Acauan escreveu:Botanico escreveu:Bem, Acauan, quando Kardec codificou o Espiritismo, ele plotou a superioridade dos espíritos como encarnando predominantemente nos caucasóides, e o inverso para os negróides e mongolóides, pois a REALIDADE de sua época e a conceituação científica sobre raças permitiam essa interpretação.Acauan escreveu:Em nada a realidade da época permitia esta interpretação, porque os europeus brancos do século XIX haviam conquistado hegemonia material sobre o mundo e não hegemonia espiritual. O fato de a Europa haver se industrializado primeiro que outras regiões e por conta disto ter imposto sua supremacia econômica, tecnológica e militar ao restante do mundo não são indicativos de superioridade moral.
Desculpe-me Acauan, mas não entendi o que você está querendo dizer com "hegemonia espiritual". Isso povo algum tem. Se está se refererindo a hegemonia moral, cai no mesmo problema. O parâmetro de comparação de superioridade ou inferioridade era alimentado apenas pelo aspecto visível de desenvolvimento tecnológico, científico e militar. Claro que, a reboque, os europeus e estadiunidenses também se achavam superiores moral e espiritualmente falando, tanto que se empenhavam em missões religiosas para converter os povos pagãos inferiores à sua fé cristã. Só que a história dá todas as provas de que os cristãos usavam de moral e a ética de duas caras: uma para eles e outra para consumo público. Tal como o nosso partido mais ético e moral que temos, o PT...Acauan escreveu: Se Kardec era incapaz de distinguir estas diferenças tão óbvias entre valores materiais e espirituais, é de se esperar que a doutrina que criou reflita as incapacidades de seu criador.
Quanto às supostas conceituações européias sobre raças do século XIX, qualquer trabalho da época sobre o tema acumula tantos erros de método, que só a predisposição de fazer vista grossa a eles explica o chama-las científicas.
Sabe, Acauan, há uma diferença enorme entre você ler sobre um assunto e outra em VIVER E VER CARA A CARA ESSE ASSUNTO. Kardec, até onde sei, não saiu da Europa e assim, tudo o que podia saber sobre outros povos era o que os antropólogos de sua época diziam, eivados de racismo ou interpretações distorcidas. Portanto o problema não era ele não saber distinguir, mas sim, de não ter elementos suficientes para formar um visão "correta".
Se os trabalhos a que se refere estão com tantos erros de métodos assim, ISSO NÃO OS INVALIDA CIENTIFICAMENTE PARA O MOMENTO EM QUE FORAM PRODUZIDOS. Acauan, quando lemos sobre coisas referente a uma época, lugar, povo, etc, TEMOS QUE NOS ENCAIXAR NO CONTEXTO DA OCASIÃO, pois não não vamos entender nada do que disseram ou do porque disseram tal e qual coisa. Por mais que os científicos por aqui queiram proclamar isso, o método científico não nasceu pronto e acabado e os métodos individuais de pesquisa também se aperfeiçoaram com o tempo. Portanto, os trabalhos que você diz que hoje nem poderiam ser considerados científicos, EM SUA ÉPOCA, ERAM. E não adianta chiar.Botanico escreveu:Contudo, essa realidade se foi: hoje não se pode mais ligar superioridade ou inferioridade moral e intelectual a raças (que cientificamente nem mais existem) ou povos.Acauan escreveu:Esta suposta realidade nunca existiu e se alguém ligava superioridade moral à raça, ontem ou hoje, o fazia por conta de suas próprias escolhas individuais.
