VARIÁVEIS OCULTAS - Uma análise crítica
Enviado: 16 Nov 2006, 19:39
VARIÁVEIS OCULTAS – UMA ANÁLISE CRÍTICA
Quando falamos de teorias da Física, é plausível supor que, quando alguém defende um determinado modelo, deva conhecer razoavelmente bem tal modelo, se não todo o formalismo matemático, pelo menos seus conceitos e características principais. Além disso, é plausível supor, também, que tais pessoas, para terem argumentação quando de um debate, por exemplo, já aplicaram tais conceitos em várias situações para saberem como o modelo se comporta, se mostra ser favorável às idéias defendidas, etc.
Contudo, quase sempre não se percebe tal postura, seja em fóruns, grupos de discussão, etc. A impressão que se tem é que a grande maioria das pessoas vê em um determinado modelo uma suposta base e/ou sustentação às suas idéias ou crenças, e passa a defendê-lo a qualquer custo.
O fato de um tal modelo apresentar “problemas”, na maioria das vezes, ou são ignorados, ou deixados de lado, ou pior ainda, são “varridos para debaixo do tapete” com “soluções” esdrúxulas que simplesmente jogam por terra efeitos, propriedades, características, etc, plenamente confirmadas pela experiência, como se a não-validade, em determinadas circunstâncias, desses efeitos, propriedades, características, etc, fosse algo absolutamente banal que somente a “massa de físicos idiotas” que se prendem a eles (e aqui, para os “varredores para debaixo do tapete”, pouco importa as evidências a favor desses “físicos idiotas”), não percebem.
Presente em quase todos os ramos, a postura descrita é muito nítida na maioria das discussões sobre Variáveis Ocultas. Mas a questão é: essas pessoas fizeram realmente uma análise crítica de tal modelo?
Antes de qualquer coisa, vamos ver o que, por definição, o modelo das Variáveis Ocultas. Tal modelo é, antes de tudo, DETERMINISTA. Ele parte da premissa de que, os fenômenos quânticos indeterministas têm uma CAUSA. O indeterminismo somente aparece como em teorias clássicas, ou seja, se deve à nossa falta de conhecimento. Em outras palavras, as causa seria variáveis desconhecidas, ocultas, a quais seriam características, propriedades, que as partículas elementares possuiriam e que ainda não foram descobertas. Outro ponto principal do modelo é que tais variáveis são REAIS, ou sejam elas existem de fato, são “coisas”. Este modelo adota uma visão realista, objetiva daquilo a que chamamos realidade física. Resumindo, ele é um modelo DETERMINISTA e REAL, sendo as partículas elementares consideradas como PARTÍCULAS, às quais se associa uma ONDA DE MATÉRIA (ou ONDA PILOTO). É exatamente por este motivo que tal modelo seduz aqueles que não gostam, ou não aceitam, a possibilidade de a realidade não ser intrinsecamente determinista e objetiva.
Estando isto claro, primeiramente vejamos alguns pontos mais técnicos, que muitos que defende a possibilidade de tal hipótese desconhecem, mas que deveriam levar em conta para terem certeza de que tal modelo é plausível e dá suporte às suas crenças.
Uma primeira questão, creio, deve ser desconhecida até mesmo de muitos físicos que defendem o modelo. Sabemos que a luz comum pode ser decomposta em duas ondas polarizadas. Na luz proveniente do átomo de hidrogênio, a chamada “onda s” está polarizada perpendicularmente, enquanto a chamada “onda p” está polarizada paralelamente. O problema aparece quando aplicamos o modelo de Bohm neste caso. Na “onda s”, do átomo de hidrogênio, como PSI é REAL, a velocidade do elétron seria nula!
Não encontrei maiores referências a esta questão, tendo sido apresentada por Osvaldo Pessoa Jr, formado em Física e Filosofia, pela USP, e bastante conhecido por seus trabalhos em Fundamentos Conceituais da Física Quântica, Abordagens Filosóficas à História da Ciência e Filosofia da Ciência. Caso consiga outras referências, postarei futuramente.
