As provações
Enviado: 20 Nov 2005, 17:33
Percebo que neste fórum alguns não possuem discriminação para com as resoluções científicas, então levanto esta questão: Satanás é uma pessoa ou anjo ou as contrariedades do coração humano?
Não posso negar que o Catecismo católico sugere uma personificação do mal, como lemos na explicação do Pai Nosso: “Mas livrai-nos do mal”. Assim proclama: “Neste pedido, o Mal não é uma abstração, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se opõe a Deus. O “diabo” é aquele que “se atravessa no meio” do plano de Deus e de sua “obra de salvação” realizada em Cristo.” (Catecismo Católico 2851).
Sem dúvidas é necessário dar nomes as figuras demoníacas, que impedem a construção do Reino. Do nome diabo, podemos sem dúvidas, especificar: tudo o que divide é proveniente do pai da mentira e tudo que leva a unidade é proveniente do Criador.
Persiste-nos algumas perguntas: Onde reside o pai da mentira? O maligno é algo interior ou exterior ao homem? É uma pessoa, anjo ou instinto de concupiscência para o mal, algo provador ou algo tentador?
O problema é que às vezes polarizamos tanto para o interior ou tanto para o exterior que perdemos a rédeas da lucidez quanto à existência do mal, ele existe, porém como existe é que devemos ser cautelosos. Já ouve tempo em que eu acreditava ser algo meramente exterior ao homem, mas depois o aprofundamento bíblico que fiz, levou-me a desconfiar que está mais para algo interior. Quando é tido como pessoa ou algo exterior, serve somente como analogia aos poderes e principados que tentam arrancar dos prediletos do Reino que pertence ao verdadeiro Rei, o Cristo Senhor.
Se é algo interior só pode ser fruto das intenções e provações do coração humano, se é algo exterior, só pode ser nomeado a partir das dominações dos príncipes deste mundo.
Fazer teologia é sempre arriscar-se e até errar, mas o importante é buscar a verdade, a Verdade é Jesus, que Ele com seu Espírito nos conduza a Verdade.
Se o Catecismo católico parte da personificação, isso não seria norma definitiva para um católico? Depende do ponto em que se olha. Há as duas possibilidades a serem seguidas, eu posso acreditar que somente do coração humano pode prover todas as maldades, já que esse é um ensinamento bíblico e posso também acreditar que é possível nomear o mal na figura de muitos príncipes deste mundo. Aderir somente uma das polaridades é que seria um risco. Chamei de polaridades, opostos, não contrários.
Em primeiro lugar, gostaria de primeiro fundamentar a origem do mal no coração humano. As provações podem provir do coração humano, assim como poderiam provir do coração de Jesus Cristo, quando foi provado no deserto, mas do coração Dele não poderiam provir tentações, por isso, afirmar que provações sejam tentações não é correto. O Salmo 36 personifica o pecado no interior do homem.
• Mateus 15,18-19: “...o que sai da boca brota do coração; e isso sim contamina o homem, pois do coração saem pensamentos malvados, assassinatos, adultérios, fornicação, roubos, perjúrios, blasfêmias.”
Não há dúvidas neste texto de que as provações sejam internas, assim como o é o oráculo do Pecado, vide Salmo 36,2: “Oráculo do Pecado ao perverso dentro de seu coração, não tem medo de Deus nem mesmo em sua presença.” Vencer o medo de Deus parece um ato de coragem, mas é ato temerário e “insensato”.
Sobre semelhante oráculo temos o Salmo 14 e Hab 2,18: como mestre de mentiras. Não sei se os evangélicos possuem o livro do Eclesiástico, creio que não, mas ele elucida uma alternativa diferente a origem do homem. Devido os evangélicos terem ficado com o cânon dos judeus de Jâmnia, perderam preciosidades da tradução dos 70 (Septuaginta –LXX), do segundo século antes de Cristo usada pelos judeus do Egito (Alexandria). Os livros são: Judite, Baruc, 1e2 Macabeus, Sabedoria, Eclesiástico e partes de Ester. Tudo porque os judeus de Jâmnia não aceitaram o Grego, só o hebraico, não é em vão que não aceitam o NT também.
• Eclesiástico 15,14: “O Senhor criou o homem no princípio e o entregou em poder de seu arbítrio.”
