Triunfo da Vontade*

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Acauan
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Triunfo da Vontade*

Mensagem por Acauan »

Triunfo da Vontade*
Postado originalmente em 8/8/2003 17:51:39

por Acauan

Quando uma vontade muito forte encontra muitas vontades fracas, surge um novo líder;
Quando uma crença muito forte encontra muitas crenças fracas, surge uma nova fé;
Quando estes dois encontros ocorrem simultaneamente, surge uma nova religião.

ACAUAN DOS TUPIS


Cristianismo e Islamismo nasceram e se desenvolveram em ambientes históricos e sociais muito diferentes, mas a consolidação de ambos como religiões hegemônicas em seus respectivos mundos deve-se em grande parte a pontos que têm em comum:

a) O surgimento de uma liderança carismática;
b) A fragmentação e fraqueza das religiões até então dominantes;
c) A obstinada decisão dos seguidores da nova religião de propagá-la pelo mundo.

Os cristãos primitivos possivelmente eram vistos pelos romanos cultos como um grupo exótico e insignificante. Os Patrícios deveriam considerar loucura a decisão fanática deles de conquistar o Império Romano e promover a chegada do dia em que mesmo César se ajoelharia diante de seu obscuro líder, um infame qualquer que foi crucificado nas províncias do oriente.

Séculos depois da chegada do cristianismo a Roma, na península arábica um auto-proclamado profeta e seus seguidores, uns poucos parentes e pessoas próximas, iniciam sua jornada para destruir a idolatria e implantar o monoteísmo entre os árabes. Expulsos de sua cidade natal refugiam-se em outra, centenas de quilômetros distante, decididos a converter seus anfitriões à sua nova religião e retornar triunfantes à sua terra de origem para convertê-la também.

O final destas duas histórias é conhecido. As várias explicações de como o contexto histórico-social favoreceu estes desfechos também.
O problema é que é fácil para um historiador, centenas e centenas de anos depois, analisar o contexto histórico e concluir que ele era favorável.
Outra coisa é alguém com uma idéia considerada maluca pela maioria juntar meia dúzia de gatos pingados, desafiar um sistema incomensuravelmente mais forte do que eles e sair vitorioso.

Quem quiser achar que Deus deu uma mãozinha que ache, mas se ele favoreceu igualmente Cristianismo e Islamismo deve ter algum tipo de distúrbio dissociativo da identidade, já que estas doutrinas são excludentes entre si.

Seja lá o que for, no centro dos acontecimentos que decidiram os rumos de duas civilizações estava a vontade dos protagonistas. Homens que ignoraram todos os sinais de que sua missão era fadada ao fracasso, desafiaram a História e construíram um destino considerado impossível.

Ironicamente, da vitória das grandes religiões destaca-se não o triunfo da vontade de Deus e sim o triunfo da vontade humana.

* n.A. (nota do Acauan): “TRIUNFO DA VONTADE” é o título do filme de Leni Riefenstahl, que documentou o encontro do Partido Nacional-Socialista, em Nuremberg, em 1934.
Execrado como propaganda nazista, o filme até hoje pode ser visto como um assustador alerta de como uma vontade poderosa consegue manipular as massas, para o bem, ou como no caso daqueles retratados por Leni, para o mais sinistro dos males.
Nós, Índios.

Acauan Guajajara
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Grande Índio,

Gostaria de fazer alguns comentários sobre esse belo texto, mas não queria que parecesse uma pregação religiosa. Gosto de tratar de temas que possuem um viés lógico, onde a fé pode ser posta de lado em favor de não mais que meras considerações. Se você acreditar que minha intenção não envolve nenhuma espécie de defesa da fé, ficarei feliz. Dito isso:

Acauan escreveu:
Quem quiser achar que Deus deu uma mãozinha que ache, mas se ele favoreceu igualmente Cristianismo e Islamismo deve ter algum tipo de distúrbio dissociativo da identidade, já que estas doutrinas são excludentes entre si.


Não tenho a menor idéia se Deus deu uma mãozinha ou não, mas, em se confirmando essa ajuda, entendo-a como perfeitamente normal. Cristianismo e Islamismo só são excludentes na perspectiva humana. Elevando essa perspectiva, longe de nossas convicções inabaláveis, todo movimento humano tem valor e efeitos similares na busca por Deus. Esse mesmo princípio é empregado em minhas recorrentes afirmações de que ateus e religiosos são iguais. O que eu estou tentando dizer é que, se existir um Deus, Ele está muito além dos nossos insignificantes conflitos, e acolheria o Islamismo, o Cristianismo, o Ateísmo, ou qualquer outro ismo, com equanimidade.

