Estes textos são do projeto evoluindo do biociência, do qual faço parte. Acho interessante divulgar. Muitos argumentos debatidos nesses textos são usados errôneamente por criacionistas tentando provar que evolução não é ciência.
Evolução e Filosofia - uma introdução
Por John S. Wilkins, 1997
Evolução e filosofia possuem um relacionamento muito antigo, existindo antes mesmo do que a própria idéia de evolução. Isto se deve particularmente ao fato de que ciência e filosofia se separaram apenas no momento em que as teorias evolucionárias foram propostas pela primeira vez, mas também porque – especialmente no contexto darwiniano – a evolução era oposta a muitas das doutrinas filosóficas vigentes.
As primeiras das principais críticas da evolução se situam na idéia de que as espécies são seres imutáveis e então, por definição, as espécies não poderiam mudar. Mais recentemente, críticas se apoiavam na noção da própria ciência, de que evolução falha em encontrar os padrões da verdadeira ciência. Idéias que também foram expressas no tempo de Darwin e anteriormente. Se nós temos de entender estas críticas, devemos entender a filosofia da ciência em detalhes.
Muitos outros tópicos de discussão filosófica foram levantados, e eles estão sumariamente revisados: reducionismo, progresso e direcionalismo, teleologia, naturalismo e ética evolucionária. Nem todos eles estão relacionados ao criacionismo, mas todos se aplicam aos argumentos anti-evolutivos por aqueles que trabalham vindos de uma inclinação humanista. Finalmente, a idéia foi posta, até mesmo por filósofos como Popper, que admira e aceita a teoria evolutiva, que ela está mais para uma tautologia e metafísica que ciência.
Minha conclusão é que evolução, especialmente as teorias modernas, é ciência ao seu mais alto grau, e quando ela e a natureza da ciência são consideradas realisticamente, evolução não está desprovida de uma perspectiva filosófica. Este ensaio (e categoria), lidará com estas questões filosóficas e enganos sobre a Evolução.
Tradução da área: Fernando Lorenzon
http://www.biociencia.org/content/category/8/95/225/
Uma boa Tautologia é difícil de encontrar
Por John Wilkens, 1997
Sumário: A afirmação de que a teoria evolutiva é uma tautologia se apóia em um engano da teoria. Adaptação é mais do que apenas sobrevivência.
A versão simplificada do tão chamado “argumento tautológico” é esta:
Seleção natural é a sobrevivência dos mais adaptados. Os mais adaptados são aqueles que sobrevivem. Portanto, evolução por seleção natural é uma tautologia (uma lógica circular).
O verdadeiro significado deste argumento não é o próprio argumento, mas que ele foi tomado seriamente por quaisquer filósofos profissionais de maneira geral. A “adaptação” para Darwin não significava aqueles que sobrevivem, mas aqueles que se poderiam esperar sobreviver devido às suas adaptações e eficiências funcionais, quando comparado a outros na população. Isto não é tautologia, ou se é, então se pode dizer o mesmo sobre a equação newtoniana F=ma, que é a base para muitas das explicações físicas habituais.
A frase ‘sobrevivência dos mais adaptados’ não é nem de autoria de Darwin. Ela foi impelida a ele por Wallace, o co-descobridor da seleção natural, que odiava ‘seleção natural’ porque ele imaginava que a frase lembrava que algo estava realizando a seleção. Darwin cunhou o termo ‘seleção natural’ porque ele fez uma analogia com ‘seleção artificial’ como as realizadas por criadores de animais, uma analogia que Wallace não tinha feito quando ele desenvolveu sua versão da teoria. A frase ‘sobrevivência dos mais adaptados’ foi originalmente imposta por Herbert Spencer alguns anos antes da publicação de “Origem das Espécies”.
Todavia, há outra versão, mais sofisticada, pertencente principalmente a Karl Popper. De acordo com Popper, qualquer situação onde espécies existem é compatível com as explicações darwinianas, porque se essas espécies não forem adaptadas, elas não existiriam. Quer dizer, diz Popper, que definimos adaptação como aquilo que é suficiente para a existência em um ambiente dado. Entretanto, visto que nada é rejeitado, a teoria não possui poder explanatório, pois tudo é considerado.
Isso não é verdade, críticos de Popper observaram. A teoria darwiniana rejeita muita coisa. Ela rejeita a existência de organismos ineficientes quando organismos mais eficientes estão ao redor. Ela rejeita mudanças que são teoricamente impossíveis (de acordo com as leis da genética, ontogenia, e Biologia molecular) para alcançar passos graduais e adaptativos. Ela rejeita novas espécies sendo estabelecidas sem espécies ancestrais.
