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A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 12:42
por spink
Essa reportagem da revista Der Spiegel se divide em seis partes.
Peço a quem estiver lendo que espere eu terminar para (se quiser) responder.
Der Spiegel
A nova ascensão de uma ex-superpotência
O Kremlin, escorado por bilhões de dólares das receitas de gás e petróleo, vai ao encontro do G8 com uma mensagem importante: o Ocidente deve finalmente aceitar o fato de que Moscou voltou ao cenário mundial.
Walter Mayr e Christian Neef
A cidade sede de São Petersburgo está se preparando para seu debut mundial.
Na manhã de sábado, os chefes de Estado das principais economias capitalistas do mundo se encontrarão no Palácio Konstantin nos arredores da cidade. Isto marcará a primeira vez que um encontro do G-8 será presidido por um ex-oficial da KGB.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, deve estar satisfeito. O palácio elaborado, construído pelo grão-duque Constantino, foi reformado ao custo de US$ 280 milhões. Vinte novas vilas de luxo, completas com saunas e piscinas, foram construídas nos arredores para receber os convidados proeminentes que participarão do encontro do G-8.
O aeroporto da cidade ficará fechado para a aviação civil por três dias. Cães de rua e ratos foram exterminados do centro de São Petersburgo. Cinco mil moradores de rua foram registrados e tiveram suas impressões digitais colhidas para que pudessem ser enviados para o interior. Cerca de 80 câmeras de segurança adicionais foram instaladas ao longo da Nevsky Prospekt, a grande avenida entre a estação de trem Moscou e o Palácio de Inverno, a residência dos antigos czares.
São Petersburgo já viu sua parcela de incidentes infelizes envolvendo os habitantes locais e estrangeiros. Um senegalês foi baleado no início do abril e um homem de Mali foi esfaqueado em fevereiro. Um estudante de Camarões foi morto no último Natal, precedido por um estudante do Congo.
Segundo a prefeita Valentina Matviyenko, as mortes não tinham nada a ver com racismo. Alguns podem chamar São Petersburgo de "a capital da xenofobia", mas Matviyenko acredita que os ataques foram apenas "tentativas fracassadas de desacreditar o encontro do G-8" -e, conseqüentemente, Putin. O presidente planeja usar o encontro em sua cidade natal como palco para promover o que ele acredita serem os pontes fortes da Rússia: administração rígida, autoconfiança e vigor renovado.
Não mais em segundo plano
A elite política de Moscou tem martelado a nova mensagem nas cabeças de seus convidados de todo o mundo, uma mensagem que já foi assimilada em seu próprio país: a Rússia, renascida das cinzas da União Soviética e recém abastada com a receita do gás e petróleo que chega a bilhões de dólares, não mais se sente compelida a um papel secundário diante das grandes potencias mundiais.
A autoconfiança recém-encontrada da Rússia vem principalmente da percepção de que o vasto país, que se estende do Báltico até o Pacífico, "já é uma potência mundial há vários anos quando se trata de crescimento econômico", como Vladimir Putin anunciou logo depois do feriado nacional de 12 de junho.
Seus sentimentos ecoam nos cantos de um novo movimento jovem nacional, o Nashi (Nosso): "A Rússia foi e sempre será uma superpotência".
Encorajado pelos comentários de Putin, mesmo o geralmente comedido ministro da Economia, German Gref, começou a falar em superlativos nacionalistas.
Segundo Gref, o Fórum Econômico Mundial anual em fevereiro, um encontro realmente essencial para aqueles que tomam decisões, deveria ocorrer na Rússia no futuro. "Afinal, o que é Davos? Uma aldeia na Suíça. São Petersburgo é a cidade mais bela do mundo."
Dmitry Medvedev, o primeiro vice-primeiro-ministro e um candidato à sucessão de Putin em 2008, acrescentou sua contribuição à atual rodada de declarações autocongratulatórias vindas do Kremlin, com um comentário sobre a crise do dólar: "O atual estado da economia nos Estados Unidos -lar da única moeda de reserva do mundo- é questionável". Por este motivo, ele acrescentou, é o "direito moral" da Rússia buscar por novas alternativas. Segundo Medvedev, o rublo poderia servir como uma moeda de reserva mundial adicional. De fato, em 1º de julho, apenas duas semanas antes do encontro de cúpula em São Petersburgo, o Kremlin anunciou que a moeda russa agora passa a ter "convertibilidade livre".
Pouco antes do encontro do G-8, o Kremlin também pediu por uma nova moeda de reserva política e moral, um contrapeso para a visão de mundo americana dominante. Em um discurso para um grupo de embaixadores no final de junho, Putin disse, sem citar especificamente os Estados Unidos ou a guerra no Iraque, que o princípio de dominação conhecido como "Quod licet Jovi, non licet bovi" (O que é permitido a Zeus, não é permitido a um boi) não deveria ser aplicado a questões de resolução de conflitos internacionais. Em vez disso, ele disse, "padrões uniformes, universais" baseados na lei internacional deveriam ser aplicados.
Grande parte da retórica tóxica que Moscou está arremessando ao Ocidente não é necessariamente errada apenas porque está sendo recebida com desagrado pela União Européia e pelos Estados Unidos. O argumento de que o Ocidente emprega o que Putin e sua comitiva chama de "dois pesos e duas medidas" ao lidar com a Rússia é ocasionalmente repetido por outras partes do mundo, como a China, América Latina e pelos países árabes, por exemplo. Mas a nova Moscou está adotando um tom excessivamente vigoroso, quase violento, antes do encontro do G-8, ao mesmo tempo em que faz campanha aberta pelo seu direito de se tornar membro do mesmo clube que tão veementemente critica. É como se o principal pária da escola repentinamente decidisse convidar para sua casa as crianças mais populares de sua classe, mas apenas com a condição de que apreciem a honra que está sendo dada a elas.
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 12:45
por spink
Jogando xadrez com as reservas de energia
Especial "A reascensão de uma ex-superpotência" - parte 2
Quando os líderes dos países industrializados mais poderosos do mundo se reunirem no sábado no salão de baile de mármore do Palácio Konstantin, em São Petersburgo, a conversa se centrará no petróleo e no gás natural. A segurança da oferta mundial de energia será o principal assunto do encontro de cúpula do G-8.
O Ocidente está ciente de que a Rússia agora é um país chave quando se trata de energia. O reino de Putin conta com as maiores reservas de gás natural do mundo, e a Gazprom, o monopólio de fornecimento de gás do país, já é a terceira maior corporação do mundo. A Rússia só perde para a Arábia Saudita em produção de petróleo. Sua economia em boom está crescendo a uma média de 6% ao ano desde 1999.