Uma segunda questão se refere ao Potencial Quântico, termo incluído por Bohm. Pertinentes são as declarações de Eduardo Castro, mestre em Filosofia pela Faculdade de Filosofia da Universidade de Lisboa:
O campo dado pela Função de Onda (PSI) é interpretado como sendo um campo REAL, no mesmo sentido em que os campos associados à teoria Eletromagnética de Maxwell são campos reais. Pelos cálculos, resulta da equação de Schrödinger, além do potencial clássico, um novo potencial chamado de “Potencial Quântico” que não tem qualquer sustentação física.
O Potencial Quântico é uma entidade bizarra com algumas propriedades não-clássicas. Primeira, o Potencial Quântico não diminui à medida que a distância entre duas partículas aumenta. Segunda, o Potencial Quântico é não-local, isto é, as partículas de um sistema estão INSTANTANEAMENTE correlacionadas. Terceira, o Potencial Quântico depende do estado quântico global de um sistema; no limite o potencial quântico pode depender do estado quântico do universo (!!!!). Quarta, o Potencial Quântico não irradia, isto é, o potencial quântico não tem uma fonte pontual.
Também Osvaldo Pessoa afirma que...
Uma partícula responde ao campo PSI, mas não atua sobre PSI (!!).
Eduardo Castro conclui assim:
A teoria de Bohm surge, assim, como uma teoria entre outras e é uma teoria com vários problemas: acrescenta variáveis às variáveis dinâmicas quânticas; a natureza do Potencial Quântico é bizarra, dado que NÃO TEM SUPORTE FÍSICO e resulta de MERA MANIPULAÇÃO ALGÉBRICA; o caráter inobservável do postulado que considera como determinada a trajetória das partículas; em termos experimentais é equivalente às previsões da Mecânica Quântica convencional e “conduz a predições conflituosas relativamente a um número de outras experiências possíveis que podem ser, de fato, extremamente difíceis de concretizar” ***; por último, é uma teoria não-local, isto é, uma partícula pode ser influenciada instantaneamente pelo potencial existente noutros pontos do espaço para além daquele onde se situa a partícula. Dados estes problemas, as interpretações convencionais da Mecânica Quântica, apesar de probabilísticas e com menos pretensões realistas quanto aos constituintes últimos da matéria, funcionam em termos experimentais e, por parcimônia, são preferíveis à interpretação da teoria de Bohm.
*** aqui, a referência é Richard Healey, autor de “The Philosophy os Quantum Mechanics”
E por se falar de Filosofia, ele termina com uma observação incrivelmente pertinente, sempre lembrando que estamos tratando de um modelo realista, objetivo:
Em suma, na teoria de Bohm as pretensas asserções metafísicas que não podem ser empiricamente suportadas sobre a natureza do Potencial Quântico, ou seja, a alegada existência, no mundo natural, de entidades que são simultaneamente físicas e indetectáveis, são asserções inconsistentes com um princípio Naturalista, chamado de Princípio Eleático, segundo o qual uma entidade é real (física) se, e só se, for capaz de participar em cadeias causais.
Possivelmente, por grande parte do exposto, John Bell, em seu livro “Speakable and Unspeakable in Quantum Mechanics”, não faz nenhuma referência ao Potencial Quântico. Conforme Osvaldo Pessoa:
...manifestaram-se dúvidas quanto à validade de se varrer simplesmente o Potencial Quântico para debaixo do tapete, como querem os neo-bohmianos. Uma questão formal que permaneceu no ar é como relacionar a Mecânica Bohmiana com a abordagem da integral de trajetória de Feynman.
Pessoa ainda levanta outras questões importantes.
A Mecânica Bohmiana não é a Mecânica Clássica com um termo adicional de força. Na Mecânica Bohmiana, as velocidades NÃO SÃO INDEPENDENTES DAS POSIÇÕES, como o são classicamente, mas estão restritos pela equação guia.
