A noção de competência na escola

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A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

Existe um mal-entendido em acreditar que ao se desenvolver competência desiste-se de transmitir conhecimentos. Quase todas as ações humanas exigem algum tipo de conhecimento, às vezes superficial, outras vezes profundo, procedente das mais variadas fontes. Em contrapartida, quanto mais complexa for a ação, maior a necessidade, qualitativa e quantitativa dos conhecimentos. O verdadeiro dilema da escola é: para construir competências, estas precisam de tempo, que é parte do tempo necessário para distribuir conhecimento profundo. O conhecimento não tem muita valia se não pode ser mobilizado eficientemente e as ações complexas não podem ser realizadas sem a base de um conhecimento aprofundado.

O conceito de competência pode ser definido da seguinte forma: “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiado em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles.” Entre alguns teóricos, há a tentativa de ampliar o conceito de conhecimento para prescindir do conceito de competência. As ciências cognitivas, por exemplo, distinguem três tipos de conhecimentos:
Conhecimentos declarativos: fatos, leis, regras.
Conhecimento procedimentais: metodologia ou procedimento a se aplicar para obter um determinado resultado.
Conhecimentos condicionais: determinam quais as condições de validade dos conhecimentos procedimentais.

Perrenoud entende que apesar dos conceitos mais amplos de conhecimento das ciências cognitivas, ainda é necessário apelar para a noção de competência. Em um determinado momento, o sujeito teria a necessidade de julgar a pertinência dos conhecimentos em relação à situação, assim como mobilizá-los com discernimento. Esse juízo ultrapassa a aplicação de uma regra ou conhecimento. Esclarecido este tema, fica mais claro perceber que inteligência e erudição não são suficientes para formar um especialista. Um especialista é alguém que desenvolveu várias competências para mobilizar seus conhecimentos aprofundados em um determinado ramo.

Embora conhecimentos e competências sejam complementares, existe grande discussão de qual abordagem deve ser priorizada na escola. O debate sobre “cabeças bem cheias” ou “cabeças bem feitas” leva a dois tipos de currículo.
Tipo 1: Muito conhecimento sem levar em conta como, onde e quando ele pode ser aplicado.
Tipo 2: Limita bastante a quantidade de conhecimento mas exercita sua mobilização.

Competência pode ser relacionada com outras abstrações como a do esquema. Esquema é uma conceito piagetiano que significa:“uma estrutura invariante de uma operação ou uma ação; um padrão de pensamento ou comportamento pelos quais os indivíduos se adaptam ao meio.” Perrenoud dá como exemplo de esquema “desmarcar-se” num jogo de futebol. Uma competência pode ser entendida como uma orquestra de esquemas.

Para dominar uma situação, discriminam-se duas reações do sujeito:
(a) Mobilização instantânea diante da situação.
(b) Necessidade de deliberação diante da situação.
No contexto do especialista, diz-se que ele:
(a) Automatiza a reação às situações comuns em seu campo de atuação.
(b) Com algum esforço o especialista dá conta de situações inéditas em seu campo de atuação.

Competência também relaciona-se com a noção de savoir-faire (saber fazer). Existem muitas concepções de savoir-faire, Perrenoud trabalha com a seguinte: “um esquema complexo que procede em geral do treinamento intensivo.” Exemplo: músicos virtuosos, artesãos, patinadores etc. Todo savoir-faire é uma competência, porém, uma competência pode ser mais complexa, aberta flexível, do que um saber-fazer e estar mais articulada com conhecimentos teóricos.

Uma vez que competência é a habilidade de dominar uma situação, existiriam tantas competências quantas situações? A vida coloca-nos, com maior ou menor freqüência, conforme nossa idade e condição e, também, em virtude de nossas escolhas, frente a situações novas, que procuramos dominar sem reinventar completamente a pólvora. Ou seja, por analogia conseguimos dar conta de situações que se assemelhem com outras que já aprendemos a controlar. Nossa vida não é tão anárquica para que sejamos desafiados sempre, nem tão monótona e repetitiva para que não sejamos desafiados nunca.

Será que podemos imaginar uma competência desenvolvida para responder uma situação única? Existem situações tão originais que nosso repertório de competências não consegue estabelecer nenhum analogia com elas. Somos obrigados a construir uma nova competência rapidamente ou desistir de dominar a situação. Eventos como crise, luto, acidente, felicidade intensa ou adentrar num mundo totalmente desconhecido, exigem aprendizado acelerado para uma situação que não necessariamente irá se repetir.

Seria o treinamento suficiente para formar competências? O treinamento é importante na formação de competências, mas corre o sério risco de alimentar uma falsa idéia da dimensão da competência adquirida. O treinamento geralmente envolve uma série de exercícios estereotipados repetidos a exaustão, porém em condições que fujam a “receita de bolo” evidencia-se que competência desenvolvida não foi muito além das atividades estereotipadas.
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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por clara campos »

dá ideia que a escola tem que escolher entre ensinar conhecimento ou competência, contudo, eles não são (aliás, não devem ser) dicotómicos.
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Re: Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

clara campos escreveu:dá ideia que a escola tem que escolher entre ensinar conhecimento ou competência, contudo, eles não são (aliás, não devem ser) dicotómicos.


