Maomé no Paquistão

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O ENCOSTO
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Maomé no Paquistão

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Maomé no Paquistão

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O escritor V. S. Naipul, bem antes de ser agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura do ano 2001, ensejou uma longa e demorada viagem de estudos pelo mundo islâmico, feito que registrou em dois alentados livros. Nesta impressão ao vivo que ele teve dos países visitados, ressalta a estranha situação do Paquistão, nação onde convivem os tumultos de um Estado jovem, fundado há pouco mais de meio século, com uma antiga religião - o islamismo.


Árabes na Índia

"A Índia, com uma intelligentsia que cresce aos saltos e passos largos, se expande em toas as direções. O Paquistão, exaltando a fé, e sempre e somente exaltando a fé, encolhe mais e mais."
V.S.Naipul - Além da fé, 1998




As catapultas de Qasim



Guerras de conquistas começam por motivos banais. O fato, séculos atrás, de Raja Dahir, o rei hindu do Sind, ter-se negado a punir uns piratas que tinham seqüestrado um grupo de muçulmanos, naufragados no litoral do que hoje é o Paquistão, foi o suficiente para o desencadear do conflito entre árabes e indianos. O califa omeída de Bagdá, tomando as dores dos seus irmãos de fé, injuriados pelos bandidos hindus, ordenou então ao jovem general árabe Mohammad bin Qasim, de apenas 19 anos, que partisse de Basra, no atual Iraque, e marchasse com 25 mil homens em direção ao Sind.

No mesmo ano, o de 711, em que o general muçulmano Tarik iniciava ao Ocidente a conquista da Península Ibérica, no extremo oriente do império islâmico, esse outro comandante maometano, Qasim, desembarcava com suas enormes catapultas de guerra nas proximidades do Paquistão. A campanha dele foi fulminante. Nunca os indianos viram uma artilharia como aquela, capaz de, em pouco tempo, arrasar qualquer muralha que encontrasse pela frente. Em 712, o Raja Dahir capitulou, e o Sind tornou-se, há treze séculos passados, a primeira parte da Índia a converter-se à fé do Profeta.


As entrevistas de Naipul


Entende-se, pois, uma certa impaciência e irritação demonstrada por V. S. Naipul (o recente vencedor do Prêmio Nobel de Literatura) quando, numa da suas viagens de visitas ao Oriente, entrevistara algumas eminentes lideranças muçulmanas do Paquistão atual. Uma delas deu-se com Khalid Ishaq, dono de uma grande banca de advogados em Karachi, que lhe revelou que as massas muçulmanas, apesar de admirarem a organização e as conquistas tecnólogicas e saberem-se materialmente dependentes dos estrangeiros mais desenvolvidos, sofriam de uma "rejeição emocional ao Ocidente", sem que por outro lado, segundo o escritor observou in loco, colocassem, para superá-lo, outra coisa no seu lugar do que uma nebulosa "experiência islâmica". Naipul teve que conter a exasperação. Os autuais integrantes da elite do Paquistão professavam a religião do Crescente há séculos, mas não tinham a mínima idéia do que era "um Estado islâmico", nem o que fazer com ele no mundo moderno.


A decepção com o país


O que sobrava daquela propaganda religiosa que ele via em todos os lugares era um conjunto de proibições: não beber, reprimir a lasciva feminina e, pasmem, nada de juros bancários. Ishaq era membro do Conselho de Ideologia Islâmica, instituição que visava modelar as instituições existentes de acordo com o Corão, mas logo ele mesmo revelou a imprecisão dos seus objetivos, a não ser estudar uma proposta de todos os paquistaneses vestirem-se igual e usarem o mesmo tipo de automóvel (sic)!

Na outra, conversou com um tal de Ahmed, um homem decepcionado com as coisas do Paquistão, dizendo-lhe "Todo mundo aqui engana todo mundo. Políticos, funcionários públicos, todos". Lamentou ele que o seu pais fosse construído em cima do medo e do ódio.


Fundando o Paquistão


Em 1947, os muçulmanos da Índia, bem menos de 10% da população, temerosos de serem engolidos por aquele mar de hindus, insistiram em ter um país próprio. Idéia que fora originalmente defendida pelo poeta A. Mohammed Iqbal, um homem que estudara na Inglaterra e na Alemanha, cognominado Muffakir do Paquistão (o filósofo do Paquistão) -, no ano de 1930


(exatamente nas terras do antigo Sind, a primeira área do subcontinente indiano que fora islamizada). Aceita a proposta por Gandhi (que pagou com a vida por isso, sendo assassinado em 1948), o Paquistão nasceu, pela insistência do seu "pai fundador" Mohammed Ali Jinnah, como um refúgio de gente desesperada que emigrara em massa do norte da Índia. Nunca os dois países se entenderam. Para piorar a situação, a questão do Caxemira (população muçulmana, governo hindu) tornou-se uma permanente dor de cabeça para eles.


A ideologia islâmica


Enquanto isso, a nação muçulmana que se formava no Paquistão, composta por desgarrados, sem raízes, vindos de diversos cantos da Índia, com suas estruturas clânicas desmanteladas e seus costumes tribais abandonados, viu-se presa fácil dos mulás e dos militares. Enquanto a Índia consegue manter-se, ainda que formalmente, nos quadros de um regime tolerante, aceitando a rotatividade dos partidos políticos no poder, o Paquistão é comandado por um entre e sai de generais muçulmanos que, um após o outro, colocam-se como os defensores da fé. O islamismo é para eles o que o anticomunismo foi durante muitos anos para os generais latino-americanos, uma ideologia de afirmação do poder corporativo deles sobre o restante da sociedade.



O site recomenda

V.S.Naipul - Entre os fiéis: Irã, Paquistão, Malásia, Indonésia - 1981 (Cia das Letras,SP,1999)
V.S.Naipul - Além da fé: Indonésia, Irã, Paquistão, Malásia - 1998 (Cia das Letras, SP., 1999)
O ENCOSTO


http://www.manualdochurrasco.com.br/
http://www.midiasemmascara.org/
Onde houver fé, levarei a dúvida.

"Ora, a fé é o firme fundamento das coisas infundadas, e a certeza da existência das coisas que não existem.”

Trancado