Um enigma chamado Stálin

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O ENCOSTO
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Um enigma chamado Stálin

Mensagem por O ENCOSTO »

Um enigma chamado Stálin





Cinco décadas depois da divulgação do Relatório Kruchióv - que expôs para o mundo a tirania e as atrocidades de Josef Stálin -, o sanguinário ditador soviético emerge de maneira ainda mais clara e assustadora em Stálin - A Corte do Czar Vermelho, livro do historiador inglês Simon Sebag Montefiore.

A monumental obra, com mais de 800 páginas, é resultado de uma pesquisa que desencava memórias, depoimentos, entrevistas, diários inéditos, cartas, agendas e bilhetes que só vieram a público recentemente, depois do colapso da União Soviética. O material mostra como Stálin e seus mais próximos seguidores comandaram a União Soviética por mais de duas décadas, transformando o Kremlin em um condomínio e o país em um imenso pátio comandado por eles. Béria, Mólotov, Vorochílov, Khruchióv formavam o círculo mais íntimo, e foi cercado por eles que Stálin lançou as bases do seu projeto de poder. O livro os identifica como "os magnatas". Todos moravam em apartamentos no Kremlin, se freqüentavam com assiduidade, levavam, nos primeiros anos, vidas modestas e só exageravam nas bebidas alcoólicas em algumas festas nas dachas. O aparente clima de amizade era apenas uma fachada para relacionamentos baseados na desconfiança, no medo e na paranóia.

A máquina de terror montada por Stálin durou anos, caçou inimigos até no Exterior (como Trotski, que, conforme revela o livro, era odiado por Stálin desde que os dois se conheceram e que foi assassinado no México em 1940 numa ação arquitetada por Béria) e amedrontou desconhecidos e pessoas próximas. Prova disso foi a queda de muitos nomes que surgiam como herdeiros de Stálin e que aos poucos foram sendo abandonados e/ou eliminados.

Montefiore conta que, ao contrário do terrível burocrata definido por Trotski, Stálin, na verdade era um organizador de talento, que jamais improvisava e que tomava decisões pesando-as cuidadosamente. Era encantador, um mestre das amizades e, quando queria, era irresistível. O livro é rico ao desvendar o lado menos conhecido do enigma Stálin. O rude camponês da Georgia era ainda um leitor compulsivo (tinha uma biblioteca de mais de 20 mil volumes), um admirador da música e da poesia e ainda um espectador atento de filmes, em especial os de John Wayne. Era também um pai extremado, principalmente com a filha Svetlana. E é aí que reside a maior virtude do livro de Montefiore: ao humanizar Stálin, o autor o deixa ainda mais monstruoso.





O reino de terror do czar vermelho
UBIRATAN BRASIL/ Agência Estado




A figura do ditador Josef Stálin sempre permaneceu como um grande enigma da história recente - famoso pelo impenetrável perfil de esfinge e modéstia fleumática, representados pelo cachimbo que fumava de modo ostentoso, o ex-líder supremo da antiga União Soviética deixou o retrato de um homem inflexível, desumano em sua crueldade, mergulhado em sofrimento, para muitos o representante do próprio mal. A abertura dos arquivos secretos em 1999, após o colapso da União Soviética, permitiu que pesquisadores tivessem acesso a novas informações, o que trouxe mais detalhes sobre a vida íntima de Stálin.

O primeiro a desvendar os segredos foi o inglês Simon Sebag Montefiore, autor de Stálin - A Corte do Czar Vermelho (Companhia das Letras, 864 páginas, R$ 64). Escritor e jornalista, que estudou história na Universidade de Cambridge, Montefiore é autor de Potemkim: Prince of Princes e, com a obra mais recente, ganhou o British Book Awards de melhor livro de história de 2004.

Por meio de documentos que passavam todos os dias pela escrivaninha de Stálin, em muitos dos quais ele deixava sua marca de aprovação, reprovação ou escárnio, Montefiore desenha um novo perfil do ditador que, sob uma pesada mão de ferro, comandou o estado comunista entre 1941 e 1953 sob o símbolo do terror.