Todas estas hipóteses são mais ou menos testáveis, e em conformidade com os padrões da ciência. A resposta a esta versão do argumento é a mesma, assim como para a versão simplista – adaptação não é apenas definida de acordo com o que sobrevive. Necessitaria haver uma história causal disponível para fazer sentido de adaptação (que é a razão da imitação em borboletas ter sido uma discussão focal na adolescência e aos vinte anos). Adaptação é um conceito funcional, não uma definição a priori lógica ou semântica, a despeito do que Popper imaginou.
O entendimento atual de adaptação é disposicional. Ou seja, adaptação é uma disposição de um traço a reproduzir-se melhor que os competidores. Não é determinístico. Se dois gêmeos são idênticos geneticamente, e, portanto, são igualmente adaptados, não há garantia que ambos sobreviverão para ter número igual de prole. Adaptação é uma propriedade estatística. O que ‘possui’ a adaptação não é o organismo, mas os genes. Eles tenderão a ser mais freqüentemente transmitidos, enquanto o que eles entregam é melhor ‘projetado’ para as necessidades dos organismos no ambiente em que vivem. E você pode determinar isso, dentro dos limites, por realizar ‘engenharia reversa’ nos traços para entender como eles funcionam.
Além disso, adaptação existe acima das propriedades dos próprios organismos individuais. Há três maneiras discutidas para interpretar isto. Adaptação pode ser uma relação de genes a outros genes. Adaptação pode ser uma propriedade superveniente – isto é, pode ser uma propriedade de estruturas físicas muito diferentes (de formigas, porcos-da-terra e alcachofras). Ou adaptação pode ser vista como uma propriedade emergente, uma propriedade de sistemas de uma determinada complexidade e dinâmica. Se adaptação é uma propriedade genética, organísmica ou sistêmica é um assunto na filosofia moderna da Biologia. Eu acho que a interpretação sistêmica é a maneira ideal de abordá-la.
Recentemente, houve ataques no verdadeiro conceito da explicação adaptativa por alguns dos próprios biólogos evolutivos (por exemplo, Gould e Lewontin). Estes caem em dois campos – aqueles que pensam que adaptação não é suficiente para explicar a diversidade da forma, e aqueles que acham que explicações adaptativas exigem mais informação que alguém pode obter tanto da engenharia reversa ou da habilidade de gerar cenários plausíveis. A razão dada pelo precedente é um tipo de argumento vindo de incredulidade – seleção natural não é imaginada como uma causa suficiente, e que a macroevolução (evolução no nível de espécies ou acima) é um processo de um tipo diferente da seleção dentro de espécies. Argumentos sobre parcimônia (Navalha de Ockham) abundam.
Argumentos para a segunda opinião – que explicações seletivas necessitam complementar – se apóiam não a uma eficácia causal de seleção (que não é negada), mas nos problemas de explicação histórica. A fim de explicar por quê uma espécie exibe este traço preferivelmente àquele traço, você precisa saber o que é a hipótese nula (do contrário, você pode fazer uma explicação seletiva para ambos, um caso e seu oposto, igualmente bem).
Talvez tenha este traço porque seus ancestrais o tinham, e este traço foi mantido por seleção. Talvez o tenha porque poderia ser muito disruptivo para o genoma inteiro e o mecanismo desenvolvido para removê-lo. Talvez o tenha por razões que tem a ver com derivação genética, acidente simples, ou qualquer coisa. A fim de fazer uma boa explicação científica, diz Griffiths, você deve saber um pouco sobre a filogenia das espécies, sua distribuição ambiental, e como o processo que cria o traço trabalha ao nível dos genes, células e zigotos.
Isto nos leva à questão sobre o que uma explicação científica realmente é; de fato, ela abre a questão sobre o que é ciência, que é tão diferente de outras perseguições intelectuais como gamão, teologia e crítica literária.
http://www.biociencia.org/content/view/206/225/
Evolução e Filosofia - uma introdução
Evolução e Filosofia - uma introdução
Cérebro é uma coisa maravilhosa. Todos deveriam ter um.
Re.: Evolução e Filosofia - uma introdução
A Evolução é Ciência, e o que ‘Ciência’ significa?