Pela liberdade, o homem chega ao autocontrole e se realiza, ficando senhor do seu destino. Mas não é senhor absoluto. Ao poder interno do arbítrio se acrescenta a luz e a força da lei, vontade de Deus feita palavra para reger e ordenar o homem livre. Cumprir o mandamento depende do querer ( Sl 40,9: “Levo tua instrução nas entranhas”).
Jesus foi posto à prova (Mt 4,3). Deve-se evitar chamá-las de tentações, porque são na verdade provações. O povo guiado por Moisés, é posta à prova repetidas vezes no deserto e falhou várias vezes. Moisés uma vez. Jesus supera todas as provas – Milagre fácil e injustificado, espetáculo gratuito abusando dos anjos, e sobretudo o poderio universal, não submetendo-se às regras do jogo impostas pelo pretenso soberano do mundo. Adoração é restrita a Deus; Jesus vence a prova do poder e do ter que não deixam de ser oriundas do coração humano, mas segundo Mateus 5,8: “Felizes os limpos de coração, porque verão a Deus”. Jesus insiste que a pureza interior é uma bem-aventurança (Mt 5,8)
• Hebreus 4,15: “ O sumo sacerdote que temos não é insensível à nossa fraqueza, já que foi provado como nós em tudo, exceto no pecado”.
Se as provações são oriundas do coração humano e não de um tentador ai inculcado, como seriam complicadas de se entenderem as possessões demoníacas. Bom, para esse problema só posso aludir a limitação científica de cada época para interpretar as doenças psicológicas.
Como já fundamentei a origem das provações no coração humano, agora terei que explicar as nomeações externas do mal, acredito que Jo 14,30: “O príncipe deste mundo é o Diabo, Satanás”. Eis uma das chaves para compreender a analogia feita neste sentido.
• “Cremos firmemente que Deus é o Senhor do mundo e da história. Mas os caminhos da sua providência muitas vezes nos são desconhecidos. Só no final, quando acabar o nosso conhecimento parcial, quando virmos Deus “face-a-face” (1Cor 13,12), teremos pleno conhecimento dos caminhos pelos quais, mesmo através dos dramas do mal e do pecado, Deus terá conduzido a sua criação até o descanso desse Sábado (Gn 2,2) definitivo, em vista do qual criou o céu e a terra... A permissão divina do mal físico e do mal moral é um mistério que Deus ilumina pelo seu Filho, Jesus Cristo, morto e ressuscitado para vencer o mal. A fé nos dá a certeza de que Deus não permitiria o mal se do próprio mal não tirasse o bem, por caminhos que só conheceremos plenamente na vida eterna. (cf. Catecismo Católico 314 e 324).
Seria bem menos complicado se optássemos pelas duas alternativas. “O mal tem duas fontes, de dentro do homem (seu coração), de fora do homem representado nos poderes políticos e civis. Mesmo assim me culpariam de despersonificação de Satanás. Porém, tenho que então personificá-lo, eis minha tarefa agora.
• Lc 10,18: “Eu via Satanás cair do céu como um raio.”
O que mais satisfaz os setenta é a eficácia dos exorcismos em nome de Jesus. Não o conseguiram com o menino no vale (Lc 9,37-43); O Satã foi derrubado de seu lugar, como o imperador emblemático da Babilônia, “caído do céu, abatido até o abismo” (Is 14,12.14). Pela vitória de Jesus (4,1-12). Graças a isso, os discípulos submeterão as potências do mal (Sl 91,13). Mas não basta submeter o inimigo de baixo; mais importante é pertencer ao reino de cima, estar inscrito em seu registro ( Ex 32,32; Sl 87,6).
O AT não oferece idéias claras e sistematizadas sobre espíritos nocivos, tentadores, hostis ao plano de Deus. O Satã do livro de Jó tem acesso à corte celeste; também o espírito enganador de 1Rs 22,21. Mais clara, a função tentadora e hostil da serpente do paraíso, da qual prescinde Bem Sirac (Eclo 15 e 17).
As vezes, os falsos deuses recebem o nome de demônios (Shedim: Dt 32,17; Sl 106,37); o deserto é refúgio de uma espécie de sátiros (Lv 17,7), e há uma espécie de demônio noturno (lilit: Is 34,14). O enigmático Azazel (Lv 16) da expiação parece uma figura demoníaca; talvez o seja o cortejo maligno de Sl 91,5-6. Asmodeu é o demônio do livro de Tobias.