A figura do homem que comandou sangrentos expurgos (segundo cálculos de historiadores, cerca de 25 milhões de soviéticos foram vítimas da repressão stalinista) surge com detalhes na descrição feita por Montefiore.

A seguir, a entrevista que o autor concedeu por telefone de sua casa em Londres:

Pergunta - Como foi a pesquisa nos arquivos russos?

Simon Sebag Montefiore - Os arquivos foram um verdadeiro tesouro, um grande manancial para a minha pesquisa. Creio que o mais interessante foi a possibilidade de mostrar Stalin de uma outra forma - não apenas sua face opressiva de ditador, mas principalmente seu lado humano, o estilo, seus interesses particulares, a relação com a mulher e a filha. Assim, ao mesmo tempo em que lidei com papéis em que Stálin ordenava mortes, descobri o homem brincalhão, um tenor de razoável talento, um contador de piadas, um intelectual que amava Ernest Hemingway, um cultivador de rosas. É evidente que jamais será esquecido que ele foi um comandante extremamente violento, mas espero que esse trabalho possa alterar a forma como o stalinismo seja descrito no futuro.

Pergunta - Qual a dificuldade que o senhor encontrou para discernir, no livro, as informações pessoais de Stálin e sua vida política?

Montefiore - Foi muito grande. Stálin definia muito sua vida pessoal a partir de seus passos políticos. Ele misturava realmente tudo, mas sabia como balancear. Assim, muitas vezes sua rotina se assemelhava a um filme, em que assassinatos combinavam com descanso de feriados, danças, com morte, envenenamento, com jantares. Era algo como torturar suas vítimas ao longo da noite e, pela manhã, tomar um frugal café da manhã com as mulheres dessas vítimas e com as mangas ainda sujas de sangue. O importante é entender como os terríveis eventos da história tornam-se normais, o que pode explicar como esse tipo de vilania é capaz do impossível, ou seja, conviver com a morte de milhões de pessoas.

Pergunta - É possível acreditar, então, que Stálin nunca descansava?

Montefiore - Sim, é bem provável, pois ele nunca relaxava. Afinal, mesmo quando jantava com amigos ou com a família, ou quando assistia a seus filmes preferidos, especialmente os faroestes de John Ford e John Wayne, ele decidia assuntos de Estado e compartilhava a responsabilidade pelo terror como os chamados "magnatas", os membros do círculo íntimo do poder - Molotov, Vorochílov, Mikoian, Khruchióv e muitos outros. Ainda sobre cinema, ele usava uma sala particular e era um censor implacável dos filmes soviéticos: tudo era submetido antes ao seu crivo. Era comum Stálin escrever as letras de suas canções, vetar roteiros, até modificar títulos. Para Ivan, o Terrível, de Eisenstein, por exemplo, ele preparou uma apresentação, uma verdadeira masterclass ao cineasta sobre como Ivan deveria ser apresentado - é que se tratava de seu herói favorito. Finalmente, era um leitor compulsivo, gostava tanto de Balzac quanto de Zola, interessava-se pela Grécia antiga e pelas táticas do chanceler alemão Otto von Bismarck, fazia anotações em todos seus livros. "Mesmo quando estiver com 70 anos, estarei aprendendo", costumava dizer.

Pergunta - Foi muito difícil enumerar tantos detalhes?

Montefiore - Bem, foi muito divertido pois agi como um verdadeiro detetive para descobrir familiares e amigos que ainda estivessem vivos. Busquei extrair todas as informações possíveis, desde as grandes decisões como comandante até a forma como Stálin andava com os pés virados para dentro. Também foi difícil encontrar os filhos de outros líderes soviéticos, embora quando encontrava um, logo conseguia o contato de outro. O mais complicado era convencê-los a falar.

Pergunta - Os tempos são outros, mas ainda é possível comparar Stálin a Saddam Hussein?

Montefiore - É curioso lembrar que Saddam Hussein sempre foi obcecado pela história de Stálin e que há muitos pontos comuns entre eles. Ambos tiveram mães enérgicas, foram instruídos por mestres inteligentes e carregam a fama de serem filhos ilegítimos. A diferença é que Saddam Hussein é menos sofisticado do que Stálin.