Você poderia questionar, neste momento, em quê se baseiam minhas “certezas” a respeito da divindade, como costumeiramente fazem. Acredito, porém, que essa é uma questão menor, como menor é o resultado da aposta ateus X crentes. Admito até que posso estar completamente errado – embora nada tenha me levado nessa direção, até então – mas restaria ainda a lógica de que um Ser possuidor de Consciência Suprema não seria suscetível às mazelas humanas.

Vi, em algum livro já esquecido pelo tempo, um exemplo que achei muito interessante: Enquanto a mãe está envolvida em seus afazeres domésticos, os filhos brincam no quintal. Ela, a mãe, não se importa se, nos folguedos, o filho faz o papel de mocinho ou bandido, médico ou paciente. Ela sabe que, finda a brincadeira, eles voltam à casa, à mesa, aos estudos, e são os seus filhos de sempre. Numa analogia ousada, é como se Deus assistisse todo o drama humano como uma grande brincadeira, sem que uma coisa ou outra tivesse maior ou menor valor.

A mãe poderia estimular o filho a brincar, encenando diferentes personagens, tanto quanto Deus poderia nos estimular a seguir nossos ismos, mesmo que seja o ateísmo, um caminho tão bom quanto qualquer outro para se chegar até Deus. Perdoe esta última frase, “quase ofensiva” para um ateu.

Outro ponto impreterível que se esclareça é que essa argumentação toda não é uma defesa moral, do tipo “tudo que Deus faz é bom”. Não sei se é bom. Não concordo com muita coisa. Mas procuro manter aprovações e desaprovações à parte de minhas conclusões.

No mais, parabéns por outro ótimo texto.


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Acauan
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Acauan »

Ayyavazhi escreveu:Grande Índio,


ANAUÊ, Ayyavazhi!

Ayyavazhi escreveu:Se você acreditar que minha intenção não envolve nenhuma espécie de defesa da fé, ficarei feliz. Dito isso:


Acredito.

Ayyavazhi escreveu:Não tenho a menor idéia se Deus deu uma mãozinha ou não, mas, em se confirmando essa ajuda, entendo-a como perfeitamente normal. Cristianismo e Islamismo só são excludentes na perspectiva humana.


Exato. O texto se atém às origens do Cristianismo e do Islã como doutrinas religiosas estabelecidas cada qual por um fundador.
Vistos exclusivamente como doutrinas, o Islã é taxativo em negar a divindade de Jesus de Nazaré, que é o fundamento doutrinário do cristianismo.


Ayyavazhi escreveu:Elevando essa perspectiva, longe de nossas convicções inabaláveis, todo movimento humano tem valor e efeitos similares na busca por Deus. Esse mesmo princípio é empregado em minhas recorrentes afirmações de que ateus e religiosos são iguais. O que eu estou tentando dizer é que, se existir um Deus, Ele está muito além dos nossos insignificantes conflitos, e acolheria o Islamismo, o Cristianismo, o Ateísmo, ou qualquer outro ismo, com equanimidade.


Isto é perfeitamente aceitável dentro de uma abordagem metafísica, que geralmente direciona o estudo de religiões comparadas.
Do ponto de vista do Infinito Metafísico as diferenças entre as religiões monoteístas podem ser vistas como distorções esperadas na transição do absoluto infinito para o relativo finito, onde se manifesta a consciência humana. Mesmo o ateísmo admite abordagem metafísica, como é o caso do Panteísmo Científico.


Ayyavazhi escreveu:Você poderia questionar, neste momento, em quê se baseiam minhas “certezas” a respeito da divindade, como costumeiramente fazem. Acredito, porém, que essa é uma questão menor, como menor é o resultado da aposta ateus X crentes. Admito até que posso estar completamente errado – embora nada tenha me levado nessa direção, até então – mas restaria ainda a lógica de que um Ser possuidor de Consciência Suprema não seria suscetível às mazelas humanas.


Mantendo-nos na abordagem metafísica seu raciocínio é perfeito.
Esta interpretação da divindade é muito clara em Spinoza.


Ayyavazhi escreveu:Vi, em algum livro já esquecido pelo tempo, um exemplo que achei muito interessante: Enquanto a mãe está envolvida em seus afazeres domésticos, os filhos brincam no quintal. Ela, a mãe, não se importa se, nos folguedos, o filho faz o papel de mocinho ou bandido, médico ou paciente. Ela sabe que, finda a brincadeira, eles voltam à casa, à mesa, aos estudos, e são os seus filhos de sempre. Numa analogia ousada, é como se Deus assistisse todo o drama humano como uma grande brincadeira, sem que uma coisa ou outra tivesse maior ou menor valor.


É aí que reside a diferença decisiva entre o Deus puramente metafísico de Spinoza e o Deus abrâmico. O primeiro é uma consciência infinita distante da humanidade ao ponto de lhe ser indiferente, enquanto o segundo se preocupa individualmente com suas criaturas, intervém no destino delas, recompensa aquelas que lhe agradam e pune as demais.

