E nós nos enganamos heim? A gente pensando que o Antonio Carlos Magalães tinha morrido, mas quem morreu foi outro.
O que nós conhecemos contunua vivo, não tem nada a ver com este que os jornais descreveram. Nas fotos se parecem, mas nas biografias é que a gente vê a diferença. Tenho certeza. Como poderia me enganar? Eu? Se foi ele quem, durante anos e anos e de maneira genial, me ensinou, ensinou a senhora, todas as famílias, que os comunas comiam criancinhas no almôço.
Me lembro bem como, sugestionado por ele, eu passei a rezar não mais para Nossa Senhora de Fátima e seus arcanjos, mas para Tio Sam e seus mariners esmagarem a cabeça dos nacionalistas. Quantas meias-noites eu não gritei pela senhora com medo de que, como ele avisara, a canalha vermelha já tivesse separando mãe e filho?
Quantas gerações de mães, padres, professores, m ilitares e políticos ele não orientou no combate aos subversivos?
Hah, que alívio eu senti quando finalmente todos, inflamados pela sua pregação, fizeram a cruzada final que nos salvou dos sindicalistas, estudantes, lavradores, professores, jornalistas, emfim, tudo que é vermelho.
Agora, esse que morreu eu não conheci, não. Fiquei conhecendo pela leitura dos jornais e passei a admirá-lo muito, mãe. Que democrata admirável era ele. E o que me impressiona é que um lutador liberal e humano de tantos e tantos anos tenha se mantido no anonimato. NNinguém no Brasil sabia que quem mais lutava pela democracia aqui era ele. Queria tanto tê-lo conhecido. E invejo muito estes editorialistas que deram seu depoimento, porque privaram deste segredo imenso.
A benção do seu filho,
Henfil"
Eu retirei esse texto do livro CARTAS DA MÃE, Uma compilação das cartas que o Henfil publicou durante anos na revista "ISTO É". Essa, precisamente, foi publicada no dia 1º de junho de 1.977, dias após o falecimento do Carlos Lacerda.
A "carta" está transcrita na íntegra. Modifiquei apenas o nome
do "homenageado".

































