03/02/2011, às 5:27
O silêncio de Dilma é a sinfonia que se propaga no vácuo da política
O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva aviltou de tal modo o decoro da Presidência da República, inclusive e muito especialmente para fazer a sua sucessora, que, agora, o simples fato de ELA não ser ELE confere à atual mandatária uma aura de superior delicadeza com as instituições. Se Lula estava sempre pronto a proferir um impropério qualquer contra a lógica, a história, a ciência e até a boa educação, Dilma faz de seu silêncio uma melodia que desafia as leis da física do poder e se propaga no vácuo da política. A estratégia marqueteira para criar a rainha da Inglaterra está, sem dúvida, dando certo. Dona Dilma Primeira, a Muda, é muito elogiada por todas as coisas que não diz. Não deixa de ser um feito notável. Candidata beneficiária da bravata, da bazófia e da mistificação buliçosas e altissonantes, a agora presidente se beneficia do mutismo.
Mas ela também fala de vez em quando, como fez ontem no Congresso. E como! Um discurso enorme (íntegra aqui), sobre o qual já escrevi alguns posts. E o que foi que ela disse de relevante? Nada! O que se viu ali foi um desfile de intenções, sem eixo nem prioridade. Parecia estar disputando eleições. Ontem, jornais na televisão estampavam em caracteres na tela: “Dilma promete política para o salário mínimo”. Errado! A política já existe. Ela defendeu a sua manutenção. E disparou generalidades sobre áreas da administração. Parece que o redator do discurso pegou a lista dos ministérios e decidiu falar um pouco sobre tudo. A mensagem não tem eixo. Se todos aqueles temas são prioritários, então nenhum é, daí a expressão, que tem a sua graça, a que ela recorreu: “prioridade central” (é a educação). Ok. Deve ser aquela cercada de “prioridades periféricas”…
Há trechos na fala um tanto espantosos porque iluminam o passado recente, o presente e o futuro e dizem muito sobre Dilma, sobre o governo de que ela foi a gerentona e de que é agora comandante, sobre as oposições e até sobre a imprensa que cobre política. Com a tranqüilidade soberana de quem dissesse “hoje é quarta-feira”, Dilma anunciou que, “no Programa Minha Casa, Minha Vida, está prevista a construção de 2 milhões de novas habitações, até 2014, envolvendo investimento de R$ 278,2 bilhões.” Rigorosamente a mesma promessa feita durante a campanha eleitoral. Do primeiro milhão, o governo só entregou 15%. Assim, até 2014, a tarefa é construir os dois milhões da promessa eleitoral mais as 850 mil que ainda não saíram do papel.
No caso das UPAs, e já escrevi a respeito (aqui), chega-se ao paroxismo da parolagem. A presidente simplesmente cortou 50% das mil que haviam sido prometidas até 2014 (leia post). Das 500 com as quais Lula havia acenado até 2010, foram entregues apenas… 91! E Dilma passou o facão sem constrangimento, naquele tom suavemente altivo que a nossa monarca está desenvolvendo.
Reformas
A imprensa deu bastante destaque às tais reformas — falo dos sites; não li ainda os jornais enquanto escrevo —, mas basta ver o peso que a questão teve no discurso como um todo para constatar que não se trata exatamente de “prioridade central” (?). Dadas as 3060 palavras, 2766 precederam a expressão “reforma política”, que veio acompanhada de “reforma tributária”. É bem possível que o governo ensaie propostas para os dois temas. Tudo vai depender do andamento do jogo. Se for só para dar um palanque para a oposição, por que Dilma o faria para valer? Reclamo da sociedade? Convenham: se as oposições esperam esse debate para ter uma bandeira, estão realmente perdidas. Nas ruas, só se fala de outra coisa. Ademais, não cumpre reclamar que o governo “não tem proposta”. A oposição tem?
Dilma mandou sua “mensagem”. Agora pode voltar a seu silêncio decoroso, que a tantos tem encantado, experimentando o gosto de governar sem oposição. Trabalho quem dá é o PMDB do deputado Eduardo Cunha (RJ). Numa entrevista publicada ontem no Estadão, um dos principais (!) parlamentares da base aliada chamou o partido da “presidenta” de ladrão.