Pô Clara, a idéia do texto é justamente o contrário.
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Re: A noção de competência na escola

Mensagem por clara campos »

Achas?
se calhar interpretei mal, mas foi a ideia com que fiquei...

Res Cogitans escreveu: O verdadeiro dilema da escola é: para construir competências, estas precisam de tempo, que é parte do tempo necessário para distribuir conhecimento profundo. O conhecimento não tem muita valia se não pode ser mobilizado eficientemente e as ações complexas não podem ser realizadas sem a base de um conhecimento aprofundado.

Esta parte por exemplo apresenta a situação como um dilema, e eu não entendo porquê. Isto porque existem determinadas competências que, sendo desenvolvidas, permitem o aprofundamento do próprio conhecimento.

Repara:
Res Cogitans escreveu:
O conceito de competência pode ser definido da seguinte forma: “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiado em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles.”

Uma competência de autonomia, por exemplo, pode ser desenvolvida pelos alunos, por forma a que eles sejam capazes de procurar e aprofundar os seus conhecimentos, assim, o dilema acima referido, seria efectivamente um falso dilema, já que não teria que existir opção.
Completando com um exemplo:
Um professor pode optar por dar o sistema solar de forma expositiva, ou então fornece aos aos alunos alguns conceitos base e depois solicita-lhes a entrega de um trabalho sob a sua monitorização.
Desta forma, ao mesmo tempo que aprofundam os seus conhecimentos, os alunos exercitam a escrita, a organização de ideias, as capacidades de pesquisa e selecção de informação, o recurso a diversas fontes informativas.

Res Cogitans escreveu:
Embora conhecimentos e competências sejam complementares, existe grande discussão de qual abordagem deve ser priorizada na escola. O debate sobre “cabeças bem cheias” ou “cabeças bem feitas” leva a dois tipos de currículo.
Tipo 1: Muito conhecimento sem levar em conta como, onde e quando ele pode ser aplicado.
Tipo 2: Limita bastante a quantidade de conhecimento mas exercita sua mobilização.

Vês, mais uma vez o dilema, o "embora".
Que tal um "tipo 3" que permita, não apenas a transmissão e mobilização de conhecimentos, como o desenvolvimrento de competências que permitam a aquisição de mais conhecimento e de desenvolvimento de outras competências?


Res Cogitans escreveu:
Competência também relaciona-se com a noção de savoir-faire (saber fazer). Existem muitas concepções de savoir-faire, Perrenoud trabalha com a seguinte: “um esquema complexo que procede em geral do treinamento intensivo.” Exemplo: músicos virtuosos, artesãos, patinadores etc. Todo savoir-faire é uma competência, porém, uma competência pode ser mais complexa, aberta flexível, do que um saber-fazer e estar mais articulada com conhecimentos teóricos.


Esta parte eu acho redutora.
Estás familiarizado com os quatro pilares da educação de Delors? Além do "saber saber" e "saber fazer", eu creio que o "saber ser" e "saber estar" também são propriedades importantíssimas das competências.
Ou seja, parece-me que o texto apresenta uma visão muito tecnicista e cognitivista de competência, desvalorizando a sua dimensão atitudinal.
Uma competência também pode englobar por exemplo sentidos de responsabilidade, curiosidade, espírito de procura, componentes que fazem com que competência e conhecimento sejam realidades absolutamente inseparáveis, por forma a que seja absolutamente non-sense falar deles em termos de "dilema".
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Re: A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

clara campos escreveu:Esta parte por exemplo apresenta a situação como um dilema, e eu não entendo porquê. Isto porque existem determinadas competências que, sendo desenvolvidas, permitem o aprofundamento do próprio conhecimento.


Clara, a escola tem um tempo limitado. O dilema está na prioridade. Desenvolver competência leva tempo, e apresentar conteúdo profundo também. Ao se aumentar o tempo de um se diminui o de outro.

Uma competência de autonomia, por exemplo, pode ser desenvolvida pelos alunos, por forma a que eles sejam capazes de procurar e aprofundar os seus conhecimentos, assim, o dilema acima referido, seria efectivamente um falso dilema, já que não teria que existir opção.


A competência de autonomia deve ser desenvolvida mas a questão aqui não é tanto no tempo fora de sala de aula. O professor deve gastar mais tempo de sua aula desenvolvendo competências ou apresentando conteúdo?
Mesmo uma abordagem totalmente conteudista pode requisitar que se aprofunde o conhecimento fora da sala de aula. Em diversas matérias você tem um professor que dá uma aula inteiramente expositiva que é apenas um apanhado de algo maior que deve ser estudado pelo aluno fora da sala de aula.

