Os ilusionistas
Enviado: 11 Fev 2006, 12:56
por João Luiz Mauad em 10 de fevereiro de 2006
Resumo: Nunca é demais repetir: o que estimula o crescimento econômico não é o superávit comercial, mas a soma das correntes de comércio com exterior.
© 2006 MidiaSemMascara.org
Ainda bem que as pessoas não saem por aí desafiando a lei da gravidade, tal qual insistem em por à prova a velha lei econômica da oferta e da demanda. Fico imaginando indivíduos usando as janelas dos edifícios, no lugar das escadas e dos elevadores, ou saltando de aviões em pleno vôo. Seria uma catástrofe, sem dúvida.
Pode parecer uma comparação descabida, afinal, afrontar a lei da oferta e da demanda não mata (pelo menos não instantaneamente). No entanto, em vários casos pode provocar danos bastante consideráveis. Numa economia livre, ou parcialmente livre, como a nossa, boa parte dos preços é determinada por essa lei: produtos, serviços, salários, juros, câmbio, aluguéis, etc. Hoje, pretendo falar de câmbio.
Todos os dias, chova ou faça sol, abrimos os jornais e nos deparamos com a indefectível chorumela dos arautos do protecionismo tupiniquim - abrigados sob pomposas siglas, como FIESP, FIRJAN, CIESP, etc. - contra a taxa de câmbio. Normalmente, acompanham-nos nesse enfadonho lamento os puxa-sacos, digo, jornalistas especializados, os doutores em economia "uspianos" e congêneres da UFRJ, alguns ministros de estado e outras carpideiras menos afamadas. Sem exceção, defendem que o dólar está muito barato. Agarram-se com todas as forças ao velho mito mercantilista segundo o qual todos os esforços de uma nação devem ser direcionados para aumentar as exportações e limitar as importações, como se a acumulação de reservas internacionais significasse aumento da riqueza nacional.
Abraçados à sua cartilha retrógrada, vociferam que devemos produzir superávits comerciais a qualquer custo e, por conseguinte, precisamos manter nossa moeda permanentemente desvalorizada, mesmo que para isso seja necessário enterrar o sistema de câmbio flutuante, predominante em todo o mundo civilizado. Cada um a seu modo e pelos mais variados motivos - os empresários por medo da concorrência externa; os jornalistas especializados porque, salvo raríssimas exceções, são incapazes de pensar pela própria cabeça; os "doutores" em dirigismo econômico da USP e da UFRJ por puro proselitismo; e os ministros de estado por interesses eleitoreiros ou mero desconhecimento - todos bradam pela desvalorização do Real. A força dessa estratégia (digna de um Gramsci) é de tal amplitude que hoje é raro encontrar alguém que não concorde com esse sofisma.
Idéias estapafúrdias não faltam: centralização, arbitramento, controle de fluxo, intervenções diárias, etc. O engraçado é que, paradoxalmente, os mesmos que sugerem essas práticas ilusionistas são unânimes em defender - desde que o assunto não seja câmbio, é claro - a necessidade de termos uma moeda forte e de fácil conversibilidade, se quisermos prosperar no mundo globalizado de hoje. Só esquecem o óbvio: moeda forte não se coaduna com controle de câmbio. Nem mesmo o yuan, a despeito das enormes reservas internacionais chinesas, tem conversibilidade fácil, simplesmente porque a sua paridade "oficial" é absolutamente artificial.
A verdade é que não existe mágica. Enquanto a entrada de moeda estrangeira no país continuar maior do que a saída, seja em função dos incessantes superávits comerciais, seja por conta da afluência maciça de investimentos estrangeiros, o dólar vai permanecer desvalorizado. Não custa repetir: por mais que já tenham tentado - e foram inúmeras as tentativas - ainda não conseguiram derrubar a velha lei da oferta e da demanda.
