Ideologia e Genética

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blink
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Ideologia e Genética

Mensagem por blink »

No fim do século 19 e principios do seculo 20 a Eugenia era uma ciência respeitavel. Julgava-se então, e a ciência apoiava, que havia algo de muito sombrio no futuro da espécie humana. As pessoas consideradas superiores (de boas famílias, prósperas, inteligentes) não tinham tantos filhos como as pessoas consideradas inferiores (os rudes, imorais, puco inteligentes). Para a Eugenia isto significava que, se as coisas se mantivessem assim, haveria inevitavelmente uma degradação do património genético da humanidade, porque os genes das pessoas inferiores iria prevalecer nas gerações futuros. A este pesadelo deu-se o nome de disgenesia.

O pensamento eugénico estabelecia então uma ligação direta entre a condição hereditária da pessoa e o seu modo de vida (este pensamento era reforçado pelo darwinismo social). Por eexemplo, se uma pessoa era pobre, então, de alguma forma, a pobreza estava na sua natureza. De maneira que, acreditando nisto, era normal que as pessoas "esclarecidas" da época julgassem que algo deveria ser feito para impedir a degradação genética da humanidade. Esta retórica fazia todo o sentido na altura e convenceu pessoas tão eminentes como Bertrand Russel; Bernard Shaw ou Winston Churchil. George Bernard Shaw dizia: "Sendo covardes, derrotamos a seleção natural ao abrigo da filantropia. Sendo preguiçosos negligenciamos a seleção artificial ao abrigo da delicadeza e da moralidade".
Aqui, Shaw estava a apelar á ideia de que era preciso perder a delicadeza e forçar a espécie humana a procriar seletivamente de maneira a que as pessoas superiores procriassem muito mais entre si. E por outro lado era necessário impedir que os "inferiores", o lixo genético, procriassem. De alguma forma era necessário que os seres humanos de então fossem maus para que os seres humanos do futuro fossem melhores. Estranha contradição.

Estas ideias, sancionadas pela ciência de então, levaram ao nascimento de várias sociedades Eugénica na Europa e na América. Antes da segunda guerra mundial centenas de milhares de indesejáveis foram compulsivamente esterilizados para o bem da espécie. Na Alemanha as coisas foram mais Graves. Inspirados na "ciência" do grande Biologo Ernst Haeckel, a sociedade Monista (uma sociedade Eugénica), defendia a eliminação dos inaptos. A sociedade Monista foi a influência direta que Hitler teve. E o resto foi história. E o que a história mostra é que o Nazismo foi o corolário lógico de um caminho que a ciência legitimou. A disto tudo lição é esta: É preciso muito cuidado quando se aplica a ciência á organização das sociedades. A ciência misturada com ideologia é veneno. Um outro exemplo deste veneno é a aplicação do Marxismo, uma teoria pretensamente ciêntífica sobre a forma como a sociedade se deveria organizar.

E o que dizer da Eugenia hoje em dia? Será que estamos a cometer o mesmo erro? A ciência que sanciona hoje o Eugenismo chama-se genética. Será que em nome da genética podemos cometer outras atrocidades?
Alguns dizem que sim. Jeremy Rifkin, por exemplo, que se opõe a qualquer manipulação genética não só de seres humanos como de quialquer outra forma de vida. Para ele há uma sabedoria natural, uma história evolutiva que criou seres vivos bem adaptados. Mexer nisto, com manipulações genéticas, é meio caminho para o desastre.

Apesar das diferenças, o argumento de Rifkin é um argumento para o bem da espécie. Tal com a Eugenia do seculo 19 era um argumento para o bém da espécie. Mas para o ambientalista Rifkin, para o bem da espécie significa não tocar em nada, enquanto que o Eugenista desejava mexer no pool genético eliminando as pessoas indesejáveis. Mas um e outro argumentam para o bem da espécie.

Um exemplo concreto pode mostrar como o argumento de Rifkin é perigoso e, se calhar, tão imoral como o argumento dos eugenistas.