O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, o primeiro e até o momento o único político que, após olhar para os olhos azuis pálidos de Putin, ficou convencido de que tinha descoberto a "alma" do presidente russo, terá duas opções em São Petersburgo: buscar a abordagem rude adotada pelo vice-presidente Dick Cheney ou seguir as regras da diplomacia.
Durante uma visita a Vilna, a capital da Lituânia, no início de maio, Cheney disparou uma série de críticas contra a Rússia, provocando um bate-boca entre as duas potências antes do encontro do G-8 e, ao mesmo tempo, acirrando retoricamente as relações já tensas entre Washington e Moscou.
"Nenhum interesse legítimo é servido quando petróleo e gás se tornam instrumentos de intimidação e chantagem", disse Cheney em um comentário direcionado à Rússia, que quatro meses antes fez com que a estatal Gazprom interrompesse o fornecimento de gás natural para a vizinha Ucrânia -uma resposta à recusa de Kiev de aceitar um aumento substancial do preço. A política de energia de Moscou, disse o vice-presidente americano, era apenas parte de uma mudança geral de direção, um retorno ao Estado forte. "Mas na Rússia de hoje", acrescentou Cheney, "os adversários da reforma estão buscando reverter os ganhos da última década. Em muitas áreas da sociedade civil -da religião e imprensa aos grupos de direitos e partidos políticos- o governo tem restringido de forma injusta e imprópria os direitos de seu povo".
O que o jornal liberal de Moscou "Kommersant" chamou de "o maior ataque contra a Rússia feito por um líder americano desde o fim da Guerra Fria" foi apenas acentuado pelo fato de Cheney ter seguido seu ataque com uma viagem ao Cazaquistão, país rico em petróleo e gás, onde só tinha elogios para o governante autocrático de longa data do país, Nursultan Nazarbayev: "Todos os americanos estão tremendamente impressionados com o progresso que você promoveu no Cazaquistão nos últimos 15 anos".
Aparições como a de Cheney -o homem que usou mentiras para defender a guerra no Iraque- facilitaram para Putin aparecer diante das câmeras de suas emissoras estatais e se queixar dos dois pesos e duas medidas no tratamento dado à Rússia pelo Ocidente, com seus olhos semicerrados e suas palavras sendo proferidas entre dentes cerrados.
Putin, entre todas as pessoas, sabe que a moralidade está em terceiro lugar, atrás do gás natural e do petróleo, na disputa global pelos combustíveis fósseis. As relações da Rússia com governantes despóticos nos vizinhos Uzbequistão, Turcomenistão e Cazaquistão estão atualmente prosperando, graças a contratos de fornecimento de longo prazo. Mas o governo em Washington tem sua própria cota de veteranos da indústria do petróleo e gás: Bush, que, seguindo os passos de seu pai, ganhou sua fortuna no setor de petróleo; Cheney, que já foi executivo-chefe da Halliburton, uma gigante no setor de serviços para a indústria do petróleo; e a secretária de Estado, Condoleezza Rice, que foi membro do conselho diretor da Chevron.
Segundo a lógica do presidente russo, ele não precisa levar a sério as críticas sobre as deficiências democráticas e de direitos humanos de Moscou desde que o Ocidente continue mais interessado nos preços do petróleo e nos gasodutos e oleodutos. Em seu discurso para o país, ele deixou claro que as relações entre a Rússia e os Estados Unidos atingiram seu ponto mais baixo desde o fim da União Soviética. "Como diz o ditado", ele disse, em comentários dirigidos aos Estados Unidos, "o camarada lobo sabe quem comer, ele come sem dar ouvidos e claramente não ouvirá ninguém".
Putin, atualmente no sétimo ano de sua presidência, é claramente o arquiteto do novo Estado russo. De forma igualmente clara, a política de energia é a fundação sobre a qual ele baseia seu plano de construção. Ele chama o setor de recursos naturais de seu "santuário", o centro de sua estratégia para devolver a Rússia ao seu lugar entre as potências mundiais. A renacionalização da indústria do petróleo e gás foi em grande parte bem-sucedida, com homens da organização de Putin atualmente detendo as rédeas das empresas de gás e petróleo do país.
No século 20, o poderio militar era a moeda dos países mais poderosos do mundo, mas atualmente a balança de poder internacional está baseada no acesso ao gás e petróleo, disse Andrew Kuchins, diretor para Eurásia do Fundo Carnegie. A Rússia, ele acredita, estará cada vez mais "em posição de competir fora de sua atual categoria de peso".
Desde os dias do ex-presidente Boris Yeltsin, a receita de petróleo de Moscou saltou nove vezes, para receitas anuais atuais de US$ 150 bilhões, enquanto o preço no mercado mundial quase quintuplicou. A média salarial na Rússia está apresentando ganho real de 10% ao ano, com a economia crescendo em média 6% ao ano desde que Putin chegou ao poder, apesar de tal crescimento estar atualmente estabilizando.
Em comparação às suas reservas gigantes de gás natural, o maior país do mundo tem reservas de petróleo relativamente limitadas, com 75% das reservas conhecidas já exploradas. Mas quando se trata de gás natural, a Rússia já atende a um quarto da demanda européia e 40% da demanda alemã. Em conseqüência, o monopólio da Gazprom não é apenas a maior corporação e contribuinte do país, mas também a jóia da coroa da política de energia de Putin.
Putin impediu prontamente as tentativas do ministro reformista da Economia, German Gref, de desmanchar a gigante de gás natural e a tornou mais eficiente nomeando um ex-colega de seus tempos em São Petersburgo, Alexei Miller, como chefe da Gazprom. Sob a liderança de Miller a empresa, seguindo fielmente o princípio leninista de capitalismo em um monopólio estatal, se transformou em um poderoso instrumento nas mãos da liderança do Kremlin.
O vagalhão Gazprom
A Gazprom emprega 250 mil pessoas e mantém uma rede de 175 subsidiárias que ganham bilhões, principalmente com a exportação de gás natural para outros países. Os acionistas minoritários da Gazprom consideram a empresa uma das operações mais ineficientes da Rússia.
Apesar de suas ineficiências, a Gazprom, com um mercado de capitalização atual de US$ 250 bilhões, já conseguiu se tornar a terceira maior corporação do mundo, atrás da Exxon Mobil e da General Electric, é fato suficiente para colocar um sorriso de auto-satisfação no rosto de Miller, enquanto ele se senta em sua sala de conferência revestida em madeira. "Ser a número um do mundo não está muito distante", ele disse.
O simples tamanho da gigante do gás praticamente força os estrangeiros a tratarem o Kremlin e Miller com certo grau de deferência. Em um discurso para o fundo de investimento Hermitage Capital de Moscou no final de junho, o ex-chanceler alemão Gerhard Schröder, atualmente na folha de pagamento da Gazprom como presidente de um consórcio para construção de um gasoduto no Mar Báltico, disse: "Os europeus não deveriam agir como se os russos devessem estar gratos pela chance de fornecer petróleo e gás para a Europa".