O Potencial Quântico é uma função no espaço de configuração que é determinada pela função de onda - ele é um funcional da função de onda. Isso sugere que a Mecânica Bohmiana requer uma peculiar dependência da dinâmica em relação à probabilidade.
E há uma outra, bastante técnica, mas que vale ser mencionada. Faz referência às trajetórias muito bem definidas, conforme a hipótese de Bohm, no Experimento das Duas Fendas (analisarei em maiores detalhes este experimento mais à frente). Para tanto, tomemos esta figura:

Conforme, Pessoa, temos:
As estranhas trajetórias de partículas previstas pela Mecânica Bohmiana no experimento das duas fendas (ver Fig.) foram criticadas e chamadas de "surrealistas". Note que tais trajetórias se confinam à região defronte à fenda pela qual a partícula passa (não ocorre "crossing over"). Englert et al. (1992) consideram o caso em que micromasers se encontram junto às fendas; neste caso o padrão de interferência desaparece, mas as partículas bohmianas continuam confinadas à região defronte à fenda pela qual passaram, por razões de simetria. Ora, há uma probabilidade razoável de medir correlações entre "passagem pelo micromaser superior" e "detecção do átomo na parte inferior da tela". Neste caso, deveríamos inferir que o átomo seguiu uma TRAJETÓRIA PROIBIDA PELA MECÂNICA BOHMIANA! Em sua resposta, Dürr et al. (1993) (seguido de tréplica) não conseguiram explicar satisfatoriamente a questão.
Estes foram os pontos críticos técnicos. Mas como muitos dos que simpatizam e defendem a factibilidade de um modelo a Variáveis Ocultas, não possuem conhecimentos tão técnicos, façamos então, uma análise de aplicação de conceitos. Para isso, vamos utilizar um experimento diferente o EPR, o qual requer a Não-Localidade. Vamos imaginar um experimento onde as distâncias são relativamente próximas, portanto, a questão da não-localidade não interferirá de modo algum. Vamos utilizar o conhecido Experimento das Duas Fendas.
De uma maneira simplificada, o experimento consiste em uma fonte de elétrons, por exemplo, que são disparados contra um anteparo com duas fendas. Após o anteparo, a uma distancia deste, há uma parede com receptores, para registrar os elétrons que atravessam as fendas e chegam à parede.
Temos que quando uma das fendas está aberta, e a outra fechada, as detecções se concentram nos pontos da parede localizados frontalmente à abertura. Seria de se esperar que, quando as duas fendas estivessem abertas, haveria duas concentrações de detecção nas regiões defronte às fendas, mas não é isso o que acontece. As detecções se apresentam distribuídas em faixas, similar às faixas de interferência de ondas. Tal fato se dá mesmo quando se dispara um elétron por vez.
Pois bem, e o que acontece quando colocamos detectores nas fendas para sabermos exatamente por que fenda o elétron passou? Obtemos o acumulo de detecções nas regiões frontalmente às fendas, como esperávamos no início, ou seja, a interferência desaparece.
Conforme a interpretação de Copenhague, de uma maneira geral, temos que...
nenhum fenômeno é um fenômeno antes de ele ser - pela observação ou por alguma combinação apropriada de teoria e observação - um fenômeno observado. O universo não “existe lá fora”, independente de todos os atos de observação. Pelo contrário, ele é, em algum sentido estranho, um universo participativo.
Ou seja, a IC adora uma visão não-realista, ou não-objetiva. Exatamente por isso, como já dissemos, o modelo de Bohm seduz tantos adeptos. Mas o que acontece quando aplicamos tal modelo ao experimento das duas fendas?
Temos que em um instante t0, o elétron é disparado. Lembremos que neste modelo, por hipótese, o elétron é um objeto REAL, bem como a sua Onda Associada, que o dirige. Também, temos por hipótese que a trajetória do elétron é REAL e a fenda através da qual ele irá passar JÁ ESTÁ DEFINIDA pelas VO, ou seja, este modelo é DETERMINISTA.
