Se tudo tem que vir de algum lugar e ter sido criado, então o seu deus também entra na sua lógica.
O gesto criador é inadmissível
Que se entende por criar?
É tomar materiais diferentes, separados, mas que existem, e, valendo-se de princípios experimentados e aplicando-lhes certas regras conhecidas, aproximá-los, agrupá-los, associá-los, ajustá-los, para fazer qualquer coisa deles?
Não! Isso não é criar. Exemplos: podemos dizer que uma casa foi criada? Não, foi construída; podemos dizer que um móvel foi criado? Não, foi fabricado; podemos dizer que um livro foi criado? Não, foi composto e depois impresso.
Assim, pegar materiais que já existem e fazer qualquer coisa com eles não é criar.
Que é, pois, criar?
Criar... com franqueza, encontro-me indeciso para poder explicar o inexplicável, definir o indefinível. Procurei, contudo, fazer-me compreender.
Criar é tirar qualquer coisa do nada; é, com nada, fazer qualquer coisa do todo; é formar o existente do não-existente.
Ora, eu imagino que é impossível encontrar-se uma única pessoa dotada de razão que conceba e admita que do nada se possa tirar e fazer qualquer coisa. Suponhamos um matemático. Procurai o calculador mais autorizado; colocai-o diante de uma lousa e pedi-lhe que escreva zero sobre zeros. Terminada a operação, solicitai-lhe que os multiplique da forma que entender, que os divida até se cansar, que faça enfim toda a sorte de operações matemáticas, e haveis de ver como ele não extrairá, desta acumulação de zeros, uma única unidade.
Com nada, nada se pode fazer; de nada, nada se obtém. É por isso que o famoso aforismo de Lucrécio ex nihilo nihil é de uma certeza e de uma evidência manifesta. O gesto criador é um gesto impossível de admitir, é um absurdo.
Criar é, pois, uma expressão místico-religiosa, que pode ter algum valor aos olhos das pessoas a que agrada crer naquilo que não compreendem e a quem a fé que se impõe tanto mais quanto menos o percebem. Mas devemos convir que a palavra criar é uma expressão vazia de sentido para todos os homens cultos e sensatos, para quem uma palavra só tem valor quando representa uma realidade ou uma possibilidade.
Conseqüentemente, a hipótese de um ser verdadeiramente criador é uma hipótese que a razão repudia.
O ser criador não existe, não pode existir.
Leia o texto que eu passei...