O próprio Putin não poderia ter colocado de forma mais clara. A mensagem por trás das declarações de Schröder é de que os amigos da Rússia podem esperar por casas bem aquecidas, enquanto os demais devem pensar em se vestir com roupas mais quentes. O romancista e principal ideólogo comunista de Moscou, Alexander Prokhanov, vê se aproximar um dia em que a Gazprom, "com suas tenazes de aço, construirá uma nova versão de um império geopolítico russo".
No início do ano, os ucranianos descobriram o que isto poderia significar para os antigos aliados de Moscou. Apesar de contratos válidos de fornecimento e preços estabelecidos, a Gazprom fechou a torneira de seu fornecimento de gás natural para o presidente reformista da Ucrânia, Viktor Yushchenko -não exatamente um amigo de Moscou- e ao povo ucraniano logo após a meia-noite do Dia de Ano Novo. A explicação oficial da Gazprom para a ação era de que queria cobrar preços de acordo com o mercado mundial.
A medida, que ocorreu minutos depois da Rússia ter assumido a presidência do G-8 pela primeira vez em sua história, também foi um alerta tardio para os parceiros comerciais de Moscou no Ocidente. O fato do Kremlin estar usando as reservas de recursos naturais como arma de política externa em seu conflito com a Ucrânia não era novidade. O que era novidade é que no momento de uma explosão mundial dos preços do petróleo, o espectro de uma nova crise de energia apareceu no meio do inverno, levando a "CNN" e outras emissoras a dar atenção especial ao incidente.
A tentativa de Moscou de punir a Ucrânia por se afastar de sua esfera de influência teve o mesmo efeito sobre os mercados mundiais de gás natural que a prisão, em outubro de 2003, de Mikhail Khodorkovsky e a destruição que se seguiu de sua companhia de petróleo Yukos teve sobre a indústria do petróleo: a conscientização de que Putin e seus estrategistas estão plenamente cientes do valor de suas cartas e estão preparados para usá-las.
Enquanto uma Europa horrorizada permanece emaranhada em seu debate sobre diversificação de sua oferta de energia, a Gazprom já seguiu em frente. No início de junho, o monopólio russo anunciou planos para investir US$ 2 bilhões na recém-nacionalizada indústria de gás natural boliviana.
Negociações também estão em andamento com a Argélia e Líbia para a exploração conjunta das reservas destes países, com os russos esperando que o fornecimento de gás dos dois produtores norte-africanos possa ajudar a atender a demanda que está crescendo rapidamente.
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 12:47
por spink
O novo Grande Jogo
Especial "A reascensão de uma ex-superpotência" - parte 3
Finalmente, na Ásia Central, o teatro principal do confronto geoestratégico entre a Rússia e o Ocidente, Putin já está se aproximando de sua meta de ganhar o controle a longo prazo sobre os recursos naturais da região. O Turcomenistão já assinou um contrato de 25 anos para fornecimento de grande parte de sua produção de gás natural para a Gazprom, o Uzbequistão está explorando suas reservas com assistência russa e o Cazaquistão está estudando um acordo de 20 anos com os russos.
Os ucranianos não são os únicos que sabem como é ser dependente do gás russo enquanto tentam ser independentes politicamente. Belarus, Geórgia, Armênia e Moldova também já receberam sua parcela de ameaças sutis. O Ocidente, Putin disse à chanceler alemã Angela Merkel em um encontro em abril passado, faria bem em não testar a paciência da Rússia com suas críticas intermináveis.
"O que fazer quando ouvimos as mesmas acusações, dia sim, dia não?"
perguntou Putin retoricamente dois meses e meio antes do encontro de cúpula do G-8. "É claro, nós começaremos a procurar por outros mercados."
Quando os líderes dos países industrializados mais poderosos do mundo se encontrarem no sábado, no salão de baile de mármore do Palácio Konstantin de São Petersburgo, eles também poderão aproveitar a oportunidade para buscar por valores comuns.
Uma questão que poderiam levantar é por que, na Rússia de Putin, o marechal Stalin está novamente sendo abertamente celebrado, enquanto o histórico de Stalin de assassino em massa está sendo quase que completamente encoberto.
Ou talvez poderiam considerar o motivo para o atual presidente do G-8 ter chamado o colapso da União Soviética como a maior catástrofe geopolítica do século 20.
Se as questões forem levantadas, Putin certamente estará bem equipado para responder. Ele poderia citar o primeiro-ministro do Japão, Junichiro Koizumi, por exemplo, que curva sua cabeça em homenagem aos criminosos de guerra japoneses em uma peregrinação anual ao controverso templo Yasukuni em Tóquio, como prova de sua afirmação geral de que o Ocidente emprega dois pesos e duas medidas.
Putin gostaria de decidir como a Rússia moderna deve lidar com sua história soviética, porque esta continua sendo a questão mais sensível na imagem que a nação tem de si mesma. Até hoje, milhões de pessoas de Kaliningrado a Vladivostok têm dificuldade para entender o colapso de seu reino no final de 1991, após russos, bielo-russos e ucranianos terem se encontrado em uma floresta perto de Brest e formado uma aliança contra a liderança central, removendo o nervoso presidente soviético Mikhail Gorbachev do Kremlin.
Triunfo e derrota fazem parte do império russo como a mudança das estações desde a derrota dos tártaros. Os moscovitas conquistaram a Sibéria, anexaram a Ucrânia, o Cáucaso, o Turquestão e o Extremo Oriente russo. Mas ao superestimar sua força, eles também perderam rapidamente alguns de seus ganhos territoriais. O último grande sonho dos russos de se tornarem uma "Terceira Roma" terminou em 1917 com a derrubada do czar e a tomada do Kremlin por Lênin.
No final da era soviética, 145 milhões de russos governavam mais de 100
grupos étnicos não-russos e 110 milhões de europeus orientais. No final, a união forjada por Lênin se tornou o maior país do mundo, se estendendo por 11 faixas de fuso horário. Ela produzia mais carvão, petróleo e tanques que os ricos Estados Unidos, possuía 45 mil ogivas nucleares, uma força militar com quase 4 milhões de soldados e uma liderança que sonhava com uma revolução mundial. E, com base na força de seus mísseis, via a si mesma como no mínimo igual aos Estados Unidos, a outra superpotência do mundo. Mas então tais aspirações chegaram a um fim abrupto.
O fim da União Soviética
O mundo pôde "dar um suspiro de alívio", disse o presidente Boris Yeltsin quando sua Federação Russa se declarou a sucessora legal da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Pego na euforia da mudança, Yeltsin abriu mão de quaisquer reivindicações do antigo papel da Rússia como superpotência. Seu país queria ser "forte e democrático, mas nunca mais um império". Daí em diante, disse Yeltsin, o papel do país não seria definido por seu tamanho, mas pela riqueza de seus cidadãos. O líder russo pediu ao Ocidente que ajudasse o país na transição do coletivismo autoritário para o livre empreendimento, porque estava "simplesmente obrigado a salvar a democracia na Rússia".
