Acauan,
Acauan escreveu:Lígia,
Até aí tudo bem, leis são apenas instrumentos e, portanto, meios e não fins.
O ideal da lei é promover a justiça e o BEM, o que desdobraria a discussão para se justiça e BEM são conceitos transcendentes ou apenas convenções definidas pelo consenso dos envolvidos, mas isto é outro longo assunto, para outra longa discussão.
[...]
Esta conceituação de certo e errado abre espaço para se concluir que tudo que beneficie uma maioria seja certo, cabendo à minoria aceitar como certo qualquer coisa que a prejudique nestas circunstâncias.
O ideal do bom e do justo se identifica e se alinha com o que é verdadeiro, sendo que o verdadeiro o é e continua a ser, independente de como seja percebido ou entendido.
Mas como disse, esta é outra longa discussão.
Mas cabe totalmente aqui. O BEM do feto pode ser o MAL para a mãe que o deseje abortar. A menos que o BEM seja algo transcendente, ou imposto de tal forma que não se possa revogar, o malefício que uma gestação indesejada e que os métodos contraceptivos não impediram de acontecer, deveria ser levado em conta. E não estou falando de risco de vida para a mulher mas de condições financeiras, mentais, emocionais que muitas vezes - e o grande número de meninos de rua no Brasil não me deixa mentir sozinha - são mais importantes do que o potencial risco de vida que a gestação represente à mãe .
O pior é notar ainda que no Brasil não há campanhas promovendo o uso de contraceptivos orais, laqueaduras e vasectomia para as populações de baixa renda, o que impele forçosamente a gestações indesejadas que resultam em meninos de rua OU a abortos clandestinos.
Acauan escreveu:Najma escreveu: O problema da proibição do aborto é o fato de mulheres continuarem submetendo-se a ele mesmo com o estado vetando. E sim, mesmo que haja permissão e até assistência, isso não tiraria a utilidade das fazedoras de anjos de fundo de quintal nem do uso das beberagens passadas de geração a geração porque a opção de impedir uma gestação indesejada é uma escolha íntima da mulher mesmo que o estado legislado majoritariamente por homens, não leve isso em consideração.
Como dito antes, não há lógica em reivindicar o fim de uma proibição sob o argumento de que a proibição não é cumprida. Seria como pedir a legalização do roubo, já que as leis existentes jamais o erradicaram, podendo-se alegar a vantagem residual que com o roubo legalizado os ladrões não precisariam usar de armas, o que salvaria milhares de vidas.
Sob esta lógica, o Estado ser legislado majoritariamente por homens ou mulheres é irrelevante para questão.
Isso é distorção da idéia. Eu não disse que se deve permitir o aborto porque ele acontece clandestinamente. Mas que ele acontece clandestinamente a despeito da proibição. Seria mais humanitário se fosse permitido livremente e assistido pelo estado, dado que, mediante a proibição, abortos acontecem em fundos de quintal, pondo em risco desnecessário a vida de milhares de mulheres.
Acauan escreveu:Najma escreveu:Bem aqui, é interessante notar um ponto. Durante as primeiras semanas de gestação, o organismo da mulher trata o óvulo fecundado recém instalado como um corpo estranho ao mesmo. Daí as ânsias de vómito e a indisposição que muitas mulheres sentem. O fato é que a natureza não segue as leis que nós estipulamos. Nosso corpo reage a corpos estranhos de forma a expurgá-los e isso acontece até mesmo com mulheres que desejam engravidar e que sofrem muito quando nesse mesmo período acontece um aborto espontâneo motivado pelas reações hormonais e metabólicas. A minha pergunta é: se o corpo da mulher reconhece o zigoto, o embrião nos primeiros estágios como um corpo estranho e não como um "decantado em prosa e verso filho parte de si mesmo", qual o porquê de, nesse mesmo período, nãos e dar o direito à MULHER escolher entre ajudar as reações físicas de repúdio ao corpo estranho permitindo que ele seja expulso, ou seguir com a gestação?
A analogia do embrião como um corpo estranho é completamente falsa.
As defesas imunológicas da mulher não se concentram com o objetivo de destruir o embrião, pelo contrário sua fisiologia é redefinida, a partir de um realimento hormonal, cujo objetivo prioritário é dar ao embrião as condições ótimas de desenvolvimento, mesmo que às custas do mal estar da mulher.
Ou seja, o corpo feminino se sacrifica para que o embrião sobreviva.
Isto é exatamente o oposto do tratamento que um corpo estranho receberia.
Os casos de abortos espontâneos são anomalias, quando o corpo da mulher justamente não consegue concluir de modo satisfatório este realinhamento fisiológico.