Por John Wilkens, 1997
Sumário: Ciência não é um processo simples de falsificação de hipóteses. A filosofia da ciência não são apenas as idéias de Popper, que possuem alguns problemas reais. Evolução pode ser falseada no significado usual na prática científica.
É freqüentemente discutido, igualmente por filósofos e criacionistas, que o darwinismo não é falseável, e, portanto, não é ciência. Isto se apóia na opinião de que alguma coisa é apenas ciência se puder ser falseada, quer dizer, provada falsa, pelo menos em princípio. Esta idéia, pertencente a Popper, não é de maneira nenhuma aceita universalmente, e a história da filosofia está a fim de dar sentido a isso e às críticas que fizeram a ele.
No tempo em que Darwin estava formulando sua concepção da evolução, o exemplo prevalente da ciência era o sistema newtoniano. Leis eram supremas, e elas determinavam o resultado. A ciência procurava generalizações. Darwin tentou fazer uma ciência newtoniana, e foi ferido quando os expoentes da área como Whewell e Herschel, dois de seus conhecidos e mentores, destituíram sua teoria por ser insuficientemente parecida com o modelo de ciência deles.
William Whewell foi o primeiro verdadeiro filósofo da ciência. Ele era sucessor das escolas inglesas e escocesas de bom senso empíricas. Ele rejeitou a concepção de Hume, de que indução (provar uma regra ou lei por referência a exemplos singulares de dados e observações) não estava correta, mesmo não negando a força lógica do argumento. Não se pode provar uma universalização, não importando quantos pedaços de evidência você tem de manipular. Whewell propôs o que ele chamou de ‘consiliência de induções’ – quanto mais casos indutivos você possuir baseados em dados, mais confiável a generalização. É isto que Darwin tentou alcançar, e particularmente explica porque ele gastou tantos anos coletando caso após caso para sustentar sua teoria. Ele achava que estava percorrendo o Caminho Correto.
Uma outra escola de pensamento era o Positivismo. Estas idéias afirmavam que apenas o verdadeiro conhecimento era conhecimento científico. Isto significava que os positivistas teriam de ser capazes de distinguir entre a verdadeira ciência e as pseudociências, como frenologia, espiritualismo, e outras teorias excêntricas vindas para a cena durante o século XIX. Um positivista influente foi o físico Ernst Mach, da celebrada velocidade Mach, e dele desenvolveu-se uma escola de pensamento nos países de idioma alemão da Europa conhecido como Positivismo Lógico, sediado em Viena.
Os Positivistas Lógicos sustentavam que algo é ciência quando puder ser verificado, e eles tinham todos os tipos de regras para isso, baseadas no atestado de Hume de que qualquer coisa que não resulta logicamente de coisas práticas ou números era metafísica. Isto era equivalente a dizer que era literalmente uma tolice para os positivistas. Quando foi observado que o Princípio de Verificação era inverificável, e, portanto, uma tolice, a escola ruiu.
No entanto, ela estimulou o jovem Karl Popper a colocar à frente seu próprio modo de diferenciar notavelmente ciência (cujo exemplo foi a nova física) de pseudociência (cujos exemplos foram Marxismo e Freudianismo). Popper também aceitou a legitimidade dos enunciados metafísicos, mas negou que eles eram quaisquer divisões da ciência. A idéia de Popper (uma variedade de empirismo lógico) foi chamada de ‘falseacionismo’, e em suas versões amadurecidas acreditavam que algo é científico até onde:
I. é suscetível a ser falseado por dados,
II. é testado por observações e experimentos, e
III. faz predições.
Verdadeiros Cientistas Fazem Predições. Este era o Verdadeiro Método Científico. Uma menor preocupação com ninharia poderia ser lidada – Popper sabia que o Princípio de Falseamento não poderia ser falseado. Era abertamente metafísico. Neste contexto, faz sentido o porquê de um pró-evolucionista como Popper chamar o Darwinismo de um programa de pesquisa metafísica. Ele não era mais falseável (pensou ele) que a idéia de que matemática descreve o mundo, e era da mesma forma básica para a Biologia moderna.
O medidor nos trabalhos foi jogado primeiro por sociólogos e historiadores da ciência, incluindo Robert Merton, e posteriormente Thomas Kuhn. O livro de Kuhn em particular misturou diferentes genéticas que se adaptaram. Se Popper pensou que o que ele estava fazendo era destilar a essência da ciência em um conjunto de proscrições, Kuhn e outros observaram que nenhuma ciência na realidade se parece como este modelo.