Com tais palavras em mente, ficou claro aos russos que o que aconteceu foi em nome da democracia. Mesmo os primeiros passos no novo sistema colocaram milhões em choque permanente.
Quando o governo de Yeltsin suspendeu os controles sobre os preços em
janeiro de 2002, o custo dos bens subiu dez vezes. A produção industrial praticamente parou e o desemprego foi às alturas. Trabalhadores foram forçados a esperar meses por seus salários. Quase da noite para o dia, o país reverteu a um sistema de escambo medieval.
Em vez de estabelecer a ampla classe pretendida de novos empreendedores, a campanha de privatização que se seguiu criou um clube de oligarcas que adquiriram as antigas empresas estatais a preço de banana. Um dos membros ilustres do grupo era o ex-líder do Komsomol, Mikhail Khodorkovsky.
Além dos resultados econômicos, ninguém foi capaz de prever as conseqüências políticas da terapia de choque da Rússia. Quando o Parlamento russo se recusou a apoiar Yeltsin, ele ordenou que tanques militares disparassem contra o prédio, levando a 200 mortes. Em novembro de 1994, a agência de inteligência do país lançou a guerra na Tchetchênia. A guerra resultou em 80 mil mortos apenas em sua primeira fase, que terminou em 1996 com uma derrota para Moscou.
Boris Yeltsin, na época visto como o destruidor do império soviético, era um homem sem um plano e sem visão. Ele foi um político para uma situação específica ao estilo dos boiardos, mas não era um democrata. Era um homem que dirigia o país de seu clube de tênis com a ajuda de seus guarda-costas, e que desapareceu do cenário político por meses após passar por uma cirurgia para colocação de cinco pontes de safena.
Para os russos, ele se tornou um símbolo de imprevisibilidade e imprudência porque os deixou desprotegidos contra o capitalismo predatório e os conceitos do Fundo Monetário Internacional. A maioria logo percebeu que em vez de aprender com o Ocidente "como viver de forma civilizada", eles estavam experimentando o amargo oposto.
Apesar de Yeltsin ter vencido outra eleição em 1996, isto ocorreu apenas com o apoio financeiro dos oligarcas. Dois anos depois o país mergulhou em uma agonia plena. Após liberar a cotação do rublo frente a outras moedas, o governo suspendeu o pagamento de suas dívidas e milhões de russos perderam todas as suas economias. A Rússia foi finalmente pronunciada um caso problema internacional.
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 12:49
por spink
Vlad, o Grande
Especial "A reascensão de uma ex-superpotência" - parte 4
O sucessor de Yeltsin, Vladimir Putin, entendeu o sentimento depressivo que tomou conta do país. Ele falava dos "valores tradicionais" da Rússia e disse que o país não se assemelharia aos Estados Unidos ou à Grã-Bretanha no futuro próximo, assim como a democracia russa "nunca copiará o modelo liberal do Ocidente". Ele também insistiu que "apenas um Estado forte pode garantir a liberdade".
As palavras de Putin foram um bálsamo para as almas dos russos ansiosos. Mesmo após a queda do comunismo, não mais do que um entre seis cidadãos votou em um dos novos partidos liberais. Dois terços dos russos logo começaram a lamentar o colapso da grande União Soviética.
A primeira medida de Putin foi promover um renascimento virtual da Rússia como grande potência. Soldados vestindo uniformes do início do século 19 carregavam a bandeira nacional e o estandarte presidencial no Palácio do Kremlin em sua posse, em 7 de maio de 2000, uma mistura de símbolos czaristas, soviéticos e pós-soviéticos conjurando o antigo papel da Rússia no palco geopolítico.
O novo homem no Kremlin prometia nacionalizar as principais indústrias,
reprimir o crime e restabelecer a reputação das forças armadas. Ele também buscou reviver o orgulho dos russos pelo próprio país, tratando os oligarcas como os perdedores em um mundo em mudança e os democratas como chequistas (um termo usado durante a era soviética para se referir aos membros das polícias secretas).
Ele trouxe de volta o velho hino nacional soviético, com letras que agora elogiam a Rússia como um "poder sagrado". Ele reintroduziu o uso pelas forças armadas da bandeira vermelha, proibida sob Yeltsin, e então, em uma grande comemoração nacional em 2005 para marcar o 60º aniversário da vitória soviética na Segunda Guerra Mundial, ele reviveu o poderoso mito da Grande Guerra Patriótica. Tendo como fundo milhares de veteranos marchando, e diante de dezenas de chefes de Estado e líderes da Igreja Ortodoxa Russa, o orgulho pelo passado se transformava em uma consciência de ser uma grande potência.
Tanto Stalin quanto o ex-líder do Partido Comunista, Leonid Brejnev, antes símbolo de estagnação e até recentemente objeto de ridículo, repentinamente ressurgiram como heróis de uma nova série de televisão -ambos como homens que ajudaram o povo a adquirir um verdadeiro poderio militar.
Na nova versão da história russa, bem e mal são mantidos bem separados. "A Nona Companhia", o primeiro filme russo sobre a guerra soviética no Afeganistão, conseguiu se tornar um sucesso de bilheteria de US$ 20 milhões no ano passado ao enfeitar a derrota humilhante do país naquele país. Mesmo os jovens russos agora vêem a campanha como "uma luta contra o terrorismo" e um feito poderoso.
Um orgulho nacional recém-encontrado
Este novo senso de orgulho nacional também ajudou a polir a imagem de um importante símbolo do poder no passado, as forças armadas, apesar do
conflito entre o Oriente e Ocidente ter acabado há 15 anos. Putin é mostrado lançando a mais recente adição à frota de submarinos da Marinha ou encomendando um novo supermíssil que "derrotará todos os sistemas existentes de defesa antimísseis" -como se o número de ogivas nucleares ainda fosse um atributo indispensável para ser uma grande potência mundial.
Nos seis anos e meio desde o final da era Yeltsin, o homem no comando do Kremlin conseguiu o aparentemente impensável: um em cada dois russos agora vê o país como igual aos Estados Unidos, sendo que 38% estão convencidos de que Putin é o responsável pela nova proeminência da Rússia, elogiando seu presidente como "o líder mais bem-sucedido de nosso país desde 1917" -ainda mais bem-sucedido do que Brejnev ou Stalin. Os reformistas Gorbachev e Yeltsin, que quiseram criar uma democracia ao estilo ocidental, estão empatados em último lugar.