Acauan, a REALIDADE é uma só, mas ela é ABSTRATA, ou seja, o ser humano não tem como apreendê-la no seu sentido integral, na sua essência. A realidade a que me refiro, é aquela que havia no tempo de Kardec: caucasóides formavam sociedades industrializadas, com avanços tecnológicos e científcos ou, senão isso, ao menos eram agricultures. Os negros e índios viviam em choupanas, pouco cultivavam e em geral em povos coletores. Os asiáticos em sua maioria seguiam esse padrão. Chineses e japoneses podiam ser ligeiramente mais cultos, mas já eram superados pela cultura ocidental. Esta era REALIDADE, Acauan, goste ou não. Agora a INTERPRETAÇÃO DOS MOTIVOS DESSA REALIDADE SER ASSIM, aí é outra estória. Os cientistas entendiam ser inferioridade racial, que os caucasóides EVOLUÍRAM numa raça melhor e mais dotada, enquanto as outras raças pouco ou nada evoluíram, continuando num estilo de vida tal como viviam os caucasóides primitivos. E Kardec, com base nesta interpretação errada, achou lógico, se assim fosse, que então nessas raças "inferiores" deveriam encarnar espíritos mais atrasados e nas "superiores" encarnariam espíritos mais "adiantados".
Hoje, tal como você apelou dizendo que os conceitos científicos antigos sobre raças estavam eivados de erros metodológicos, a ponto de anular sua validade científica, nós espíritas também dizemos que a interpretação de Kardec sobre esse assunto baseou-se num equívoco e por isso não é mais válida.
Mas os nossos amigos céticos, por falta de argumento...Botanico escreveu:Que possa haver quem pense assim, não vou negar, mas isto é negado pelo Espiritismo enquanto aspecto geral.Acauan escreveu:Você confunde suas concepções pessoais sobre a doutrina espírita com aspectos gerais da doutrina. As origens históricas do espiritismo, as idéias de seu fundador e suas bases filosóficas sustentam tanto suas concepções pessoais quanto às concepções racistas.
A diferenciação se dá pela escolha da facção espírita em interpretar os textos base de sua doutrina de forma literal e absoluta ou metafórica e relativa.
Numa correlação com ambigüidade similar existente entre os cristãos, pode-se dizer que espíritas fundamentalistas são mais potencialmente racistas que os que não o são.
Mas isto é apenas questão de escolha pessoal. Nada no conteúdo da doutrina garante que a abordagem não racista lhe seja uma interpretação natural.
Bem, então a qual facção espírita está se referindo? Que facção é essa que adota como exatos e infalíveis os textos de Kardec e defende então a aplicação de políticas racistas tendo em vista os textos aqui criticados?
De facções, eu só conheço o rustenguismo e o ramatismo. Quanto ao resto, só sei de diferenças insiguinificantes que não caracterizaria tanto como facção.Botanico escreveu:O exemplo que citei é para mostrar que EM ESPIRITISMO, não há restrições de reencarnação. Qualquer espírito está sujeito a reencarnar em corpos de qualquer raça ou sexo, e em qualquer povo deste planeta (e outros também).
Por que é que o Espiritismo na sua forma não fez sucesso entre os anglo-saxônicos? Exatamente por isso: acha que um lorde inglês, rico e bem nascido poderia aceitar a idéia de estar sujeito a reencarnar com um negro pobre em alguma favela moçambicana?
Ficou até gozado: há o New Spiritualism, que aceita a comunicação espiritual, mas rejeita a reencarnação; há grupos reencarnacionistas anglo-saxônicos, mas que não aceitam que espíritos se comuniquem.Acauan escreveu:O espiritismo não fez sucesso entre povo nenhum, exceto o brasileiro.
Entre os anglo-saxônicos esta aversão era mais esperada, uma que são em sua maioria protestantes, facção cristã que tem como regra a proibição bíblica de comunicação com os mortos.
Um exemplo interessante de como os americanos encaram o espiritismo são os tabuleiros Ouija, que para eles é apenas um brinquedo.
Acho que você está muito mal informado.Botanico escreveu:Os textos de Kardec politicamente incorretos referem-se a uma interpretação que ele fez da realidade de sua época. Então a Ciência dizia que as raças não-caucasóides eram menos dotadas de capacidade intelectual e moral e até mesmo entre os caucasóides haviam raças inferiores, como nós os latino-americanos, os judeus, os eslavos, os ciganos... O que Kardec fez foi juntar a isso uma interpretação moral: se essas raças eram inferiores, então é lógico supor que nelas encarnavam espíritos menos evoluídos intelectualmente. É como numa empresa de computação, que reservará os computadores top de linha, caros e cheios de medalha para os que trabalham com programas pesados e consomem muitos recursos. Já para os filhos de funcionários brincarem na creche, estes podem lidar com computadores fraquinhos e que rodam os joguinhos infantis.