Pois bem, o elétron e sua Onda Guia ou Onda Piloto seguem até atingir o anteparo no instante t1, onde a onda, similar à ondas em uma superfície de água, se divide, com uma parte carregando o elétron passando por uma das fendas e outra parte passando pela outra. Ao sair do outro lado, as duas partes da onda se chocam, causando interferência e obtendo a distribuição de detecções em faixas, exatamente como acontece.
Da mesma maneira que anteriormente, vamos colocar detectores nas fendas para ver o que acontece. Tudo se passa da mesma maneira até t1. Neste ponto, a onda se divide, com uma parte carregando o elétron passa, por exemplo, pela fenda F2, que é acusado pelo detector. O que acontece aqui? Perceba que, OBRIGATORIAMENTE, a onda que passa pela fenda F1, tem “energia zero”, ou seja, é uma onda vazia, seja lá o que isso for do ponto de vista de um “objeto real”!
Em termos de interpretação de um objeto real, pode-se levantar a questão de que aqui, a onda tem “energia zero” até o limite de nossa detecção, sendo que na realidade, ela possui um valor que, embora baixo, é diferente de zero. Isto pode parecer até uma ótima saída, mas se enquadra perfeitamente naquilo que falei no início da postagem. No fundo, nada mais é que uma “resposta para sair do problema”, sem, contudo, analisar em que implica esta proposta. Dizer que, em realidade, a onda tem alguma energia equivale a... dividir o quantum!!!!! Obviamente, dividir o quantum para “resolver” (??) o problema da onda vazia implica em se assumir TODOS os problemas que existiam no final do século XIX e que levaram Planck a formular tal hipótese, inclusive com o cálculo de seu valor exato!! E como veremos adiante, mesmo que tal “hipótese absurda” fosse válida, não resolverá a questão que apresentarei.
Pois bem, analisando-se os dois resultados, e tendo-se em mente, como venho realçando, que se trata de um modelo REALISTA e DETERMINISTA, nota-se uma questão muito grave. Mas vamos tornar o experimento um pouco mais complexo, para ficar claro o que quero expor. Vamos tornar esta experiência um Experimento de Escolha Retardada, ou seja, vamos montá-lo de uma tal maneira que após a partida do elétron, mas antes de sua detecção, posso mudar minhas opções. Tal experimento é totalmente consistente com a interpretação de Copenhague. Será que é com o modelo de Bohm?
Iniciamos o experimento exatamente do mesmo modo como fizemos no último exemplo, com os detectores em cada fenda ligados. Dispararmos um único elétron, com sua onda piloto associada, no instante t0 que, pela hipótese do modelo, já tem determinado por qual fenda o elétrons irá passar, assim como a onda irá se dividir (afinal, pela hipótese, o modelo é DETERMINISTA).
Pois bem. Sabemos que a onda com o elétron irá atingir o anteparo com as fendas em t1, e que o resultado, tanto pelos cálculos de Bohm, como pelo resultado do experimento anterior, será que a onda irá se dividir, os detectores determinarão exatamente por qual fenda passa a partícula e, conseqüentemente, a onda vazia passará pela outra.
Só que, desta feita, no instante t1/2 > t0, desligamos os detectores. O que acontece neste caso? Bem, nesse caso, após passarem pelas fendas, deverá, OBRIGATORIAMENTE, haver interferência!
Mas espere um instante. Como pode haver interferência se a energia da onda já estava previamente determinada como zero pelas variáveis ocultas, como afirma a hipótese do modelo? Se este modelo se diz REALISTA e DETERMINISTA por definição, como a escolha do observador pode influenciar em características pré-determinadas, por propriedades físicas reais, ainda por cima no... passado?
O que temos aqui é muito claro. O modelo com suas “criaturas absurdas”, tais como o Potencial Quântico, bem como “ondas vazias” que são REAIS, mas QUE não interagem, não só violam suas próprias “conjecturas filosóficas”, como mostrado com a violação do Princípio Eleático, bem como, fisicamente, temos a interferência do observador em “propriedades reais”, exatamente algo que o modelo diz, taxativamente, não existir!
