Fayman escreveu:Ah, sim, você poderia dizer quais os pontos marcantes da filosofia de Leibniz e em que eles diferem da... sei lá... filosofia tradicional?
E porque tal filosofia estaria equivocada, caso o cérebro funcionasse nos moldes apresentados?
Abraços!
A idéia básica de Leibniz é que antes de criar o mundo Deus teria visto todas as possibilidades de existência e avaliado uma por uma. Então Ele teria escolhido a melhor, em detrimento de sua infita capacidade de julgar todas para escolher a melhor.
O que se diz muito, mas eu tenho lá minhas dúvidas sinceras se é o que o Leibniz faz, é que assim sendo Deus teria acabado por predeterminar todos os acontecimentos vindouros. Calculando inclusive suas intervenções misericordiosas (os milagres). Este modelo passa a idéia de que tudo já estaria previamente predeterminado por Deus.
Corriqueiramente muitos críticos de Leibniz afirmam que se assim fosse Deus não seria um ser livre (pois teria sido obrigado a criar o mundo que criou por uma determinação lógica intrínseca nas próprias possibilidades dos mundos possíveis, porém não criados, que fizesse com que este mundo, o melhor dos mundos possíveis - segundo Leibniz -, existisse por necessidade. E não por uma escolha divina.
Se o problema do arbítrio se coloca já para Deus imagine o que se coloca pra nós, meras criaturas criadas. Produtos da ação necessária do Criador.
Se pensarmos nisso, o decaimento de uma partícula, sendo um fenômeno natural, deveria poder ser conhecido por Deus mesmo antes da criação do mundo. Afinal aquele decaimento seria uma consequência da ação imediata do Criador na coisa criada. Isso pra não falar que isso tb seria negar a onisciência divina.
Em consequência a isso, todos os eventos produzidos pela alma teriam sido causados por Deus. E não existiria livre-arbítrio.
Mas eu, pessoalmente, tenho lá minhas dúvidas. Afinal existia um ponto de vista muito similar a este na época de Leibniz que era defendido por Espinosa. E Leibniz com certeza lera Espinosa (aliás, quase foi pra fogueira em virtude disso, hehehe). E muitos críticos chamavam Leibniz de espinosista (acredite, isso era um chingamento sem tamanho). E o próprio filósofo insistiu muito na idéia de que sua filosofia não recai num espinosismo. Na idéia de que Deus é livre, e que nós somos livres.
Ano passado eu fui apresentar um trabalho na USP. E a minha mesa era composta por mais três leibnizianos. Eu fiz uma pergunta pra eles mostrando que o tal espinosismo estava impícito nas idéias que eles estavam defendendo. Não me lembro bem da resposta, até pq eu não entendo muito de Leibniz e fica complicado de acompanhar. Mas eles me deram uma resposta que ia no sentido de mostrar que este espinosismo não existe em Leibniz. Eu teria que estudar mais aprofundadamente o filósofo para dizer que concordo com o juízo do meu amigo.
Este meu amigo é cientista, e tem uma atitude científica ao ler Leibniz. Na ciência é possível aceitar ou recusar um juízo determinado. Mas em termos de filosofia não se aceita ou recusa um único juízo. Se aceita ou recusa um sistema inteiro, ou então determinados princípios que levam a aceitar ou recusar grande parte do sistema. Pq os juízos são apenas resultado da ação necessária do pensamento funcionando em um determinado sistema, com determinados princípios.