Os Evangelhos apresentam os demônios (espíritos imundos, maus) segundo as crenças da época, geralmente produzem doenças ou possessões; adivinhações (At 16,16). Não induzem ao pecado nem levam à condenação; mas podem levar a perder a fé ( 1Tm 4,1; 1Jo 4,6). Aparecem personificados: reconhecem, falam, pedem, habitam, saem, sabem teologia, mais me parecem figuras de linguagem, mas o Devaney não aceita essa argumentação, pois não costuma estudar a crítica das formas e gêneros literários.
Jesus e os apóstolos têm poder sobre eles. Identificados com os ídolos ( 1Cor 10,20). A última exigência de Satã é ser adorado (Mt 4,1-12). Os reinos do mundo com seu esplendor se opõem ao reino dos céus com sua glória. Os reis terrestres querem homenagens ( Dn 3,5). A partir desta analogia, podemos perceber a nomeação.
• Mc 1, 26: “O espírito imundo o sacudiu, deu um forte grito e saiu dele”.
O Demônio sabe teologia, aqui se apresenta, na linguagem e na mentalidade da época, a primeira confrontação é a vitória de Jesus sobre os poderes do mal que escravizam o homem. Em Mc 3,22, notemos que Belzebu é um dos nomes tradicionais do Diabo (tomado do deus de Acaron – 2 Rs1). Zebul significa provavelmente príncipe. Mc 5,8: “Chamo-me Legião, porque somos muitos”. Legião é termo latino, tipicamente romano militar. Mas o que fazer se alguns textos apresentam dramaticamente um tentador externo ao homem, como a serpente (Gn 3) ou Satã (Jó). Então vamos ver se não é figura de linguagem.
Gênesis 3,1: A serpente representa, nas culturas circundantes, a força hostil a Deus e a seu plano. Personificação do mal ativo, sedutor ou agressor. Ben Sirac não a menciona (Eclo 15,11-20; Sb 2,24 fala da “inveja do diabo”); Ap 12,8-9 acumula nomes, identificando e interpretando: “dragão, serpente primordial, satã, diabo, acusador. Além disso, o nome hebraico de serpente coincide com “vaticínio”. O falso oráculo é arma da serpente contra Eva: tira a base da proibição de Deus, dando-lhe intenções escusas, promete como bem o que é mal, pois conhecer o mal por experiência é um mal. Sobre semelhante oráculo: Sl 14, Hab 2,18, “mestre de mentiras”.
A serpente no paraíso personifica o poder adverso a Deus e que tenta o homem com astúcia e engano (Gn 3): a imagem parece tomada de representações mitológicas da serpente como poder cósmico rebelde; disso ficam traços no AT: Is 51,9; Sl 136,13. Desce ao fundo do mar (Am 9,3) e fere no deserto (Dt 8,15). O Senhor a fere e derrota (Jo 26,13).
Na era escatológica será aniquilada (Is 27,1). Os perversos participam de sua natureza: o império agressor (Is 14,29), os chefes depravados (Sl 58,5s; 140,4). A serpente de bronze era sinal salvador, pela visão (Nm21) ou pela fé (Sb 16,5-7); mas não devia ser venerada (2Rs 18,4). No NT é exemplo de astúcia (Mt 10,16), temível por seu veneno e usada como injúria (Mt 23,33). Cristo na cruz é antítipo da serpente primordial (Gn 3) em 2Cor 11,3; Ap 12,9; 20,2. A serpente era o animal emblemático de Esculápio, deus da saúde, por isso asado ainda hoje como símbolo da Medicina.
• Gálatas 4,3: “Da mesma forma nós, enquanto éramos menores de idade, éramos escravos dos elementos cósmicos.” Segundo alguns, os “elementos cósmicos” são criaturas divinizadas pelo homem – idolatria da lei ( Cl 2,20).
Bom, deu para perceber que não é um absurdo considerar a nomeação de Satã com os reinos dominadores assim como aos princípios cósmicos. Logo, não podemos deixar de acreditar que seja o mal no exterior do homem figura de linguagem, existem para dizer que o mal existe e que devemos lutar pelo bem, sabendo de antemão que é do coração humano que nascem as adversidades. Mas nele também está inscrita a lei de Deus, lei natural, assim como se queira entender.