Curiosamente, assim como acontece com as questões técnicas expostas, nenhum defensor das VO explica este... FATO
Quando falamos de teorias da Física, é plausível supor que, quando alguém defende um determinado modelo, deva conhecer razoavelmente bem tal modelo, se não todo o formalismo matemático, pelo menos seus conceitos e características principais. Além disso, é plausível supor, também, que tais pessoas, para terem argumentação quando de um debate, por exemplo, já aplicaram tais conceitos em várias situações para saberem como o modelo se comporta, se mostra ser favorável às idéias defendidas, etc.
Contudo, quase sempre não se percebe tal postura, seja em fóruns, grupos de discussão, etc. A impressão que se tem é que a grande maioria das pessoas vê em um determinado modelo uma suposta base e/ou sustentação às suas idéias ou crenças, e passa a defendê-lo a qualquer custo.
O fato de um tal modelo apresentar “problemas”, na maioria das vezes, ou são ignorados, ou deixados de lado, ou pior ainda, são “varridos para debaixo do tapete” com “soluções” esdrúxulas que simplesmente jogam por terra efeitos, propriedades, características, etc, plenamente confirmadas pela experiência, como se a não-validade, em determinadas circunstâncias, desses efeitos, propriedades, características, etc, fosse algo absolutamente banal que somente a “massa de físicos idiotas” que se prendem a eles (e aqui, para os “varredores para debaixo do tapete”, pouco importa as evidências a favor desses “físicos idiotas”), não percebem.
Presente em quase todos os ramos, a postura descrita é muito nítida na maioria das discussões sobre Variáveis Ocultas. Mas a questão é: essas pessoas fizeram realmente uma análise crítica de tal modelo?
Antes de qualquer coisa, vamos ver o que, por definição, o modelo das Variáveis Ocultas. Tal modelo é, antes de tudo, DETERMINISTA. Ele parte da premissa de que, os fenômenos quânticos indeterministas têm uma CAUSA. O indeterminismo somente aparece como em teorias clássicas, ou seja, se deve à nossa falta de conhecimento. Em outras palavras, as causa seria variáveis desconhecidas, ocultas, a quais seriam características, propriedades, que as partículas elementares possuiriam e que ainda não foram descobertas. Outro ponto principal do modelo é que tais variáveis são REAIS, ou sejam elas existem de fato, são “coisas”. Este modelo adota uma visão realista, objetiva daquilo a que chamamos realidade física. Resumindo, ele é um modelo DETERMINISTA e REAL, sendo as partículas elementares consideradas como PARTÍCULAS, às quais se associa uma ONDA DE MATÉRIA (ou ONDA PILOTO). É exatamente por este motivo que tal modelo seduz aqueles que não gostam, ou não aceitam, a possibilidade de a realidade não ser intrinsecamente determinista e objetiva.
Estando isto claro, primeiramente vejamos alguns pontos mais técnicos, que muitos que defende a possibilidade de tal hipótese desconhecem, mas que deveriam levar em conta para terem certeza de que tal modelo é plausível e dá suporte às suas crenças.
Uma primeira questão, creio, deve ser desconhecida até mesmo de muitos físicos que defendem o modelo. Sabemos que a luz comum pode ser decomposta em duas ondas polarizadas. Na luz proveniente do átomo de hidrogênio, a chamada “onda s” está polarizada perpendicularmente, enquanto a chamada “onda p” está polarizada paralelamente. O problema aparece quando aplicamos o modelo de Bohm neste caso. Na “onda s”, do átomo de hidrogênio, como PSI é REAL, a velocidade do elétron seria nula!
Não encontrei maiores referências a esta questão, tendo sido apresentada por Osvaldo Pessoa Jr, formado em Física e Filosofia, pela USP, e bastante conhecido por seus trabalhos em Fundamentos Conceituais da Física Quântica, Abordagens Filosóficas à História da Ciência e Filosofia da Ciência. Caso consiga outras referências, postarei futuramente.
