clara campos escreveu:Pegando primeiro no teu exemplo concreto:
- Tu estás a assumir que o "criador de tal personagem" criou a personagem com o objectivo específico de, de alguma forma, "educar" os seus companheiros.
- O que eu afirmo é que tu não tens como saber se isso é verdade ou se o "xamã" teve uma "alucinação fantástica" .
- Tu desvalorizas a hipótese da "alucinação fantástica", concentrando-te na lição de moral (que tu extraiste, mas outra pessoa poderia extrair outra como: se não se respeitar a vontade do anão enlouqueceremos)
Ok, não dá para saber com 100% de certeza, entretanto, podemos analizar o conteúdo e procurar saber qual é a opção mais provável.
Inventar estórias é a melhor forma de se transmitir conhecimento oral, principalmente em sociedades onde não existe a escrita, e/ou a escrita é de conhecimento de poucos.
Essa discussão, entretanto, é tola.
A minha argumentação, diz respeito justamente ao fato de que não devemos nos cegar a religião, com base únicamente na hipótese da literalidade dessas estórias.
Já que não a consenso nesse ponto, a questão não é "acreditar" no meu ponto de vista, ou "acreditar" que não são literais e que então a religião é uma coisa boa.
A questão aqui, é observar pessoalmente os diversos pontos de vista e, questiona-los.
Isso não é feito pela maioria, que questiona unicamente o ponto de vista literal e, tira suas conclusões com base nisso.
Foi justamente isso que eu argumentei, mas a maioria aqui, se preocupou em argumentar que o meu ponto de vista pode estar errado, que talvez as estórias sejam literais... mas essa nunca foi a questão.
clara campos escreveu:Do ponto de vista geral:
O que te estou a tentar dizer é que de quase tudo da vida: histórias ou experiências de vida, se podem extrair lições de moral. Contudo, nem todas as pessoas extraíem as mesmas lições de moral da mesma história. E isto é válido para História, Filosofia e Religião.
Esse é o ponto em que a religião, supera a história e a filosofia.
A maioria das estórias contadas na religião, procuram dar uma idéia "racional", daquilo que poderemos ver em primeira mão com a "pratica" dos ensinamentos.
O verdadeiro conhecimento que a religião nos permite, é adquirido através da pratica.
O objetivo da religião, é levar nossas mentes para um outro estado de conciência.
Na religião, o estado de "vigilia" que nos encontramos agora, é classificado como um dos estados do "sono". Os ensinamentos server para ensinar o homem a ir para o estado de conciência verdadeiramente "desperto".
É no estado desperto que atingimos a compreensão real do que está sendo ensinado e, isso elimina os enganos e erros de raciocínio ou interpretação.
clara campos escreveu:O grande senão da religião, é que abre a possiblidade de se acreditar em "alucinações", e que temos que nos submeter à vontade dessas alucinações.
O mesmo pode acontecer em qualquer área.
Ao enaltecer a "razão", muitos acreditam que animais não tem "direitos", porquê não tem "razão" e com isso, não tem liberdade e consciência.
Isso acarreta em prejuizo ao homem, pois o mesmo argumento pode ser usado contra deficientes mentais, ou mesmo contra pessoas "ignorantes", que não fazem uso da "razão".
Esse argumento o antigo argumento religioso disfarçado.
Os animais não tem "alma".
Na religião, consciência é sinônimo de alma, o que esse argumento faz, é alegar que o que cria a "alma" (consciência) é a "razão".
Existem tratados que defendem essa teoria, mesmo sem provar que o homem é o único a possuir razão e consciência... grande alucinação.
Como pode ver, isso não é problema apenas da religião.
Só porque qualquer "ciência", corre o risco de ser mal usada, ou mal interpretada, isso não faz dela uma coisa "ruim".
Vamos abolir a fisica ou a quimica, pelo risco delas serem mal utilizadas?
clara campos escreveu:Muitos teístas desenvolvem um conceito de deus difuso, não nos esqueçamos por exemplo de Espinosa. O problema, é que muitos escritos religiosos são suficientemente ambíguos em realação às verdadeiras intenções do autor, pelo que permitem diversas interpretações e diversas lições de moral.
Esse problema é conhecido dentro da religião.
Existem textos que falam sobre o assunto, ou mesmo estórinhas que o exemplificam.
Como a estória que conta o porquê diferentes religiões, falam sobre diferentes características de Deus, ou sobre como as pessoas se confundem e criam "rituais" e "superstições".
A primeira conta que um discipulo de um Buda, queria saber porque as diferentes seitas hindus, descreviam Deus de forma diferente uma da outra.
