe mais baixa, esbarra num fato bastante singelo: somente na quarta tentativa o eterno candidato do PT logrou se eleger. Nas três campanhas anteriores, nas quais o discurso do petista causava medo aos grandes empresários, banqueiros e investidores, a maioria dos brasileiros também não se identificava com a retórica esquerdista e se recusou a por Lula lá por mais carismático e persuasivo que agora dizem ele ser. O eterno candidato do PT conseguia sempre 30% dos votos, porcentagem que englobava, menos seus ex-companheiros de macacão, e mais setores da classe média composta por professores e alunos universitários, a Igreja dita progressista, profissionais liberais, funcionários públicos, artistas, enfim, os grupos para os quais é politicamente correto ser de esquerda.
Somente na quarta campanha, Duda Mendonça, o marqueteiro oficial, operou prodígios. Ele vestiu o Lulinha de paz e amor com terno Armani, lhe ensinou a adoçar um pouco a voz e a moderar o discurso, sendo que a Carta ao Povo tranqüilizou o grande capital com a promessa de que nada mudaria. Só então a candidatura petista deslanchou.
Acrescente-se que o vice, José de Alencar, foi a garantia de que estava selada a união simbólica entre capital e trabalho, e na esteira daquele empresário vieram as Igrejas Evangélicas, notadamente a Igreja Universal, que somaram sua fé e força à CNBB em prol do candidato do PT. Quanto às FFAA, numa espécie de 64 às avessas, prestigiaram em grande parte com seu voto o candidato da esquerda movidos pela insatisfação com o governo anterior. Assim foi eleito Luiz Inácio com o apoio de gregos, troianos e baianos, sendo que uma parte respeitável destes não tinha cara de pobre nem de desvalido, muito pelo contrário.
Outra teorização interessante que vem surgindo é a seguinte: “Luiz Inácio vai ganhar porque o povo não se incomoda com corrupção”. Isso significa que estamos está mais para plebe, termo que expressa o sentido pejorativo de povo. Seríamos uma nação de corruptos, uma cleptocracia onde, como se costuma dizer, “quem não rouba é burro”. Aqui vigora a esperteza. A palavra de ordem é passar o outro para trás, é levar vantagem em tudo, é cultuar anti-heróis e antivalores.
Convenhamos que existe um quê de verdade nessa explicação. Ela é comprovada pela mentalidade do “rouba mais faz” que consagrou Adhemar de Barros. Golpes pequenos ou grandes acontecem rotineiramente na vida particular e na esfera pública, e estamos longe de ser uma meritocracia. Para agravar a situação no Brasil reina a mais perfeita impunidade, pois o que se pode esperar da aplicação justa da Lei quando o próprio presidente do Supremo Tribunal Federal julga com base em sua inclinação política do momento e não conforme a imparcialidade jurídica que o seu alto cargo requer?
Contudo, o “rouba, mas faz” não funcionou, pelo menos no caso do PT, quando muitos dos seus quadros foram eleitos nos níveis municipal e estadual, e mesmo quando o partido alcançou a presidência da República. Isso porque, a lendária retórica petista baseada na ostentação de serem eles éticos e puros, angariou votos dos eleitores que sentiam um grande cansaço cívico por conta do comportamento indesejável de vários integrantes da classe política, no Legislativo e no Executivo. Além do mais, quando os trabalhos das CPIs estavam no auge, pesquisas acusaram forte queda da popularidade do presidente Luiz Inácio e do seu governo.
Agora é esperar outubro para saber se o povo brasileiro se indigna com a corrupção ou se lhe é indiferente na medida em que também a pratica largamente. Essa atitude irá indicar se somos povo ou plebe. De todo modo, outros fatores irão interferir no sucesso ou não do candidato-presidente. Por enquanto existem apenas especulações.
www.diegocasagrande.com.br
por Maria Lucia Victor Barbosa, socióloga
Como é comum em ano de eleições, curiosas teorias vão surgindo para justificar ou não essa ou aquela candidatura. Assim, na medida em que se volta a cogitar sobre a possibilidade da reeleição do candidato-presidente que parecia perdida no fundo do poço dos escândalos de corrupção, sua possível vitória é prevista quando se diz, por exemplo: “ele ganha porque é a cara do povo”.
