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Paulo Henrique Amorim: Agora, ministro, sobre o acidente da Gol, houve notícias no fim de semana de que teria havido, entre outros fatos, problemas na torre de controle. O senhor tem condições de falar sobre isso?
Waldir Pires: Tenho sim. A torre de controle que eles falam é a de São José dos Campos. Esta torre é pequena e dá somente uma indicação – “bom, você vai viajar de São José dos Campos para Manaus, você vai a 37 mil pés”. Bom. Até Manaus. Quer dizer, até Manaus não é 37 mil pés. Isso dentro das regras. Até Manaus é um vôo. Agora, o percurso é o plano de vôo, que ele submeteu, que foi aprovado e que o comandante leva no bolso junto com a carta geográfica que tem lá detalhada todos os caminhos, todas as chamadas aerovias. De forma que, o plano de vôo de quem emite a autorização de decolar, é para que ele atinja a altitude que deve atingir: 37 mil pés. Mas no plano de vôo, em seguida, você tem escrito lá: quando se aproximar de Brasília, em Brasília, você deverá estar com 36 mil pés. Quando você chegar de Brasília e se aproximar de um ponto aeronáutico, que eles convencionam chamar de ponto Teres, adiante de Brasília algumas milhas, você vai para a altitude 38 mil pés, e você voa em 38 mil pés para Manaus. Isso é o que está no plano do vôo, que o comandante leva no bolso.
Paulo Henrique Amorim: E o plano de vôo se sobrepõe a essa informação de São José dos Campos?
Waldir Pires: Não se sobrepõe, só o plano de vôo é o plano de vôo. O que há na decolagem é a decolagem. Você sobre, vai para 37 mil pés e cumpra seu plano de vôo. Isso não precisa ser dito pelo controlador de terra, de qualquer lugar, de qualquer lugar de onde saia um avião.
Paulo Henrique Amorim: Então a culpa do acidente não pode ser atribuída à torre de São José dos Campos?
Waldir Pires: Não, seguramente, não. A não ser que se subvertam todas as regras. Uma delas aí nisso é, Paulo Henrique, é que, digamos assim, eles teriam que viajar com o transponder ligado, com a indicação precisa da sua altitude. A partir do momento que não foi possível uma comunicação com a base, com a terra, com os diversos setores de controle, por exemplo, o controle de Brasília, o Cindacta-1, se não foi possível, ele não está conseguindo, porque realmente ele saiu, não é, ele saiu e a torre de Brasília ficou chamando sucessivamente.
Paulo Henrique Amorim: E o transponder não estava ligado?
Waldir Pires: Não estava ligado o transponder. O transponder dá hoje uma precisão absolutamente rigorosa. 37 mil pés são 37 mil pés, acabou, não pode ser 37.050 nem 36.900. Não é uma indicação do radar, porque uma indicação do radar até na tela, você tinha lá a idéia de que eles estavam em torno de 36 mil pés quando eles se aproximaram de Brasília, mas sem conseguir comunicação. Também, quando não consegue comunicação, é regra internacional que disque um código chamado 7.600: “Estou sem comunicação, estou sem comunicação”. Então, todas as áreas de mobilizam para localizá-lo. Como ele liga, por exemplo, o 7.700, quando eu estou em emergência. Então, o transponder não estava funcionando. Como o transponder não estava funcionando, não funcionou um equipamento que se chama ticas, que é um, digamos assim, um impeditivo do choque, ele impede, ele inibe a colisão porque ele entra em disparo e começa a sinalizar e aí já dar, inclusive, quando se aproximam de um eventual choque, eles já fazem indicações: um diz, “tome a direita”, outro, “tome a esquerda”, ou suba, ou desça, para o piloto cumprir isso automaticamente.
Paulo Henrique Amorim: E o ticas não estava funcionando.
Waldir Pires: O ticas não estava funcionando, na medida em que o transponder não estava. Agora, o transponder só começou a funcionar depois do acidente, dois minutos depois do acidente, dois a três minutos depois do acidente o transponder funcionou e eles falaram com a torre de Cachimbo para descer em Cachimbo. De modo que esse, infelizmente, é o fato. Imaginar que um controlador de São José dos Campos pode dar, quando ele diz “Viaje a 37 mil pés, autorizado até Manaus”, ele está autorizando a viagem. A viagem tem essa direção. Mas de acordo com o plano de vôo. Até porque, todas as cartas geográficas estão lá indicando que todos os vôos que vem do Norte para Brasília, todos eles, estão em números ímpares, vindos de Manaus para cá [Brasília]. E em números pares, vindos de cá para Manaus. São todas as cartas. A segurança de vôo está em função do que está no plano de vôo, e não no equívoco, digamos, de um funcionário desse ou daquele lugar, de onde sobe um avião.
Paulo Henrique Amorim: E essa distinção entre par e ímpar é um código universal.
Waldir Pires: É um código universal. Os números ímpares vêm do Norte para o Sul e os pares, do Sul para o Norte. Tem mão e contramão, o mesmo princípio.
Paulo Henrique Amorim: Ministro, muito obrigado, um grande abraço. É um grande prazer falar com o senhor.
Waldir Pires: Agora, olha aqui, Paulo Henrique. Eu estou dando essas informações todas pelo o que fui informado e pelo o que constatei ouvindo e vendo as informações do Cindacta, portanto, do que foi efetivamente o que se passou. Evidente que não sou a autoridade julgadora de coisa nenhuma. Quem vai julgar isso são outros organismos. A caixa de voz do Boeing, essa caixa de voz, estava sendo examinada ainda ontem, começando a ser analisada ontem lá no Canadá. Que nós mandamos tudo isso como a outra do Legacy foi pra lá, essa do Boeing também foi para lá, para a Organização Internacional de Aviação Civil, a fim de que tenha uma coisa plena de normalidade.