Deuses ou monstros
por Percival Puggina em 03 de maio de 2007
Resumo: Assustadora idéia! A pessoa humana deixa de ser uma noção objetiva e uma realidade autônoma para se converter numa construção.
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Estamos, de novo, às voltas com a questão do aborto. O ministro Temporão quer fazer um plebiscito sobre o assunto. Há poucas semanas elaborei uma extensa matéria sobre o tema criticando os vários argumentos daqueles que o defendem. Na ocasião dei pouco relevo ao argumento religioso por me parecer que o assunto é eminentemente moral (embora as razões religiosas tenham lugar, sim, no debate de temas civis).
Lendo agora o livro “Aborto e a sociedade permissiva”, de Pedro-Juan Viladrich, editado pela Quadrante, deparo-me com uma interessante linha de raciocínio. Diz o autor, no capítulo intitulado “O abortismo ideológico” (e aí se vê a razão pela qual todos os projetos que tratam de facilitar o aborto provêm da mesma vertente ideológica), vê as coisas da seguinte maneira: “Existe pessoa quando existe um mundo de consciência explícita, uma ordem de interioridade auto-consciente e um desabrochar da própria liberdade. Uma vez que não possui essas características, o feto talvez seja vida na perspectiva biológica, mas não é um ser humano do ponto de vista ideológico ou cultural; quem suprime um feto suprime vida biológica, mas não uma humanidade”.
Assustadora idéia! A pessoa humana deixa de ser uma noção objetiva e uma realidade autônoma para se converter numa construção. Nas brilhantes palavras de Viladrich, tais ideólogos da cultura supõem que ao fazer uma “idéia de homem” estejam fazendo o próprio homem “à imagem e semelhança” de seu pensamento e de sua vontade.
E surge uma insuperável contradição. Só poderia criar o homem a partir de uma idéia quem pudesse criar a si mesmo a partir de uma idéia. Ora, o homem pode tirar-se a própria vida, mas não a pode dar-se; pode tirá-la de outrem, mas não a pode devolver. Por outro lado, não é a cultura que faz o homem (“porque a cultura não cria a si mesma”), mas é o homem quem faz a cultura. Logo, a cultura é a construção e o homem, o construtor.
Admitir-se o inverso, tolerar-se que a vontade de um ou de muitos possa definir o que é o humano e quem deve viver ou ser suprimido seria
aceitar os autores de tais conceitos como “deuses ou como monstros”. As conseqüências já conhecidas de suas teses consagram a segunda hipótese. Até porque, como ressalta Viladrich, ao triavializarem o real (a vida humana e sua essência) em benefício de sua “idéia de homem” (esta sim, absolutamente irreal, cultural, ideológica e transitória), franqueiam a humanidade inteira ao totalitarismo que tanto se empenham em vender sob os mais encantadores disfarces, ou impor pelos mais perversos méis de ação.
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Deuses ou monstros
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Deuses ou monstros
"Let 'em all go to hell, except cave 76" ~ Cave 76's national anthem
Perguntar-se-ia então, como é que o caminho de mão inversa, aquele que define o que é humano segundo uma essência que é baseada em pura crença pode impor sua verdade aos outros.
Obviamente, para que haja sociedade e não seja utilizada uma relativização geral que impeça qualquer vida humana de ter legitimidade, algum conceito de humanidade deve ser criado. E o autor insiste que, já que o conceito utilizado não é o dele (que, na opinião do próprio, mas não da grande maioria, é auto-evidente), que se crie um conceito novo em prol da "liberdade individual". E, ora ora, quem definiu que um embrião é um indivíduo foi justamente o próprio autor. E ainda bem que ele não veio com o papo torto do indivíduo ser um "ser essencial", e não uma construção...
A propósito, ele deveria ver a masturbação com os mesmos olhos que vê o aborto nas primeiras semanas de gravidez.
Obviamente, para que haja sociedade e não seja utilizada uma relativização geral que impeça qualquer vida humana de ter legitimidade, algum conceito de humanidade deve ser criado. E o autor insiste que, já que o conceito utilizado não é o dele (que, na opinião do próprio, mas não da grande maioria, é auto-evidente), que se crie um conceito novo em prol da "liberdade individual". E, ora ora, quem definiu que um embrião é um indivíduo foi justamente o próprio autor. E ainda bem que ele não veio com o papo torto do indivíduo ser um "ser essencial", e não uma construção...
A propósito, ele deveria ver a masturbação com os mesmos olhos que vê o aborto nas primeiras semanas de gravidez.
Re.: Deuses ou monstros
Mas...até que aparecem textos bons no merda sem máscara, vez por vez...