Ayyavazhi escreveu:A mãe poderia estimular o filho a brincar, encenando diferentes personagens, tanto quanto Deus poderia nos estimular a seguir nossos ismos, mesmo que seja o ateísmo, um caminho tão bom quanto qualquer outro para se chegar até Deus. Perdoe esta última frase, “quase ofensiva” para um ateu.


Tanto a religião quanto o ateísmo podem ser pontos de partida para quem busca a verdade absoluta. Religiosos acreditam que esta verdade se manifesta desde o ponto de partida por algum tipo de revelação ou manifestação divina, enquanto os ateus colherão suas pistas em outras fontes.
Havendo humildade e honestidade intelectual para entender que pontos de partida diferentes podem levar ao mesmo ponto de chegada, sua frase faz muito sentido.


Ayyavazhi escreveu:Outro ponto impreterível que se esclareça é que essa argumentação toda não é uma defesa moral, do tipo “tudo que Deus faz é bom”. Não sei se é bom. Não concordo com muita coisa. Mas procuro manter aprovações e desaprovações à parte de minhas conclusões.


O Problema do Mal é um dos mais espinhosos para os religiosos doutrinários, coisa que o ateísmo resolve com o relativismo moral, que é um problema tão espinhoso quanto.

Ayyavazhi escreveu:No mais, parabéns por outro ótimo texto.


Obrigado.
Nós, Índios.

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Ayyavazhi escreveu:Cristianismo e Islamismo só são excludentes na perspectiva humana.

E temos outra?
Se adotarmos a visão de que Deus vê da mesma forma todas as religiões, também será a perspectiva humana.

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Acauan escreveu:É aí que reside a diferença decisiva entre o Deus puramente metafísico de Spinoza e o Deus abrâmico. O primeiro é uma consciência infinita distante da humanidade ao ponto de lhe ser indiferente, enquanto o segundo se preocupa individualmente com suas criaturas, intervém no destino delas, recompensa aquelas que lhe agradam e pune as demais.


Ainda estou preso à idéia de que Deus não pode ser conhecido e compreendido pela mente humana. Por essa ótica, tudo o que dissermos, absolutamente tudo, estará errado. Mas, no inevitável exercício das interações humanas e na necessidade de situarmos nossa existência em um padrão lógico, inserimos Deus no ambiente comandado pelo intelecto.

Sei que minhas afirmações estão sempre tangenciando o contraditório. Ninguém defende tanto uma tal “busca por Deus” do que eu, neste fórum, e como se poderia buscar o que é inatingível? É neste ponto que se faria necessária a inserção de conceitos-tabus, como a existência do espírito, por exemplo. O espírito, eterno!, ofereceria uma alternativa plausível ao intelecto, mas este é um assunto por demais longo, e mais ainda arriscado, para ser tratado em ambiente ateu/cético.

Dentro dos limites do intelecto, e prometo que vou tentar não ultrapassá-los, suas definições de um Deus distante e indiferente já me ocorreram em diversos momentos. Lembro-me de ter definido Deus como “divinamente indiferente” e fui criticado por um autoproclamado mestre asceta. Digo autoproclamado porque minha curta convivência com ele não me mostrou um Mestre, mas alguém com grande conhecimento no assunto. Um bom professor, digamos assim. Pois bem, esse não-mestre fez a seguinte analogia:

Deus seria como o oceano, que permeia, envolve e suporta todas aquelas incontáveis formas de vida. O oceano não toma partido de indivíduos, mas garante o equilíbrio e possibilita a existência de todas as espécies. Uma idéia bem parecida foi tratada no filme Avatar. Assim, a noção de indiferença seria fruto da modesta visão humana, ignorando que sua própria existência só é possível porquanto existe o Oceano.

Eu nunca descarto uma possibilidade antes de olhar para ela. Olhando para Deus com o intelecto, eu só consigo ver indiferença. Por curiosidade, teimosia ou necessidade de conhecer a verdade, eu trilho outros caminhos...

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Fernando Silva escreveu:
Ayyavazhi escreveu:Cristianismo e Islamismo só são excludentes na perspectiva humana.

E temos outra?
Se adotarmos a visão de que Deus vê da mesma forma todas as religiões, também será a perspectiva humana.


Adotar uma visão é sempre uma perspectiva humana. Abandonar todas as visões nos oferece horizontes que, penso eu, mereceriam ser escrutinados.

Minha memória me trai; acho que foi Gibran: “Nada que é humano tem valor, se permanecer humano”.


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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Ayyavazhi escreveu:Minha memória me trai; acho que foi Gibran: “Nada que é humano tem valor, se permanecer humano”.

E como fazer para que deixe de ser humano sem deixarmos de ser humanos?