Botanico escreveu:Acauan, como você mesmo cita um trinômio abaixo, é bom entender que não existe essa pureza doutrinária absoluta em campo algum do conhecimento humano. O homem está inserido no seu tempo.
As doutrinas racistas de então podiam ser ideológicas, MAS NÃO ERAM CONTESTADAS PELA CIÊNCIA, ou seja, os cientistas achavam tão óbvio que havia raças superiores (as caucasóides, umas mais e outras menos) e raças inferiores (todas as outras) que nem se justificavam estudos científicos para confirmar ou negar esse óbvio ululante. Daí portanto é inútil tentar salvar a cara da Ciência neste aspecto. Não me consta que se façam estudos científicos para se comprovar o óbvio.Acauan escreveu:Não há porque tentar salvar a cara da Ciência porque ela não tem uma. A Ciência é um método de obtenção de conhecimento baseado na observação, teorização e experimentação.
O fato de cientistas defenderem determinada tese não a torna científica e sim o método que produziu as evidências que a comprovam.
Se Sir Isaac Newton apresentasse sua teoria da gravitação baseando suas conclusões apenas nos pressupostos teológicos cristãos nos quais acreditava, tais conclusões não seriam consideradas científicas, mesmo que apresentadas pelo cientista mais respeitado de seu tempo.
Assim, não importa a realidade histórica, cultural ou ideológica de uma época, a classificação de uma tese como científica deve considerar apenas os aspectos metodológicos referentes às conclusões e às evidências que as sustentam.
Por este critério, não há respaldo científico algum para as doutrinas racistas do século XIX.
Bem, não vou repetir tudo de novo, pois acho que você já deve ter entendido que a minha colocação é que, EM SUA ÉPOCA, a coisa dita científica ERA científica, mesmo que agora saibamos de erros metodológicos. Isto é da própria evolução da Ciência e do seu método de trabalho.Botanico escreveu:O pensador torna-se um farol de seu tempo. DO SEU TEMPO. Voltaire foi um pensador iluminista que sofreu perseguições de uns, mas no geral foi muito aplaudido e popular. Onde e quando ele viveu? Na Europa do século 18, onde os ideais absolutistas já estavam sendo questionados nas cabeças dos próprios aristocratas. Com as idéias que divulgava, ele mostrava um novo sentido de vida, de política, de sociedade, etc, para as quais havia um mercado interessado. Tivesse sido o que foi 100 anos antes, ele seria queimado vivo ou seria um escritor sem leitores.Acauan escreveu:Entretanto, os grandes pensadores, que realmente se tornaram faróis de seu tempo e dos tempos futuros, muitas vezes foram ignorados, perseguidos ou mortos por seus contemporâneos, mas suas idéias eram tão poderosas que não só sobreviveram às suas próprias mortes como modificaram o mundo.
A civilização Ocidental se construiu sobre dois exemplos disto, Sócrates e Jesus de Nazaré.
No livro de Kardec, A Gênese, este discorre que o maior milagre que Jesus realizou foi o triunfo de sua doutrina, que tinha contra si tudo aquilo que é causa do fracasso das obras dos homens. Isso prova que era divina a missão de Jesus. Mas isso não muda o que eu disse. Voltaire coincidiu de trazer luzes a um mercado que ansiava por elas; Jesus e Sócrates encontraram um público consumidor pequeno, que mesmo assim desagradou a concorrência, levou ao assassinato de seus mestres, mas os discípulos fizeram o serviço.Botanico escreveu:Muito que bem, Kardec codificou uma doutrina que prega o reencarnacionismo, mas distinto de todos os que o precederam, pois não há restrições de ordem sexual, social ou racial (apenas que humanos não reencarnam em corpos animais); INOVOU com relação à comunicação espiritual, por mostrar ser ela acessível a todos e não um privilégio de uns poucos profetas e iluminados; isso abriu a porta para que os espíritos dos falecidos se revelassem e revelassem também as conseqüências de seus atos no mundo espiritual. Sinto muito, mas não posso concordar que essas coisas foram produtos de ideologias da época.