No sábado, também haverá conversa sobre liberdade de expressão e de
imprensa -abertamente ou nas entrelinhas. Bush, Cheney e Rice expressaram recentemente fortes críticas às condições no Estado de Putin. Alguns poucos senadores americanos, liderados pelo republicano John McCain, chegaram até mesmo a pedir a exclusão da Rússia do G-8.
Mas mesmo os russos não deixaram de notar que a Itália, durante o reinado do czar da mídia Silvio Berlusconi, caiu para o 42º lugar -atrás da Namíbia e da Coréia do Sul- em uma comparação internacional da liberdade de imprensa divulgada pela organização Repórteres Sem Fronteiras. No Congresso de Jornais Mundiais no mês passado em Moscou, Putin rejeitou tranqüilamente todas as críticas dizendo: "As condições para a imprensa na Rússia estão se tornando mais favoráveis a cada ano".
Certamente, mais de uma década e meia após a queda do comunismo, o estilo de censura à imprensa ao estilo soviético não mais existe, e não há mais ideólogos do partido para suprimir artigos. O governo é dono de apenas 10% da mídia eletrônica, há 53 mil periódicos e há bastante crítica da mídia independente ao líder do Kremlin.
Por outro lado, a Repórteres Sem Fronteira classificou a Rússia em 138º
lugar em sua lista, à frente de Belarus, Arábia Saudita e Cuba. Ainda assim, o fato não fez com que manifestantes tomassem as ruas de Moscou, porque há uma grande diferença na percepção da imprensa livre entre Moscou e o exterior.
O cidadão comum experimentou a diversidade de opinião durante a era Yeltsin como um reflexo do declínio do Estado, assim como Putin e outros como ele. Até hoje, os membros da comunidade de inteligência culpam as reportagens da imprensa sobre as atrocidades cometidas pelas tropas russas durante a primeira guerra na Tchetchênia pelo derrota das forças armadas naquela campanha.
Para promover sua campanha para restauração da autoconfiança russa, Putin queria ver o país marchando de acordo com uma música diferente, mais rigidamente controlada, e um cenário jornalístico mais claro. Em vez de pessoas controlando o governo por meio da mídia, a noção de Putin era de que a liderança deveria controlar tudo que acontece fora dos muros do Kremlin.
Em 2000, dois dos empreendedores de mídia mais importantes da era
Yeltsin -Boris Berezovsky, o maior acionista da ORT, a principal rede de televisão do país, e Vladimir Gusinsky, dono da emissora de TV NTW- foram forçados a deixar o país após se recusarem a atender as exigências de Putin de reportagens patrióticas.
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 12:51
por spink
Criando uma mídia amigável para com o Kremlin
Série "A reascensão de uma ex-superpotência" - parte 5
Em vez de impor uma proibição ostensiva, o presidente usou as autoridades fiscais e o judiciário controlado pelo Kremlin para atingir os seus objetivos. No caso de Gusinsky, a Gazprom, a gigantesca estatal do setor de gás natural, adquiriu a estação. Atualmente, a Gazprom Media é a acionista majoritária de duas das principais estações de televisão do país, do tradicional jornal "Izvestiya" e da ex-estação de rádio cult Echo Moskvy. A siderúrgica Severstal a a companhia petrolífera Surgutneftegas, ambas controladas por indivíduos associados a Putin, obtiveram o controle sobre a Ren TV. A derradeira rede de televisão de grande porte privada, que fazia cobertura de âmbito nacional, a TW-6, fechou as portas em 2002.
Estações patrióticas gerenciadas pelas forças armadas, pela igreja e pelo Estado logo ocuparam o espaço vago no éter com suas ondas hertzianas. A ofensiva de Putin no setor de mídia foi fortalecida por uma nova legislação que tornou mais complexa a veiculação de notícias sobre a guerra na Tchetchênia, sujeitando a possíveis penalidades criminais qualquer repórter que ouse, por exemplo, entrevistar os combatentes clandestinos caucasianos.
Os telespectadores russos podem agora assistir a programações de natureza violenta ou pornográfica, ou a telenovelas, para se entreterem, mas o governo controla os programas informativos. Segundo o sindicato russo dos jornalistas, 90% das notícias difundidas pelas redes de cobertura nacional são compostas de matérias sobre o poder do Estado - ou sobre o próprio Putin. Gavin O'Reilly, o presidente da Associação Mundial de Jornais, perguntou diretamente a Putin: "Por que o Estado ainda é acusado de promover uma atmosfera de cautela e censura entre os jornalistas, que temem perder seus empregos caso ultrapassem de forma muito visível os limites estabelecidos?".
Não se trata apenas de oportunismo quando até mesmo os jornais que eram liberais bajulam o presidente.
"A Rússia poderá se fragmentar caso não consiga se restabelecer como uma grande potência, tanto econômica quanto militarmente", adverte Alexei Pushkov, que redigia discursos para Gorbachev, e que atualmente apresenta um programa chamado "Post Scriptum", no qual se culpam rotineiramente os "inimigos da Rússia" - os norte-americanos, os cidadãos dos Estados bálticos, os poloneses, os georgianos - pelos problemas que o país têm enfrentado nos últimos 15 anos.
A telejornalista Olga Romanova realizou uma experiência no início deste ano. "Fiquei sem me conectar à Internet durante três dias, e durante aquele período também não assisti aos canais ocidentais de televisão por satélite", conta Romanova. "Depois daqueles três dias, eu comecei a acreditar que a Rússia estava cercada de inimigos, e que Putin era a nossa maior esperança".
Utilizando como modelo o tratamento que dispensa à mídia, Putin também interferiu nas instituições políticas do país, em uma iniciativa que ele chama de "reforma do poder". Como resultado, 77% dos burocratas do governo são atualmente veteranos das forças armadas e dos serviços de inteligência.
Os governadores do país foram obrigados a abandonar os seus assentos no Conselho Federal, o que fez com que a casa superior do parlamento russo perdesse grande parte dos seus poderes. O Kremlin elaborou uma nova lei eleitoral que tornou a maioria dos partidos insignificantes, permitindo que o seu próprio partido, o "Rússia Unida", obtivesse uma maioria de dois terços na Duma, e reescrevesse inescrupulosamente as regras para procedimentos parlamentares de forma a atender aos seus próprios interesses.
O sistema de eleição direta de governadores também foi eliminado, e os candidatos são atualmente escolhidos pelo presidente. Ele criou a "Câmara do Povo", supostamente para que esta fosse "a consciência do país", mas o órgão não conta com poder para implementar as suas decisões. Por outro lado, uma lei restritiva foi baixada com o intuito de barrar as atividades das organizações não governamentais (ONGs) que recebem verbas do exterior e que criticam o gradual retorno da Rússia a um sistema autocrata.