Vês, mais uma vez o dilema, o "embora".
Que tal um "tipo 3" que permita, não apenas a transmissão e mobilização de conhecimentos, como o desenvolvimrento de competências que permitam a aquisição de mais conhecimento e de desenvolvimento de outras competências?


Perrenoud não diz que só existem essas possibilidades e sim descreve que no mundo escolar a discussão do currículo escolar quase sempre é pautada em um dos 2 tipos. Ao menos aqui no Brasil, a abordagem conteudista vende disparado.


Esta parte eu acho redutora.
Estás familiarizado com os quatro pilares da educação de Delors? Além do "saber saber" e "saber fazer", eu creio que o "saber ser" e "saber estar" também são propriedades importantíssimas das competências.
Ou seja, parece-me que o texto apresenta uma visão muito tecnicista e cognitivista de competência, desvalorizando a sua dimensão atitudinal.
Uma competência também pode englobar por exemplo sentidos de responsabilidade, curiosidade, espírito de procura, componentes que fazem com que competência e conhecimento sejam realidades absolutamente inseparáveis, por forma a que seja absolutamente non-sense falar deles em termos de "dilema".


Perrenoud tem uma visão congnitivista sim. Não sei se ele relaciona também com "saber ser" e "saber estar". Perrenoud no texto em questão estava relacionando o conceito de competência com outros conceitos, como esquemas (Piaget) e savoir-faire. Isso não significa que ele não admita a relação do conceito de competência com mais outros conceitos.
Tem algo mais completo e diretamente de Perrenoud aqui:
http://www.multirio.rj.gov.br/seculo21/ ... =3&letra=c
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Re.: A noção de competência na escola

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gracias, vou ler esse material mas apenas na segunda pois vou estar fora no fim de semana.
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Desculpa o atraso Res. Já percebi melhor o que estavas a dizer.

Contudo, antes de comentar, gostava que me ajudasses a interpretar uma parte do texto que não percebi bem (a propósito, o material está muito bom...).


Le Boterf (1994, 1997), que desenvolveu a idéia fundamental de mobilização, arrisca confundir todas as cartas ao definir a competência como um "saber-mobilizar". É uma bela imagem, que alimenta, entretanto, um risco de confusão, na medida em que a mobilização de recursos cognitivos não é a expressão de um saber-fazer específico, que seria chamado de "saber-mobilizar", e, menos ainda, de um "procedimento de mobilização" codificado. No processamento de uma situação complexa, talvez a mobilização de diversos recursos cognitivos não seja uma invenção totalmente espontânea e original, pois ela passa por uma série de operações mentais que atualizam esquemas e, às vezes, aplicam métodos. A "gestão mental", a "programação neurolingüística" (PNL) e os diversos métodos de educação pretendem, justamente, ajudar o sujeito a tomar consciência de seus mecanismos de pensamento, para dominá-los melhor. Contudo, não existe nenhum "saber-fazer" universal, que operaria em toda situação e que poderia ser aplicado a quaisquer recursos cognitivos, ou, então, ele se confunde com a inteligência do sujeito e sua busca de significado.

Uma competência pressupõe a existência de recursos mobilizáveis, mas não se confunde com eles, pois acrescenta-se aos mesmos ao assumir sua postura em sinergia com vistas a uma ação eficaz em determinada situação complexa. Ela acrescenta o valor de uso dos recursos mobilizados, assim como uma receita culinária engrandece seus ingredientes, pois ordena-os, relaciona-os, funde-os em uma totalidade mais rica do que sua simples união aditiva.