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Ayyavazhi escreveu:Deus seria como o oceano, que permeia, envolve e suporta todas aquelas incontáveis formas de vida. O oceano não toma partido de indivíduos, mas garante o equilíbrio e possibilita a existência de todas as espécies. Uma idéia bem parecida foi tratada no filme Avatar. Assim, a noção de indiferença seria fruto da modesta visão humana, ignorando que sua própria existência só é possível porquanto existe o Oceano.

Não me agradam comparações deste tipo: o oceano, que é material e conhecido, com uma entidade espiritual cuja existência apenas imaginamos e sobre a qual não sabemos nada.

Parece-me que se tenta reduzir algo infinito e incompreensível a dimensões e complexidades que caibam na nossa limitada compreensão.

Algo do tipo "O Tao sobre o qual se pode debater não é o Tao".

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Acauan »

Ayyavazhi escreveu: Ainda estou preso à idéia de que Deus não pode ser conhecido e compreendido pela mente humana. Por essa ótica, tudo o que dissermos, absolutamente tudo, estará errado. Mas, no inevitável exercício das interações humanas e na necessidade de situarmos nossa existência em um padrão lógico, inserimos Deus no ambiente comandado pelo intelecto.


É o velho problema de como analisar o infinito.
Na metafísica admite-se que determinadas propriedades do finito se manifestam infinitamente – como a lei da causa e efeito, nos permitindo tirar conclusões racionais sobre o que está além do alcance de nossa experiência. Isto vale para a matemática, uma realidade abstrata, mas nada garante que se aplique à realidade concreta.
Não há como provar ou mesmo se ter uma certeza razoável de que a premissa metafísica é verdadeira. Kant e outros filósofos a questionaram.
Schopenhauer, por exemplo, defendia que a única certeza que podemos ter é a da nossa própria consciência no instante presente, tudo o mais pode ser ou não ser o que pensamos que seja.
Por isto as grandes religiões têm a fé como fundamento, por mais que defendam a racionalidade de sua teologia.


Ayyavazhi escreveu: Sei que minhas afirmações estão sempre tangenciando o contraditório. Ninguém defende tanto uma tal “busca por Deus” do que eu, neste fórum, e como se poderia buscar o que é inatingível? É neste ponto que se faria necessária a inserção de conceitos-tabus, como a existência do espírito, por exemplo. O espírito, eterno!, ofereceria uma alternativa plausível ao intelecto, mas este é um assunto por demais longo, e mais ainda arriscado, para ser tratado em ambiente ateu/cético.


O problema com o conceito "espírito" é que ele é vago demais.
Se definirmos espírito simplesmente como inteligência incorpórea fica a pergunta se não é corpóreo, é o que?
Mesmo o espiritismo kardecista não se atreveu a desvincular o espírito de algum tipo de ancoragem física, o chamado perispírito.
Assim apenas transformamos a questão "não sabemos o que sustenta a coerência do cosmo" em "algo (ou alguém) que não sabemos o que é sustenta a coerência do cosmo", isto, claro, admitindo-se que o cosmo seja coerente.


Ayyavazhi escreveu: Dentro dos limites do intelecto, e prometo que vou tentar não ultrapassá-los, suas definições de um Deus distante e indiferente já me ocorreram em diversos momentos. Lembro-me de ter definido Deus como “divinamente indiferente” e fui criticado por um autoproclamado mestre asceta. Digo autoproclamado porque minha curta convivência com ele não me mostrou um Mestre, mas alguém com grande conhecimento no assunto. Um bom professor, digamos assim. Pois bem, esse não-mestre fez a seguinte analogia:


Um Deus indiferente é uma explicação mais direta que um Deus Pai para a existência em um espaço-tempo tão maiores que uma vida humana que terminam por torná-la comparativamente insignificante.
A solução encontrada pela teologia foi propor uma vida pós-morte eterna e bem-aventurada, na qual a humanidade ganha relevância perante o universo.


Ayyavazhi escreveu: Deus seria como o oceano, que permeia, envolve e suporta todas aquelas incontáveis formas de vida. O oceano não toma partido de indivíduos, mas garante o equilíbrio e possibilita a existência de todas as espécies. Uma idéia bem parecida foi tratada no filme Avatar. Assim, a noção de indiferença seria fruto da modesta visão humana, ignorando que sua própria existência só é possível porquanto existe o Oceano.


Na verdade este conceito de Deus-oceano não é muito diferente do conceito de flutuações quânticas. Nos dois casos a realidade é extraída das infinitas possibilidades seguindo apenas probabilidades.

Ayyavazhi escreveu: Eu nunca descarto uma possibilidade antes de olhar para ela. Olhando para Deus com o intelecto, eu só consigo ver indiferença. Por curiosidade, teimosia ou necessidade de conhecer a verdade, eu trilho outros caminhos...