Uma segunda questão se refere ao Potencial Quântico, termo incluído por Bohm. Pertinentes são as declarações de Eduardo Castro, mestre em Filosofia pela Faculdade de Filosofia da Universidade de Lisboa:
O campo dado pela Função de Onda (PSI) é interpretado como sendo um campo REAL, no mesmo sentido em que os campos associados à teoria Eletromagnética de Maxwell são campos reais. Pelos cálculos, resulta da equação de Schrödinger, além do potencial clássico, um novo potencial chamado de “Potencial Quântico” que não tem qualquer sustentação física.
O Potencial Quântico é uma entidade bizarra com algumas propriedades não-clássicas. Primeira, o Potencial Quântico não diminui à medida que a distância entre duas partículas aumenta. Segunda, o Potencial Quântico é não-local, isto é, as partículas de um sistema estão INSTANTANEAMENTE correlacionadas. Terceira, o Potencial Quântico depende do estado quântico global de um sistema; no limite o potencial quântico pode depender do estado quântico do universo (!!!!). Quarta, o Potencial Quântico não irradia, isto é, o potencial quântico não tem uma fonte pontual.
Também Osvaldo Pessoa afirma que...
Uma partícula responde ao campo PSI, mas não atua sobre PSI (!!).
Eduardo Castro conclui assim:
A teoria de Bohm surge, assim, como uma teoria entre outras e é uma teoria com vários problemas: acrescenta variáveis às variáveis dinâmicas quânticas; a natureza do Potencial Quântico é bizarra, dado que NÃO TEM SUPORTE FÍSICO e resulta de MERA MANIPULAÇÃO ALGÉBRICA; o caráter inobservável do postulado que considera como determinada a trajetória das partículas; em termos experimentais é equivalente às previsões da Mecânica Quântica convencional e “conduz a predições conflituosas relativamente a um número de outras experiências possíveis que podem ser, de fato, extremamente difíceis de concretizar” ***; por último, é uma teoria não-local, isto é, uma partícula pode ser influenciada instantaneamente pelo potencial existente noutros pontos do espaço para além daquele onde se situa a partícula. Dados estes problemas, as interpretações convencionais da Mecânica Quântica, apesar de probabilísticas e com menos pretensões realistas quanto aos constituintes últimos da matéria, funcionam em termos experimentais e, por parcimônia, são preferíveis à interpretação da teoria de Bohm.
*** aqui, a referência é Richard Healey, autor de “The Philosophy os Quantum Mechanics”
E por se falar de Filosofia, ele termina com uma observação incrivelmente pertinente, sempre lembrando que estamos tratando de um modelo realista, objetivo:
Em suma, na teoria de Bohm as pretensas asserções metafísicas que não podem ser empiricamente suportadas sobre a natureza do Potencial Quântico, ou seja, a alegada existência, no mundo natural, de entidades que são simultaneamente físicas e indetectáveis, são asserções inconsistentes com um princípio Naturalista, chamado de Princípio Eleático, segundo o qual uma entidade é real (física) se, e só se, for capaz de participar em cadeias causais.
Possivelmente, por grande parte do exposto, John Bell, em seu livro “Speakable and Unspeakable in Quantum Mechanics”, não faz nenhuma referência ao Potencial Quântico. Conforme Osvaldo Pessoa:
...manifestaram-se dúvidas quanto à validade de se varrer simplesmente o Potencial Quântico para debaixo do tapete, como querem os neo-bohmianos. Uma questão formal que permaneceu no ar é como relacionar a Mecânica Bohmiana com a abordagem da integral de trajetória de Feynman.
Pessoa ainda levanta outras questões importantes.
A Mecânica Bohmiana não é a Mecânica Clássica com um termo adicional de força. Na Mecânica Bohmiana, as velocidades NÃO SÃO INDEPENDENTES DAS POSIÇÕES, como o são classicamente, mas estão restritos pela equação guia.
O Potencial Quântico é uma função no espaço de configuração que é determinada pela função de onda - ele é um funcional da função de onda. Isso sugere que a Mecânica Bohmiana requer uma peculiar dependência da dinâmica em relação à probabilidade.
