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É proibido proibir.

Enviado: 20 Abr 2006, 18:54
por spink
http://jc.uol.com.br/jornal/2006/04/20/not_180935.php


É proibido proibir
Publicado em 20.04.2006

MARIA HELENA HULAK

O excesso de regulamentação está em moda, beirando ao absurdo. Alguns fatos me chamaram a atenção na imprensa: “Bater em filhos menores e adolescentes será proibido”, pretende um novo projeto de lei da deputada Maria do Rosário, do PT-RS, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente. Outro fato que me chamou a atenção: “É proibido lançar olhares maliciosos para as(os) companheiras(os) de trabalho”, diz a nova cartilha de uma multinacional, segundo Gilberto Dimenstein em programa da JC/CBN. No primeiro caso, parece a descoberta da roda. Desde quando foi incentivado ou houve uma lei que permitisse bater em filhos? Menores, adolescentes ou maiores? Pensei que o Estatuto da Criança e do Adolescente abrangia, nas entrelinhas, a relação entre pais e filhos. E as milhares de pessoas que são espancadas diariamente? Cadê a lei? Ou o cumprimento dela? Quem tomará conta dos lares deste Brasil garantindo o cumprimento da nova lei?

Sabemos que a maioria dos crimes bárbaros contra crianças e adolescentes se dá nas classes mais desprotegidas, onde muitas vezes uma questão passional é vingada em crianças. Não que isso não ocorra em classes mais privilegiadas. Sem querer justificar, o desespero de não ter o que dar para um filho comer aliado à profunda ignorância levam miseráveis ao desespero. Se essas crianças tivessem acesso à educação, a um mínimo de alimentação diária, os choros noturnos poderiam ser amenizados e elas teriam esperança de uma vida melhor. Lei ou ementa não mata fome. Leiam a Ementa: “Dispõe sobre a alteração da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, o Novo Código Civil, estabelecendo o direito da criança e do adolescente a não serem submetidos a qualquer forma de punição corporal, mediante a adoção de castigos moderados ou imoderados, sob a alegação de quaisquer propósitos, ainda que pedagógicos, e dá outras providências.”

No segundo caso parei pra pensar. Qual seria o conceito de um olhar malicioso? Melhor: qual o conceito de malícia? Aquele que pode estar simplesmente admirando (do ponto de vista de encantamento) uma criatura e que possa ser tomado como malicioso? Seria o olhar que desnuda, tipo assedioso? Seria uma tentativa de paquera das mais ingênuas? Um olhar do tipo que se lança para uma pessoa que está prestes a ser demitida, ou admitida? Consultemos Aurélio Buarque de Holanda. Para ele, malícia significa, entre outras coisas, uma “interpretação maldosa”. Embora ele seja gênio no gênero, sabemos que as palavras são usadas, entendidas e aplicadas de forma inadequada. Então, teremos a interpretação da interpretação para saber se foi maldosa ou não.

Como será compreendido/interpretado um olhar? E como será flagrado? Todos usarão câmeras moderníssimas acopladas à lapela para que o filme vá a julgamento por uma corte? Imagine o caos, cada pessoa com uma leitura diferenciada sobre um “determinado” olhar. Qual seriam a pena máxima e a mínima? Dependeria da intensidade do olhar? Da sua duração? De outras expressões faciais? Faça-me o favor. Tantas preocupações para uma rede desse porte se ocupar, e vai agora espionar olhares. Seria bom parar de inventar e cuidar do cumprimento das leis em vigor. Ou será que terá uma lei específica: é proibido assaltar pessoas nas ruas, nos shoppings, nas entradas de suas residências, e é bom lembrar, também é proibido matá-las.

Recente tragédia no Blue Tree Park, quando uma criança de nove anos morreu em função de intoxicação alimentar, ainda sem resultado conclusivo, lembra a Resolução RDC nº 216 (2004) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa. Entre alguns regulamentos técnicos de “Boas Práticas para Serviços de Alimentação” estão, por exemplo: “... os manipuladores não devem falar desnecessariamente, cantar, assobiar”, etc. Trabalhar feliz, nem pensar: ter que criar um índice aferidor de fala desnecessária fica difícil, mas a falta de higiene no preparo e manuseio na estocagem de alimentos acontece, causando até a intoxicação de diversas pessoas e o óbito de outras.

Espancar criança ou adolescente sempre foi crime. Assediar sexualmente profissionais que estão no exercício do seu trabalho também. Cuidar da higiene básica nas cozinhas de qualquer estabelecimento comercial, sejam bares, restaurantes ou hotéis, sempre foi, ou deveria ser, questão prioritária. Não vamos inventar a roda, vamos fazê-la rodar de forma eficiente e eficaz.

Maria Helena Hulak é jornalista.

Re.: É proibido proibir.

Enviado: 20 Abr 2006, 18:56
por Poindexter
É proibido proibir que se proíba. :emoticon14:

Re.: É proibido proibir.

Enviado: 20 Abr 2006, 19:00
por Hugo
O problema é que proibições não adiantam no Brasil. Ninguém respeita.