Não posso negar que o Catecismo católico sugere uma personificação do mal, como lemos na explicação do Pai Nosso: “Mas livrai-nos do mal”. Assim proclama: “Neste pedido, o Mal não é uma abstração, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se opõe a Deus. O “diabo” é aquele que “se atravessa no meio” do plano de Deus e de sua “obra de salvação” realizada em Cristo.” (Catecismo Católico 2851).
Sem dúvidas é necessário dar nomes as figuras demoníacas, que impedem a construção do Reino. Do nome diabo, podemos sem dúvidas, especificar: tudo o que divide é proveniente do pai da mentira e tudo que leva a unidade é proveniente do Criador.
Persiste-nos algumas perguntas: Onde reside o pai da mentira? O maligno é algo interior ou exterior ao homem? É uma pessoa, anjo ou instinto de concupiscência para o mal, algo provador ou algo tentador?
O problema é que às vezes polarizamos tanto para o interior ou tanto para o exterior que perdemos a rédeas da lucidez quanto à existência do mal, ele existe, porém como existe é que devemos ser cautelosos. Já ouve tempo em que eu acreditava ser algo meramente exterior ao homem, mas depois o aprofundamento bíblico que fiz, levou-me a desconfiar que está mais para algo interior. Quando é tido como pessoa ou algo exterior, serve somente como analogia aos poderes e principados que tentam arrancar dos prediletos do Reino que pertence ao verdadeiro Rei, o Cristo Senhor.
Se é algo interior só pode ser fruto das intenções e provações do coração humano, se é algo exterior, só pode ser nomeado a partir das dominações dos príncipes deste mundo.
Fazer teologia é sempre arriscar-se e até errar, mas o importante é buscar a verdade, a Verdade é Jesus, que Ele com seu Espírito nos conduza a Verdade.
Se o Catecismo católico parte da personificação, isso não seria norma definitiva para um católico? Depende do ponto em que se olha. Há as duas possibilidades a serem seguidas, eu posso acreditar que somente do coração humano pode prover todas as maldades, já que esse é um ensinamento bíblico e posso também acreditar que é possível nomear o mal na figura de muitos príncipes deste mundo. Aderir somente uma das polaridades é que seria um risco. Chamei de polaridades, opostos, não contrários.
Em primeiro lugar, gostaria de primeiro fundamentar a origem do mal no coração humano. As provações podem provir do coração humano, assim como poderiam provir do coração de Jesus Cristo, quando foi provado no deserto, mas do coração Dele não poderiam provir tentações, por isso, afirmar que provações sejam tentações não é correto. O Salmo 36 personifica o pecado no interior do homem.
• Mateus 15,18-19: “...o que sai da boca brota do coração; e isso sim contamina o homem, pois do coração saem pensamentos malvados, assassinatos, adultérios, fornicação, roubos, perjúrios, blasfêmias.”
Não há dúvidas neste texto de que as provações sejam internas, assim como o é o oráculo do Pecado, vide Salmo 36,2: “Oráculo do Pecado ao perverso dentro de seu coração, não tem medo de Deus nem mesmo em sua presença.” Vencer o medo de Deus parece um ato de coragem, mas é ato temerário e “insensato”.
Sobre semelhante oráculo temos o Salmo 14 e Hab 2,18: como mestre de mentiras. Não sei se os evangélicos possuem o livro do Eclesiástico, creio que não, mas ele elucida uma alternativa diferente a origem do homem. Devido os evangélicos terem ficado com o cânon dos judeus de Jâmnia, perderam preciosidades da tradução dos 70 (Septuaginta –LXX), do segundo século antes de Cristo usada pelos judeus do Egito (Alexandria). Os livros são: Judite, Baruc, 1e2 Macabeus, Sabedoria, Eclesiástico e partes de Ester. Tudo porque os judeus de Jâmnia não aceitaram o Grego, só o hebraico, não é em vão que não aceitam o NT também.
• Eclesiástico 15,14: “O Senhor criou o homem no princípio e o entregou em poder de seu arbítrio.”