Esse Buda então chamou dois cegos e os colocou proximos a um elefante e, pediu para eles o tocarem.
O cego que tocou a tromba, disse que um elefante se parecia com uma cobra, o outro que tocara o traseiro, logo protestou e teimou em dizer que um elefante se parecia com cavalo, só que bem maior.
A segunda estória, conta que um monge hindu que morava em um mosteiro, ensinava que a religião deve ser sempre o mais pura possivel, sem rituais ou grandes tratados explicando um tema. Sempre que ele iniciava sua meditação, era interrompido pelo gato de um outro monge, que miava sem parar.
Ele então passou a amordaçar o gato antes de iniciar a meditação, para poder meditar em paz.
100 anos depois, um outro monge escreveu um grande tratado sobre os beneficios de se amordaçar um gato durante a meditação, explicando em detalhes como "energia vital" do gato, ajuda a guiar a mente humana no processo da meditação.
Existem contos Budistas, Hinduistas, Taoistas e de outras religiões, falando sobre essas coisas.
Na religião muitos falam sobre como a religião ao longo dos tempos, vai se enchendo de rituais e superstições.
clara campos escreveu:O que se defende neste fórum, é que as "boas lições de moral" fornecidas pela religão (que não são de desprezar) podem ser extraídas de outras fontes (como filosofia, etc) que não possuem o poder alucinogénico da religão.
E é justamente esse o engano.
Só na religião encontramos a meditação acompanhada dos outros ensinamentos praticos.
Essa é a única tecnica existente até hoje, que permite ao homem eliminar todos os seus medos e inseguranças, vicios e crenças, bem como é a única que ensina ao homem como controlar completamente sua propria mente, o que permite ao homem "acordar".
Em nenhuma outra ciência, você vai encontrar isso.
clara campos escreveu:E muito embora filosofias arreligiosas (como o marxismo p.e.) tenham servido de base a acções e reflexões profundamente díspares, estas não conferem aos seus seguidores a sensação de impunidade que é tão sobejamente fornecida (ainda que fruto duma "má" interpretação) pela "vontade divina".
Bom, primeiro que nem toda religião, fala sobre "vontade divina", não é nem ao menos necessário falar sobre "Deus".
Segundo que conferem sim, ao passo que tirando Deus da jogada e, colocando a "razão" em seu lugar, conferem aos seus seguidores a mesma sensação de impunidade.
Compare a quantidade de mortos causada pela religião e pelo marxismo...
Depois, é o que eu já disse.
1 - Toda religião ensina que devemos compreender corretamente o que está sendo dito, bem como praticar o que é ensinado.
2 - A fisica e a quimica, são potencialmente muito mais "perigosas" que a religião, mesmo assim, vocês não reclamam do mal uso feito delas. (E não devem mesmo, assim como não devem atacar a religião, pela burrice de alguns "crentes").
3 - Cristo foi um dos maiores criticos ao mal uso da religião, bem como dos religiosos que interpretavam a religião de forma errônea.
Ele os chamava de "cegos" quiando "cegos", bem como dizia que o que eles pregavam não era o verdadeiro Judaismo, mas sim conceitos humanos enganosos.
Leia o novo testamente, Cristo foi crucificado, justamente por ser um "teísta militante" contra as "igrejas" e "pastores" da época.
Todo "ateu militante" deveria amar Cristo, pois nesse ponto, são muito parecidos.
clara campos escreveu:Em relação ao conteúdo parabólico e não literal da história judaico-cristã da origem do Homem talvez a intenção do autor (...)
-na eventual tentativa de explicação científica
-na eventual tentativa de oferecer um "regra moral geral" - pois ou será errada (na minha perspectiva) ou ambígua
O mesmo se aplicaria, continuando no genesis, à origem das dores do parto - castigo por ter desobedecido a deus.
Mas talvez eu esteja a concretizar demais.
Ainda que seja verdade que da bílbia se possam extrair lições muito interessantes, e que valeria a pena generalizar e defender, ela tão é prolífera em maus exemplos, más lições e trágicas "morais".
Refiro-me por exemplo à legitimização do machismo ou à sublimação da intolerância, ainda que perpetuada de forma pacífica.
Bom, primeiro é bom saber, que o Cristianismo, Judaismo e Islamismo, diferem de religiões como Budismo, Taoismo e Hinduismo em um ponto fundamental.
Eles ensinam a mesma coisa, mas usam um meio diferente pra isso.