De acordo com Kuhn, você não pode nem comparar quando uma teoria é melhor que outra cientificamente, devido a cada teoria global carregar seus próprios métodos de avaliação. Mudar de uma teoria global para outra está mais ligado a uma conversão religiosa que uma decisão racional. Ciência apenas muda quando a teoria mais velha não pode lidar com um número arbitrário de anomalias, e está em ‘crise’. Quando isto ocorre, a comunidade científica age como alguém olhando para aqueles quadros de duplo aspecto, como o famoso quadro da mulher idosa/jovem. Eles ‘alternam’ de uma visão para outra, que Kuhn chamou de ‘troca de paradigma’. Ciência resiste a revoluções, e o único caminho para determinar se algo é científico é vendo o que os cientistas fazem (há uma circulariedade óbvia aqui).
Isto foi muito popular no relativístico fim da década de 1960, mas causou o aumento de alguns problemas sérios. Para começar, ninguém podia encontrar revoluções radicais nos registros históricos. Até Galileu e Newton se mostraram mais revisionistas que revolucionários. Então, o ‘paradigma’ começou a ser usado para cada nova teoria com impacto em uma disciplina (que são tudo teorias, no final das contas). Eventualmente, se torna óbvio que enquanto Kuhn fez muitas observações interessantes, não houve tal ciclo universal como ele tinha proposto na ‘vida’ de uma teoria científica. O próprio termo ‘paradigma’ foi atacado como sendo muito vago, e Kuhn eventualmente o largou em favor de outros termos mais restritos, como ‘matriz disciplinária’ e ‘exemplo’.
O amigo de Kuhn, Paul Feyerabend, agitou ainda mais as coisas por afirmar que não houve até então algo como o Método Científico. Tampouco Kuhn acreditou existir algo em um sentido mais filosófico. Feyerabend argumentou que o método era restrito a pequenas subdisciplinas, e que a qualquer circunstância quaisquer cientistas poderiam trazer para dentro qualquer coisa da astrologia a numerologia se isso ajudasse. Ele até encorajou o criacionismo inicialmente recente. Isto foi o fim extremo da abordagem “ciência é o que cientistas fazem”. Feyerabend queria que cientistas fizessem qualquer coisa que quisessem, e chamar isso de ciência.
Isso foi contrariado por Imre Lakatos, que afirmou que ciência era uma série histórica de programas de pesquisa. Enquanto eles estavam obtendo resultados, progredindo de um problema a outro, estavam ‘gerando’, ao contrário, os outros estavam ‘degenerando’. De acordo com Lakatos, um programa de pesquisa é um núcleo de teorias altamente protegido que são relativamente imunes à revisão, enquanto teorias subsidiárias são freqüentemente revisadas ou abandonadas.
Uma coisa estes três filósofos pensavam em oposição a Popper – não havia circunstância que poderia ser rejeitada como linha divisória entre ciência ‘racional’ e não-ciência ’não-racional’. Lakatos identificou o que ele chamou de Tese de Duhen-Quine – nada pode ser falseado se você quiser fazer ajustes adequados em outro lugar em seus comprometimentos teóricos. Obteve um resultado que arruína sua teoria da gravitação favorita? Então os instrumentos estão errados, ou algo está interferindo com as observações, ou há outro processo que você não conhecia, ou alguma outra teoria de fundo está errada. E o motivo disso é que todos estes movimentos são na verdade usados – eles são racionais no sentido da boa prática científica. Positivismo está irresgatavelmente morto neste estágio.
Então, qual é a diferença entre ciência e não-ciência? Há várias alternativas mutualmente compatíveis. Pragmatismo, a única filosofia originada na América do Norte, acredita que a verdade ou o valor de um relato como a teoria ou hipótese está situada em seu resultado prático. Pragmatistas dizem que ser científico é um rótulo retroativo dado a quem sobrevive testando e fazendo uma verdadeira diferença prática, como a teoria sobre um câncer afetando como aquele câncer é tratado, de forma mais bem sucedida. Progresso na ciência é o acúmulo de teorias que dão certo.
Realistas continuam a dizer que o que faz algo científico é sua modelação de realidade de forma bem sucedida, e isto fez surgir o que é conhecido como a Concepção Semântica de Teorias. Nesta descrição, o que ciência faz é criar modelos efetivos, e se um modelo encontra o critério de Lakatos para gerar um programa de pesquisa, esses modelos são assumidos como adequados e verdadeiros. E há uma pressão sociológica. Isto é divergente, mas é também totalmente relativístico (ciência é somente algo que cientistas constroem para algumas razões sociais particulares próprias), ou mais pragmatista e realístico, e compartilha um forte comprometimento para a importância e exclusividade da ciência.