Mera briga de companheiros de jornada, de sócios de empreitada. Eu acredito em tudo o que um diz do outro…
Por Reinaldo Azevedo
02/02/2011, às 20:38
Discurso de Dilma: Rainha revoluciona língua e cria a “prioridade central”
Para quem aprecia a língua portuguesa — e não é exatamente o caso de Dona Dilma Primeira —, a rainha cravou uma expressão deliciosa em seu discurso: a “prioridade central”. A “prioridade central” vem a ser aquela que, de tão primeira, fica no centro, jamais no topo ou à frente. Por central, ela vive rodeada. Rodeada de quê? De prioridades secundárias, quero crer.
Tal expressão é uma boa síntese do seu discurso, uma maçaroca que, como já disse, trata de tudo e de nada ao mesmo tempo. Escolha, leitor: salário mínimo, tragédia no Rio, educação, saúde, segurança pública, PAC, pré-sal, meio ambiente, política externa, reforma política, reforma tributária, melhoria do gasto público. Em qualquer desses assuntos, ficamos sabendo que o governo já fez muito e muito mais pode fazer.
Há coisas que chegam a ser engraçadas. Ela promete entregar 500 UPAs até 2014. Ok. Isso dá sumiço em outras 500, que deveriam ter sido entregues até 2010. Fizeram-se apenas 91.
Sobre o programa Minha Casa, Minha Vida, afirmou a presidente: “No Programa Minha Casa, Minha Vida, está prevista a construção de 2 milhões de novas habitações até 2014, envolvendo investimento de R$ 278,2 bilhões.” Do primeiro milhão, entregaram-se apenas 15%.
E as mistificações continuaram, com referências discretas à reforma política e à reforma tributária, mais Mercosul, Unasul etc e tal. Dilma falou sobre tudo, Dilma falou sobre nada. Mas nada se iguala ao estelionato escandaloso das UPAs, a que volto no próximo post.
Por Reinaldo Azevedo
31/01/2011, às 4:31
As promessas que Dilma já não cumpriu e as que ela não vai cumprir
A Folha deste domingo trouxe uma reportagem impressionante de Gustavo Patú sobre “os governos” Dilma. Escrevo, assim, no plural porque, afinal, eu acreditei no que ela e Lula disseram durante a campanha: ela governou com Lula, foi a grande gerente, no tempo em que ainda não havia virado “rainha” (ver texto acima). Antes que comente o texto de Patú, algumas considerações sobre jornalismo.
Antigamente, um texto com esses dados seria candidato a manchete. A Folha escolheu a crise no Egito. Vá lá. Talvez eu tivesse feito o mesmo. Incompreensível é que a questão tenha merecido só uma menção lá no pé da página. Patú é bom na sua área, bastante técnico. No caso do texto, talvez técnico demais, o que dilui o impacto político do que noticia. Mas a radiografia, para quem lê tudo com atenção, impressiona. Querem ver? Seu texto segue em preto. De vez em quando, faço algumas intervenções em azul.
*
Atrasos herdados da administração anterior e a necessidade de cortar investimentos para equilibrar as contas do governo ameaçam algumas das principais promessas da campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff.
Acho que a expressão “administração anterior” dá um viés excessivamente “despolitizante” ao texto. Não há “administração anterior” no sentido político da expressão, certo? O eixo da campanha eleitoral é que passaríamos do governo Lula-Dilma para o governo Dilma. Como vocês verão, não são só as promessas de campanha que estão ameaçadas. A agora presidente Dilma, quando ministra Dilma, não entregou o que prometeu.
Manter em dia o cronograma de realizações significa construir, só neste ano, 3.288 quadras esportivas em escolas, 1.695 creches, 723 postos de policiamento comunitário, 2.174 Unidades Básicas de Saúde e 125 Unidades de Pronto Atendimento, além de centenas de milhares de moradias subsidiadas para a população de baixa renda.
Vejam com é fácil fazer obra com saliva no horário eleitoral gratuito, que nós pagamos…
As metas constam do planejamento oficial que embasou a elaboração do Orçamento deste ano - até hoje não sancionado pelo Planalto, o que reduz a virtualmente zero a possibilidade de liberar dinheiro público para novos projetos.
Fora os compromissos de apelo popular mais imediato, há ainda R$ 7 bilhões destinados a novas obras em rodovias, ferrovias, portos, irrigação e saneamento, igualmente incluídas na segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento, batizada de PAC 2.