Qualquer conceito Deus é incompleto sem algum tipo de fé e somente a devoção religiosa autoriza a crença em um Deus que ama suas criaturas.
Um Deus intelecto pode simplesmente se aprazer com sua criação, um cosmo infinito e coerente no todo, que não se preocupa com suas partes infinitesimais.
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Acauan »

Fernando Silva escreveu:Algo do tipo "O Tao sobre o qual se pode debater não é o Tao".


Mas a afirmação é bastante honesta, Fernando.
Algumas experiências reais não são verbalizáveis.
Basta imaginar um modo de descrever para um cego de nascença como é determinada cor.
Não sei se a frase citada faz realmente parte do TAO, mas se fizer contém uma dose de humildade, ao contrário de certos fundamentalistas que querem dar materialidade física à sua fé pessoal.
Nós, Índios.

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Apo »

Fernando Silva escreveu:
Ayyavazhi escreveu:Minha memória me trai; acho que foi Gibran: “Nada que é humano tem valor, se permanecer humano”.

E como fazer para que deixe de ser humano sem deixarmos de ser humanos?


Mas isto é fácil:

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Fernando Silva escreveu:
Ayyavazhi escreveu:Minha memória me trai; acho que foi Gibran: “Nada que é humano tem valor, se permanecer humano”.

E como fazer para que deixe de ser humano sem deixarmos de ser humanos?


Eu não tenho nada a ver com isso, não. A frase é do Gibran.

Brincadeira.

Nossa condição atual é esta, somos humanos. Não significa que isso seja imutável. A evolução das espécies nos mostra que, em algum momento de nossa trajetória no planeta, éramos qualquer outra coisa que não o Homo sapiens que hoje conhecemos. No plano espiritual (supondo que haja um espírito), não precisamos de muita imaginação para especular que uma evolução possa estar em curso. Mesmo acorrentado à nossa condição humana, antes que qualquer mudança relevante tenha lugar, somos capazes de grandes feitos, grandes superações. Às vezes, de tão única, essa superação pode ser vista como uma manifestação supra humana.

Só para constar, eu acredito cada vez menos nessa evolução espiritual. Quando eu descobrir a verdade, compartilharei com os colegas.


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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Fernando Silva escreveu:Não me agradam comparações deste tipo: o oceano, que é material e conhecido, com uma entidade espiritual cuja existência apenas imaginamos e sobre a qual não sabemos nada.

Parece-me que se tenta reduzir algo infinito e incompreensível a dimensões e complexidades que caibam na nossa limitada compreensão.


Mas é exatamente isso, Fernando. Você já respondeu. Tudo o que nós fazemos é trazer o incompreensível para uma dimensão conhecida e, assim, esboçamos uma explicação que a mente possa entender. É por isso que eu sempre uso analogias. É como mostrar uma imagem de algo que eu não consigo descrever e, com esse recurso, tento me comunicar. Não é possível definir a divindade e quem acha que consegue está apenas se enganando. Ciente dessa impossibilidade, eu me resigno com definições limitadas e que, desde a origem, não correspondem à realidade absoluta. Se é o relativo que está ao meu alcance, é com ele que vou lidar.

E isso não obsta que eu possa perceber e apreender um conceito que o intelecto não consegue traduzir.


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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Acauan escreveu:Por isto as grandes religiões têm a fé como fundamento, por mais que defendam a racionalidade de sua teologia.


Quando a mente religiosa se confronta com algum conceito metafísico, fora do alcance de qualquer investigação empírica, ela sente a necessidade de dar sentido à questão, de torná-la compreensível e descritível. É neste cenário que se forma uma suposta racionalidade. Na verdade, a mente acha mesmo que compreendeu alguma coisa e que essa alguma coisa é racional. Quem defende sua fé e seus dogmas, está sendo verdadeiro na maior parte do tempo, dentro do que o seu intelecto construiu como resposta . Antes de compreender isso, eu tentava dialogar com religiosos, pois infantilmente acreditava que poderia demonstrar a falha lógica de seus argumentos.

Desconfio que a mente possui algum sistema de defesa, algo que levanta uma parede de proteção sempre que ela se sente ameaçada. Qualquer argumento lógico se perde e se desvirtua ao passar por esse esquema de defesa, tão bem elaborado.


Acauan escreveu:O problema com o conceito "espírito" é que ele é vago demais.


Sinceramente, eu nem tento definir o espírito. Se você me fizer essa pergunta eu vou responder um simples “não sei”. É bem verdade que eu nunca me interessei muito pelo assunto, mas não sei se chegaria tão mais longe se me interessasse. Alma, espírito, perispírito, protoespírito, etc., são conceitos demais e que não chegam onde eu quero. Sempre confessei, em nossos debates, a simplicidade de meus métodos. Desde que esses métodos continuem a me trazer resultados palpáveis, passo ao largo de lucubrações filosóficas.