De volta à evolução. Torna-se claro o motivo das repetições simplórias, até por cientistas, de que “se ela não pode ser falsificada não é ciência”, não é suficiente para rejeitar uma teoria. O que ciência é realmente é um assunto para demasiada discussão. A redescoberta pós-Merton da natureza social da ciência lançou os eternos Métodos Científicos pela janela, mas isso não significa que ciência não é mais distinguível de não-ciência.
Simplesmente não é mais fácil como alguém gostaria em um mundo ideal. Pelo que vi, não era um mundo ideal, de qualquer jeito.
Entretanto, no entendimento ordinário de falseamento, a evolução darwiniana pode ser falseada. Também, ela pode ser verificada de uma maneira não-dedutiva. Whewell estava certo no sentido de que você pode mostrar a validade relativa de uma teoria se for criticada o suficiente, e Popper tinha uma noção similar, chamada ‘verossimilhança’. O que cientistas fazem, ou ainda o que eles dizem fazer, é no fim muito pouco afetado por prescrições filosóficas a priori. Darwin estava certo em tomar a abordagem que ele fez.
É significativo que, embora freqüentemente afirmado que o Darwinismo é não-falseável, muitas das coisas que Darwin disse foram, na realidade, falseadas. Muitas de suas declarações foram de fato revisadas ou negadas; muitos de seus mecanismos rejeitados ou modificados até por quem o apoiou mais fortemente (ex., por Mayr, Gould, Lewontin, e Dawkins), e ele consideraria difícil reconhecer algumas versões da teoria moderna da seleção como sua teoria da seleção natural. Isto é exatamente o que um estudante da história da ciência poderia esperar. Ciência progride, e se uma teoria não, isso é uma forte evidência prima facie que isto na verdade é uma crença metafísica.
Uma citação final sobre Hull é instrutiva:
Outra ambigüidade ainda surge constantemente em nossas discussões sobre teorias científicas. Elas são hipóteses ou fatos? Elas podem ser “provadas”? Os cientistas têm o direito de dizer que “sabem” de tudo? Enquanto eu entrevistava os cientistas, engajado nas controvérsias sob investigação, eu perguntei, “Você acha que a ciência é provisional, que cientistas devem estar dispostos para reexaminar qualquer idéia que eles sustentam, se necessário?” Todos os cientistas que eu entrevistei responderam afirmativamente. Posteriormente, eu perguntei, “A teoria evolucionária poderia ser falsa?” A esta questão eu recebi três diferentes respostas. A maioria respondeu de imediato que não, ela não pode ser falsa. Vários oponentes do consenso então atualmente responderam que não apenas poderia ser falsa, mas que também ela era falsa. Uns poucos sorriram e me pediram para esclarecer minha questão. “Sim, qualquer teoria científica poderia ser falsa sumariamente, mas dado o atual estado de conhecimento, os axiomas básicos da teoria evolucionária são apropriadas para continuar a se levar investigações.”
Filósofos visam objetivar uma maleabilidade conceitual. Cientistas fazem isso também – quando esta maleabilidade funciona contra eles. Caso contrário, eles não se importam muito. Na realidade, eles se irritam quando algum pedante aponta isso.
A maioria dos cientistas não é inclinada filosoficamente e eles farão uso de qualquer coisa que ajude em seus trabalhos, mas não da forma como Feyerabend pensava. Cientistas reflexivos sabem que o que conta é como você questiona a questão. A maioria dos físicos não irá imediatamente pensar que a teoria atômica poderia ser falsa, também. Eles estão respondendo à questão “É mais apropriado suspendê-la mais tarde?”, não ao filosófico “poderia teoricamente ser suspensa?”, o que é um problema diferente. Filósofos fazem uma arrumação conceitual, entre outras coisas, mas cientistas são os que fazem toda a serragem na oficina, e eles precisam não ser tão arrumados. E nenhum faxineiro deve dizer a qualquer profissional (outro que não faxineiros) como deve ser feito. Criacionistas que dizem “se a evolução não é como Popper disse que ciência deveria ser, então não é ciência” são como porteiros que dizem que professores não deixam suas salas-de-aula limpas o suficiente, então não são professores.
http://www.biociencia.org/content/view/207/225/
Por John Wilkens, 1997
Sumário: Ciência não é um processo simples de falsificação de hipóteses. A filosofia da ciência não são apenas as idéias de Popper, que possuem alguns problemas reais. Evolução pode ser falseada no significado usual na prática científica.