Ah! A propósito: Blavatsky foi posterior a Kardec e anti-espírita.Acauan escreveu:Citei Madame Blavatsky apenas como um dos vários exemplos que mostram que as ideologias racistas do século XIX eram mais baseadas em algum tipo de misticismo do que em verdadeira ciência.
E não há absolutamente nada de inovador na proposta kardecista de que qualquer um pode se comunicar com espíritos, tal idéia é comum em inúmeras culturas, desde animistas tribais até a Europa pré-industrial.
Afinal, o que é ver e falar com fantasmas que não comunicar-se com espíritos, e não foi Kardec quem inventou os fantasmas.
O que é atribuível à Kardec é a pretensão de dar a tais comunicações status científico, pretensão esta jamais reconhecida fora da comunidade que ele fundou.
Vamos tentar deixar claro umas coisas: antes de Kardec (até um pouco antes dele, com as irmãs Fox e outros menos cotados) comunicação com espíritos era coisa para mestre iniciado e os espíritos não eram bem entendidos sobre sua natureza real. Kardec, com seus estudos, apontou que são simplesmente humanos desencarnados. Nada de demônios, anjos, deuses, Deus, etc. Quanto à questão científica, bem, isso já foi tão discutido por aqui, que acho que não cabe alongar-me. Essa questão se resume no fato de que essas comunicações são inaceitáveis para comunidade científica, pois elas contradizem os dogmas da Ciência e você sabe muito bem que isso não é permitido.Botanico escreveu:Acauan, eu gostaria que você ao menos admitisse isso: EXISTEM DIFERENÇAS MORAIS E INTELECTUAIS NAS PESSOAS. Não há fugir disso. Isso não desmente a nossa igualdade essencial como espécie e pessoas, mas é um fato. E o que o Espiritismo faz é simplesmente colocar que este fato também está presente na condição espiritual.Acauan escreveu:Por que eu negaria que há diferenças morais e intelectuais entre as pessoas? Isto é conseqüência direta da própria definição de individualidade.
O que rejeito é que estas diferenças sejam regidas por algum tipo de determinismo, o que é a própria negação da individualidade.
Seriam regidas pelo quê, então? O que é que torna as pessoas diferentes? Então uma criança nasce com falha genética no metabolismo da galactose e fica com deficiência cerebral por conta disso. Foi um DETERMINISMO GENÉTICO, certo? Aliás, muita coisa já existe sobre essa questão de genética e sua influência na DETERMINAÇÃO de nossas capacidades. Então eu diria que aqui já há um DETERMINISMO, com a diferença mínima (ou máxima, conforme o ponto de vista) de que este é palpável e verificável, enquanto o determinismo espírita, que diz que espíritos têm graus variados de evolução e, ao encarnarem, isso poderá se refletir na sua existência encarnada, não é verificável. Determinismos, portanto, existem, meu caro.Botanico escreveu:Por isso mesmo que as lembranças das vidas anteriores são apagadas. O que acontece, Acauan, é que as dores e sofrimentos humanos têm embaraçados os filósofos e confundido as religiões. Não pretendemos, nós os espíritas, afirmar que estão plenamente resolvidas, mas cremos a maior luz sobre o assunto, senão a única, partiu do Espiritismo. O Cristianismo, sobre esse ponto, apresenta ensinos de lastimável pobreza e impossível aceitação. De acordo com ele, as causas do sofrimento foi a burrada de Adão e Eva. O Espiritismo coloca como causa os nossos próprios erros. Ou seja, a culpa é nossa e não de algum pecador ancestral. A Ciência busca as causas físicas e tenta encontrar as soluções, mas oferece suporte moral para nada disso.