Este fato em si não implica em desdobramentos filosóficos sobre a questão, mas se resultasse, seriam todos favoráveis ao feto.
Não nas primeiras semanas que, não por acaso, acaba sendo a data limite para o aborto em países onde ele é legal. No correr do tempo, a maioria das mulheres se adapta mas no princípio existe repúdio ao que é tratado como corpo estranho sim. Há pelo menos a teoria que relaciona a produção de
hCG pela placenta recém instalada e os centros de "rejeição" do cérebro, causando náuseas que em alguns casos pode levar à
hiperêmese.
A causa exata da hiperêmese da gestação é desconhecida, mas alguns fatores podem incluir:
· níveis elevados de hCG (gonadotropina coriônica humana). Os níveis desse hormônio da gestação aumentam rapidamente durante as etapas inicias da gestação e podem ativar a porção do cérebro que controla as náuseas e os vômitos.
Note na lista do link abaixo que o aborto é ilegal em países subdesenvolvidos ou com baixos índices de natalidade. A data limite é a 12a. semana:
http://www.euvotosim.org/internacional? ... ceeb47e93fAcauan escreveu:Najma escreveu:Não tenho a pretensão de estar tratando o assunto com argumentos racionais mas note:
- As leis que seguimos são feitas por seres humanos, não importa se divinizadas ou não, de onde vem a "dignidade humana" ou a "alma" que estamos negando a um abortado.
Vem de nossa própria percepção de que possuímos uma dignidade e se a reconhecemos em nós mesmos não a podemos negar a outros seres humanos, seja lá em que fase da vida eles estejam.
Mas se não dispusermos de condições de oferecer uma vida digna ao filho que foi concebido acidentalmente, de que adianta a dignidade "inerente" que nós mesmos atribuímos? Será mais um a ser jogado na rua ou espancado até a morte...
Acauan escreveu:Najma escreveu:- A lei que proíbe o aborto no Brasil é uma lei que visa o natalismo e não preservar o direito das mulheres de escolherem o tempo em que querem engravidar, caso os métodos contraceptivos falhem.
As leis que proíbem o aborto no Brasil visam apenas reconhecer o feto como pessoa humana, com dignidade e direito à vida.
O mesmo que disse acima. Onde vai a dignidade que a lei tenta atribuir ao abortável quando o mesmo é lançado na sarjeta ou morto pelo descaso dos pais que não tinham meios emocionais, estruturais, mentais de aceitá-lo? Há milhares de casos assim. Não seria a hora do estado abrir os olhos e incentivar a anticoncepção e o aborto por parte de quem não tem condições de gerar filhos?
Acauan escreveu:Najma escreveu:- Nós agimos na contramão do que é natural quando fazemos sexo heterossexual com intercurso vaginal sem fins de procriação.
Depende do critério para "natural". Bonobos fazem isto e não estão na contramão de nada.
Os Bonobos atribuem dignidade ou divindade a si mesmos?
Acauan escreveu:Najma escreveu:- Nós acalentamos um óvulo fecundado como um "ser humano" passível de ser "assassinado" caso esteja instalado em um útero de um corpo que por todos os meios, irá tentar expurgá-lo por tratá-lo como um corpo estranho durante as primeiras semanas.
Se isto fosse verdade, a grande maioria das gravidezes resultaria em aborto espontâneo, o que não ocorre.
Por uma questão de adaptabilidade da espécie, visto que os organismos que não aguentam não se reproduzem... mas os centros cerebrais que respondem ao repúdio são acionados em todas.
Acauan escreveu:Najma escreveu:- Não é muita contradição junta, não?
No meu entender, não.
Não somos Bonobos. Somos macacos mais metidos... Atribuímos dignidade a nós mesmos e fazemos sexo vaginal por prazer, sem a pretensão de arcar com o ônus de gerar outros seres dignos todo período fértil. Isso é contradicioso. Métodos contraceptivos, à exceção de "fechar as pernas" ou optar por anal ou oral, são anti-naturais.
Acauan escreveu:Najma escreveu:- Em que ponto está a razão?
Na dúvida prefiro que não se destrua uma vida inocente, enquanto existir a mínima possibilidade de ela de fato sê-la.
Bem, então concordamos em discordar. Sua opinião é essa. O estado também pensa assim. Mas eu discordo pelo que enumerei acima. A razão e a verdade estão onde não há contradições. E até onde eu vejo, há contradições na forma de encarar a vida de um embrião como digna de viver a despeito de necessitar de uma mãe disposta a arcar com o ônus da gestação. A decisão da mulher, o direito dela optar, deveria ser mais importante, sempre.
Beijos