Tudo que envolve Deus ou o espírito, é complexo demais sem a nossa ajuda. Na tentativa de compreender, nós transformamos o complexo em obscuro, o difícil em emaranhadamente intricado. Quando aprendermos a simplificar essa “busca”, que nunca será realmente simples!, poderemos nos deparar com resultados surpreendentes.


Acauan escreveu:A solução encontrada pela teologia foi propor uma vida pós-morte eterna e bem-aventurada, na qual a humanidade ganha relevância perante o universo.


A sobrevivência do indivíduo, de sua consciência após a morte do corpo físico, é uma conclusão óbvia para quem acredita em espírito, embora eu não acredite no verbo “acreditar”. Mas a tal bem-aventurança não será alcançada simplesmente porque morremos. Pedindo licença para ultrapassar levemente aquela linha divisória, mas empurrado por seus comentários, eu diria que o espírito faz pequenas incursões no mundo físico e, terminada essa experiência, nada de extraordinário acontece. Continuamos nosso aprendizado, na matéria ou fora dela, até que o propósito seja atingido, sabe-se lá quando. Eu estou tentando dizer isso de uma forma que não pareça muito anedótico em um sítio ateu, mas não é fácil. Releve qualquer deslize, por gentileza.

Dizendo isso de uma outra maneira: Sim, eu “acredito” na vida eterna, e nós ainda vamos tomar uma cerveja, rindo de toda essa bobagem, lá no “outro lado”.

Que fique bem claro: estar do “outro lado” é tão ilusório e relativo quanto estar aqui. A Verdade última, ainda não foi alcançada. Perdoe-me, velho amigo, estou esquecendo minha promessa.


Acauan escreveu:Na verdade este conceito de Deus-oceano não é muito diferente do conceito de flutuações quânticas. Nos dois casos a realidade é extraída das infinitas possibilidades seguindo apenas probabilidades.


Se você me permite a ousadia, eu diria que trabalho com algo mais concreto do que meras probabilidades. Considerá-las, é um dever de uma mente que se diz cética, mas sempre que eu puder dar o próximo passo, eu o farei, em busca de resultados tangíveis.


Acauan escreveu:Qualquer conceito Deus é incompleto sem algum tipo de fé e somente a devoção religiosa autoriza a crença em um Deus que ama suas criaturas.
Um Deus intelecto pode simplesmente se aprazer com sua criação, um cosmo infinito e coerente no todo, que não se preocupa com suas partes infinitesimais.


É possível, Acauan, é possível. Talvez, e apenas talvez, Deus nos ame à sua maneira. Talvez o amor seja uma poderosa força criadora que deu origem a tudo o que podemos ver e o que não podemos, e nós o traduzimos, ou melhor, o reduzimos a um conceito sentimental e humano. Talvez Deus seja cada uma dessas partes infinitesimais e, por isso mesmo, parece tão distante delas. Eu trabalho com uma possibilidade até que ela seja esgotada, ou até que alguma certeza se produza. E já que estamos falando de Deus, isso está bem longe de acontecer.


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Re: Triunfo da Vontade*

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Acauan escreveu:Algumas experiências reais não são verbalizáveis.
Basta imaginar um modo de descrever para um cego de nascença como é determinada cor.


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Re: Triunfo da Vontade*

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Ayyavazhi escreveu:
Fernando Silva escreveu:
Ayyavazhi escreveu:Minha memória me trai; acho que foi Gibran: “Nada que é humano tem valor, se permanecer humano”.

E como fazer para que deixe de ser humano sem deixarmos de ser humanos?


Eu não tenho nada a ver com isso, não. A frase é do Gibran.

Brincadeira.

Nossa condição atual é esta, somos humanos. Não significa que isso seja imutável. A evolução das espécies nos mostra que, em algum momento de nossa trajetória no planeta, éramos qualquer outra coisa que não o Homo sapiens que hoje conhecemos. No plano espiritual (supondo que haja um espírito), não precisamos de muita imaginação para especular que uma evolução possa estar em curso. Mesmo acorrentado à nossa condição humana, antes que qualquer mudança relevante tenha lugar, somos capazes de grandes feitos, grandes superações. Às vezes, de tão única, essa superação pode ser vista como uma manifestação supra humana.

Só para constar, eu acredito cada vez menos nessa evolução espiritual. Quando eu descobrir a verdade, compartilharei com os colegas.



E, claro, você vai descobrir esta verdade...rsrsrs

O que tem a ver grandes feitos com a tal necessidade de ver a realidade de forma não-humana blablabla?

Você se comlicou todo nestes conceitos e não disse nada.
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Mensagem por Apo »

Ayyavazhi escreveu:
Fernando Silva escreveu:
Ayyavazhi escreveu:Minha memória me trai; acho que foi Gibran: “Nada que é humano tem valor, se permanecer humano”.

E como fazer para que deixe de ser humano sem deixarmos de ser humanos?


Eu não tenho nada a ver com isso, não. A frase é do Gibran.