Completar um mês sem iniciar investimentos é usual para um começo de administração, mesmo no caso de um governo de continuidade. A equipe econômica, porém, já prepara o terreno para uma demora maior.
É preciso combinar dois objetivos: o fiscal - bloquear despesas e elevar os recursos para o abatimento da dívida pública, desde 2009 abaixo do prometido - e o gerencial - encerrar a lista de obras e projetos prioritários inacabados, grande parte deles coordenados pela própria Dilma nos tempos de ministra-chefe da Casa Civil.
Como se nota, uma informação relavantíssima está aqui, devendo, quem sabe, num texto mais adequadamente “politizado” e “politizante”, estar lá no alto. As promessas eleitorais e as previsões orçamentárias foram feitas ignorando-se tudo o que não foi entregue. E não é pouca coisa.
Em um cenário de recursos escassos, as obras já em curso ganham primazia, como já indicaram a Fazenda e o Planejamento. Mais delicado politicamente seria citar pelo nome os candidatos a serem preteridos.
O exemplo de maiores proporções é o da segunda etapa do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, que pretende viabilizar a construção e a aquisição de 2 milhões de casas e apartamentos até 2014.
Há R$ 12,7 bilhões autorizados no Orçamento de 2011 para a iniciativa, de longe o maior volume destinado a um programa de caráter não permanente nem obrigatório.
Mas, ainda que escape dos cortes a serem anunciados até março, a verba terá de acomodar também R$ 9,5 bilhões em despesas que ficaram por ser executadas da primeira etapa do Minha Casa - na qual as moradias efetivamente concluídas não chegaram a um quarto do 1 milhão contratado no papel.
O “não chegam a um quarto”, que eu saiba, significa algo em torno de 15%. Vale dizer: Lula e Dilma prometeram entregar um milhão de casas (inicialmente, até 2010; depois, sem data definida) e deixaram de cumprir 85% do prometido. Na campanha, dobraram o delírio: 2 milhões. Isso quer dizer que, até 2014, Dilma terá de construir os dois milhões de casas da campanha eleitoral e as 850 mil do mandato passado…
O mesmo acontece com as novas Unidades de Pronto Atendimento, os prontos-socorros 24 horas que estrelaram a plataforma petista para a saúde. Os recursos reservados para iniciar as 500 UPAs programadas até 2014 terão de disputar espaço com a conclusão das outras 500 que deveriam ter sido entregues até 2010. Pelos dados do Ministério da Saúde, apenas 91 UPAs estavam em funcionamento até o início de dezembro.
Você pode não ter entendido direito, então vou destacar: o governo Lula havia prometido entregar 500 UPAs até 2010. Entregou 91 — 18%. Tendo Dilma prometido mais 500, então está devendo agora 909!!!
Sintomaticamente, a bancada governista no Congresso ajudou a promover, sem alarde, um corte de 15% nos recursos para as UPAs e a construção de postos UBS (Unidades Básicas de Saúde) durante a tramitação do projeto de lei orçamentária.
Isso porque a Saúde seria uma prioridade absoluta. Vocês não cansaram de ver o povo feliz nas UPAs da Dilma, certo?
Maior ainda, de quase 35%, foi a redução da verba para a construção e adequação de quadras esportivas nas escolas de ensino médio, ação também classificada como prioritária, incluída no PAC 2 e repetida na campanha eleitoral.
Outro complicador é que todas essas metas - incluindo a construção de creches e de postos de policiamento - dependem da participação de governos estaduais ou prefeituras para elaboração de projetos, cessão de terrenos e custeio das unidades.
Pois é, essas são dificuldades que não apareceram agora e que sempre fizeram parte da equação. A creche serviu de mote para João Santana vender Dilma como a “mãe do Brasil”, depois que ele foi governado pelo pai.
Como não existe a grana, o marqueteiro decidiu transformar a “mãe” na rainha da Inglaterra.
Por Reinaldo Azevedo
Paulo Henrique Amorim (A de "amigo" do PT), é quem mesmo?
Ah, aquele cara de fala esquisita que assusta quem surfa pelo controle remoto nos domingos, quando passa pelo canal público pago pelos fiéis da Seita Universal...