E há uma outra, bastante técnica, mas que vale ser mencionada. Faz referência às trajetórias muito bem definidas, conforme a hipótese de Bohm, no Experimento das Duas Fendas (analisarei em maiores detalhes este experimento mais à frente). Para tanto, tomemos esta figura:

Conforme, Pessoa, temos:
As estranhas trajetórias de partículas previstas pela Mecânica Bohmiana no experimento das duas fendas (ver Fig.) foram criticadas e chamadas de "surrealistas". Note que tais trajetórias se confinam à região defronte à fenda pela qual a partícula passa (não ocorre "crossing over"). Englert et al. (1992) consideram o caso em que micromasers se encontram junto às fendas; neste caso o padrão de interferência desaparece, mas as partículas bohmianas continuam confinadas à região defronte à fenda pela qual passaram, por razões de simetria. Ora, há uma probabilidade razoável de medir correlações entre "passagem pelo micromaser superior" e "detecção do átomo na parte inferior da tela". Neste caso, deveríamos inferir que o átomo seguiu uma TRAJETÓRIA PROIBIDA PELA MECÂNICA BOHMIANA! Em sua resposta, Dürr et al. (1993) (seguido de tréplica) não conseguiram explicar satisfatoriamente a questão.
Estes foram os pontos críticos técnicos. Mas como muitos dos que simpatizam e defendem a factibilidade de um modelo a Variáveis Ocultas, não possuem conhecimentos tão técnicos, façamos então, uma análise de aplicação de conceitos. Para isso, vamos utilizar um experimento diferente o EPR, o qual requer a Não-Localidade. Vamos imaginar um experimento onde as distâncias são relativamente próximas, portanto, a questão da não-localidade não interferirá de modo algum. Vamos utilizar o conhecido Experimento das Duas Fendas.
De uma maneira simplificada, o experimento consiste em uma fonte de elétrons, por exemplo, que são disparados contra um anteparo com duas fendas. Após o anteparo, a uma distancia deste, há uma parede com receptores, para registrar os elétrons que atravessam as fendas e chegam à parede.
Temos que quando uma das fendas está aberta, e a outra fechada, as detecções se concentram nos pontos da parede localizados frontalmente à abertura. Seria de se esperar que, quando as duas fendas estivessem abertas, haveria duas concentrações de detecção nas regiões defronte às fendas, mas não é isso o que acontece. As detecções se apresentam distribuídas em faixas, similar às faixas de interferência de ondas. Tal fato se dá mesmo quando se dispara um elétron por vez.
Pois bem, e o que acontece quando colocamos detectores nas fendas para sabermos exatamente por que fenda o elétron passou? Obtemos o acumulo de detecções nas regiões frontalmente às fendas, como esperávamos no início, ou seja, a interferência desaparece.
Conforme a interpretação de Copenhague, de uma maneira geral, temos que...
nenhum fenômeno é um fenômeno antes de ele ser - pela observação ou por alguma combinação apropriada de teoria e observação - um fenômeno observado. O universo não “existe lá fora”, independente de todos os atos de observação. Pelo contrário, ele é, em algum sentido estranho, um universo participativo.
Ou seja, a IC adora uma visão não-realista, ou não-objetiva. Exatamente por isso, como já dissemos, o modelo de Bohm seduz tantos adeptos. Mas o que acontece quando aplicamos tal modelo ao experimento das duas fendas?
Temos que em um instante t0, o elétron é disparado. Lembremos que neste modelo, por hipótese, o elétron é um objeto REAL, bem como a sua Onda Associada, que o dirige. Também, temos por hipótese que a trajetória do elétron é REAL e a fenda através da qual ele irá passar JÁ ESTÁ DEFINIDA pelas VO, ou seja, este modelo é DETERMINISTA.
