Kramer,
karma é uma palavra que vem do sânscrito e significa "ação". Esse termo era originalmente utilizado no contexto do "Hinduísmo" ortodoxo e foi absorvido pelo Budismo, embora com algumas modificações conceituais. Não vou adentrar no conceito hindu de karma, pois não o conheço suficientemente para isso.
Nos escritos de Kardec, a palavra karma não aparece, mas é introduzido o conceito de Lei de Ação e Reação. Vejamos a definição espírita dessa suposta lei:
www.espirito.org.br escreveu:Não há uma única imperfeição da alma que não importe funestas e inevitáveis conseqüências, como não há uma só qualidade que não seja fonte de um gozo.
A lei de ação e reação, ou o a cada um segundo suas próprias obras, baseia-se num perfeito mecanismo de justiça e igualdade absoluta para todos.
O mal sempre gerará consequencias desagradáveis.
A inspiração desse princípio do Espiritismo vem da Terceira Lei de Newton ("Toda ação provoca uma reação de igual intensidade e em sentido contrário") combinada com uma interpretação da moral dos evangelhos.
O fundamento do karma na visão budista vem do princípio da condicionalidade (
idappaccayata):
SN.II.28,65 escreveu:A. Imasmim sati idam hoti: Quando existe isso, aquilo existe.
Imasuppada idam upajjati: Com o surgimento disso, aquilo surge.
B. Imasmim asati idam na hoti: Quando não existe isso, aquilo também não existe.
Imassa nirodha idam nirujjhati: Com a cessação disto, aquilo cessa.
Isso quer dizer que as coisas ocorrem de maneira interdependente. Por exemplo, para eu estar aqui escrevendo para você são necessárias muitas condições (eu estar vivo, ter tempo, ter a motivação, ter um computador, ter acesso à Internet, etc.). É o que diz a parte A da citação acima. E a parte B diz que se alguma dessas condições não for satisfeita, eu não poderia estar aqui.
O entendimento do karma, nessa perspectiva, quer dizer que sofremos as consequências das nossas ações. Só que as reações não vêm de maneira direta, mas interagem numa complexa rede de condições que fazem com que as coisas se manifestem de uma maneira ou de outra. Isso nos permite entender, por exemplo, porque está cheio de bandidos soltos por aí enquanto há ladrões de galinha presos, embora as ações sejam moralmente distintas, há todo um conjunto de condições que permitem que as coisas aconteçam ou não.
Existe uma semelhança? Sim, existe, mas é demasiadamente superficial para que se chame os dois sistemas
similares, como feito pela autora desse seu livro. Há um texto clássico que ilustra bem uma importante diferença:
Muitos são os sofrimentos, muitas são as desvantagens desde corpo que dá origem a muitas doenças, como: problemas de visão, audição, olfato, paladar, pele, dor de cabeça, cachumba, problemas na boca, dor de dente, tosse, asma, ... diabetes, hemorróidas, cancer, fistulas, e doenças da bile, fleuma, vento, do conflito dos humores, de mudanças climáticas, de condições adversas, de dispositivos (por exemplo, quando o Lula perdeu o dedo), de kamma-vipaka (resultados do karma); e frio, calor, fome, sede, excrementos e urina.
Veja que karma aparece na lista de fatores,
como um deles e não como explicação geral para todos os males que podemos sofrer! Os espiritas, entretanto, postulam que não há mal que aconteça sem um motivo moral diretamente correspondente, pois partem da idéia de que essa é a maneira que Deus encontrou para tornar o universo justo - uma noção completamente estranha à visão budista.
Para resumir, enquanto karma (ou melhor, Lei de Ação e Reação) para os espíritas é um "mecanismo moral de perfeita justiça", para os budistas é um "fator moral de causalidade", sem nenhuma pretensão a ser "justo" ou "perfeito", mas a ser observado para que tenhamos atenção à qualidade das nossas ações e possamos evitar prejudicar a nós mesmos e aos outros com atitudes irrefletidas.