Horror.

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spink
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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opinia ... 200607.htm


JOÃO SAYAD

Horror

Cena de horror : corpos espalhados pelo chão ao lado de sapatos, bolsas, roupas e outros objetos pessoais. A vida transformada em uma coisa qualquer por tsunamis, terremotos, deslizamentos de terra ou furacões. É a revelação surpreendente da fragilidade da vida humana neste mundo de 14 bilhões de anos.
Depois há o horror causado pelos bombardeios, campos de concentração, nações inteiras fugindo por estradas enlameadas. O horror da cobiça, do racismo ou de grandes idéias sobre um novo mundo racialmente puro, sem desigualdade, totalmente cristão ou totalmente muçulmano.
Há também o horror dos pesadelos. Monstros com a cara coberta de cicatrizes e dentes assustadores, insetos gigantescos ou seres de outros planetas dos filmes de terror. Horror ao desconhecido.
O Brasil está um horror. Não é o belo horrível da natureza nem o horror trágico das guerras.
Um horror patético. Não "patético" de "pathos" ou paixão. Patético no sentido modificado -a mistura insólita do triste com o ridículo. Um horror como o do filme Fargo quando o assassino depois de esquartejar a vítima a luz do dia no quintal, descobre que pernas e braços ensangüentados não cabem no porta-malas do carro.
Um horror pequeno demais para rezarmos pedindo misericórdia. Vazio de idéias que justificassem um renascimento político ou uma nova ONG. Estamos horrorizados com escândalos sobre amores clandestinos, furtos de dinheiro público, mentiras, sonegação,desobediência tosca às leis e outras trapalhadas.
Passaremos o ano eleitoral distraídos com essas coisas horrorosas.
O destino do país seria diferente se nada disso tivesse acontecido? Nunca mais veríamos fotos de presos nus no pátio das prisões? Rio e São Paulo ficariam livres do PCC e da guerra diária entre policia e traficantes? Mais importante ainda -cresceríamos mais depressa do que os míseros 2% para que os brasileiros que saem da universidade encontrem emprego?
Irritados, não conseguimos enxergar onde está o país. Fomos protegidos do vazio da pós-modernidade (com exceção do pensamento econômico) Temos alguns marxistas, restam conflitos entre a esquerda e a direita. Não há terrorismo. Não somos fundamentalistas como americanos e o Oriente Médio. Nem brancos e racistas como a Europa, que queima hospedarias marroquinas ou é agredida por hordas de adolescentes de origem árabe ou africana na França. Nem choramos a morte de um líder acusado de genocídio como na Sérvia. Talvez sejamos o único país do mundo onde ainda se discute reforma agrária.
Estamos horrorizados com a falta de escrúpulo e pela falta de jeito que gerou os escândalos políticos.
Horror trágico é sublimado em teatro épico em prosa ou verso. Ou gera revoluções. O nosso nem pode ser sublimado. É inconsolável.
Estamos horrorizados como o passageiro de avião sobre quem a aeromoça derrubou um bule de café ou como quem descobre que o pneu furou numa noite de chuva na marginal. Coisas horrorosas, que nos enchem de raiva, nos envergonham, mas são irrelevantes para a mudar os rumos do país.
"Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma." (Joseph Pulitzer).

Trancado