"Como nos dias do czar Nicolau 2º, a política atualmente é ditada pela corte real", afirma Dimitri Trenin, do Carnegie Center, de Moscou. "O presidente, como um czar moderno, é a única instituição em funcionamento". De fato, alguns meses atrás, o tribunal constitucional do país admitiu abertamente que é isto que está ocorrendo. Segundo o tribunal, devido ao fato de o presidente russo ser "o representante direto da totalidade do povo", enquanto o povo é "a única fonte de poder", Putin pode exercer todos os poderes que desejar - ainda que estes não estejam previstos na constituição.
Tais interpretações bizarras da lei teriam gerado uma tempestade de indignação em qualquer outro lugar, mas as políticas híbridas de Putin previnem o desenvolvimento de uma oposição democrática significativa. Ele oferece simultaneamente um governo autocrático e eleições, liberdade lado a lado com autoritarismo. Putin é um homem que promete apoiar praticamente qualquer grupo-alvo.
Isso pode explicar o fato desconcertante de que, 15 anos após o fim do sistema totalitário soviético, um entre cada dois russos veja mais uma vez como fenômeno positivo a política do Estado forte. "O povo decidiu retornar à familiar e tranqüila União Soviética, e a um estado no qual prevalecem regras permanentes do jogo e um futuro previsível", afirmou em um editorial a revista moscovita "Profile".
Um outro conjunto de questões-chave que estarão na agenda de discussões quando os líderes mundiais se reunirem no próximo sábado dirá respeito ao combate à pobreza e à luta pela justiça social.
Em tal momento, Tony Blair, o primeiro-ministro do Reino Unido - país no qual, segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, 11,4 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza -, fará bem em não dar conselhos a Vladimir Putin, o presidente da Rússia, que atualmente conta uma reserva de US$ 250 bilhões em ouro e moeda estrangeira.
Putin acredita estar seguindo a rota correta. Os aumentos drásticos dos preços do petróleo e do gás fizeram com que o tesouro nacional ficasse abarrotado em um tempo recorde. O ministro das Finanças, Alexei Kudrin, anunciou que Moscou não será mais "um freguês do Clube de Paris", composto de Estados credores, a partir de 21 de agosto, quando a Rússia pretende saldar a dívida remanescente da era soviética, de US$ 20,8 bilhões, em um único pagamento antecipado.
A doença holandesa da Rússia
O fato de a Rússia deixar de ser uma nação devedora é profundamente satisfatório para as elites governantes em Moscou. Mas o ex-assessor econômico de Putin, Andrei Illarionov, que renunciou em 2005, vê a fixação da Rússia nos seus recursos naturais no valor de bilhões de dólares como uma negligência. Segundo Illarionov, a experiência demonstra que em países como Arábia Saudita, Nigéria e Venezuela, cujos produtos internos brutos são derivados em sua maior parte das exportações dos recursos naturais, a maioria da população se torna menos afluente, em vez de se beneficiar com a venda desses recursos a outras nações. O fenômeno, conhecido como "doença holandesa", que atualmente está enraizado na Rússia, gera uma supervalorização da moeda como resultado dos elevados rendimentos com as exportações, e reduz a competitividade de outras indústrias, ao tornar mais difícil para elas a venda dos seus produtos. Essa expressão é derivada das experiências dos holandeses, quando estes descobriram gás natural na década de 1970.
De fato, o crescimento tem sido vagaroso na indústria manufatureira russa, e isto ocorre apesar de o especialista do Banco Mundial, Itzhak Goldberg, alegar que as companhias russas estão entre as mais competitivas do mundo. Com a exceção de aviões de caça e de mísseis, e, até certo ponto, de softwares, esse país gigantesco ainda produz pouquíssimos bens de exportação.
Segundo Illariaonov, o país atende a apenas um dos critérios fundamentais para fazer parte do G-8. Ele se refere à enorme extensão territorial da Rússia. Mas Illarionov frisa que, quando se trata de concorrência empresarial, combate à corrupção e proteção da propriedade privada, Moscou não tem lugar no clube dos países líderes da economia mundial.
Os reformistas que integram o governo da Rússia se contentam em fazer discretas advertências, e muitos se sentem felizes em parar de exercer pressões, contanto que continuem recebendo os seus salários. O ministro da Economia, Gref, começou a defender aguerridamente as privatizações há mais de seis anos. Quando Putin descartou o seu plano e ordenou que ele fizesse exatamente o oposto, Gref, a despeito disso, permaneceu no cargo. "Todo monopólio gera pobreza no país", diz ele com resignação.
Na Rússia, 25 milhões de pessoas ainda vivem abaixo de uma linha de pobreza que não leva em conta os preços em disparada dos terrenos e apartamentos, do transporte público e, acima de tudo, dos serviços de saúde. O tratamento médico adequado e gratuito não é mais uma garantia na Rússia, que prefere que tal tratamento seja dispensado àqueles que pagam poer esses serviços em dinheiro vivo por debaixo dos panos.
A média de vida dos homens russos é de apenas 59 anos, e a população do país sofre uma redução de cerca de 700 mil habitantes por ano. Putin reconheceu o problema, e anunciou que combatê-lo é uma das suas principais prioridades.
Mas todas as tentativas de enfrentar a situação com "projetos nacionais" altamente subsidiados fracassam face à realidade russa, marcada pela corrupção generalizada e pela existência de uma casta insaciável de burocratas governamentais.
O número de cidadãos russos que asseguram que a corrupção governamental é mais generalizada na era Putin do que no governo de Boris Yeltsin triplicou desde 2001, afirma Georgy Satarov, diretor do grupo de pesquisas Indem.
Segundo um estudo conduzido pela Academia de Ciências Russa, Putin só é bem avaliado nas pesquisas no que se refere a políticas familiares e aos pagamentos confiáveis das pensões.
Gref enfatiza que a luta contra a pobreza é um teste ácido para o governo. "A menos que enfrentemos esse problema, possivelmente não seremos capazes de falar de um clima social favorável no nosso país", alerta Gref.
Quando os líderes das nações industrializadas mais poderosas se reunirem no sábado no salão de baile repleto de mármores do Palácio Constantino, em São Petersburgo, também será discutida a questão do grau apropriado do envolvimento estatal em uma era de globalização.
O presidente francês Jacques Chirac é uma pessoa que poderia travar uma boa conversa com o seu anfitrião, Putin. Isso porque os franceses acabam de decidir pelo adiamento da privatização da companhia nacional de gás, a Gaz de France. Além do mais, segundo um novo estudo, a França é o único país industrializado no qual a economia de mercado não é vista como algo justo e legítimo.
Mas será que os líderes do Kremlin estão sequer interessados em receber apoio de alguém? "A escolha de um modelo para economias em desenvolvimento deveria se basear na sua qualidade, e não em quem a propõe", declarou o vice-primeiro-ministro Medvedev pouco antes do encontro de cúpula do G-8, em uma nítida reação à versão dos Estados Unidos de uma economia de mercado. No seu outro emprego, Medvedev é nada mais nada menos do que o presidente do conselho diretor da Gazprom.