Quando puderes, dá-me uma ajudinha com este excerto.
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Clara, sábado ou domingo eu faço minha leitura do texto selecionado.
Abraços.
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Preocupa-me um pouco a idéia de que DEVEMOS nos ater mais às competências, pois são a APLICAÇÃO do conhecimento. É como (ou é isso mesmo) quiséssemos JUSTIFICAR o conhecimento apreendido (de aprEEnder). Deixa-me fazer uma pequena digreção na área científica, onde sinto-me mais à vontade. O conhecimento DEVE ser, sim, justificável ao aluno. Mas quando digo que um conhecimento deve ser justificável, não quero fazer supor uma aplicação imediata deste, onde o mesmo não faz sentido sem o provocativo “para quê serve?”. Afinal, que diferença faz se existem nove ou dez (ou oito) planetas em nosso sistema solar? Se adjunto adnominal e complemento adnominal não são a mesma coisa? Se o aluno não consegue memorizar a capital do Acre? Afinal, que falta faz, na vida de um aluno, não saber calcular uma associação de capacitores? Faltará algo em sua vida se ele não souber a diferença entre uma mitocôndria e um cloroplasto? Sim, faltará. Tenho certeza de que ensinar apenas o imediatamente aplicável é a melhor maneira de retrocedermos intelectual e socialmente, pois não haveria lugar para o novo e para a sistematização tão importante à manutenção do conhecimento científico. São justamente os saberes menos compromissados com o imediatamente aplicável que mais afetam este último, quase paradoxalmente. Apenas como exemplo, poderíamos lembrar da indução eletromagnética constatada por Faraday, que teria sido questionado da relevância deste conhecimento. Pobre inquiridor se soubesse das aplicações que viriam a seguir! Ainda lembrando o mesmo Faraday, este grande cientista iniciou pesquisas com descargas elétricas em gases rarefeitos, que originariam toda uma nova física, impensável até então. É bastante ilustrativo o fato de estas mesmas pesquisas possibilitarem, um pouco mais tarde, o advento dos tubos de Raios-X que, por sua vez, além das evidentes aplicações em medicina, possibilitaram a descoberta da estrutura do DNA que, por sua vez ainda, geraria toda uma revolução na biologia. Percebemos assim a relevância em se tratar com cautela o assunto da aplicabilidade do conhecimento científico, uma vez que sua gênese se dá normalmente em um contexto não pragmático.
É evidente que o aluno deve ser inquirido a partir de seu mundo imediato, sob pena de não apreensão do conhecimento ensinado (ainda que se saia bem na prova!), mas o professor deve ter o discernimento para saber quando uma ruptura deve ser promovida, onde o aluno possa ser aportado para um mundo ulterior ao seu. A conhecida tática de ensinar os resultados da atração gravitacional Terra-Lua usando-se as marés como exemplo, pode ilustrar bem o problema, quando aplicada em uma comunidade onde muitos nem sequer conhecem o mar. Mas isto não é motivo, de forma alguma, para não se ensinar as causas das marés. Apenas um sinal claro de que as justificações devem ser mais bem trabalhadas pelo professor, que deve mostrar competências que melhor se apliquem à referida comunidade, mas sem deixar de lado a universalidade dos conceitos científicos estudados. Fazer brilhar o Sol, já alertava Freinet. A velha máxima “é só saber usar a fórmula” é remanescente do ensino voltado à prática que, paradoxalmente à sua intenção, limita o aluno a ser apenas um utilizador de tais ferramentas, enquanto que a produção destas é que caracteriza um intelecto criativo, menos dependente e tecnologicamente mais produtivo.
Só para usar alguns exemplos da matemática, é perturbador ver, ainda hoje e com uma freqüência maior do que se gostaria, alunos que sabem somar frações porque decoraram o método do “mmc”, não sabendo realmente do que se trata, alunos que “multiplicam cruzado” aqui, “cortam este com aquele” lá, efetuam as quatro operações com uma quantidade enorme de “regrinhas” que há muito sobrepujaram o conhecimento real do que se está sendo feito, e finalmente que fazem todo o tipo de análise de funções matemáticas mas cuja relação com a ciência (que as produziu!) é raramente percebida. A física, por sua vez, serve-nos com inúmeros exemplos onde obter o resultado é, inequivocamente, o mais importante. O verdadeiro conhecimento físico por de trás do que se está sendo feito também foi sobrepujado pelo objetivo-mor, que é o bom desempenho nas avaliações.
Alguém poderia objetar, dizendo que, assim como é desnecessário o motorista conhecer os detalhes de funcionamento do automóvel, ou desnecessário uma dona de casa conhecer física moderna para operar o forno de microondas, é também desnecessário conhecer os fundamentos por de trás das regras aprendidas na escola. Julgo ser, este, um pensamento pernicioso, não porque apologeticamente defenda o pragmatismo e o imediatismo, afinal isto pode ser, sim, desejável em muitas situações (como as citadas acima), mas porque estamos tratando aqui de educação científica formal. Desdenhar as bases do conhecimento científico na educação, aquilo que sustenta e torna possível a estrutura dos saberes que mantém nossa tecnologia e, portanto, nosso modo de viver, é possuir olhos sem nunca tê-los aberto. Isto não será analisado aqui, mas o resultado é um aluno formado com uma quantidade incrivelmente limitada de independência intelectual, cujo suposto conhecimento científico obtido desfar-se-á em contato com o conhecimento obtido no mundo imediato ao seu redor, propalado por autores irresponsáveis e por uma mídia epidérmica e pueril. Por isso acredito que qualquer coisa relacionada com COMPETÊNCIAS deve ser mais bem discutida, para não transparecer uma preocupação meramente de aplicação. O conhecimento dignifica o homem, só ele o faz, e não podemos resumí-lo a um conjunto de ferramentas para se conseguir alguma coisas prática. Em uma escola onde trabalho a avaliação é feita por competências, onde temos três registros de notas (isto está ficando comum em escolas técnicas, por exemplo): conhecimentos, habilidades e atitudes. Acredito que isto não sirva para muita coisa. Não há como ser habilidoso sem conhecimento, e a atitude tomada a partir da obtenção do conhecimento está diretamente associada à habilidade. Então é uma confusão só, ninguém consegue sintetizar o que se quer com isto.
docdeoz escreveu:
"Você vai apertando a "coisa" e encontra um livro- "Variedades da Experiência Científica" que que CARL SAGAN afirma que há evidências de uma entidade chamada DEUS...
PASMEM!"