Brincadeira.

Nossa condição atual é esta, somos humanos. Não significa que isso seja imutável. A evolução das espécies nos mostra que, em algum momento de nossa trajetória no planeta, éramos qualquer outra coisa que não o Homo sapiens que hoje conhecemos. No plano espiritual (supondo que haja um espírito), não precisamos de muita imaginação para especular que uma evolução possa estar em curso. Mesmo acorrentado à nossa condição humana, antes que qualquer mudança relevante tenha lugar, somos capazes de grandes feitos, grandes superações. Às vezes, de tão única, essa superação pode ser vista como uma manifestação supra humana.

Só para constar, eu acredito cada vez menos nessa evolução espiritual. Quando eu descobrir a verdade, compartilharei com os colegas.



E, claro, você vai descobrir esta verdade...rsrsrs

O que tem a ver grandes feitos com a tal necessidade de ver a realidade de forma não-humana blablabla?

Você se comlicou todo nestes conceitos e não disse nada.
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Ayyavazhi
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Apo escreveu:E, claro, você vai descobrir esta verdade...rsrsrs


Óbvio! Eu sou teísta, lembra?, portanto, superior a você.

Apo escreveu:O que tem a ver grandes feitos com a tal necessidade de ver a realidade de forma não-humana blablabla?


Que necessidade? Você sempre fala isso. "Necessidade de que haja um deus, necessidade de explicar isso, necessidade de explicar aquilo". Quem tem necessidades é você, Apo, e quer porque quer que os outros também as tenham. Alguém do meu nível não se atormenta com necessidades pueris, e você não vai conseguir entender isso

Apo escreveu:Você se comlicou todo nestes conceitos e não disse nada.


Vou esperar pela resposta do Fernando. Se ele não entender, serei forçado a admitir que chutei para fora. Por enquanto, nada de anormal aconteceu, apenas rotina


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Fernando Silva
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Acauan escreveu:
Fernando Silva escreveu:Algo do tipo "O Tao sobre o qual se pode debater não é o Tao".


Mas a afirmação é bastante honesta, Fernando.
Algumas experiências reais não são verbalizáveis.
Basta imaginar um modo de descrever para um cego de nascença como é determinada cor.
Não sei se a frase citada faz realmente parte do TAO, mas se fizer contém uma dose de humildade, ao contrário de certos fundamentalistas que querem dar materialidade física à sua fé pessoal.

Eu me expressei mal. Na verdade, quis dizer que prefiro a atitude de Lao Tse ao reconhecer que sua descrição do Tao é limitada, tanto que o Tao Te Ching traz no início esses disclaimers:

O Tao de que se pode falar não é o verdadeiro e eterno Tao.
O nome que pode ser dito não é o verdadeiro nome.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Tao_Te_Ching

Um exemplo que ele dá é o da palavra "cavalo", que é apenas uma descrição muito genérica, quando teríamos que dizer "cavalo branco com 3 anos, de tal tamanho, tal peso, nascido em ... etc. etc.".

O Tao seria um caminho, um fluxo, um rio infinito, no qual surgimos e logo desaparecemos e do qual temos apenas uma visão infinitamente limitada.

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Fernando Silva
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Ayyavazhi escreveu:
Fernando Silva escreveu:Não me agradam comparações deste tipo: o oceano, que é material e conhecido, com uma entidade espiritual cuja existência apenas imaginamos e sobre a qual não sabemos nada.

Parece-me que se tenta reduzir algo infinito e incompreensível a dimensões e complexidades que caibam na nossa limitada compreensão.


Mas é exatamente isso, Fernando. Você já respondeu. Tudo o que nós fazemos é trazer o incompreensível para uma dimensão conhecida e, assim, esboçamos uma explicação que a mente possa entender. É por isso que eu sempre uso analogias. É como mostrar uma imagem de algo que eu não consigo descrever e, com esse recurso, tento me comunicar. Não é possível definir a divindade e quem acha que consegue está apenas se enganando. Ciente dessa impossibilidade, eu me resigno com definições limitadas e que, desde a origem, não correspondem à realidade absoluta. Se é o relativo que está ao meu alcance, é com ele que vou lidar.

E isso não obsta que eu possa perceber e apreender um conceito que o intelecto não consegue traduzir.


Sim, faz sentido tentarmos aprender o pouco que é possível aprender sobre algo infinitamente grande e complexo, desde que, a partir daí, não façamos afirmações absolutas.
Por outro lado, acho que é preciso provar a existência e detectar esse algo antes de tentar explicá-lo e descrevê-lo.