O Estado de Putin está usando a Gazprom como um exemplo da forma como vê as relações comerciais globais. Tanto os executivos da Gazprom quanto o Kremlin reclamam abertamente da falta de acesso irrestrito da companhia aos lucrativos gasodutos e redes de distribuição da Europa Ocidental. Vladimir Putin classifica isso como "competição injusta nos mercados mundiais".
No final de junho, quando fracassou uma fusão prevista entre a Severstal, a maior produtora de aço da Rússia, e a companhia luxemburguesa Arcelor, Putin anunciou laconicamente que a Rússia sabe como usar os seus recursos para proteger os seus interesses. Os jornais de Moscou afirmaram que o fracasso do negócio foi uma prova do "sentimento anti-russo" e de um "esfriamento" das relações que serão presenciadas no encontro do G-8.
Putin, por sua vez, há muito tempo estimulou a aprovação de uma "Lei de Recursos Naturais" pela Duma. O objetivo dessa legislação é relegar as companhias estrangeiras ao papel de investidores minoritários na exploração dos recursos naturais russos. Ele também compôs uma lista de "negócios estratégicos", que acabou incluindo 39, em vez das 17 indústrias originalmente previstas. Novamente, o objetivo era proteger setores-chave da economia russa contra a investida das empresas estrangeiras.
Quando lhe perguntaram em junho último se até mesmo as telecomunicações seriam classificadas como um setor estratégico no futuro, o ministro da Economia, Gref, respondeu com aquele que deve ter sido o comentário mais sarcástico que já fez na vida. "Em nome dos céus, não", afirmou Gref, acrescentando que, afinal de contas, as telecomunicações se constituem em uma das indústrias mais competitivas do país. "O setor estaria morto no momento que fosse rotulado de 'estratégico', e nós ficaríamos sem os nossos telefones celulares".
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 12:52
por spink
Recriando o sistema soviético
Série "A reascensão de uma ex-superpotência" - parte 6
A auto-ironia é indispensável quando a camarilha política de Putin, equipada como está com o treinamento precoce no marxismo-leninismo, tenta inserir a Rússia no mercado global.
"Mas a própria direção é pré-determinada, à medida que o presidente procura recriar o sistema soviético no qual foi treinado", afirma a cientista política Nina Khrushcheva, bisneta de Nikita Khruschev, que foi líder do Partido Comunista e chefe de Estado.
Essa é uma iniciativa que pode fazer com que coxas de galinhas norte-americanas sejam rejeitadas devido a supostas regulamentações negligentes quanto à higiene, ou implicar no desaparecimento do vinho georgiano, por razões similares, das prateleiras das casas de vinho de Moscou pela primeira vez em um período de várias gerações.
Mesmo se, conforme foi anunciado, os norte-americanos deixem de opor resistência ao ingresso da Rússia na Organização Mundial do Comércio, este fato não faria com que desaparecessem instantaneamente desavenças profundamente enraizadas entre Moscou e os seus parceiros ocidentais, já que uma economia livre não pode funcionar em um país que carece de uma sociedade livre.
"A Rússia está preparada para manter relações internacionais, mas prefere impedir que outros países se interessem pelas questões russas" disse o cientista político russo Isaiah Berlin, 60 anos atrás. De acordo com Berlin, a maioria dos povos eslavos apresenta uma propensão para o "distanciamento", embora não necessariamente para o isolamento - em outras palavras, uma propensão para "se afastar do resto do mundo, refugiando-se em uma ilha".
Um estudo atual realizado pelo Centro Levada, de Moscou, reforça as teorias de Isaiah Berlin, ao argumentar que a tendência ao isolacionismo e à xenofobia está em ascensão constante na sociedade russa. Segundo o estudo, a porcentagem daqueles que concordam com o slogan "a Rússia para os russos" aumentou de 43% em 1998 para os atuais 58%. E isso em um país que abriga 160 povos e etnias.
Em um momento no qual o clamor por uma direção "russa" independente cresce mais uma vez em Moscou, o pragmatismo parece ser a melhor estratégia para os líderes ocidentais ao lidarem com o Kremlin. E em nenhuma área a alegação da Rússia de que é uma grande potência e a realidade crua destoam tanto quanto na política externa.
Política externa disparatada
Nos últimos 15 anos, o arsenal exibido pelos diplomatas russos incluiu de tudo, da retórica de confronto aos gestos de cooperação, e das tentativas infantis de obter vantagens do Ocidente à pose entediante de grande potência. Moscou estava frágil e dependendo demais do Ocidente , o que explica as suas tentativas incansáveis de demonstrar "que tipo de país nos tornaremos", para citar Boris Yeltsin. Ela foi forçada a observar impotente enquanto a Otan intervia nos Balcãs e inseria a sua aliança militar profundamente na Europa Oriental.
Desde os ataques terroristas de 2001 nos Estados Unidos, Putin vem tentando recuperar o papel da Rússia no cenário da política externa. Ele se juntou à aliança global anti-terrorismo, apoiou a invasão do Afeganistão, aceitou a instalação de bases dos Estados Unidos nas fronteiras meridionais da Rússia na Ásia Central e sequer fez qualquer objeção significativa à guerra no Iraque.
Porém, sob o ponto de vista russo, o Ocidente jamais recompensou o país pela sua mudança de postura. Quando as revoluções "arco-íris" apoiadas pelos norte-americanos irromperam na Georgia, na Ucrânia e no Quirguistão, países localizados na porta de entrada da Rússia, a auto-imagem russa sob a ótica geopolítica atingiu o seu patamar mais baixo, e uma Moscou ultrajada resolveu reagir.
O governo Bush atualmente é obrigado a observar os acontecimentos, com irritação, enquanto a Rússia recupera a sua influência nos Estados pós-soviéticos da Comunidade dos Estados Independentes. Quando Tashkent solicitou aos norte-americanos que deixassem o Uzbequistão no ano passado (os norte-americanos criticaram o regime do país de forma muito ostensiva), Moscou ofereceu imediatamente o seu próprio pacto de segurança e cooperação à nação da Ásia central.
A rival China se transformou em um substituto dos Estados Unidos, e Putin se reuniu com o seu congênere chinês, Hu Jintao, cinco vezes no ano passado.
Ele sugeriu que a Rússia poderia estar interessada em um oleoduto semelhante àquele planejado para o Japão, e, juntamente com Hu, revitalizou o Grupo de Xangai, uma aliança que inclui Moscou, Pequim, quatro países da Ásia Central, além da Índia, do Paquistão, da Mongólia e do Irã, na condição de observadores. O grupo, que especialistas dos Estados Unidos já batizaram de "a Otan do Oriente", criticou a campanha norte-americana no Afeganistão, sugerindo que a Rússia pode ter planos para desempenhar mais uma vez um papel na região do Hindukush.