Não sei a que outras escolhas você se refere, mas como tenho dito, aquilo que não se pode remediar, é conta da lei de causa e efeito. O que se pode remediar e nada se faz ou busca-se atalhos para se livrar do problema, já é questão de escolha pessoal. Cabe só aqui a advertência espírita: _ A semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória.Acauan escreveu:As respostas do Cristianismo ao Problema do Mal parecem menos pobres quando analisadas em seus aspectos simbólicos, além do literalismo fundamentalista.
Mas uma das melhores respostas religiosas, na minha opinião, vem do judaísmo, do Livro de Jó, cuja mensagem é que mesmo que todo o Universo lhe pareça injusto e que a opção pelo BEM só lhe traga dores, deve-se perseverar no caminho da Justiça.
O porquê deve ser assim o livro não diz, apenas deixa claro no diálogo de Deus com Jó que a resposta não está no cosmo externo a ele, para o qual a existência individual humana é insignificante.
Já a cosmovisão espírita sobre o problema é repleta de contradições, pois associa o mal à ignorância dos espíritos primitivos e propõe que o BEM é alcançado pelo aprendizado decorrente das reencarnações sucessivas.
Esta idéia é quase Positivismo puro, a convicção de que o progresso leve necessariamente ao BEM, inclusive o progresso histórico, que tornaria a modernidade obrigatoriamente melhor que os tempos que a precederam.
Não há qualquer veracidade comprovada nesta opinião, que, portanto, é apenas isto.
Se a crença no progresso Positivo fosse verdadeira, o próprio passar do tempo evidenciaria, por si só, a redução da quantidade de Mal no mundo, uma vez que os espíritos evoluiriam sempre e assim o mal diminuiria continuamente.
Não há evidências históricas disto. Em muitos períodos pode-se observar o contrário.
Além disto, o espiritismo se baseia na mesma idéia fundamental do Cristianismo quanto ao tema, que o mal seja uma anomalia na realidade e não uma condição natural dentro dela, tanto que ambas estabelecem esquemas cósmicos para a eliminação do mal, a redenção e a reencarnação, respectivamente.
Se existe um complexo esquema cósmico para eliminar o mal da realidade, cabe perguntar por que não há um esquema cósmico constituído na inexistência do mal.
Kardec mesmo faz uma interpretação simbólica do episódio da queda do homem no Éden, mas ela é só para consumo espírita: os cristãos jamais a aceitariam, pois defendem a literalidade do texto bíblico e fim de papo. Neste caso então entra aquilo que eu disse de que seus ensinos para explicar a causa do mal e do sofrimento humano são de lastimável pobreza e impossível aceitação.
Se o livro de Jó não deixa claro o motivo de porque devemos perservar no caminho do Bem, não importa o quão ruim ele seja, então não resolve o problema. Não achei que fosse uma boa interpretação. Ao que parece trata-se apenas de uma disputa entre Deus e o Demo, onde o primeiro permite o abuso absurdo de se usar o Jó como saco de pancadas para se testar sua fé.
Na interpretação espírita, é o próprio espírito que se submeteria a situações assim para testar a SI MESMO. É UMA ESCOLHA PESSOAL e não um desafio entre Deus e Demo.
Quando vem um testemunha de jeová na minha porta, quase sempre se apela para dizer que o Mundo hoje está muito pior que o de antigamente. Sinceramente não sei qual o critério para se aferir isso. Temos armas mais destrutivas? Sim, temos, mas moralmente como estamos em relação ao passado? Tudo bem, você pode não concordar, mas há uma melhora considerável. Os criminosos, culpados ou inocentes, sofriam torturas e execuções com grande sofrimento, para a alegria e aplauso da galera, nada diferente dos circos romanos. O conceito de infância não existia. Uma menina de 6 anos que fosse acusada de bruxaria, seria cruelmente torturada e queimada lentamente para servir de exemplo às outras. Na Inglaterra do século XIX era assim: a maioridade era aos 7 anos e as penalidades para as crianças muito mais severas do que para os adultos. Bem, não vou aqui desfiar exemplos e mais exemplos. Acho que você entendeu. Esse argumento de mundo pior hoje é mais balela do que outra coisa.