É freqüentemente discutido, igualmente por filósofos e criacionistas, que o darwinismo não é falseável, e, portanto, não é ciência. Isto se apóia na opinião de que alguma coisa é apenas ciência se puder ser falseada, quer dizer, provada falsa, pelo menos em princípio. Esta idéia, pertencente a Popper, não é de maneira nenhuma aceita universalmente, e a história da filosofia está a fim de dar sentido a isso e às críticas que fizeram a ele.
No tempo em que Darwin estava formulando sua concepção da evolução, o exemplo prevalente da ciência era o sistema newtoniano. Leis eram supremas, e elas determinavam o resultado. A ciência procurava generalizações. Darwin tentou fazer uma ciência newtoniana, e foi ferido quando os expoentes da área como Whewell e Herschel, dois de seus conhecidos e mentores, destituíram sua teoria por ser insuficientemente parecida com o modelo de ciência deles.
William Whewell foi o primeiro verdadeiro filósofo da ciência. Ele era sucessor das escolas inglesas e escocesas de bom senso empíricas. Ele rejeitou a concepção de Hume, de que indução (provar uma regra ou lei por referência a exemplos singulares de dados e observações) não estava correta, mesmo não negando a força lógica do argumento. Não se pode provar uma universalização, não importando quantos pedaços de evidência você tem de manipular. Whewell propôs o que ele chamou de ‘consiliência de induções’ – quanto mais casos indutivos você possuir baseados em dados, mais confiável a generalização. É isto que Darwin tentou alcançar, e particularmente explica porque ele gastou tantos anos coletando caso após caso para sustentar sua teoria. Ele achava que estava percorrendo o Caminho Correto.
Uma outra escola de pensamento era o Positivismo. Estas idéias afirmavam que apenas o verdadeiro conhecimento era conhecimento científico. Isto significava que os positivistas teriam de ser capazes de distinguir entre a verdadeira ciência e as pseudociências, como frenologia, espiritualismo, e outras teorias excêntricas vindas para a cena durante o século XIX. Um positivista influente foi o físico Ernst Mach, da celebrada velocidade Mach, e dele desenvolveu-se uma escola de pensamento nos países de idioma alemão da Europa conhecido como Positivismo Lógico, sediado em Viena.
Os Positivistas Lógicos sustentavam que algo é ciência quando puder ser verificado, e eles tinham todos os tipos de regras para isso, baseadas no atestado de Hume de que qualquer coisa que não resulta logicamente de coisas práticas ou números era metafísica. Isto era equivalente a dizer que era literalmente uma tolice para os positivistas. Quando foi observado que o Princípio de Verificação era inverificável, e, portanto, uma tolice, a escola ruiu.
No entanto, ela estimulou o jovem Karl Popper a colocar à frente seu próprio modo de diferenciar notavelmente ciência (cujo exemplo foi a nova física) de pseudociência (cujos exemplos foram Marxismo e Freudianismo). Popper também aceitou a legitimidade dos enunciados metafísicos, mas negou que eles eram quaisquer divisões da ciência. A idéia de Popper (uma variedade de empirismo lógico) foi chamada de ‘falseacionismo’, e em suas versões amadurecidas acreditavam que algo é científico até onde:
I. é suscetível a ser falseado por dados,
II. é testado por observações e experimentos, e
III. faz predições.
Verdadeiros Cientistas Fazem Predições. Este era o Verdadeiro Método Científico. Uma menor preocupação com ninharia poderia ser lidada – Popper sabia que o Princípio de Falseamento não poderia ser falseado. Era abertamente metafísico. Neste contexto, faz sentido o porquê de um pró-evolucionista como Popper chamar o Darwinismo de um programa de pesquisa metafísica. Ele não era mais falseável (pensou ele) que a idéia de que matemática descreve o mundo, e era da mesma forma básica para a Biologia moderna.
O medidor nos trabalhos foi jogado primeiro por sociólogos e historiadores da ciência, incluindo Robert Merton, e posteriormente Thomas Kuhn. O livro de Kuhn em particular misturou diferentes genéticas que se adaptaram. Se Popper pensou que o que ele estava fazendo era destilar a essência da ciência em um conjunto de proscrições, Kuhn e outros observaram que nenhuma ciência na realidade se parece como este modelo.