"A política externa russa substituiu uma posição de fraqueza por uma outra de força", garante o cientista político Trenin. "A humilhação pós-soviética é coisa do passado. Os líderes russos passaram a gostar de jogar pesado".
De acordo com a visão de Trenin em relação ao futuro, o Kremlin cultivará laços estreitos com a Bielo-Rússia, ampliará a sua influência nos países do Mar Cáspio ricos em recursos naturais, exercerá pressões por mudanças nos atuais governos anti-russos na Geórgia e na Moldávia e tentará impedir que a Ucrânia ingresse na Otan.
A equipe de Putin não se sente mais intimidada pelas críticas ocidentais à ofensiva de Moscou no campo da política externa. Ao contrário, como resultado disso, ela sente até que tal ofensiva é válida. "O desprazer ocidental se deve ao fato de a Rússia ter começado a buscar as suas políticas próprias e independentes", afirma Mikhail Margelov, diretor do comitê de política externa da casa superior do parlamento russo.
Mas essa independência muitas vezes se limita a uma ênfase teimosa no papel especial da Rússia. Quando os Estados Unidos e a Europa Ocidental cancelaram o pagamento das verbas de auxílio aos palestinos, depois que o governo do Hamas foi eleito, o ministro das Relações Exteriores de Putin ofereceu ao presidente palestino Mahmoud Abbas, de forma desafiadora, uma "assistência econômica emergencial".
Até 2004, Moscou rotulava o Irã de "parceiro estratégico", insistindo que Teerã não estava desenvolvendo armas nucleares. Pouco depois, os russos criticaram duramente o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad, e a seguir assinaram um acordo para o fornecimento de um lote de mísseis ao Irã - "duas coisa mutuamente exclusivas", afirma o especialista russo Ariel Cohen, da Washington Heritage Foundation.
Seria a Rússia uma "nova antiga superpotência"? O Kremlin criou um cenário elaborado em São Petersburgo para marcar o seu retorno ao cenário mundial. Mas embora a Rússia possa impressionar alemães e franceses, os norte-americanos dificilmente elogiarão o país recém-fortalecido.
Tanto os políticos quanto os especialistas não chegam a um consenso quando se trata de determinar se a Rússia recuperou a sua posição como potência global. Aqueles que ainda vêem este reino do leste como um colosso com pés de barro apresentam argumentos convincentes. A Rússia está em 14º lugar no mundo em termos de produto interno bruto, ficando atrás da Índia e do México. Com base na renda per capita, ela chega a se situar entre nações recém-industrializadas. Além do mais, o sistema político de Putin só é atraente para os bielo-russos, os uzbeques e os turcomenos, e ninguém está comprando computadores ou automóveis russos, ou defendendo entusiasmadamente o estilo de vida russo.
"Uma entidade estatal sólida não pode ser construída somente com base no isolacionismo nacional e em um petro-imperialismo dirigido para fora", opina Jutta Scherrer, um famosa especialista em questões russas da escola de ciências sociais EHESS, em Paris. E segundo Liliya Shevzova, do Centro Carnegie de Moscou, a estratégia de Putin de atingir a estabilidade por meio da concentração de poder só camufla os conflitos candentes que ele enfrenta. Ela diz ainda que a atual equipe de Putin não conta com a capacidade necessária para modernizar o país.
A outra escola de pensamento, cujos defensores são em sua maioria economistas, esperam que a Renascença da Rússia prossiga sem interrupções.
De fato, os mais otimistas acreditam que o crescimento econômico russo continuará consistentemente elevado, possivelmente em patamares de 5% a 7% ao ano até 2015.
Existe um consenso geral de que uma fome mundial por energia consumirá 105 milhões de barris de petróleo diariamente dentro de 15 anos, um aumento de mais de um quinto em relação ao consumo atual. As reservas de petróleo entre o Báltico e o Pacífico poderiam de fato se constituir no mais importante instrumento da Rússia para a aquisição de poder no futuro - à medida que as reservas de combustíveis fósseis se transformam nas novas armas estratégicas do século 21.
No início de junho, Henry Kissinger, um ex-secretário de Estado norte-americano, ganhador do Prêmio Nobel da Paz e, aos 83 anos de idade, ainda requisitado em todo o mundo como guru político, foi mais uma vez um hóspede particular do presidente russo Putin. "Seria um equívoco tratar a Rússia como um inimigo", advertiu o velho estadista, acrescentando que os russos são novamente uma potência, assim como foram "nos dias de Pedro, o Grande".
Enviado: 16 Jul 2006, 13:12
por Azathoth
Todas as pessoas honestas e perspicazes entendem o que está por trás disso.
Os "camaradas" sorrateiramente se apresentam de forma enganosa.
Uma nova Revolução está para acontecer.
A página a seguir é muito explicativa:
http://ussrback.ytmnd.com/
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 13:15
por Aurelio Moraes
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 14:15
por Poindexter
Quem tem Bomba Atômica nunca sai do "Cenário Mundial".
Enviado: 16 Jul 2006, 14:27
por user f.k.a. Cabeção
Azathoth escreveu:Todas as pessoas honestas e perspicazes entendem o que está por trás disso.
Os "camaradas" sorrateiramente se apresentam de forma enganosa.

Uma nova Revolução está para acontecer.

A página a seguir é muito explicativa:
http://ussrback.ytmnd.com/
Cara, eu estava procurando desesperadamente essas fotos mas não achei. É do episódio "Homer Tide", que sacaneia o filme "Crimson Tide".
Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 15:36
por Samael
Comunistas...
Re: Re.: A nova ascensão de uma ex-superpotência
Enviado: 16 Jul 2006, 15:40
por spink
Poindexter escreveu:Quem tem Bomba Atômica nunca sai do "Cenário Mundial".
Ter a bomba atômica não basta; o que importa é envia-la à longas distâncias anulando qualquer chance de defesa.
Como o
TOPOL-M2

Enviado: 16 Jul 2006, 15:43
por Hugo
user f.k.a. Cabeção escreveu:Azathoth escreveu:Todas as pessoas honestas e perspicazes entendem o que está por trás disso.
Os "camaradas" sorrateiramente se apresentam de forma enganosa.

Uma nova Revolução está para acontecer.

A página a seguir é muito explicativa:
http://ussrback.ytmnd.com/
Cara, eu estava procurando desesperadamente essas fotos mas não achei. É do episódio "Homer Tide", que sacaneia o filme "Crimson Tide".
Essa é a minha cena favorita de toda a série. Pena que essa página aí não tenha a ressurreição do Lenin...