Vamos supor que estamos numa sociedade democrática liberal. Vamos supor também que a genética já identificou todas as doenças genéticas e está preparada para intervir diretamente sobre elas impedindo a sua proliferação. Tudo o que falta é a permissão da sociedade para usar a tecnologia. Suponhamos que essa sociedade não tem nenhuma ideologia "Para o bem da espécie". Nesse caso o que acontecerá é óbvio. Todos os pais irão desejar ter filhos sem defeitos genéticos. Quem poderá, no seu perfeito juizo, julgar errado que um médico diga a futuros pais que o embrião tem defeitos genéticos mas que não há problema porque serão corrigidos? Algum paiou mãe, sabendo isto, deixaria o seu filho nascer por exemplo com distrofia muscular. Só se estivessem bebados, numa sociedade assim, na prática, muitos genes defeituosos seriam eliminados do pool genético da humanidade, sem que por trás disso existisse qq ideologia ou objetivo concreto para melhorar as espécie humana.
Agora vamos olhar a mesma sociedade dominada pela ideologia de Rifkin. Nessa sociedade acredita-se que não há genes maus. A evolução é Sábia e um gene "mau" hoje pode ser útil amanhã noutro ambiente. Ou seja, em nome de uma possivel e incerto bem para a espécie esta ideologia vai permitir que em gerações sucessivas nasçam pessoas para sofrer e morrer de forma evitável. Na Eugenia era-se activamente nau, No ambientalismo genético é-se passivamente mau. As ideologias para o bem da espécie são uma merda.

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Clauss
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Re.: Ideologia e Genética

Mensagem por Clauss »

Interessante essa linha Blink. Não tinha parado para pensar sobre eugenia e sociologia ainda. Mas a ciência afirma que o que fazemos é apenas acelerar o que a natureza leva mais tempo para fazer. Além do mais, os genes tendem a se adaptar para que seu aglomerado se adapte às suas necessidades e não às necessidades dos seres humanos.
Existem dois tipos de humanos: Os manipuladores e os manipulados. Qual deles você é?

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blink
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Registrado em: 09 Mar 2006, 14:01

Mensagem por blink »

Ei Johny... só falta mais isto... :emoticon16:

Mas isto ainda não refuta o argumento dos ambientalistas genéticos; de que a evolução é sábia e de que não existem genes maus. O que temos então são apenas genes e alguns estão apenas á espera de uma oportunidade de se mostrarem úteis. Eliminar qualquer variante genética significa diminuir a diversidade... o que pode conduzir, a longo prazo, á extinção da espécie humana.

Acho que não vale apena perder muito tempo com isto (declaração triunfal e arrogante :emoticon16: .)

Em primeiro lugar gostaria que eles me explicassem como pode a variação ao acaso fazer melhor que as escolhas conscientes do ser humano (mesmo que essas escolhas se baseiem em muita igorância, concerteza não são escolhas mais ignorante que a variação cega mais a seleção natural)

Em segundo lugar, alterar o pool genético não destroi a mutação, o motor da evolução. Portanto, nada impede que este "motor" adicione genes "bons" no pool genético.

Em terceiro lugar a evolução está constantemente a eliminar variantes genéticas por deriva genética. Portanto, a Sábia evolução também elimina genes. Mas, ao contrário dos seres humanos, não se importa se esses genes sãos bons ou maus.

Em quarto lugar, a diversidade genética humana é colossal. Para verem como é colossal basta dizer isto:
"Se caísse um cometa na Terra que eliminasse 95% da espécie humana, os restantes 5% ainda teriam mais diversidade genética do que toda a humanidade do tempo de Jesus. De fato. teria mais diversidade que qualquer grupo de mamiferos que alguma vez tenha existido." Lee Silver, geneticista

Ou seja, mesmo que eliminassemos as milhares de variantes de genes causadores de doenças, o impacto sobre a diversidade genética da humanidade seria insignificante.

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Clauss
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Re.: Ideologia e Genética

Mensagem por Clauss »

Sim, mas isto não esgota as possibilidades combinacionais entre os gênes. E ainda podemos ter os mesmo gênes tendo variações em uma determinada região e os mesmo não tendo em outra. São muitos os fatores, entende?
Existem dois tipos de humanos: Os manipuladores e os manipulados. Qual deles você é?

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blink
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Re.: Ideologia e Genética

Mensagem por blink »

O que importa, é que o ambientalismo genético é furado. Eu acho que se deixarem as coisas com os pais, as coisas poderão não correr mal com a aplicação da genética. O pior é se algum grupo com alguma ideologia tomar controlo do destino genético da humanidade. Aí... que os deuses nos acudam...

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Azathoth
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Re.: Ideologia e Genética

Mensagem por Azathoth »

Eugenia é falácia naturalística.
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blink
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Registrado em: 09 Mar 2006, 14:01

Re.: Ideologia e Genética

Mensagem por blink »

Pois é. A ideia de que se é natural, então é bom. Dá vontade de oferecer cogumelos venenosos a quem comete essa falácia... :emoticon16:

Trancado