Já o Daniel Douglas Home, médium anti-Kardec e anti-reencarnacionista, entrou nesta questão do progresso de que, se houvesse reencarnação e os espíritos se aperfeiçoassem, então a França de sua época seria muito mais moral que a de 300 anos antes e a Grécia de então seria muito mais culta do que a de 300 anos antes de Cristo. O raciocínio dele seria válido se SEMPRE OS MESMOS ESPÍRITOS REENCARNASSEM SEMPRE NAS MESMAS REGIÕES. Só que pela doutrina espírita, sabemos que não é isso o que acontece. Os espíritos migram de povos e de planetas e no Livro dos Espíritos isso é discutido.
Entendeu?Botanico escreveu:Quis dizer que índios são gente igual às outras gentes, com qualidades e defeitos, como todo mundo. Há quem considere os índios um bando de incivilizados inúteis, que precisam de uma enorme floresta para sustentar uma tribo de 100 índios, prejudicando os valorosos fazendeiros à volta, que querem vender o mogno e transformar a floresta e plantações de grãos. Há também aqueles que consideram os índios como santos. Lembrei-me agora de um aluno da extinta disciplina "Estudos sobre Problemas Brasileiros" (criada pelos militares para dar aos alunos uma imagem maravilhosa do Brasil e dos seus governantes milicos _ acho que esta disciplina deveria ter outro nome...). Foi feita uma palestra por um antropologista, que falou sobre as questões envolvendo os índios, como era sua organização social, os conflitos deles com os fazendeiros, etc e tal. No dia da prova, o professor pediu justamente para que então os alunos discorressem sobre o tema envolvendo os índios. Bem, um dos alunos fez lá um discurso dizendo que a coisa não era nada daquilo, pois o índio é bom, é sensível, é humilde, e todo o dia é dia de índio, etc e tal...
E aí? Você que é índio concorda com esse aluno? Se os índios são todos santinhos, onde se encaixa o cacique Paiacã, aquele que estuprou e espancou uma professorinha e ainda botou a culpa toda na mulher dele?Acauan escreveu:Se o tal aluno tivesse conhecido um guerreiro Tupi, não teria estas idéias idiotas, criadas pelos escritores românticos brasileiros do século XIX.
Éramos bárbaros, selvagens e cruéis.
Era a nossa cultura.
Não era lá muito romântica ou bonita, mas nos manteve vivos em um ambiente terrivelmente hostil até eu ter a chance de escrever estas palavras.
Acertou... pena que o pior animal no ambiente hostil em que os índios viviam tem duas pernas e espingardas e revólvers nas mãos...Botanico escreveu:Falou do tal trinômio: individualidade – sociedade – cultura. E vai querer me dizer que ele não alimenta o racismo?Acauan escreveu:Qualquer coisa pode alimentar o racismo em quem acredita nele.
É o solo fértil da mente racista que faz a semente do ódio germinar.
Sim, mas só que se o elemento determinista é impalpável e inverificável, não dá para se fazer política racista.Botanico escreveu:Houve um ministro do Lula que disse que a presença de nordestinos em São Paulo contribui para o aumento da criminalidade. Numa firma em trabalhei (em São Paulo), ouvi essa: _ Mantenha essa cidade limpa matando um baiano por dia. O meu irmão é escrivão de polícia e ficou horrorizado quando um nordestino, bichinho, chegou lá furioso, querendo que prendessem o namorado da filha dele, pois o garotão tirou a virgindade da mocinha. Protestava esse pai: _ Eu estava preparando a minha filha para mim! Eu é que tinha que tirar a virgidade dela e esse desgraçado que passou na minha frente! _ Será que um caso assim não levaria a se pensar que todo pai nordestino, bichinho, é que tira a virgindade da filha?Acauan escreveu:Pensará assim quem quiser pensar assim.
Os demais julgarão o sujeito que declarou tal intenção pelas intenções que ele próprio declarou e não julgarão os que nunca declararam intenção igual, com base nas intenções que não declararam.
O preconceito anti-nordestino em São Paulo cresceu no ambiente da industrialização acelerada dos anos sessenta e setenta, quando várias comunidades de migrantes dividiram espaço com as comunidades operárias nativas, muitas delas descendentes de imigrantes europeus.