CADÊ O TRECHO? EM QUÊ PÁGINA? DE QUAL EDIÇÃO? EM QUAL CONTEXTO? SUA HONESTIDADE INTELECTUAL É IGUAL A UMA TEMPERATURA DE - 274 GRAUS CENTÍGRADOS, NÃO É MESMO?

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Le Boterf (1994, 1997), que desenvolveu a idéia fundamental de mobilização, arrisca confundir todas as cartas ao definir a competência como um "saber-mobilizar". É uma bela imagem, que alimenta, entretanto, um risco de confusão, na medida em que a mobilização de recursos cognitivos não é a expressão de um saber-fazer específico, que seria chamado de "saber-mobilizar", e, menos ainda, de um "procedimento de mobilização" codificado. No processamento de uma situação complexa, talvez a mobilização de diversos recursos cognitivos não seja uma invenção totalmente espontânea e original, pois ela passa por uma série de operações mentais que atualizam esquemas e, às vezes, aplicam métodos. A "gestão mental", a "programação neurolingüística" (PNL) e os diversos métodos de educação pretendem, justamente, ajudar o sujeito a tomar consciência de seus mecanismos de pensamento, para dominá-los melhor. Contudo, não existe nenhum "saber-fazer" universal, que operaria em toda situação e que poderia ser aplicado a quaisquer recursos cognitivos, ou, então, ele se confunde com a inteligência do sujeito e sua busca de significado.


Grosso modo, competência é a capacidade de dominar uma situação mobilizando conhecimentos.
A crítica de Perrenoud ao conceito de "saber-mobilizar" é poderia igualar o conceito de competência a um algoritmo mental, um método específico de resolução do problema que se apresenta ao sujeito. Praticamente um conhecimento procedimental.

Uma competência pressupõe a existência de recursos mobilizáveis, mas não se confunde com eles, pois acrescenta-se aos mesmos ao assumir sua postura em sinergia com vistas a uma ação eficaz em determinada situação complexa. Ela acrescenta o valor de uso dos recursos mobilizados, assim como uma receita culinária engrandece seus ingredientes, pois ordena-os, relaciona-os, funde-os em uma totalidade mais rica do que sua simples união aditiva.


Uma imagem melhor:

Competência: saber jogar bem xadrez
recursos mobilizáveis:
as regras do xadrez
jogadas e estratégias específicas
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Let me think for a while escreveu:Preocupa-me um pouco a idéia de que DEVEMOS nos ater mais às competências, pois são a APLICAÇÃO do conhecimento. É como (ou é isso mesmo) quiséssemos JUSTIFICAR o conhecimento apreendido (de aprEEnder). Deixa-me fazer uma pequena digreção na área científica, onde sinto-me mais à vontade. O conhecimento DEVE ser, sim, justificável ao aluno. Mas quando digo que um conhecimento deve ser justificável, não quero fazer supor uma aplicação imediata deste, onde o mesmo não faz sentido sem o provocativo “para quê serve?”. Afinal, que diferença faz se existem nove ou dez (ou oito) planetas em nosso sistema solar? Se adjunto adnominal e complemento adnominal não são a mesma coisa? Se o aluno não consegue memorizar a capital do Acre? Afinal, que falta faz, na vida de um aluno, não saber calcular uma associação de capacitores? Faltará algo em sua vida se ele não souber a diferença entre uma mitocôndria e um cloroplasto? Sim, faltará. Tenho certeza de que ensinar apenas o imediatamente aplicável é a melhor maneira de retrocedermos intelectual e socialmente, pois não haveria lugar para o novo e para a sistematização tão importante à manutenção do conhecimento científico. São justamente os saberes menos compromissados com o imediatamente aplicável que mais afetam este último, quase paradoxalmente. Apenas como exemplo, poderíamos lembrar da indução eletromagnética constatada por Faraday, que teria sido questionado da relevância deste conhecimento. Pobre inquiridor se soubesse das aplicações que viriam a seguir! Ainda lembrando o mesmo Faraday, este grande cientista iniciou pesquisas com descargas elétricas em gases rarefeitos, que originariam toda uma nova física, impensável até então. É bastante ilustrativo o fato de estas mesmas pesquisas possibilitarem, um pouco mais tarde, o advento dos tubos de Raios-X que, por sua vez, além das evidentes aplicações em medicina, possibilitaram a descoberta da estrutura do DNA que, por sua vez ainda, geraria toda uma revolução na biologia. Percebemos assim a relevância em se tratar com cautela o assunto da aplicabilidade do conhecimento científico, uma vez que sua gênese se dá normalmente em um contexto não pragmático.
É evidente que o aluno deve ser inquirido a partir de seu mundo imediato, sob pena de não apreensão do conhecimento ensinado (ainda que se saia bem na prova!), mas o professor deve ter o discernimento para saber quando uma ruptura deve ser promovida, onde o aluno possa ser aportado para um mundo ulterior ao seu. A conhecida tática de ensinar os resultados da atração gravitacional Terra-Lua usando-se as marés como exemplo, pode ilustrar bem o problema, quando aplicada em uma comunidade onde muitos nem sequer conhecem o mar. Mas isto não é motivo, de forma alguma, para não se ensinar as causas das marés. Apenas um sinal claro de que as justificações devem ser mais bem trabalhadas pelo professor, que deve mostrar competências que melhor se apliquem à referida comunidade, mas sem deixar de lado a universalidade dos conceitos científicos estudados. Fazer brilhar o Sol, já alertava Freinet. A velha máxima “é só saber usar a fórmula” é remanescente do ensino voltado à prática que, paradoxalmente à sua intenção, limita o aluno a ser apenas um utilizador de tais ferramentas, enquanto que a produção destas é que caracteriza um intelecto criativo, menos dependente e tecnologicamente mais produtivo.
Só para usar alguns exemplos da matemática, é perturbador ver, ainda hoje e com uma freqüência maior do que se gostaria, alunos que sabem somar frações porque decoraram o método do “mmc”, não sabendo realmente do que se trata, alunos que “multiplicam cruzado” aqui, “cortam este com aquele” lá, efetuam as quatro operações com uma quantidade enorme de “regrinhas” que há muito sobrepujaram o conhecimento real do que se está sendo feito, e finalmente que fazem todo o tipo de análise de funções matemáticas mas cuja relação com a ciência (que as produziu!) é raramente percebida. A física, por sua vez, serve-nos com inúmeros exemplos onde obter o resultado é, inequivocamente, o mais importante. O verdadeiro conhecimento físico por de trás do que se está sendo feito também foi sobrepujado pelo objetivo-mor, que é o bom desempenho nas avaliações.
Alguém poderia objetar, dizendo que, assim como é desnecessário o motorista conhecer os detalhes de funcionamento do automóvel, ou desnecessário uma dona de casa conhecer física moderna para operar o forno de microondas, é também desnecessário conhecer os fundamentos por de trás das regras aprendidas na escola. Julgo ser, este, um pensamento pernicioso, não porque apologeticamente defenda o pragmatismo e o imediatismo, afinal isto pode ser, sim, desejável em muitas situações (como as citadas acima), mas porque estamos tratando aqui de educação científica formal. Desdenhar as bases do conhecimento científico na educação, aquilo que sustenta e torna possível a estrutura dos saberes que mantém nossa tecnologia e, portanto, nosso modo de viver, é possuir olhos sem nunca tê-los aberto. Isto não será analisado aqui, mas o resultado é um aluno formado com uma quantidade incrivelmente limitada de independência intelectual, cujo suposto conhecimento científico obtido desfar-se-á em contato com o conhecimento obtido no mundo imediato ao seu redor, propalado por autores irresponsáveis e por uma mídia epidérmica e pueril. Por isso acredito que qualquer coisa relacionada com COMPETÊNCIAS deve ser mais bem discutida, para não transparecer uma preocupação meramente de aplicação. O conhecimento dignifica o homem, só ele o faz, e não podemos resumí-lo a um conjunto de ferramentas para se conseguir alguma coisas prática. Em uma escola onde trabalho a avaliação é feita por competências, onde temos três registros de notas (isto está ficando comum em escolas técnicas, por exemplo): conhecimentos, habilidades e atitudes. Acredito que isto não sirva para muita coisa. Não há como ser habilidoso sem conhecimento, e a atitude tomada a partir da obtenção do conhecimento está diretamente associada à habilidade. Então é uma confusão só, ninguém consegue sintetizar o que se quer com isto.


Só tem uma coisa... você não entendeu o conceito de competência.
Só para dar alguns exemplos: interpretação de textos, resolução de integrais, escrever uma redação... tudo isso é competência.
Esse apelo a utilidade do "pra q serve?" não é a questão do dilema.
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

*Deus deixou seu único filho morrer pendurado numa cruz, imagine o que ele fará com você.

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Mas como ter competência sem conhecimento?
docdeoz escreveu:
"Você vai apertando a "coisa" e encontra um livro- "Variedades da Experiência Científica" que que CARL SAGAN afirma que há evidências de uma entidade chamada DEUS...
PASMEM!"

CADÊ O TRECHO? EM QUÊ PÁGINA? DE QUAL EDIÇÃO? EM QUAL CONTEXTO? SUA HONESTIDADE INTELECTUAL É IGUAL A UMA TEMPERATURA DE - 274 GRAUS CENTÍGRADOS, NÃO É MESMO?

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Let me think for a while escreveu:Mas como ter competência sem conhecimento?