Qual é então a solução? Façamos a pergunta ao senhor mercado: se há excesso de algum produto, qual é a "fórmula" normalmente utilizada pelos seus agentes para equilibrar as coisas? Elementar, meu caro Watson. A queda do preço desestimulará a produção e aquecerá a demanda até que elas se equilibrem num novo patamar. O problema é que a solução espontânea do mercado jamais será eficaz em situações onde o Estado estiver exercendo a sua influência nefanda. E este, infelizmente, é o caso brasileiro. Só os ingênuos podem achar que as nossas vendas para o exterior são muito superiores às compras porque temos uma certa vocação exportadora ou porque o resto do mundo precisa mais dos nossos produtos do que nós dos deles. Nada poderia ser mais falso. Nossa balança comercial é superavitária simplesmente porque os produtos exportados são isentos de quaisquer impostos, enquanto os importados são taxados de todas as formas possíveis, além de conviverem com inúmeras barreiras alfandegárias e burocráticas.
O nosso propalado superávit é, por conseguinte, induzido por barreiras legais. Não é outra a razão por que, apesar do baixo preço, a demanda por dólar ainda permanece bem abaixo da oferta. Como equilibrar as coisas? Não é difícil deduzir que a única maneira razoável é liberar as amarras das importações. Falo de redução e corte de impostos, desburocratização aduaneira, liberação de créditos à importação, dentre outras medidas que tornem atraente a compra de produtos no exterior.
Uma eventual abertura do mercado brasileiro aos importados, além de beneficiar o consumidor com a oferta de mercadorias baratas e de qualidade, equilibrar a balança comercial e deter a desvalorização do dólar, seria especialmente benéfica em termos de controle da inflação – a concorrência costuma fazer cair os preços -, facilitando, inclusive, a redução da taxa básica de juros. Tudo isso, sem falar no enorme incentivo que tal medida traria à promoção do comércio internacional do país. Aliás, nunca é demais repetir: o que estimula o crescimento econômico não é o superávit comercial, mas a soma das correntes de comércio com exterior.
A solução para o problema cambial é simples. Só não vê quem não quer. Ou melhor, quem prefere ficar do lado dos anti-capitalistas; dos que têm aversão à livre concorrência; dos que sabem que não sobreviverão sem esse protecionismo estúpido, mas tão popular.
O autor é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=4569
Resumo: Nunca é demais repetir: o que estimula o crescimento econômico não é o superávit comercial, mas a soma das correntes de comércio com exterior.
© 2006 MidiaSemMascara.org
Ainda bem que as pessoas não saem por aí desafiando a lei da gravidade, tal qual insistem em por à prova a velha lei econômica da oferta e da demanda. Fico imaginando indivíduos usando as janelas dos edifícios, no lugar das escadas e dos elevadores, ou saltando de aviões em pleno vôo. Seria uma catástrofe, sem dúvida.
Pode parecer uma comparação descabida, afinal, afrontar a lei da oferta e da demanda não mata (pelo menos não instantaneamente). No entanto, em vários casos pode provocar danos bastante consideráveis. Numa economia livre, ou parcialmente livre, como a nossa, boa parte dos preços é determinada por essa lei: produtos, serviços, salários, juros, câmbio, aluguéis, etc. Hoje, pretendo falar de câmbio.
Todos os dias, chova ou faça sol, abrimos os jornais e nos deparamos com a indefectível chorumela dos arautos do protecionismo tupiniquim - abrigados sob pomposas siglas, como FIESP, FIRJAN, CIESP, etc. - contra a taxa de câmbio. Normalmente, acompanham-nos nesse enfadonho lamento os puxa-sacos, digo, jornalistas especializados, os doutores em economia "uspianos" e congêneres da UFRJ, alguns ministros de estado e outras carpideiras menos afamadas. Sem exceção, defendem que o dólar está muito barato. Agarram-se com todas as forças ao velho mito mercantilista segundo o qual todos os esforços de uma nação devem ser direcionados para aumentar as exportações e limitar as importações, como se a acumulação de reservas internacionais significasse aumento da riqueza nacional.