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Mig29
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Mig29 »

Fernando, não vejo problema falar no absoluto. Desde que, a humildade se faça presente. A frase que você apresentou é disto bastante eloquente. Creio que é simples entender a sua frase, se pensarmos que a palavra, absoluto, significa a totalidade - qualquer tentativa para definir o que este absoluto seja é estar a limitar, retirar uma parte deste todo. Portanto, já estaremos a falar de outra coisa que não o absoluto.
Acredito que este é o problema que tem ocupado a humanidade nos últimos milénios. Não é se existe ou não Deus, mas como entender a unidade e multiplicidade. Podemos começar de pontos diferentes, mas acabamos por buscar o entendimento desta relação entre a unidade e multiplicidade.
Inclusive, quando hoje se fala, direito individual e coletivismo, não passa de uma variante desta temática.
Sobre a importância da prova, você tem razão. No entanto, se estivermos a falar de Deus, sendo dito que este é o absoluto - o debate termina aqui, como referi, absoluto, não é possível de isolar.
Uma ultima consideração a respeito da palavra absoluto. Esta ganhou ao longo do tempo, um significado mais distante da noção de totalidade - devido a um excesso de relativismo. Este relativismo que tem sido tão criticado, é importante para conseguirmos viver num mundo, onde é impossível de tudo saber e conhecer. O problema é que levado ao extremo, torna o mundo instável, as pessoas perdem as referências orientadoras de suas vidas. Felizmente, existe o que quase aparenta ser natural, duas forças contrarias que ao lutarem entre si, impedem o caos.

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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Fernando Silva escreveu:Sim, faz sentido tentarmos aprender o pouco que é possível aprender sobre algo infinitamente grande e complexo, desde que, a partir daí, não façamos afirmações absolutas.
Por outro lado, acho que é preciso provar a existência e detectar esse algo antes de tentar explicá-lo e descrevê-lo.


Concordo contigo, mas, modéstia à parte, acho que poucos teístas são mais cautelosos do que eu ao fazer afirmações. Usando tua própria definição, conhecer um fragmento de realidade não significa conhecer TODA a realidade. Mas, será que só o conhecimento do TODO nos autoriza a ter algumas certezas?

Será que é imprescindível poder definir Deus, para ter certeza que Ele existe? E se eu não posso compreender a divindade, isso me desqualifica para compreender a vida espiritual? Saber que existe um espírito, e que ele sobrevive à morte do corpo físico, é realmente inatingível para o homem?

Fiz algumas perguntas e poderia fazer muitas outras, mas não é necessário. Estou forçando uma resposta lógica e tenho certeza que você já percebeu isso. Mais do que lógica, mais do que possibilidade, considere que, talvez, tudo isso possam ser experiências verdadeiras, porém não verbalizáveis, como disse com excelência o Acauan. Não pode ser demonstrado, e é por isso que eu estou aqui, numa conversa informal com amigos e não em uma convenção de ciências pagando mico. E nem por isso deixa de ser verdade.


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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Ayyavazhi »

Fernando Silva escreveu:
O Tao de que se pode falar não é o verdadeiro e eterno Tao.
O nome que pode ser dito não é o verdadeiro nome.



"O Deus de que se pode falar não é o verdadeiro e eterno Deus.
O nome que pode ser dito não é o verdadeiro nome."

Percebe? O princípio não foi alterado, não foi corrompido. É este princípio que tento defender, desde sempre.


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Fernando Silva
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Ayyavazhi escreveu:Será que é imprescindível poder definir Deus, para ter certeza que Ele existe? E se eu não posso compreender a divindade, isso me desqualifica para compreender a vida espiritual? Saber que existe um espírito, e que ele sobrevive à morte do corpo físico, é realmente inatingível para o homem?

E se ficar provado que o Sol é Deus? O que fazer a respeito? Nada. Saberemos que ele existe, como se parece e mais um monte de coisas, mas, se não conseguirmos nos comunicar com ele, será ele lá e nós cá. Ele será apenas uma curiosidade e nossa vida não será afetada em nada por essa descoberta.
Ayyavazhi escreveu:Saber que existe um espírito, e que ele sobrevive à morte do corpo físico, é realmente inatingível para o homem?

Não há como afirmar nada a este respeito no momento, nem sim nem não.

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Fernando Silva
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Re: Triunfo da Vontade*

Mensagem por Fernando Silva »

Ayyavazhi escreveu:
Fernando Silva escreveu:
O Tao de que se pode falar não é o verdadeiro e eterno Tao.
O nome que pode ser dito não é o verdadeiro nome.



"O Deus de que se pode falar não é o verdadeiro e eterno Deus.
O nome que pode ser dito não é o verdadeiro nome."

Percebe? O princípio não foi alterado, não foi corrompido. É este princípio que tento defender, desde sempre.


O princípio é válido, sim, como método. O que não me parece válido é aplicá-lo a algo que nem sabemos se existe.
Assim como você substituiu 'Tao' por 'Deus', eu poderia substituir por 'mundo das fadas', 'dimensão púrpura' ou qualquer outra coisa que eu pudesse imaginar.

Trancado