Pela liberdade, o homem chega ao autocontrole e se realiza, ficando senhor do seu destino. Mas não é senhor absoluto. Ao poder interno do arbítrio se acrescenta a luz e a força da lei, vontade de Deus feita palavra para reger e ordenar o homem livre. Cumprir o mandamento depende do querer ( Sl 40,9: “Levo tua instrução nas entranhas”).
Jesus foi posto à prova (Mt 4,3). Deve-se evitar chamá-las de tentações, porque são na verdade provações. O povo guiado por Moisés, é posta à prova repetidas vezes no deserto e falhou várias vezes. Moisés uma vez. Jesus supera todas as provas – Milagre fácil e injustificado, espetáculo gratuito abusando dos anjos, e sobretudo o poderio universal, não submetendo-se às regras do jogo impostas pelo pretenso soberano do mundo. Adoração é restrita a Deus; Jesus vence a prova do poder e do ter que não deixam de ser oriundas do coração humano, mas segundo Mateus 5,8: “Felizes os limpos de coração, porque verão a Deus”. Jesus insiste que a pureza interior é uma bem-aventurança (Mt 5,8)
• Hebreus 4,15: “ O sumo sacerdote que temos não é insensível à nossa fraqueza, já que foi provado como nós em tudo, exceto no pecado”.
Se as provações são oriundas do coração humano e não de um tentador ai inculcado, como seriam complicadas de se entenderem as possessões demoníacas. Bom, para esse problema só posso aludir a limitação científica de cada época para interpretar as doenças psicológicas.
Como já fundamentei a origem das provações no coração humano, agora terei que explicar as nomeações externas do mal, acredito que Jo 14,30: “O príncipe deste mundo é o Diabo, Satanás”. Eis uma das chaves para compreender a analogia feita neste sentido.
• “Cremos firmemente que Deus é o Senhor do mundo e da história. Mas os caminhos da sua providência muitas vezes nos são desconhecidos. Só no final, quando acabar o nosso conhecimento parcial, quando virmos Deus “face-a-face” (1Cor 13,12), teremos pleno conhecimento dos caminhos pelos quais, mesmo através dos dramas do mal e do pecado, Deus terá conduzido a sua criação até o descanso desse Sábado (Gn 2,2) definitivo, em vista do qual criou o céu e a terra... A permissão divina do mal físico e do mal moral é um mistério que Deus ilumina pelo seu Filho, Jesus Cristo, morto e ressuscitado para vencer o mal. A fé nos dá a certeza de que Deus não permitiria o mal se do próprio mal não tirasse o bem, por caminhos que só conheceremos plenamente na vida eterna. (cf. Catecismo Católico 314 e 324).
Seria bem menos complicado se optássemos pelas duas alternativas. “O mal tem duas fontes, de dentro do homem (seu coração), de fora do homem representado nos poderes políticos e civis. Mesmo assim me culpariam de despersonificação de Satanás. Porém, tenho que então personificá-lo, eis minha tarefa agora.
• Lc 10,18: “Eu via Satanás cair do céu como um raio.”
O que mais satisfaz os setenta é a eficácia dos exorcismos em nome de Jesus. Não o conseguiram com o menino no vale (Lc 9,37-43); O Satã foi derrubado de seu lugar, como o imperador emblemático da Babilônia, “caído do céu, abatido até o abismo” (Is 14,12.14). Pela vitória de Jesus (4,1-12). Graças a isso, os discípulos submeterão as potências do mal (Sl 91,13). Mas não basta submeter o inimigo de baixo; mais importante é pertencer ao reino de cima, estar inscrito em seu registro ( Ex 32,32; Sl 87,6).
O AT não oferece idéias claras e sistematizadas sobre espíritos nocivos, tentadores, hostis ao plano de Deus. O Satã do livro de Jó tem acesso à corte celeste; também o espírito enganador de 1Rs 22,21. Mais clara, a função tentadora e hostil da serpente do paraíso, da qual prescinde Bem Sirac (Eclo 15 e 17).
As vezes, os falsos deuses recebem o nome de demônios (Shedim: Dt 32,17; Sl 106,37); o deserto é refúgio de uma espécie de sátiros (Lv 17,7), e há uma espécie de demônio noturno (lilit: Is 34,14). O enigmático Azazel (Lv 16) da expiação parece uma figura demoníaca; talvez o seja o cortejo maligno de Sl 91,5-6. Asmodeu é o demônio do livro de Tobias.