Você leu o primeiro post?
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

*Deus deixou seu único filho morrer pendurado numa cruz, imagine o que ele fará com você.

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Re: A noção de competência na escola

Mensagem por Dick »

Li o primeiro post, é claro, mas como costumo pensar em conhecimento como algo às vezes relacionado à competência, e às vezes não, acabo fazendo surgir alguns embates de conceitos na minha cabeça. No meu primeiro post, referi-me ao "pra quê serve", pois quando ouço que os conhecimentos apreendidos na escola, por exemplo, são inúteis se não servirem para alguma ação do aluno, diga-se, uma competência, fico profundamente consternado por ver o conhecimento ser resumido a um alicate. O problema é que é isto mesmo que muitos pensam, espero que não você. E discorri sobre o que acredito ser uma faca de dois gumes, por dar a impressão de que o conhecimento DEVE estar atrelado a uma competência, o que não concordo. Na verdade não é que ele não pode, mas sim que em determinadas situações isto não faz nem sequer sentido, como a contemplação de um matemático, por exemplo, de um tópico teórico avançado completamente destituído de uma aplicação, seja ela qual for. Ainda, posso perfeitamente considerar ele COMPETENTE por conseguir lidar com aquilo. E, veja que interessante, se pensado assim, percebemos que conhecimento e competência se confundem por completo.
Já quando eu ensino algo teórico, mas que é base para alguma coisa no quotidiano do aluno, não consigo separar conhecimento de competência. Na verdade não consigo abstrair uma situação onde as competências são o foco, sem cair no pragmatismo ao qual eu me referi. Assim, o que considero ideal é a preocupação com o conhecimento, a partir de um professor competente :emoticon19: que considere as formas de competência possibilitadas por aquele. É como vejo também a interdisciplinaridade. Acredito que o principal responsável seja o professor, que deveria (idealmente) localizar e relacionar sua disciplina junto às demais. Mas, como sabemos da limitação normal do contingente de professores formados no país, então isto acaba virando mágica de pedagogo. Já faz algum tempo que idéias e notícias sobre competências me atingem a cara, e eu ainda não percebi o que este povo quer. Provavelmente é uma limitação minha, mas ainda não percebi um objetivo explícito na discussão conhecimento x competência. (repetindo novamente mais uma vez de novo, A NÃO SER QUANDO SE CONSIDERA O PRAGMATISMO COMO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO ESCOLAR)

P.S.: Desculpe a bagunça de idéias, é como este assunto está na minha cabeça.
docdeoz escreveu:
"Você vai apertando a "coisa" e encontra um livro- "Variedades da Experiência Científica" que que CARL SAGAN afirma que há evidências de uma entidade chamada DEUS...
PASMEM!"

CADÊ O TRECHO? EM QUÊ PÁGINA? DE QUAL EDIÇÃO? EM QUAL CONTEXTO? SUA HONESTIDADE INTELECTUAL É IGUAL A UMA TEMPERATURA DE - 274 GRAUS CENTÍGRADOS, NÃO É MESMO?

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Res Cogitans
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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

Na verdade não é que ele não pode, mas sim que em determinadas situações isto não faz nem sequer sentido, como a contemplação de um matemático, por exemplo, de um tópico teórico avançado completamente destituído de uma aplicação, seja ela qual for. Ainda, posso perfeitamente considerar ele COMPETENTE por conseguir lidar com aquilo.


Desculpe mas você continua confundindo.

Vou dar um exemplo, dois professores de redação:
um dá toda a teoria da redação e só pede uma redação apenas no final do curso.

outro dá menos teoria da redação mas os alunos escrevem vários textos que são analisados pelo professor

Qual professor está gastando mais tempo em desenvolver competência????
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

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Sr. Incógnito
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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por Sr. Incógnito »

Filosofia da educação? Até vai.
Pedagogia? Socorro.
Admiro quem consegue ler os grandes pedagogos. De minha parte, não consigo ler, pois as conclusões não se seguem das premissas em 95% dos casos, tornando o texto sem sentido. Ou então, acho muito chato mesmo. Como professor, sei que a discussão é importante. Assim sendo, parabéns.

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clara campos
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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por clara campos »

Então Res, já estou mais a ver o tal "paradoxo".

Na minha prespectiva, esse paradoxo pode realmente existir numa disciplina, embora não deva existir ao longo da formação.
Ou seja, se os professores dos vários anos e disciplinas se articularem, é realmente possível desenvolver diversas e importantes competências sem que a transmissão de conteúdos seja comprometida.

Pessoalmente, eu defendo que o ensino (não me estou a referir ao ensino superior) deve privilegiar a pedagogia por competências, sem contudo comprometer va transmissão de alguns conhecimentos considerados mínimos (quais seriam estes já dava para outra longa discussão, mas acho mesmo que muito dos conteúdos obrigatórios, pelo menos em portugal, são desnecessários e inúteis).