Esta idéia nada mais é do que a repetição do que disse o próprio Luiz Inácio em um de seus mais recentes comícios, pois ele se vangloriou de ter a cara do povo e não das pessoas da zona sul ou da Avenida Paulista. Naturalmente escapa ao presidente da República e aos que o imitam, que povo significa o conjunto dos indivíduos que habitam um determinado território nacional, sem distinção de classe, raça, cor, religião, riqueza ou pobreza.
Em todo caso, tanto o discurso populista do presidente quanto a imaginação dos analistas de plantão, que certamente confundem a categoria povo com indivíduos da classe mais baixa, esbarra num fato bastante singelo: somente na quarta tentativa o eterno candidato do PT logrou se eleger. Nas três campanhas anteriores, nas quais o discurso do petista causava medo aos grandes empresários, banqueiros e investidores, a maioria dos brasileiros também não se identificava com a retórica esquerdista e se recusou a por Lula lá por mais carismático e persuasivo que agora dizem ele ser. O eterno candidato do PT conseguia sempre 30% dos votos, porcentagem que englobava, menos seus ex-companheiros de macacão, e mais setores da classe média composta por professores e alunos universitários, a Igreja dita progressista, profissionais liberais, funcionários públicos, artistas, enfim, os grupos para os quais é politicamente correto ser de esquerda.
Somente na quarta campanha, Duda Mendonça, o marqueteiro oficial, operou prodígios. Ele vestiu o Lulinha de paz e amor com terno Armani, lhe ensinou a adoçar um pouco a voz e a moderar o discurso, sendo que a Carta ao Povo tranqüilizou o grande capital com a promessa de que nada mudaria. Só então a candidatura petista deslanchou.
Acrescente-se que o vice, José de Alencar, foi a garantia de que estava selada a união simbólica entre capital e trabalho, e na esteira daquele empresário vieram as Igrejas Evangélicas, notadamente a Igreja Universal, que somaram sua fé e força à CNBB em prol do candidato do PT. Quanto às FFAA, numa espécie de 64 às avessas, prestigiaram em grande parte com seu voto o candidato da esquerda movidos pela insatisfação com o governo anterior. Assim foi eleito Luiz Inácio com o apoio de gregos, troianos e baianos, sendo que uma parte respeitável destes não tinha cara de pobre nem de desvalido, muito pelo contrário.
Outra teorização interessante que vem surgindo é a seguinte: “Luiz Inácio vai ganhar porque o povo não se incomoda com corrupção”. Isso significa que estamos está mais para plebe, termo que expressa o sentido pejorativo de povo. Seríamos uma nação de corruptos, uma cleptocracia onde, como se costuma dizer, “quem não rouba é burro”. Aqui vigora a esperteza. A palavra de ordem é passar o outro para trás, é levar vantagem em tudo, é cultuar anti-heróis e antivalores.
Convenhamos que existe um quê de verdade nessa explicação. Ela é comprovada pela mentalidade do “rouba mais faz” que consagrou Adhemar de Barros. Golpes pequenos ou grandes acontecem rotineiramente na vida particular e na esfera pública, e estamos longe de ser uma meritocracia. Para agravar a situação no Brasil reina a mais perfeita impunidade, pois o que se pode esperar da aplicação justa da Lei quando o próprio presidente do Supremo Tribunal Federal julga com base em sua inclinação política do momento e não conforme a imparcialidade jurídica que o seu alto cargo requer?
Contudo, o “rouba, mas faz” não funcionou, pelo menos no caso do PT, quando muitos dos seus quadros foram eleitos nos níveis municipal e estadual, e mesmo quando o partido alcançou a presidência da República. Isso porque, a lendária retórica petista baseada na ostentação de serem eles éticos e puros, angariou votos dos eleitores que sentiam um grande cansaço cívico por conta do comportamento indesejável de vários integrantes da classe política, no Legislativo e no Executivo. Além do mais, quando os trabalhos das CPIs estavam no auge, pesquisas acusaram forte queda da popularidade do presidente Luiz Inácio e do seu governo.
Agora é esperar outubro para saber se o povo brasileiro se indigna com a corrupção ou se lhe é indiferente na medida em que também a pratica largamente. Essa atitude irá indicar se somos povo ou plebe. De todo modo, outros fatores irão interferir no sucesso ou não do candidato-presidente. Por enquanto existem apenas especulações.
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