No Budismo, ensinam a não acreditar em nada e muito se explica sobre os porquês dos ensinamentos, para que com isso, a pessoa pratique.
Cristo faz o oposto, não explica os motivos de cada ensinamento e pede para "acreditar" nele e com isso, praticar o que ele diz.
A linguagem também é diferente, Cristo afirma tudo e Buda nega tudo.
Para fazer uma analogia meio boba:
Digamos que os dois querem ensinar uma criança, que se ela colocar o dedo na tomada, vai levar um choque.
Buda explica isso pra ela, conta estórias sobre crianças que levaram choque, conta que machuca e com o que se parece a dor do choque, etc...
Cristo não explica nada, ele faz o oposto de Buda e diz para criança colocar a mão na tomada, dessa forma, deixa que ela aprenda através da experiência.
Meios diferentes, para ensinar a mesma coisa.
Não basta você ler as estórinhas da biblia e tentar tirar uma "moral" disso, pois a "moral" das estórinhas, serve para guiar aqueles que estão aprendendo com a "pratica", sendo impossivel interpretar corretamente o que está sendo ensinado, apenas com a leitura dos textos.
clara campos escreveu:Em relação a religiões pagãs pré-europeias, os seus panteões divinos eram arquétipos naturais, representativos, sim, mas também activos.
O sol era adorado como sendo um verdadeiro deus (não somente a sua representação), ou seja eles realmente acreditavam que o sol era um ser consciente, com vontade própria.
O mesmo para a lua, que seria uma divindade feminina.
As estações deviam-se aos ciclos de vida-reencarnação destes deuses: o inverno começa porque o sol morre, o dia cresce porque a criança-sol cresce.
Estes elementos básicos encontram-se presentes em muitas religiões antigas, cujo objectivo principal talvez fosse explicar os fenómenos naturais. A partir do momento em que se criam estes deuses, e se assume que eles são mais poderosos que nós, então há que criar um sistema moral que lhes agrade, sob pena de castigo.
Você está apontando um "talvez", sem nem ao menos conhecer a doutrina dessas religiões.
A crença popular, sempre cria superstições e rituais em torno da religião, sem que isso signifique, que é o memso que a religião em si ensina.
Esse é o problema de se criar "verdades" sobre a religião, tendo por base historiadores e sociólogos.
A historia e a sociologia, são ciências distintas da religião e não podem estudar a religião em si (visto que essa é uma ciência distinta), mas somente a forma como o povo interage com a religião.
É o mesmo que eu querer falar sobre "a ciência", com base em como a sociedade se comporta em torno dela.
clara campos escreveu:
Se esses sacerdotes eram ou não inspirados por deus (ou acreditavam - ou não - ser) não é verdadeiramente relevante, pois os mesmos códigos podem ser inspirados por outra fonte, que não a divina, e que não estejam protegidas pela impunidade do "foi deus que disse".
A religião, como eu ja disse, ensina que devemos conhecer os ensinamentos e pratica-los. (isso elimina esses enganos).
Cristo foi um dos maiores criticos desses "sacerdotes" e foi crucificado por combate-los.
O potencial de mal uso da religião, não é justificativa para o desconhecimento da mesma, nem é desculpa para dizer que ela é algo "ruim", visto que QUALQUER área corre o mesmo risco.
clara campos escreveu:O problema é que, na prática, a distinção que fazes entre religião e política é uma interpretação pessoal tua, partilhada por muitos, mas não por todos.
Além do mais, ainda que assumindo que esse limite existe, a bíblia continua a possuir "lições boas" e "lições más" (já para não falar que a bíblia é uma colectânea motivada por diversos interesses políticos) e a dar azo a insterpretações terrivelmente divergentes.
O que estou a dizer é: um código de valores que enalteça o amor, mas que permita também enaltecer a vingança não é um código válido.
Essa é outra grande questão.
Nenhuma religião tem por objetivo, trazer um código de conduta moral que deve ser seguido para sempre, por ser a forma "correta" de se agir.
O objetivo da religião, é permitir ao homem acordar, de modo que ele próprio possa diferenciar a forma mais adequada de agir, bem como ensinar ao homem como usar seu livre-arbitrio.
Veja o que Paulo diz sobre isso: "Pois o que faço, não o entendo; porque o que quero, isso não é prático; mas o que aborreço, isso faço. E, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. Agora, porém, não sou mais eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum. Com efeito, o querer o bem está em mim, mas o efetuá-lo não está. Pois não faço o bem que quero, mas o mal que não quero, esse pratico. Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim. Acho então esta lei em mim, que, mesmo querendo eu fazer o bem, o mal está comigo (Rm 7.15-21)"
É a religião que nos ensina, como fazer o que realmente queremos.