Perrenoud salienta, e tem a minha concordância, que as competências requerem a prática, o exercício, o treino. Este processo, que obviamente levaria a um menor aprofundamento teórico, é apesar de tudo mais enriquecedor, mais útil e duradouro (embora naturalmente dependa um pouco de que disciplinas estamos a falar).

Também é verdade que o exercício de algumas competências exige algum aprofundamento teórico e conceptual, mas o autor também refere as competências mais simples e outras mais complexas, estas também englobadoras de outras competências estruturalmente mais simples. Então, se queremos trabalhar competências complexas, não nos pudemos demitir de trabalhar as mais simples.

Julgo que a articulação entre o vários professores e níveis de ensino é condição essencial para se alcançar um equilíbrio saudável, até porque um professpr sozinho dificilmente conseguirá trabalhar determinadas competências, principalmente as referentes ao saber-ser e saber-estar, pilares do conhecimento ainda amplamente ignoradas pelas escolas e professores (cá, por exemplo, a pontualidade de um aluno é mais valorizada que a sua democraticidade, capacidade de escuta-activa, ou competências relaccionais).

Outro tipo de competências como a capacidade de pesquisa e selecção de informação, a gestão de tempo, a organização e estruturação mental de conhecimentos, a mobilização de conhecimentos teóricos em aplicações práticas e/quotidianas, a autonomia nas acções também são dificilmente desenvolvidas somente numa disciplina, e contudo são competências que a Escola se propõe desenvolver.
Só por existir, só por duvidar, tenho duas almas em guerra e sei que nenhuma vai ganhar... (J.P.)

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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

Muito bom Clara!

Dependendo da matéria acho que o tempo em sala de aula devia ter um pouco mais de desenvolvimento de competência. Boa parte dos conteúdos são facilmente assimiláveis fora da sala de aula (estudo em casa), eu cansei de ter professores que davam praticamente o mesmo conteúdo presente nos livros. Não vejo sentido em pagar para uma pessoa ler para mim.
Deixe os alunos estudarem em casa os temas mais fáceis e pegue este tempo para desenvolver competência.
Editado pela última vez por Res Cogitans em 17 Dez 2006, 20:28, em um total de 1 vez.
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Re: Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por clara campos »

Res Cogitans escreveu: Não vejo sentido em pagar para uma pessoa ler para mim.
Deixe os alunos estudarem em casa os temas mais fáceis e pegue este tempo para desenvolver competência.

Exactamente.

Sempre odiei aqueles profs que passam a aula a ler o livro ou as projecções, sempre me perguntei "caraças, mas eles desconhecem que eu sei ler desde os 6anos?"Além duma mais essas aulas só dão para dormir e depois o pessoal tem que estudar à mesma sozinho :emoticon2:

Há muitas coisas que os garotos podem perfeitamente estudar sozinhos, desde que depois existam mecanismos de avaliação e controlo pelo professor.
No mês pasasado, por exemplo, estivemos a ensinar aos catraios do 8ºano(13anos) as cadeias alimentares. Esta matéria desenvolve também o fluxo de energia e ciclos de matéria nos ecossitemas. O currículo sugere que, como exemplo de ciclo da matéria, se explore o ciclo da água (que é um tédio para os putos). Então, optámos por não dar o ciclo da água, antes pedir-lhes que elaborassem um trabalho, em que, além da explicação do ciclo da água, teriam que, a partir dele, explicar o porquÊ de cada vez menos autores considerarem a água potável um recurso renovável.

Constatámos que, alunos com notas fracas e motivação praticamente nula, chegaram a conclusões muito interessantes e desenvolveram trabalhos bastante bons.

Naturalmente "perdemos" o triplo do tempo, mas os resultados foram muito encorajadores.

('tou tão babada não tou?? :emoticon1: )
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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

clara campos escreveu:'tou tão babada não tou??


Desculpe, não usamos estes termos, assim como vc não usa mala=chato. Pelo contexto posso especular alguns significados mas preferia q vc dissesse.
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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por clara campos »

sorry, babada significa tão orgulhosa, embevecida, que até se baba... tipo, "pai babado" ou "mãe babada"... deu para perceber?
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Re: Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por Res Cogitans »

clara campos escreveu:sorry, babada significa tão orgulhosa, embevecida, que até se baba... tipo, "pai babado" ou "mãe babada"... deu para perceber?


Foi o que imaginei :emoticon1:
*Estou REALMENTE muito ocupado. Você pode ficar sem resposta em algum tópico. Se tiver sorte... talvez eu lhe dê uma resposta sarcástica.

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Re.: A noção de competência na escola

Mensagem por clara campos »

Res, estarão os "nossos" professores, o nosso "sistema" preparado para o ensino por competências? Parace-me que um professor que consiga efectivar com sucesso uma pedagogia por competências, além duma excelente bagagem específica e pedagógica, deve possuir uma espécie de "dom" para a dinamização de grupos, bem como largos anos de experiência... :emoticon8:
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