Os Evangelhos apresentam os demônios (espíritos imundos, maus) segundo as crenças da época, geralmente produzem doenças ou possessões; adivinhações (At 16,16). Não induzem ao pecado nem levam à condenação; mas podem levar a perder a fé ( 1Tm 4,1; 1Jo 4,6). Aparecem personificados: reconhecem, falam, pedem, habitam, saem, sabem teologia, mais me parecem figuras de linguagem, mas o Devaney não aceita essa argumentação, pois não costuma estudar a crítica das formas e gêneros literários.
Jesus e os apóstolos têm poder sobre eles. Identificados com os ídolos ( 1Cor 10,20). A última exigência de Satã é ser adorado (Mt 4,1-12). Os reinos do mundo com seu esplendor se opõem ao reino dos céus com sua glória. Os reis terrestres querem homenagens ( Dn 3,5). A partir desta analogia, podemos perceber a nomeação.
• Mc 1, 26: “O espírito imundo o sacudiu, deu um forte grito e saiu dele”.
O Demônio sabe teologia, aqui se apresenta, na linguagem e na mentalidade da época, a primeira confrontação é a vitória de Jesus sobre os poderes do mal que escravizam o homem. Em Mc 3,22, notemos que Belzebu é um dos nomes tradicionais do Diabo (tomado do deus de Acaron – 2 Rs1). Zebul significa provavelmente príncipe. Mc 5,8: “Chamo-me Legião, porque somos muitos”. Legião é termo latino, tipicamente romano militar. Mas o que fazer se alguns textos apresentam dramaticamente um tentador externo ao homem, como a serpente (Gn 3) ou Satã (Jó). Então vamos ver se não é figura de linguagem.
Gênesis 3,1: A serpente representa, nas culturas circundantes, a força hostil a Deus e a seu plano. Personificação do mal ativo, sedutor ou agressor. Ben Sirac não a menciona (Eclo 15,11-20; Sb 2,24 fala da “inveja do diabo”); Ap 12,8-9 acumula nomes, identificando e interpretando: “dragão, serpente primordial, satã, diabo, acusador. Além disso, o nome hebraico de serpente coincide com “vaticínio”. O falso oráculo é arma da serpente contra Eva: tira a base da proibição de Deus, dando-lhe intenções escusas, promete como bem o que é mal, pois conhecer o mal por experiência é um mal. Sobre semelhante oráculo: Sl 14, Hab 2,18, “mestre de mentiras”.
A serpente no paraíso personifica o poder adverso a Deus e que tenta o homem com astúcia e engano (Gn 3): a imagem parece tomada de representações mitológicas da serpente como poder cósmico rebelde; disso ficam traços no AT: Is 51,9; Sl 136,13. Desce ao fundo do mar (Am 9,3) e fere no deserto (Dt 8,15). O Senhor a fere e derrota (Jo 26,13).
Na era escatológica será aniquilada (Is 27,1). Os perversos participam de sua natureza: o império agressor (Is 14,29), os chefes depravados (Sl 58,5s; 140,4). A serpente de bronze era sinal salvador, pela visão (Nm21) ou pela fé (Sb 16,5-7); mas não devia ser venerada (2Rs 18,4). No NT é exemplo de astúcia (Mt 10,16), temível por seu veneno e usada como injúria (Mt 23,33). Cristo na cruz é antítipo da serpente primordial (Gn 3) em 2Cor 11,3; Ap 12,9; 20,2. A serpente era o animal emblemático de Esculápio, deus da saúde, por isso asado ainda hoje como símbolo da Medicina.
• Gálatas 4,3: “Da mesma forma nós, enquanto éramos menores de idade, éramos escravos dos elementos cósmicos.” Segundo alguns, os “elementos cósmicos” são criaturas divinizadas pelo homem – idolatria da lei ( Cl 2,20).
Bom, deu para perceber que não é um absurdo considerar a nomeação de Satã com os reinos dominadores assim como aos princípios cósmicos. Logo, não podemos deixar de acreditar que seja o mal no exterior do homem figura de linguagem, existem para dizer que o mal existe e que devemos lutar pelo bem, sabendo de antemão que é do coração humano que nascem as adversidades. Mas nele também está inscrita a lei de Deus, lei natural, assim como se queira entender.