Como não fazemos o que queremos, seguimos os ensinamentos, de modo a eliminar o que nos impede de fazer o que queremos.
clara campos escreveu:NadaSei escreveu:Agora, inegavelmente, classificar uma fonte milenar de conhecimento como a religião, como sendo veneno, só pode faze-lo seguindo um ponto de vista dogmático.
Aqueles que votaram nas opções 1 e 2, demonstram pontos de vista dogmáticos.
A posição 3, já demonstra certa cautela, podendo uma pessoa com algum conhecimento sobre religião, chegar a essa opnião.
Não concordo.
Como tenho vindo a referir, a maioria dos foristas não ignora as mensagens proveitosas da religião. Considera somente que a Religião tem demasiados aspectos negativos e fantasiosos e que como os positivos podem ser extraídos de outras fontes, ela é um veneno.
Ou seja, o saldo é negativo.
Isso já mostra que ignoram o que a religião ensina, pois não
existe substituto para o que a religião ensina, em nenhuma outra fonte de conhecimento humano e é justamente esse o meu ponto.
Seria ótimo, se a psicologia, por exemplo, pudesse substituir a religião e ensinar o que ela ensina, mas infezmente, a ignorância sobre a religião continua muito grande, o que faz com que ela ainda seja fundamental.
Buda bem que tentou simplificar a religião, pegando o principal e retirando rituais e superstições (ele retirou até mensmo "Deus"), mas com o passar tempo, tudo isso foi sendo colocado de volta.
clara campos escreveu:Além disso, ao colocares a opção "religião é veneno", que é o nome do fórum... não sei se estás ver a indução óbvia...
(além disso um veneno é-o em determinadas doses...)
Sim, isso porque "religião é veneno" exemplifica muito bem o que grande parte dos ateus, pensa sobre o tema.
Como eu já disse... falta de conhecimento sobre o assunto.
clara campos escreveu:NadaSei escreveu:Segundo que eu não falei sobre "acreditar" em Deus, mas sim sobre considerar a religião como fonte de conhecimento valida.
Primeiro - de acordo afinal
Segundo - como referi, o conhecimento fornecido pelas religiões pode ser obtido de outras fontes, que não incorporem um "divino".
O conto budista do céu/inferno poderia ser igualmente eficaz sem referências religiosas.
Mas a essência da religião é o divino, e esse por estas bandas não é reconhecido.
Homens escreveram coisas belíssimas mas "deus manda que" é um mandamento humano e não divino.
Bom como eu já expliquei, o conhecimento da religião não pode ser adquirido em outras áreas.
A religião não depende do "divino", como você coloca, visto que o Budismo orinigal, nem ao menos falava sobre Deus.
clara campos escreveu:E o céu e inferno interiores ou exteriores não deixam de ser figuras de estilo das realidades que representam ( e existem tantas representações... que cada uma em si é muito pouco fiável!).
O ponto da religião sobre o céu ou inferno, não é esse.
A questão religiosa é permitir ao homem não entrar em "infernos" de nenhum tipo e, demonstrar que atualmente estamos no inferno permanentemente, mas podemos sair dele.
clara campos escreveu:NadaSei escreveu:O engraçado é que eu nem cheguei a explica o "meu" conceito de "Deus", visto que eu não o tenho definido de forma satisfatória.
Eu apenas apresentei "algumas" das "muitas" coisas que se fala sobre o tema, na religião.
Podia jurar que já tinha visto qualquer do género "deus é o teu reflexo" ou "se olhares para o espelho verás deus" em vez de "fulano disse que x..."
Normalmente quando afirmamos que algo é, é porque estamos a dar a nossa própria visão.
De qualquer forma percebi que não seria essa a tua intenção, por isso adiante...
Eu estava apenas explicando que muito é dito sobre Deus e, que ele é um "algo" complexo dividido normalmente em três partes: Deus pessoal, Deus impessoal e Deus interior.
Fala-se seobre "partes" de um algo, sem realmente conceitua-lo como um todo.
Ninguém deve criar um "conceito" sobre o que é Deus, pois até onde sei, dizem ser impossivel conhece-lo por completo.
O que a religião faz, é criar conceitos como "Deus pessoal" e "Deus impessoal", para falar sobre partes desse "algo" indefinido.
Meu argumento é o de que muitos questionam apenas uma caricatura do conceito "Deus pessoal", e tiram suas conclusões com base nisso.