Lula no país das maravilhas
Enviado: 09 Nov 2005, 08:09

Lula no país das maravilhas
Ninguém pode dizer que não foi uma viagem exótica a que Bush fez ao Brasil. Para começar, comeu na Granja do Torto um churrasco de carne de Mato Grosso. Em seguida, foi posto diante de um mapa do Brasil. Mais exótico que isso, só se Bush tivesse ido acampar com os colegas de Washington em Adis-Abeba.
O mais surpreendente mesmo foi o tal mapa do Brasil diante de Bush. Parece que isso é um hábito de Lula. Ele já tinha feito o mesmo com autoridades chinesas que estiveram por aqui. Volta e meia, Lula pega um estrangeiro e mostra o mapa do Brasil para ele. Mas, diante do mapa, Bush fez a pergunta que aparentemente não quer calar: onde fica a Amazônia? É isso aí. O sujeito é o chefe da nação mais poderosa do mundo e não sabe onde fica a Amazônia. Para quem está insatisfeito com seu presidente da República, não deixa de ser um consolo. O toque de classe foi Lula apontar direitinho para Bush a localização que despertou a curiosidade do presidente americano. Em outras palavras: Lula sabe onde fica a Amazônia! Pelo que o seu governo faz pela região, nem parece.
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Está sendo, definitivamente, a temporada Lula. Depois do rega-bofe com Bush, nosso líder e senhor dignou-se a dar uma entrevista, mais ou menos coletiva, no programa “Roda viva”. Foi a primeira entrevista do presidente desde que começou a aparentemente interminável crise que afunda seu governo. Bem, teve aquela maracutaia em Paris, mas é melhor não se lembrar disso.
Passada a entrevista, fica uma constatação: é inacreditável que o presidente não tenha dado uma entrevista antes. Ele se sai muito bem nestas situações. É seguro, simpático, leva o assunto para onde lhe interessa, até parece mesmo um estadista preocupado com os rumos do país. O único problema de Lula — e talvez ele já tenha se dado conta disso e, por isso mesmo, prefira não se expor em entrevistas — é que, entre perguntas e respostas, ele acaba demonstrando que vive num país imaginário. Tal qual Alice, é o Lula no país das maravilhas. Fala de progressos que só ele vê, não acredita em denúncias cada vez mais evidentes, finge que apóia qualquer CPI e tira da cartola uma numerália que descreve um país que vai pra frente, irritando os espectadores que só vêem o país andando para trás.
É tanta fantasia no discurso de Lula que, no fim, ele fica com uma imagem meio ridícula. Pois ridícula é a única maneira de qualificar sua resposta quando o apresentador do programa, Paulo Markum, perguntou-lhe sobre o apoio milionário da Telemar aos negócios esquisitos de seu filho, Fábio Luís Lula da Silva. O presidente creditou o interesse da telefônica em participar do negócio do primeiro filho ao “extraordinário sucesso” dos programas de televisão (?) que a empresa dele produz. “Têm mais audiência que a MTV”, orgulhou-se Lula pai. Vem cá, quem contou isso para o presidente? E ele acreditou? Me diz: é ou não é uma Alice?
Foi patética também a reação do presidente à pergunta de Heródoto Barbeiro sobre os comentários de que ele não gosta de trabalhar. Lula rebateu dizendo que trabalhou como operário durante 22 anos e que fazia hora extra aos sábados. Como se isso fosse o bastante para ele entrar no livro Guiness de Recordes. O desabafo foi para dizer que nunca trabalhou tanto como na Presidência da República. Cá entre nós, de alguma maneira ele tinha que compensar os longos períodos de descanso até finalmente ganhar uma eleição para o cargo que atualmente exerce.
Lula tem uma interpretação muito peculiar do que seja uma entrevista. Logo no início do programa foi cobrado dele o fato de ter passado tanto tempo sem conversar com a imprensa. Ele se mostrou surpreso. Afinal, tem dias em que faz até oito pronunciamentos. Que tal? Ele acha que basta isso. Que a população fica satisfeita com seus discursos. Que ninguém precisa lhe cobrar nada. Não interessa o que o povo quer lhe perguntar.
Enfim, Lula falou. E se mostrou mais ou menos como a gente imaginava que ele faria. Uma decepção.
Em todo caso, ponto para o “Roda viva”, que conseguiu convencer o presidente e comemorou com fanfarras a edição de seu milésimo programa.
http://oglobo.globo.com/jornal/colunas/xexeo.asp