Abraçados à sua cartilha retrógrada, vociferam que devemos produzir superávits comerciais a qualquer custo e, por conseguinte, precisamos manter nossa moeda permanentemente desvalorizada, mesmo que para isso seja necessário enterrar o sistema de câmbio flutuante, predominante em todo o mundo civilizado. Cada um a seu modo e pelos mais variados motivos - os empresários por medo da concorrência externa; os jornalistas especializados porque, salvo raríssimas exceções, são incapazes de pensar pela própria cabeça; os "doutores" em dirigismo econômico da USP e da UFRJ por puro proselitismo; e os ministros de estado por interesses eleitoreiros ou mero desconhecimento - todos bradam pela desvalorização do Real. A força dessa estratégia (digna de um Gramsci) é de tal amplitude que hoje é raro encontrar alguém que não concorde com esse sofisma.
Idéias estapafúrdias não faltam: centralização, arbitramento, controle de fluxo, intervenções diárias, etc. O engraçado é que, paradoxalmente, os mesmos que sugerem essas práticas ilusionistas são unânimes em defender - desde que o assunto não seja câmbio, é claro - a necessidade de termos uma moeda forte e de fácil conversibilidade, se quisermos prosperar no mundo globalizado de hoje. Só esquecem o óbvio: moeda forte não se coaduna com controle de câmbio. Nem mesmo o yuan, a despeito das enormes reservas internacionais chinesas, tem conversibilidade fácil, simplesmente porque a sua paridade "oficial" é absolutamente artificial.
A verdade é que não existe mágica. Enquanto a entrada de moeda estrangeira no país continuar maior do que a saída, seja em função dos incessantes superávits comerciais, seja por conta da afluência maciça de investimentos estrangeiros, o dólar vai permanecer desvalorizado. Não custa repetir: por mais que já tenham tentado - e foram inúmeras as tentativas - ainda não conseguiram derrubar a velha lei da oferta e da demanda.
Qual é então a solução? Façamos a pergunta ao senhor mercado: se há excesso de algum produto, qual é a "fórmula" normalmente utilizada pelos seus agentes para equilibrar as coisas? Elementar, meu caro Watson. A queda do preço desestimulará a produção e aquecerá a demanda até que elas se equilibrem num novo patamar. O problema é que a solução espontânea do mercado jamais será eficaz em situações onde o Estado estiver exercendo a sua influência nefanda. E este, infelizmente, é o caso brasileiro. Só os ingênuos podem achar que as nossas vendas para o exterior são muito superiores às compras porque temos uma certa vocação exportadora ou porque o resto do mundo precisa mais dos nossos produtos do que nós dos deles. Nada poderia ser mais falso. Nossa balança comercial é superavitária simplesmente porque os produtos exportados são isentos de quaisquer impostos, enquanto os importados são taxados de todas as formas possíveis, além de conviverem com inúmeras barreiras alfandegárias e burocráticas.
O nosso propalado superávit é, por conseguinte, induzido por barreiras legais. Não é outra a razão por que, apesar do baixo preço, a demanda por dólar ainda permanece bem abaixo da oferta. Como equilibrar as coisas? Não é difícil deduzir que a única maneira razoável é liberar as amarras das importações. Falo de redução e corte de impostos, desburocratização aduaneira, liberação de créditos à importação, dentre outras medidas que tornem atraente a compra de produtos no exterior.
Uma eventual abertura do mercado brasileiro aos importados, além de beneficiar o consumidor com a oferta de mercadorias baratas e de qualidade, equilibrar a balança comercial e deter a desvalorização do dólar, seria especialmente benéfica em termos de controle da inflação – a concorrência costuma fazer cair os preços -, facilitando, inclusive, a redução da taxa básica de juros. Tudo isso, sem falar no enorme incentivo que tal medida traria à promoção do comércio internacional do país. Aliás, nunca é demais repetir: o que estimula o crescimento econômico não é o superávit comercial, mas a soma das correntes de comércio com exterior.
A solução para o problema cambial é simples. Só não vê quem não quer. Ou melhor, quem prefere ficar do lado dos anti-capitalistas; dos que têm aversão à livre concorrência; dos que sabem que não sobreviverão sem esse protecionismo estúpido, mas tão popular.
O autor é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=4569