De acordo com Kuhn, você não pode nem comparar quando uma teoria é melhor que outra cientificamente, devido a cada teoria global carregar seus próprios métodos de avaliação. Mudar de uma teoria global para outra está mais ligado a uma conversão religiosa que uma decisão racional. Ciência apenas muda quando a teoria mais velha não pode lidar com um número arbitrário de anomalias, e está em ‘crise’. Quando isto ocorre, a comunidade científica age como alguém olhando para aqueles quadros de duplo aspecto, como o famoso quadro da mulher idosa/jovem. Eles ‘alternam’ de uma visão para outra, que Kuhn chamou de ‘troca de paradigma’. Ciência resiste a revoluções, e o único caminho para determinar se algo é científico é vendo o que os cientistas fazem (há uma circulariedade óbvia aqui).
Isto foi muito popular no relativístico fim da década de 1960, mas causou o aumento de alguns problemas sérios. Para começar, ninguém podia encontrar revoluções radicais nos registros históricos. Até Galileu e Newton se mostraram mais revisionistas que revolucionários. Então, o ‘paradigma’ começou a ser usado para cada nova teoria com impacto em uma disciplina (que são tudo teorias, no final das contas). Eventualmente, se torna óbvio que enquanto Kuhn fez muitas observações interessantes, não houve tal ciclo universal como ele tinha proposto na ‘vida’ de uma teoria científica. O próprio termo ‘paradigma’ foi atacado como sendo muito vago, e Kuhn eventualmente o largou em favor de outros termos mais restritos, como ‘matriz disciplinária’ e ‘exemplo’.
O amigo de Kuhn, Paul Feyerabend, agitou ainda mais as coisas por afirmar que não houve até então algo como o Método Científico. Tampouco Kuhn acreditou existir algo em um sentido mais filosófico. Feyerabend argumentou que o método era restrito a pequenas subdisciplinas, e que a qualquer circunstância quaisquer cientistas poderiam trazer para dentro qualquer coisa da astrologia a numerologia se isso ajudasse. Ele até encorajou o criacionismo inicialmente recente. Isto foi o fim extremo da abordagem “ciência é o que cientistas fazem”. Feyerabend queria que cientistas fizessem qualquer coisa que quisessem, e chamar isso de ciência.
Isso foi contrariado por Imre Lakatos, que afirmou que ciência era uma série histórica de programas de pesquisa. Enquanto eles estavam obtendo resultados, progredindo de um problema a outro, estavam ‘gerando’, ao contrário, os outros estavam ‘degenerando’. De acordo com Lakatos, um programa de pesquisa é um núcleo de teorias altamente protegido que são relativamente imunes à revisão, enquanto teorias subsidiárias são freqüentemente revisadas ou abandonadas.
Uma coisa estes três filósofos pensavam em oposição a Popper – não havia circunstância que poderia ser rejeitada como linha divisória entre ciência ‘racional’ e não-ciência ’não-racional’. Lakatos identificou o que ele chamou de Tese de Duhen-Quine – nada pode ser falseado se você quiser fazer ajustes adequados em outro lugar em seus comprometimentos teóricos. Obteve um resultado que arruína sua teoria da gravitação favorita? Então os instrumentos estão errados, ou algo está interferindo com as observações, ou há outro processo que você não conhecia, ou alguma outra teoria de fundo está errada. E o motivo disso é que todos estes movimentos são na verdade usados – eles são racionais no sentido da boa prática científica. Positivismo está irresgatavelmente morto neste estágio.
Então, qual é a diferença entre ciência e não-ciência? Há várias alternativas mutualmente compatíveis. Pragmatismo, a única filosofia originada na América do Norte, acredita que a verdade ou o valor de um relato como a teoria ou hipótese está situada em seu resultado prático. Pragmatistas dizem que ser científico é um rótulo retroativo dado a quem sobrevive testando e fazendo uma verdadeira diferença prática, como a teoria sobre um câncer afetando como aquele câncer é tratado, de forma mais bem sucedida. Progresso na ciência é o acúmulo de teorias que dão certo.
Realistas continuam a dizer que o que faz algo científico é sua modelação de realidade de forma bem sucedida, e isto fez surgir o que é conhecido como a Concepção Semântica de Teorias. Nesta descrição, o que ciência faz é criar modelos efetivos, e se um modelo encontra o critério de Lakatos para gerar um programa de pesquisa, esses modelos são assumidos como adequados e verdadeiros. E há uma pressão sociológica. Isto é divergente, mas é também totalmente relativístico (ciência é somente algo que cientistas constroem para algumas razões sociais particulares próprias), ou mais pragmatista e realístico, e compartilha um forte comprometimento para a importância e exclusividade da ciência.