Como disse antes, optar pelo preconceito era uma opção individual.
Na rua onde cresci havia italianos, espanhóis, japoneses, ucranianos (natos ou descendentes) convivendo com nordestinos, mineiros e outros migrantes em clima de ótima vizinhança.
Sim, tem toda a razão: o preconceito é individual... até que apareça alguém que capitalize um motivo, sobre o qual aglutine os individuais e torne o preconceito uma coisa coletiva. Quando há emprego sobrando nos EUA, ninguém se queixa dos imigrantes ilegais (ou legais), desde que façam o serviço de catar lixo e lavar sanitários. Mas quando faltam empregos e aí o americano nativo vai ter de catar lixo e lavar os sanitários, ah! Que se liquidem os imigrantes!
O preconceito começa quando não se aprende a aceitar o diferente. Uma coisa boa que eu acho que se deveria fazer é aproveitar aquela inútil disciplina Educação Moral e Cívica (do meu tempo) e a sua substituta (Organização Social e Política Brasileira), que nem sei se ainda existem, e em vez de falar de picuinhas políticas o que deveriam fazer é trazer pessoas de diversas culturas, nordestinos, ciganos, judeus, índios, etc e tal e que eles falassem e respondessem perguntas sobre sua cultura e sua gente. Uma coisa é lei: tememos o que não conhecemos.Botanico escreveu:Olha, Acauan, acho que toda essa nossa conversa pode ser resumida nesta frase: _ Não é negando as diferenças que se acaba com o racismo e sim aprendendo a reconhecê-las, respeitá-las e conviver com elas.Acauan escreveu:Repetindo, o problema não são as diferenças, mas os determinismos que afirmam dominar a fórmula que governa estas diferenças.
E como continuo dizendo: só os determinismos palpáveis e verificáveis possibilitam isso (é negro, nasceu no Ceará, é cigano, é macumbeiro, é estrangeiro...). Não é o caso da reencarnação, cujo espírito que reencarna é caixa preta.Botanico escreveu:Sabe, Acauan, NÃO HÁ COMO PREVER O QUE UMA DOUTRINA FARÁ NO FUTURO ATÉ QUE O FAÇA. Karl Marx tinha uma visão de uma sociedade mais justa e menos desigual, mas no que é que deu o Marxismo? Resultou numa tirania desumana que tem muitos mais milhões de vítimas do que todas as religiões juntas. Jesus deixou ensinamentos de amar ao próximo, de que o apego às riquezas e pompas são tesouros que as traças roem, que quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado, etc e tal. No entanto, no que deu o Cristianismo? Dispensa comentários, não?
A mesma coisa é o Espiritismo, só que este, com todos os seus senões, ainda não virou o que você acha que tem potencial para se tornar. Primeiro porque a mudança de realidade e mentalidade já inutilizou os textos politicamente incorretos de Kardec e em segundo, como já disse, SEM UM REFERENCIAL FIXO, não há como se aplicar políticas racistas.Acauan escreveu:Como disse alguém, o preço da liberdade é a eterna vigilância.
Certa vez escrevi sobre como certas interpretações do fundamentalismo cristão se aproximavam perigosamente das ideologias fascistas, o que me valeu algumas ameaças veladas de um religioso participante aqui.
Por mais que pareça impossível o surgimento de uma ditadura fundamentalista cristã, nunca é demais alertar para o risco que certos conteúdos e suas interpretações representam, o que não deixa de ser uma forma de se prevenir contra estas possibilidades, mesmo que remotas.
Teria sido ótimo se uma melhor leitura crítica e um mais decidido senso de prevenção tivessem criado, em sua época, uma prevenção eficaz contra o fascismo e o comunismo.
Os conteúdos racistas conseqüentes do determinismo positivo espírita representam um perigo ínfimo, mas isto não é razão para fingir que eles não existem.
Insisto que não existem esses perigos pois como tenho dito, a reencarnação é INDETERMINADA e os motivos que levaram Kardec a tentar determiná-la no sentido racial simplesmente caducaram na nossa realidade atual.