Trecho de "Stálin - A Corte do Czar Vermelho"




"Depois de mais uma fuga, Koba retornou a Petersburgo em 1912, compartilhando o quarto com um bolchevique corpulento que seria seu camarada mais próximo: Viatcheslav Scriábin, de apenas 22 anos, acabara de adotar o costume bolchevique de assumir um codinome bem masculino, escolhendo o "nome industrial" de Mólotov - "o martelo". Koba também assumira uma alcunha "industrial": em 1913, assinou pela primeira vez um artigo com o nome "Stálin". Não era por coincidência que "Stálin" rimava com "Lênin". Talvez já tivesse se usado este nome antes, e não apenas por seu som metálico. Talvez o tivesse tomado emprestado da "bela e rechonchuda" bolchevique Ludmila Stal, com quem tivera um caso.

Esse "georgiano maravilhoso", como Lênin o chamou, foi cooptado pelo Comitê Central do Partido no final da Conferência de Praga de 1912. Em novembro, Koba Stálin viajou de Viena a Cracóvia para se encontrar com Lênin, com quem ficou. O líder supervisionou seu dileto discípulo na escrita de um artigo que expressava a posição bolchevique sobre a sensível questão de nacionalidade, a partir de então uma especialidade de Stálin. "O marxismo e a questão nacional", que defendia a manutenção do Império Russo unido, granjeou-lhe renome ideológico e a confiança de Lênin.

"Foi você que escreveu tudo isso", perguntou Lênin (de acordo com Stálin).

"Sim... Cometi algum erro?"

"Não, ao contrário, está excelente!" essa foi sua última viagem ao exterior antes da Conferência de Teerã, em 1943.

Em fevereiro de 1913, Stálin foi preso de novo e recebeu uma pena de exílio suspeitamente leve: seria ele um agente da Okhrana, a polícia secreta do czar? O sensacionalismo histórico da duplicidade de Stálin revela uma incompreensão ingênua da vida na clandestinidade: os revolucionários foram incessantemente espionados pela Okhrana, mas muitos eram agentes duplos ou triplos. Koba estava disposto a trair colegas que se opunham a ele, mas, como a Okhrana admitia em seus relatórios, ele continuava a ser um marxista fanático - e era isso o que importava.

O último exílio de Stálin começou em 1913, no distante e gélido Nordeste da Sibéria, onde ganhou o apelido de "Zé Bexiguento" dos camponeses locais. Temendo-se mais fugas, os exilados foram levados para Kureika, uma aldeia desolada em Turukhansk, ao norte do Círculo Ártico, onde a perícia de Stálin na pesca convenceu os habitantes locais de que possuía poderes mágicos e onde teve mais uma amante. Stálin escreveu cartas de lamentação para Serguei e Olga Allilúiev: "A natureza nesta região maldita é vergonhosamente pobre". E implorava que lhe mandassem um postal: "Estou louco de saudade por cenas da natureza, mesmo que seja apenas no papel". Não obstante, foi também um tempo feliz, talvez o mais feliz da vida, pois até morrer gostava de lembrar de suas aventuras naquele lugar, em particular da expedição de caça, quando esquiou taiga adentro, matou muitas perdizes e depois quase morreu congelado no caminho de volta."






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O ENCOSTO


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Onde houver fé, levarei a dúvida.

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Tranca
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Re.: Um enigma chamado Stálin

Mensagem por Tranca »

Ele já deve ter reencarnado umas duas vezes de lá para cá. Deve ter evoluído bastante.

Pode ser hoje um espírita bem evoluído, que escolheu pagar o seu karma através do trabalho voluntário para o bem da humanidade, tendo tido pais muito ricos e nascido sem nenhum defeito físico, ao invés morrer as próximas 25.000.000 de encarnações por fuzilamentos, torturas e outros modos de assassinato ou nascer umas 10.000.000 de encarnações retardado.
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Roberto Campos

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Samael
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Re.: Um enigma chamado Stálin

Mensagem por Samael »

Pode ter sido, segundo Montefiore, um leitor assíduo, mas, de forma alguma, foi um bom intelectual. Quem já leu algo do punho do dito cujo sabe do que estou a falar.

Nesse quesito Lênin era bem superior...

Trancado