De volta à evolução. Torna-se claro o motivo das repetições simplórias, até por cientistas, de que “se ela não pode ser falsificada não é ciência”, não é suficiente para rejeitar uma teoria. O que ciência é realmente é um assunto para demasiada discussão. A redescoberta pós-Merton da natureza social da ciência lançou os eternos Métodos Científicos pela janela, mas isso não significa que ciência não é mais distinguível de não-ciência.
Simplesmente não é mais fácil como alguém gostaria em um mundo ideal. Pelo que vi, não era um mundo ideal, de qualquer jeito.
Entretanto, no entendimento ordinário de falseamento, a evolução darwiniana pode ser falseada. Também, ela pode ser verificada de uma maneira não-dedutiva. Whewell estava certo no sentido de que você pode mostrar a validade relativa de uma teoria se for criticada o suficiente, e Popper tinha uma noção similar, chamada ‘verossimilhança’. O que cientistas fazem, ou ainda o que eles dizem fazer, é no fim muito pouco afetado por prescrições filosóficas a priori. Darwin estava certo em tomar a abordagem que ele fez.
É significativo que, embora freqüentemente afirmado que o Darwinismo é não-falseável, muitas das coisas que Darwin disse foram, na realidade, falseadas. Muitas de suas declarações foram de fato revisadas ou negadas; muitos de seus mecanismos rejeitados ou modificados até por quem o apoiou mais fortemente (ex., por Mayr, Gould, Lewontin, e Dawkins), e ele consideraria difícil reconhecer algumas versões da teoria moderna da seleção como sua teoria da seleção natural. Isto é exatamente o que um estudante da história da ciência poderia esperar. Ciência progride, e se uma teoria não, isso é uma forte evidência prima facie que isto na verdade é uma crença metafísica.
Uma citação final sobre Hull é instrutiva:
Outra ambigüidade ainda surge constantemente em nossas discussões sobre teorias científicas. Elas são hipóteses ou fatos? Elas podem ser “provadas”? Os cientistas têm o direito de dizer que “sabem” de tudo? Enquanto eu entrevistava os cientistas, engajado nas controvérsias sob investigação, eu perguntei, “Você acha que a ciência é provisional, que cientistas devem estar dispostos para reexaminar qualquer idéia que eles sustentam, se necessário?” Todos os cientistas que eu entrevistei responderam afirmativamente. Posteriormente, eu perguntei, “A teoria evolucionária poderia ser falsa?” A esta questão eu recebi três diferentes respostas. A maioria respondeu de imediato que não, ela não pode ser falsa. Vários oponentes do consenso então atualmente responderam que não apenas poderia ser falsa, mas que também ela era falsa. Uns poucos sorriram e me pediram para esclarecer minha questão. “Sim, qualquer teoria científica poderia ser falsa sumariamente, mas dado o atual estado de conhecimento, os axiomas básicos da teoria evolucionária são apropriadas para continuar a se levar investigações.”
Filósofos visam objetivar uma maleabilidade conceitual. Cientistas fazem isso também – quando esta maleabilidade funciona contra eles. Caso contrário, eles não se importam muito. Na realidade, eles se irritam quando algum pedante aponta isso.
A maioria dos cientistas não é inclinada filosoficamente e eles farão uso de qualquer coisa que ajude em seus trabalhos, mas não da forma como Feyerabend pensava. Cientistas reflexivos sabem que o que conta é como você questiona a questão. A maioria dos físicos não irá imediatamente pensar que a teoria atômica poderia ser falsa, também. Eles estão respondendo à questão “É mais apropriado suspendê-la mais tarde?”, não ao filosófico “poderia teoricamente ser suspensa?”, o que é um problema diferente. Filósofos fazem uma arrumação conceitual, entre outras coisas, mas cientistas são os que fazem toda a serragem na oficina, e eles precisam não ser tão arrumados. E nenhum faxineiro deve dizer a qualquer profissional (outro que não faxineiros) como deve ser feito. Criacionistas que dizem “se a evolução não é como Popper disse que ciência deveria ser, então não é ciência” são como porteiros que dizem que professores não deixam suas salas-de-aula limpas o suficiente, então não são professores.
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Cérebro é uma coisa maravilhosa. Todos deveriam ter um.
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Re.: Evolução e Filosofia - uma introdução
Excelente!