Pois bem, o elétron e sua Onda Guia ou Onda Piloto seguem até atingir o anteparo no instante t1, onde a onda, similar à ondas em uma superfície de água, se divide, com uma parte carregando o elétron passando por uma das fendas e outra parte passando pela outra. Ao sair do outro lado, as duas partes da onda se chocam, causando interferência e obtendo a distribuição de detecções em faixas, exatamente como acontece.
Da mesma maneira que anteriormente, vamos colocar detectores nas fendas para ver o que acontece. Tudo se passa da mesma maneira até t1. Neste ponto, a onda se divide, com uma parte carregando o elétron passa, por exemplo, pela fenda F2, que é acusado pelo detector. O que acontece aqui? Perceba que, OBRIGATORIAMENTE, a onda que passa pela fenda F1, tem “energia zero”, ou seja, é uma onda vazia, seja lá o que isso for do ponto de vista de um “objeto real”!
Em termos de interpretação de um objeto real, pode-se levantar a questão de que aqui, a onda tem “energia zero” até o limite de nossa detecção, sendo que na realidade, ela possui um valor que, embora baixo, é diferente de zero. Isto pode parecer até uma ótima saída, mas se enquadra perfeitamente naquilo que falei no início da postagem. No fundo, nada mais é que uma “resposta para sair do problema”, sem, contudo, analisar em que implica esta proposta. Dizer que, em realidade, a onda tem alguma energia equivale a... dividir o quantum!!!!! Obviamente, dividir o quantum para “resolver” (??) o problema da onda vazia implica em se assumir TODOS os problemas que existiam no final do século XIX e que levaram Planck a formular tal hipótese, inclusive com o cálculo de seu valor exato!! E como veremos adiante, mesmo que tal “hipótese absurda” fosse válida, não resolverá a questão que apresentarei.
Pois bem, analisando-se os dois resultados, e tendo-se em mente, como venho realçando, que se trata de um modelo REALISTA e DETERMINISTA, nota-se uma questão muito grave. Mas vamos tornar o experimento um pouco mais complexo, para ficar claro o que quero expor. Vamos tornar esta experiência um Experimento de Escolha Retardada, ou seja, vamos montá-lo de uma tal maneira que após a partida do elétron, mas antes de sua detecção, posso mudar minhas opções. Tal experimento é totalmente consistente com a interpretação de Copenhague. Será que é com o modelo de Bohm?
Iniciamos o experimento exatamente do mesmo modo como fizemos no último exemplo, com os detectores em cada fenda ligados. Dispararmos um único elétron, com sua onda piloto associada, no instante t0 que, pela hipótese do modelo, já tem determinado por qual fenda o elétrons irá passar, assim como a onda irá se dividir (afinal, pela hipótese, o modelo é DETERMINISTA).
Pois bem. Sabemos que a onda com o elétron irá atingir o anteparo com as fendas em t1, e que o resultado, tanto pelos cálculos de Bohm, como pelo resultado do experimento anterior, será que a onda irá se dividir, os detectores determinarão exatamente por qual fenda passa a partícula e, conseqüentemente, a onda vazia passará pela outra.
Só que, desta feita, no instante t1/2 > t0, desligamos os detectores. O que acontece neste caso? Bem, nesse caso, após passarem pelas fendas, deverá, OBRIGATORIAMENTE, haver interferência!
Mas espere um instante. Como pode haver interferência se a energia da onda já estava previamente determinada como zero pelas variáveis ocultas, como afirma a hipótese do modelo? Se este modelo se diz REALISTA e DETERMINISTA por definição, como a escolha do observador pode influenciar em características pré-determinadas, por propriedades físicas reais, ainda por cima no... passado?
O que temos aqui é muito claro. O modelo com suas “criaturas absurdas”, tais como o Potencial Quântico, bem como “ondas vazias” que são REAIS, mas QUE não interagem, não só violam suas próprias “conjecturas filosóficas”, como mostrado com a violação do Princípio Eleático, bem como, fisicamente, temos a interferência do observador em “propriedades reais”, exatamente algo que o modelo diz, taxativamente, não existir!
Curiosamente, assim como acontece com as questões técnicas expostas, nenhum defensor das VO explica este... FATO