user f.k.a. Cabeção escreveu:ímpio escreveu:Só que não tem como não ser arbitrária mesmo assim. Há diversas outras células e conjuntos de células, vivas, com cadeias de ácidos nucléicos que as tornam qualificáveis como portadores do genoma humano, que no entanto podem morrer ou serem mortas sem suscitar questões morais.
Contudo, não são destruídas deliberadamente com a finalidade de evitar que o indivíduo caracterizado pelas mesmas se desenvolva.
O potencial de um espermatozóide não é um ser humano, a menos que ele encontre um óvulo, e para que isso ocorra é necessário um intercurso decidido por duas pessoas (ou uma, no caso de estupro). Já um embrião não precisa da decisão de ninguém para se desenvolver num ser humano, exceto se considerarmos como decisão de sua mãe não assassiná-lo.
Mas aí, nesse caso, todas as outras pessoas vivem por decisões de outras em não assassiná-las. E o "direito de escolha" deveria portanto estender a todo indivíduo um conteúdo de "liberdade" que autorizasse uns a matarem os outros.
Considero essa argumentação tão válida quanto a de que um óvulo é uma vida humana num estágio que depende da fecundação para continuar a viver e se desenvolver, não diferentemente de um bebê recém-nascido precisa da nutrição fornecida pelos pais.
Mesmo que se possa dizer que a sobrevivência do óvulo depende da decisão das pessoas, o mesmo vale para a alimentação de crianças recém nascidas. E não é por elas não serem autônomas e provavelmente morrerem de fome se forem deixadas por elas mesmas, que se pode fazer isso, optar por deixá-las morrerem de fome. Assim a fecundação do óvulo poderia ser vista como obrigação moral da mesma forma.
O fato é que o embrião é uma vida humana e deve ser protegida e respeitada como tal.
Na prática não é assim; embriões morrem em abortos espontêneos em uma quantidade aproximadamente igual (ou uma quantidades considerável, de qualquer forma) a daqueles que vingam, e no entanto essas mortes todas são bastante negligenciadas pelos pró-vida. Se a vida humana nesse estágio é tão valiosa quanto em qualquer outro estágio posterior, seria de se esperar que as pessoas só tentassem engravidar depois de baterias e baterias de exames médicos tentando eliminar ao máximo a possibilidade de matar vários filhos em tentativas.
Isso é "desculpado" pelas pessoas geralmente não terem consciência nem intenção de causarem essas mortes, sendo meio comparável a homicídio culposo (sem intenção) e negligência. Mas a indulgência é bem maior do que com qualquer outra coisa que se pudesse imaginar na qual se matasse acidentalmente tantas outras pessoas, como num hipotético caso de um cego que quisesse simplesmente se divertir - e não matar - atirando a esmo com uma arma de fogo.
Todos os argumentos, seja o de "direito de opção" da mãe, seja o do "caos social" decorrente do excesso de população pobre, são rasos e imorais sob qualquer perspectiva que considere inconcebível a relativização da vida humana.[/b]
O meu argumento é talvez apenas um "acessório" (ainda que eu pessoalmente considere a parte fundamental) desse do direito da mãe. Sob a minha perspectiva, que não sei o quanto relativizaria a vida humana, mas não me parece fazer isso além do razoável, ou até inevitável, não é mais imoral que aborto espontâneo, menstruação/não-fecundação voluntária, transfusão de sangue ou transplante de órgãos.
Considero inversamente, imoral defender-se um apanhado de células por causa do genoma (seqüências de nucleotídeos) que tiverem, implicando isso no que implicar, desde o nascimento de bebês em situações que podem não ser as mais adequadas tanto para eles próprios quanto para os pais ou a mãe solteira (indo desde inconveniente, até à pior situação possível, mas não há necessidade de exagerar), até a negação de um leque de possibilidades de pesquisas de tratamento de diversas condições que afetam a vida de outras pessoas já bem mais formadas que embriões, as quais julgo serem bem mais merecedoras de preocupação.
Mas novamente, poderia se dizer que isso é relativizar, e comparar com aquele filme com o Gene Hackman em que ele mata e/ou aleija mendigos para pesquisas de tratamentos médicos porque ninguém liga para eles, ou que poderia se cometer genocídios como meio para o fim da pobreza ou qualquer outra inconveniência. Aí voltamos a que eu acho que o mesmo poderia ser dito da defesa da não-fecundação voluntária do óvulo, que só não é algo defendido de veradade porque a fecundação é culturalmente
overrated. E a partir daí provavelmente só se andaria em círculos na discussão, como parece ser sempre o caso...